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Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Instituto de Psicologia Departamento de Psicologia Social e Institucional

Odara Muniz

As Entidades Grupais: Primeiro Movimento Onto-Epistêmico

Trabalho
Analítico- observacional
proposto na cadeira de
Processos Grupais, ministrada
pelo professor Luis Artur Costa

Porto Alegre, 2023


As Entidades Grupais: Primeiro Movimento Onto-Epistêmico

Resumo: O presente trabalho se debruça na escuta grupal, ação que se constitui em 4 pilares,
sendo eles: a escuta em si como ferramenta epistêmica, os pensamentos do primeiro movimento
onto-epistêmico, em especial de Lewin (que irá direcionar a escuta), a escolha do grupo a ser
analisado e sua delineação enquanto objeto. Primeiro será apresentada a proposição de escuta e
os grupos escolhidos, na sequência serão destacados os principais elementos teóricos utilizados
na escuta e, por fim, haverá o “desenho” ou síntese como resultante de um modo específico de
captura do nosso objeto central.

Palavras-chave: grupo, escuta, primeiro movimento onto-epistêmico, delineação, objeto,


Lewin.

i. Introdução

O presente trabalho tem como objetivo exercitar a escuta psicológica voltada para os grupos e
suas dinâmicas, bem como articular os conceitos do primeiro movimento onto-epistêmico em
função da análise calcada na perspectiva múltipla que advém do processo observacional do sujeito
do conhecimento separado – na medida do possível – do todo grupal e das relações e posições
intrínsecas a ele.

A proposição que dá base ao trabalho é a seleção de um grupo (ou uma obra cultural que contenha
a apresentação de um grupo) para que, com base neste, seja realizada a aplicação dos
conhecimentos adquiridos em aula em um cenário específico. Tal seleção de grupo conta com
premissas pré-estabelecidas1, aqui a única modificação que teremos será a de analisar alguns
grupos ao invés de apenas um, visando uma maior utilização e aproveitamento tanto dos
elementos teóricos apresentados em aula quanto do próprio material analisado, que apresenta
diversos grupos e instituições que se relacionam a partir da movimentação dos sujeitos que neles
se encontram.

Para tanto, foi selecionada uma obra ficcional produzida no ano de 2018, denominada “Pico da
Neblina”. Essa é uma série brasileira, produzida pela HBO, que se passa nas ruas de São Paulo e
acompanha o protagonista chamado Biriba, mostrando as interações deste com diversos grupos e
instituições que o constituem, como sua família, o tráfico, o ambiente de trabalho formal e seu

1
Todas as premissas e a metodologia do trabalho estão descritas no moodle da cadeira, aqui serão
expostas apenas as partes que sofreram pequenas adequações do modelo para melhor análise e
articulação dos conceitos na obra selecionada, sem causar impactos nos objetivos principais da escrita.
amigo, que serão melhor apresentados e detalhados ao longo deste escrito. A análise como um
todo irá se ater aos dois episódios iniciais da primeira temporada da série, assim reduzindo a
quantidade de elementos a serem verificados e ainda mantendo insumos o suficiente para a
construção do pensamento e correlação com as ferramentas teóricas.

ii. Contexto da trama

A série inicia nos apresentando o personagem Biriba e o contexto político em voga naquele
momento, onde o parlamento está decidindo e votando a legalização da cannabis para uso
recreativo no Brasil, ponto muito importante na vida do personagem, que é vendedor direto da
planta, ainda ilegalmente, e desde o início se enxerga apartado da instituição do tráfico, vendendo
no centro da cidade para pessoas burguesas e, na sua maioria, branca. Isso fica claro quando mais
a frente percebemos que ele se recusa a vender cocaína e a trabalhar na biqueira2, além de dizer
algumas vezes que não é bandido, tanto para seu melhor amigo, Salim e sua mãe, Irene – ambos
o incentivam a gerar capital à margem da lei.

Os grupos apresentados na série e que serão analisados aqui são: a) a Família3 de Biriba, composta
por ele mesmo, sua mãe, duas sobrinhas e sua irmã, b) o crime organizado, composto de vários
membros e liderado por Cláudio Dias, grupo esse autonomeado como Movimento4 e c) a Empresa5
aberta por Biriba e um de seus clientes, o Vinicius, com o intuito de vender cannabis legalmente,
tal grupo, além dos já apresentados, é composto também por Nanda (namorada de Vinícius e
agente publicitária) e Digão (amigo de Vinicius e gerente financeiro da loja).

Apesar da série ser protagonizada por Biriba, não nos ateremos apenas a relação deste com os
grupos, mas na relação entre todas as partes, seguindo os fundamentos da Gestalt, tendo em vista
que nosso objeto é o todo grupal. Antes de me aprofundar na análise dos grupos em si e no
desenrolar da trama a partir da dinâmica desses, farei um breve resumo de nossa base teórica que
direciona a maneira de observar (episteme) e define nosso objeto (ontologia).

iii. Primeiro movimento onto-epistêmico

2
Nome dado aos pontos de venda de drogas ilícitas.
3
Para os momentos em que referenciar especificamente à família extensa do Biriba utilizarei a palavra
iniciada em letra maiúscula.
4
Nome dado ao crime organizado pelas próprias pessoas da instituição, na série. A partir deste
momento utilizarei esta palavra com inicial maiúscula para diferenciar os momentos em que ela se
refere a esse grupo em específico.
5
A empresa aberta por eles tem o nome de Empório Maria Joana, com intuito de simplificação, utilizarei
a palavra “empresa” com inicial maiúscula para diferenciar e apontar este grupo específico.
Para análise dos grupos descritos acima utilizaremos como base a teoria de Kurt Lewin e para
isso serão trazidos e sintetizados os principais elementos do texto “A "Dinâmica de Grupo" de
Kurt Lewin: proposições, contexto e crítica” (Juliana C. Pasqualini; Fernando Ramalho Martins;
Antonio Euzébios Filho). Um dos fundamentos do pensamento é a definição do grupo como
objeto central, sendo ele baseado no campo vital, ou seja, o campo ao qual o indivíduo está
reagindo, um campo dinâmico e tensionado por forças que são geradas na relação entre os
indivíduos do grupo, gerando uma resultante, que neste caso são os movimentos do grupo. As
forças podem se subcategorizar de muitas formas e com diversos motivadores, sendo enfatizadas
as forças de atração e repulsão pelo grupo em suas múltiplas dimensões. Tomando o grupo como
um campo de forças, o que mantém essa estrutura é a interdependência entre as partes, além disso,
a estrutura (ideais e objetivos) do grupo – enquanto entidade própria – é o que molda as ações e
sentimentos dos seus membros, sendo necessário que tal estrutura se transforme para que os
indivíduos sejam tomados por um devir-outro. Isso implica que o grupo é maior que os seus
membros e pode afetar diretamente a constituição subjetiva desses, daí podemos observar duas
coisas: a tendência a homogeneidade e o princípio gestaltista de que o “todo é maior do que a
soma das partes”.

Dando foco à tendencia de homogeneidade, podemos enxergá-la como a confluência das forças
expressas em movimentos explícitos dos membros, tais quais serão resultado do jogo de forças
que ocorre constantemente, seja por elas estarem correndo na mesma direção, seja pela
sobreposição de uma força maior em um embate de direções opostas. No segundo caso, há a
manutenção de forças contrárias implícitas no espaço vital, podendo acarretar o aumento de
tenção que, segundo Lewin, condiciona o cansaço, a agressão e a menor produtividade (na
perspectiva de não haver progresso em direção aos objetivos do grupo). Portanto, não podemos
tomar a tensão e a homogeneidade como conceitos duais, tendo em vista que o grupo pode manter
a homogeneidade em suas expressões e ainda assim haver um acúmulo de tenção repulsiva.
considerando as constantes mudanças e decisões que o grupo tem de enfrentar, é pouco provável
que não haja forças opostas atuando nele, sendo assim, o principal foco de Lewin é em como
produzir mudanças desejadas sem que se tenha (ou reduzindo) as tenções e ansiedades presentes
no campo grupal. Como aqui nosso foco é na escuta e análise, não nos aprofundaremos nos
mecanismos de intervenção – degelo, movimento e congelamento –, mas sim na observação de
um dos elementos principais para tais mudanças: a concepção de poder, que está diretamente
atrelada ao estilo de liderança e, por fim, a figura de líder. Em suma, tal posição define a
atmosfera do grupo, tendo Lewin trabalhado com duas em seus experimentos: a autoritária e a
democrática.

Nos experimentos, foi definido que na atmosfera autoritária as decisões seriam tomadas pelo mais
forte, os devires dos membros impostos por uma liderança impessoal ao grupo e sem
envolvimento com os esforços coletivos, onde esse direciona todos os passos do grupo, um por
vez, sem que os participantes tenham visão dos objetivos ou próximas ações. Já na atmosfera
democrática, os membros tinham mais liberdade individual e de organização, além de escolherem
coletivamente o como seria a divisão de tarefas, tudo explicado do início ao fim por uma figura
de liderança desde o início da dinâmica que, ao contrário da figura autoritária, se coloca como um
membro do grupo e contribui com este. Foi constatado ao final do experimento tenções maiores
em grupos autoritários e vantagens no grupo democrático, como a maior cooperação, menor
tenção repulsiva entre os próprios membros e entro um membro e o grupo e, também, a maior
produtividade desses. Ainda houve um terceiro modelo, que logo foi descartado por não
demonstrar nenhuma eficiência, colaboração ou organização, o modelo idealista, onde não há
mediação nenhuma da figura de liderança, que somente aponta o objetivo final.

iv. Dinâmica dos grupos – A escuta grupal

Tendo em vista que a escuta grupal se dá com base em um direcionador teórico, aqui não separarei
a escuta em si da análise, ou seja, não delinearei os fatos para correlacioná-los posteriormente aos
elementos teóricos, pois ambos serão concomitantes, um se dará pelo outro. Na conclusão serão
inseridas algumas observações sobre tal processo.
a. A Família

Este grupo é apresentado logo nos primeiros minutos da série. Já sendo bem consolidado, seus
participantes têm uma relação pregressa e contém quatro sujeitos. Nos primeiros momentos
podemos reparar que a Família tem de lidar com algumas tensões, considerando que um dos
membros traz à tona sua discordância com a decisão do outro – que não está presente na cena –
de realizar mais reformas na residência do que o acordado inicialmente – no caso, no porão.
Contudo, é importante reparar que logo antes da exposição de tal desconforto, Irene pergunta a
Biriba – seu filho – o como tinha sido seu dia de trabalho, ele a entrega o dinheiro que conseguiu
com as vendas e diz que foi “normal”, contudo ele estava perdendo as perspectivas de continuar
vendendo cannabis em decorrência de sua recente legalização e, logo após a exposição do
desconforto ele a pergunta se ela ficou sabendo da legalidade da planta, coisa que pode por em
risco o ganho de capital da Família. Irene diz a Biriba para que ele não se preocupe, pois há outras
possiblidades e produtos, neste momento a tensão é reprimida ao Biriba se retirar do local, tendo
em vista que o cenário implícito que se colocava ali implicava em ele vender cocaína ao invés de
cannabis. Outro ponto interessante de se reparar, é que mesmo com discordâncias, Biriba entrega
o dinheiro para Irene, o que representa uma centralização das tomadas de decisão relacionadas
aos movimentos e certas potencialidades do grupo, ou seja, neste momento temos indícios de que
é ela quem desempenha o papel de liderança deste núcleo.
Em um momento posterior a integrante mais nova do grupo vai até o porão, local que havia
começado a ser reformado recentemente, lá se assusta com o que vê ao iluminar um buraco no
chão, ao gritar, comove toda a Família, que se reúne em sua totalidade naquele local. Neste
momento as tenções implícitas entre Biriba e Kelly se tornam explicitas ao iniciarem uma
discussão sobre as decisões futuras e questões passadas do grupo. Percebe-se que Irene não se
manifesta e não há nenhuma outra forma de mediação ali. Logo, pela falta da tomada de decisão
calcada no bem-estar coletivo, advindo de uma mediação da posição de poder que considera todas
as perspectivas (democracia) e pela falta de uma imposição centralizada de um viés único para os
devires do grupo, podemos considerar que o grupo está atuando sob um regime idealista até este
momento.
Na cena posterior a essa e ao início do segundo episódio, é demonstrada a participação de outros
membros da Família, sendo que dois desses não se fazem presentes no espaço físico, contudo,
compõe e tensionam seu campo vital, são duas figuras paternas e ausentes, cada um por sua
respectiva causa. A atuação desses se torna clara com tenções percebidas entre Biriba e Irene no
primeiro episódio e entre Kelly e Gabi no segundo. Já o terceiro membro, que se faz presente
fisicamente, é Salim, que tem uma relação próxima com todos da casa, cresceu com Biriba e o
considera como um irmão, foi cuidado por Irene e o considera como sua mãe, sendo o primeiro
caso implícito no campo verbal e o segundo, explicito. Um ponto de grande singularidade entre
as duas figuras ausentes e a terceira figura parcialmente presente, se dá nas possíveis soluções
que os primeiros poderiam dar para os dilemas do grupo e a solução apresentada pelo terceiro.
Onde ambas são rejeitadas por alguns membros (Biriba e Gabi) e aceitada pela liderança (Irene).
Tais tensionamentos impedem que o grupo tome decisões em conjunto e se aplique,
verdadeiramente, no alcance de seus objetivos. De fato, faz com que haja até um deslocamento
de Salim, que em um movimento de repulsão se coloca fora daquele grupo ao final do segundo
episódio, em uma conversa que tem com Laura, sua esposa. Pensando interventivamente – de
maneira simplória – e considerando nossa base teórica, seria necessário reduzir os níveis emotivos
do grupo e eliminar os conflitos trazendo um senso de cooperação ao centrar os membros em seus
problemas em comum para estabelecer uma decisão grupal em conjunto. O que definitivamente
não ocorreu no decorrer dos dois episódios analisados, ao percebermos as atitudes isoladas, como
a de Biriba sobre seu emprego. Contudo, apesar de todas as questões, isso não culmina na
dissolução do grupo, tendo em vista tanto os fortes vínculos afetivos, quanto a interdependência
dos membros (dois pontos que, inclusive, estão fortemente entrelaçados).
b. O Movimento

O Movimento é constituído e articulado por diversos membros, com um grande grupo, se divide
em grupos menores para realizar suas atuações. É apresentado ao início da série realizando uma
de suas principais atividades, a venda de cocaína e cannabis. Nesta noite em específico, está
ocorrendo a votação parlamentar para a legalização da venda e consumo recreativo de cannabis
no Brasil e todo o grupo presente naquele núcleo a acompanha em conjunto, pela televisão, e fica
claro – em suas reações aos votos a favor e contra – que o interesse do Movimento é pela
continuidade da proibição e criminalização, para que seus negócios se mantenham acontecendo.
Logo na sequência desse evento, é demonstrada uma reestruturação da organização grupal, ao
Salim informar que foi chamado para ocupar um cargo de liderança na organização, o de
coordenador regional, ao mesmo tempo em que houve a confirmação da legalidade da planta que
eles comercializam. Portanto, dadas as condicionalidades impostas – incerteza quanto ao futuro
da comercialização e troca de líder –, podemos prever uma necessidade de adequação das formas
de atuação do grupo e mudanças iminentes, que propiciam as tencionalidades e conflitos entre os
membros. Neste momento também é apresentada a possibilidade de Biriba entrar definitivamente
para o Movimento ao trabalhar em um de seus pontos de venda. Devido à falta de interesses em
comum do indivíduo com o grupo, percebemos uma força repulsiva que o impele, inicialmente,
a não comungar com tal entidade.
Na próxima cena em que o grupo se mostra novamente, pelo menos de forma mais tangível, na
relação entre os membros, não somente na sua manifestação subjetiva presente em sentimentos e
ações dos envolvidos, temos a troca da posição de liderança a partir de uma reunião formal de
Salim e Cláudio Dias (apresentado como uma figura de liderança maior hierarquicamente). Toda
a questão hierárquica aqui está bem clara para todos os componentes do grupo, a base disso é a
posição bem definida que Salim irá assumir em conjunto com o poder de Cláudio Dias ao ter a
autoridade de colocá-lo em tal posição. Concomitantemente a isso, podemos ver a configuração
autoritária de poder que se dá no Movimento, que se mostra factualmente na sentença de morte
que Cláudio impõe ao antigo coordenador regional, segundos antes de dar o cargo a Salim e,
apesar das súplicas de alguns membros do grupo e do próprio sentenciado, sem que haja uma não
execução do seu comando. Ainda nesta cena há um elemento tencional e intencional por parte de
Cláudio, que realiza ambas as ações (a sentença de morte e a ocupação do cargo) em um mesmo
momento e na presença de Salim, o que implica em uma tenção bem específica de atração ao
grupo por meio do medo, ou seja, pela consequência de erros ou desvios do padrão imposto.
Dadas as condicionalidades, também podemos ver o tipo de força de atração que o grupo promove
para a entrada de novos membros, pois acaba sendo uma opção real para pessoas que não
conseguem se enquadrar em outras instituições, principalmente estatais e privadas. Analisando
este ponto a partir do envolvimento de Biriba com o Movimento, podemos ver que este individuo,
apesar de não confluir com os ideais do grupo, tem uma relação comercial com ele e se vê
impelido ao entrar definitivamente, quando não lhe restam mais opções profissionais (que
atendam às suas necessidades) à disposição. Ademais, ele até mesmo cumpre uma tarefa
extremamente desconfortável para si com o intuito de fazer parte deste movimento grupal.
c. A Empresa

Este é o único grupo que se forma e se constitui ao longo da trama, não havendo uma estrutura
pré-concebida antes do momento temporal em que a série se passa – pelo menos não como a
Empresa propriamente dita –, a não ser a relação estritamente de compra e venda de produtos
entre dois de seus membros. Em uma conversa é concebida em um campo de ideações e deste
ponto até o seu despontar tem um caminho tortuoso, contudo, os recursos para tal confecção são
elaborados e ela nasce em um processo formal ao início do segundo episódio da série.
Apesar de Biriba e Vinicius fundarem a Empresa em conjunto em com direitos iguais, logo é
percebido que é Vinicius quem toma as principais decisões e de forma unilateral, abrindo espaços
para algumas discussões, contudo, dando os principais direcionamentos, ao indicar qual seria o
local da loja, realizar a ocupação de cargos de gerência publicitária e financeira da empresa, além
de definir o como o espaço físico seria organizado, sem a consulta prévia a Biriba, que se mostra
em uma posição passiva e surpresa ao se deparar com tais coisas. Com estes pontos colocados,
podemos relacionar a figura de liderança atrelada a Vinicius, contudo, não podemos nos precipitar
e colocar a configuração em um estilo autoritário, pois no campo discursivo há referência a
igualdade das partes e de direito de fala.
Ao avançar algumas cenas, podemos perceber que há uma votação – sugerida por Vinicius – para
a decisão do nome da Empresa e estilo de publicidade, apresentação, ou, além disso, a definição
de identidade do grupo enquanto entidade, processo onde há um impasse na votação e um dos
membros (Digão) é tencionado para votar a favor da ideia inicial juntamente com Vini e Nanda,
onde apenas Biriba não concorda, mas acaba cedendo. A partir deste ritual, podemos projetar a
Empresa como uma instituição formalmente democrática que tem base em na tomada de decisão
coletiva e em contraste tem elementos autoritários ao, a partir dos tensionamentos do espeço vital,
propiciar a coerção de seus membros, tanto no momento da votação, quanto na tomada de ações
isoladas por parte de um dos sócios.

v. Conclusão
Na escuta de grupos é possível perceber a ramificação interpretativa que podemos dar aos fatos e
o como isso depende do nosso ponto de vista sobre eles, mais do que isso, sobre o como olhamos
e o que procuramos ao olhar para os movimentos das relações e o como as organizações e
agrupamentos podem se tornar entidades próprias que reverberam no devir de seus membros –
que aqui podemos ler tanto com a ótica de fazer parte quanto como partes de tal corpo. Durante o
processo de escuta, o processamento das informações obtidas é inerente e se dá de maneira
orgânica, sendo necessário direcionar tal síntese para delinear o objeto procurado ao cruzar os
dados e gerar informação sobre eles. Por isso, creio que não seja possível realizar uma escuta sem
um viés, ou uma escuta apenas do que é. Podemos, sim, apenas descrever os fatos e os
movimentos, mas nesse caso não haveria a clarificação do objeto que estamos procurando gerar
conhecimento.

vi. Referências

ASQUALINI, Juliana; MARTINS, Fernando Ramalho; EUZEBIOS FILHO, Antonio. A


"Dinâmica de Grupo" de Kurt Lewin: proposições, contexto e crítica. Estud. psicol. (Natal)
[online]. 2021, vol.26, n.2, pp. 161-173. ISSN 1413-294X. http://dx.doi.org/10.22491/1678-
4669.20210016.

FERNÁNDEZ, Ana; O campo grupal. Notas para uma genealogia; São Paulo, Martins
Fontes, 2006.

LEWIN, Kurt; Experimentos com espaço social; 1939.

A ESCUTA (parte 1) - A CLÍNICO-POLÍTICA DO ESCUTAR AS EXPERIÊNCIAS. [oucação


de: COSTA, Luis. Local: Anchor, 20/09/2020. Podcast. Disponível em: https://anchor.fm/l-a-
costa/episodes/A-ESCUTA-parte-1---A-CLNICO-POLTICA-DO-ESCUTAR-AS-
EXPERINCIAS-ejuamg.

PICO da Neblina. Direção: MEIRELLES, Quico; MEIRELLES Fernando; CARONE Luis;


PESAVENTO Rodrigo. São Paulo: HBO Latin America Group, 2018. Episodio 1 (58min)
PICO da Neblina. Direção: MEIRELLES, Quico; MEIRELLES Fernando; CARONE Luis;
PESAVENTO Rodrigo. São Paulo: HBO Latin America Group, 2018. Episodio 2 (53min)

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