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A PARTICIPAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES NA PRÁTICA DA

EXTENSÃO RURAL

Douglas Daneluz Germiniani1*, Serinei César Grígolo2**, Marcos Hallas3 e


Almir Antônio Gnoatto4

* Acadêmico do 3º semestre de Zootecnia da UTFPR, Câmpus Dois Vizinhos,


bolsista do Programa Institucional de Extensão (PIBEXTI)/UTFPR, Dois
Vizinhos, Brasil
** Professor da UTFPR, Câmpus Dois Vizinhos, coordenador do projeto
Sistematização de Metodologias Inovadoras de Extensão Rural, do edital
033/2009 MDA/CNPq./UTFPR, Dois Vizinhos, Brasil.

e-mail: dd.germiniani@hotmail.com

Resumo Keywords: Training, associations,


cooperatives, development, credit.
A Cooperativa de Crédito Cresol do
munícipio do Verê no estado do Paraná, com
Introdução
iniciativas inovadoras de formação têm
contribuído para a melhoria das condições de
vida dos agricultores e agricultoras que
O sistema cooperativo no meio rural surgiu
participam do Programa dos Agentes
Comunitários de Desenvolvimento e Crédito, do anseio de resgatar a participação
promovendo o desenvolvimento de suas
comunitária de agricultores e agricultoras em
comunidades a partir de ações de extensão
rural, onde através de mudanças ocorridas nas ações de interesse coletivo, com o
propriedades referências, das quais os agentes
entrosamento de ideias, trabalho conjunto e
são pioneiros, proporciona-se a troca de
conhecimentos com os demais agricultores. ajuda mútua, que contribuem para a
Palavras-chave: Formação, associativismo,
prosperidade socioeconômica das famílias
cooperativismo, desenvolvimento, crédito.
envolvidas (RECH, 2000).
A missão do programa de Agentes de
Abstract
Crédito e Desenvolvimento é contribuir a
The Cooperative Credit Cresol the
inclusão social da Agricultura Familiar através
municipality of Vere in the state of Paraná,
with innovative training initiatives have do acesso ao crédito, da poupança e da
contributed to the improvement of living
apropriação do conhecimento, visando o
conditions of farmers and farmers participating
in the Program of Community Development desenvolvimento local e a sustentabilidade
Agents and Credit, promoting the development
institucional, possuindo como princípios a
of their communities from actions of
extension, where through changes in the interação solidária, formação, capacitação e
properties references, which agents are
organização dos associados, descentralização
pioneers, offers to exchange knowledge with
other farmers. das decisões, crescimento horizontal e

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democratização do crédito, promovendo o pesquisa buscou entender como os agricultores
desenvolvimento de suas comunidades através familiares podem ser sujeitos ativos da
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de ações de extensão rural (CADERNOS construção de seus projetos de vida e
INFOCOS, 2007). consequentemente dos projetos das
Os Agentes fomentam discussões sobre o cooperativas e demais entidades da
papel do crédito como instrumento para a Agricultura Familiar.
construção de um sistema de produção
sustentável para as unidades familiares de Materiais e Métodos
produção, com a adoção de tecnologias que
possibilitem ao agricultor desenvolver seus O processo de sistematização é um trabalho
projetos sem afetar o equilíbrio da natureza de produção de conhecimento produzidos
melhorando assim as condições de vida no durante a prática, através de processos de
campo. Para melhor desempenharem seu análise e interpretação.
papel, os Agentes estão em constante processo O trabalho consiste em descrever a prática e
de capacitação (CADERNOS INFOCOS eleger uma pergunta que expresse mais
2007). claramente o que se quer conhecer com
Este estudo baseou-se na sistematização do relação ao tema.
programa Agentes Comunitários de No momento a seguir, trata-se de analisar o
Desenvolvimento e Crédito desenvolvido na que aconteceu na experiência para
Cresol do município de Verê com a compreendê-la enfatizando a solução com a
participação do grupo de estudo e pesquisa teoria.
Agroecologia e Agricultura Familiar da
UTFPR Câmpus Dois Vizinhos, visando o Resultados
fortalecimento dos agricultores e das
agricultoras familiares junto às suas Em julho de 1997 é aberto um PAC na
comunidades, suas Unidades de Produção e cidade do Verê. A Cresol – Verê, que
Vida Familiar – UPVFs2 e Cooperativa. A pertencia inicialmente à área de abrangência
de Dois Vizinhos, desmembra-se da unidade
1
O termo Extensão Rural neste estudo, pode ser deste último e cria no ano de 1999 a Agência
entendido como práticas de desenvolvimento rural.
2
UPVF – Unidade de Produção e Vida Familiar
Cresol – Verê.
– é um termo utilizado e construído a partir dos debates Desde então, um dos critérios da Cresol –
realizados, principalmente pelas organizações da
educação do campo, para denominar o lugar de vida das Verê, é que todo diretor da unidade deve ser
famílias agricultoras não apenas como espaço de
produção, mas também como tempos e espaços de também um agente do Programa de Agentes
relações, de cultura, de lutas, de organizações.
Comunitários de Crédito e Desenvolvimento,

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considerando que esta é uma forma capaz de necessidades e das suas expectativas de vida e
auxiliar na formação dos agricultores e de produção.
agricultoras, visto que reuniões, encontros e Neste aspecto, o repasse de experências
assembleias, tempos atrás, eram momentos entre as partes interessadas (agricultores,
muito teorizados e que após a implantação do Agentes Comunitários de Desenvolvimento e
programa passou a vincular mais os Crédito e cooperativa) consiste em vincular a
produtores, permitindo que se sintam parte do sistematização com o estudo em si, onde
processo. “apropriar-se da experiência vivida e dar conta
O Agente Comunitário de Desenvolvimento dela, compartilhando com os outros o
e Crédito é o agricultor e a agricultora familiar aprendido” (HOLLIDAY, 2006, p. 22).
da comunidade que desempenham o papel de Desta forma o programa dos agentes, parte
aproximar comunidade e cooperativa, como do anseio pela otimização do uso do crédito
um elo, potencializando as demandas e debates rural em propostas produtivas sustentáveis,
nestes espaços. Ainda, exerce a função de como consequência do processo de reflexão e
gerar e ser referência em nível local de sua construção dos projetos de vida dos
unidade de produção e vida familiar, na área agricultores e das agricultoras. Da mesma
do uso do crédito, da produção, da forma, os projetos das comunidades e das
transformação, da comercialização, da gestão e entidades, bem como, as formas de gestão
da organização social. dessas, são resultados de um processo de
Para isso, por meio de processos de formação e articulação.
formação e de outras práticas de reflexão e Os agentes são estabelecidos por
vivências, o programa tem a missão de comunidades ou regiões, as quais indicam um
construir e consolidar ações relacionadas aos representante para ocupar este cargo. Em
principais espaços sociais da vida dos comunidades em que isso não ocorre, uma
agricultores e das agricultoras familiares, que pessoa é convidada pela Cooperativa de
são: a UPVF, a comunidade, a cooperativa e Crédito Cresol para desempenhar a função.
entidades. Assim, o programa dos agentes Geralmente para cada 50 associados é
surge dentro da Central Cresol Baser para designado um agente de apoio.
fortalecer processos formativos e organizativos Nos primeiros meses ocorrem visitas às
junto aos agentes, as comunidades e as casas dos agentes, com o intuito de se realizar
cooperativas ou outras entidades, como forma um apanhado geral das condições em que se
de potencializá-los enquanto atores da encontram a propriedade, o que remete a
Agricultura Familiar, partindo da sua elaboração de um planejamento das atividades
realidade, das suas considerações, das suas (criação de animais, pastagem, culturas, etc.),

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onde o grupo destaca o que está bom e não na construção de seus projetos de vida. Assim,
precisa ser modificado, bem como propõe os objetivos atuais do programa são:
melhorias nas demais técnicas de exploração 1) Contribuir nos debates sobre a
agropecuária, elegendo prioridades para se construção do Projeto de Vida4 e produção da
trabalhar. família; construção do controle social e gestão
Alfonso Ibáñez3 (1991 apud HOLLIDAY, democrática; geração de Unidades de
2006, p. 21) compartilha deste ponto de vista Referência (para sair da teoria, e mostrar
ao afirmar que “...As práticas de educação mudanças práticas nas propriedades cada
popular buscam inserir-se nos processos agente deve ter em sua propriedade algo que
sociais e organizativos da população, visando seja diferente); diversificação da produção, de
a resolução de seus problemas, necessidades e modo que se pratique uma melhor distribuição
aspirações, num contexto bem determinado”. de renda.
Após a primeira visita, a cada mês as 2) Motivar e viabilizar condições para a
reuniões são realizadas na casa de um agente participação dos associados na gestão (política,
diferente do mês anterior (em 2010 chegaram administrativa e operacional) das cooperativas
a ocorrer duas visitas durante o ano, em cada e das entidades, somando-se as relações de
residência), que conta com a presença de um parcerias em vista da cooperação, da
diretor, não apenas para tratar individualmente democracia, da participação, enquanto prática
o crédito, mas com auxilio de material coletiva de fortalecimento da Agricultura
desenvolvido pela base, são propostas práticas Familiar e do controle social sobre as
de melhoria das atividades de exploração entidades.
agropecuária. 3) Desenvolver processos formativos junto
Atualmente, o programa afirma-se como aos coordenadores e as coordenadoras dos
resultado da apropriação das experiências agentes comunitários de desenvolvimento e
vividas, (re)vendo e (re)pensando as práticas crédito, potencializando os atores da
adotadas, constituindo o agente numa forte Agricultura Familiar para a construção de
liderança local, a partir das demandas da alternativas de produção no campo e uso do
Agricultura Familiar, por meio da crédito.
democratização e do fortalecimento da
4
O Projeto de Vida é desenvolvido como um plano,
participação dos agricultores e das agricultoras onde são planejadas as ações que deverão ser realizadas
durante um prazo também estipulado em conjunto pela
família; são discutidas as prioridades para o
3
desenvolvimento da propriedade, que englobem todas as
Ibáñez, Alfonso: La dialética en la sistematisación de áreas (social, ambiental, produtiva). A utilização da
experiências, Revista Tarea, Lima, setembro de 1991, ideia de “Projetos de Vida”, vem da parceria feita com a
p.33. ASSESOAR, que auxiliou a Cresol no desenvolvimento
do material utilizado nesse programa.

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4) Potencializar a formação de lideranças Os produtores ao se referirem da Cresol,
comunitárias valorizando as experiências de declaram os benefícios de ser parte de um
vida como outras formas de conhecimento, grupo cooperativo, onde geralmente o pequeno
bem como, multiplicando-as com as trocas de agricultor que possui produção familiar é
experiências e gerando dessa forma outras valorizado, recebendo atendimento
formas de organização na UPVF, na diferenciado, e o mais importante, não sendo
comunidade, cooperativa e entidades. considerado uma fonte de renda assim como
5) Fortalecer a ATER institucional, por em outras entidades.
meio da organização e da (re)construção dos O crescimento no número de associados
projetos de vida das famílias, propondo ações registrado desde a criação do Programa dos
na área da produção, na agroindustrialização e Agentes Comunitários de Desenvolvimento e
na comercialização, a partir de uma matriz Crédito na unidade da Cooperativa Cresol no
produtiva sustentável (a exemplo da produção município do Verê até os dias atuais, evidência
orgânica e agroecológica) a fim de promover o sucesso da participação dos agricultores no
referências capazes de gerar debates e processo de inovação das práticas de ATER
iniciativas entre os diversos agricultores através da adoção dos sistemas de produção
familiares, as cooperativas e as entidades. implantados nas propriedades da Agricultura
6) Realização de compras coletivas; Familiar das comunidades envolvidas.
integrações esportivas; intercâmbios que são As oportunidades criadas a partir do acesso
realizados entre municípios e também entre ao conhecimento e crédito, gerou entre as
regiões, promovendo a interação social entre famílias dos agricultores uma concepção de
os envolvidos. parceria entre eles próprios, assim como com a
No entanto percebe-se que as atividades cooperativa de crédito, contribuindo não
deste programa, variam de um local para somente em assuntos do âmbito da produção
outro, conforme a dedicação e interesse de agrícola, mas também no que se refere às
cada cooperativa. ações promovidas na comunidade, como a
Com a adesão de mais pessoas e prática de esportes, conscientização das
consequentemente associados à cooperativa, crianças e jovens sobre técnicas de produção
os agentes passam a ter condições de estarem sustentáveis e a valorização da interação
formando outros agentes, permitindo assim a social, promovendo a qualidade de vida dessas
perpetuação do programa e a continuidade da pessoas.
família no meio rural, com perspectivas
positivas de uma vida melhor.

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Discussão iniciativa privada usa de artifícios comerciais,
tais como persuasão, manipulação entre
O programa visa através da construção dos outros, para vender seu produto.
projetos de vida, estimular o desenvolvimento O anseio em manter o programa, de modo
da família como um todo, tanto na área que este se consolide como referência em
produtiva quanto no lazer, na residência, nas alternativas de produção, tem como propósito
relações de gênero, etc. Há grande valorização disseminar ainda mais práticas como a
pela participação de toda a família durante as diversificação da produção, com uma
discussões sobre o projeto, pois percebeu-se distribuição de renda que ofereça melhores
que quando o debate era realizado apenas com condições de vida aos agricultores e suas
os homens, a parte produtiva acabava sendo famílias, bem como consolidar a participação
destaque, enquanto outras áreas eram deixadas dos envolvidos com a cooperativa e as demais
de lado. entidades como forma de promover o controle
Quando parte para os debates direcionados social e a autogestão dos processos. Essa
as famílias, a primeira questão que surge é em dinâmica valoriza as relações de parcerias,
relação ao custo para participar do programa. fortalecendo a cooperação, a democracia e a
Mesmo que outras famílias que não participam participação dos atores, enquanto construção
desacreditem no potencial desse de redes sociais solidárias.
empreendimento, ainda assim algumas acabam
copiando as estratégias aplicadas no programa. Conclusão
No entanto, o que se percebe na prática é
que as mudanças ocorridas nas propriedades O associativismo e cooperativismo quando
referências, das quais os agentes são pioneiros, integrados com assistência técnica e extensão
tem alterado a maneira das comunidades rural constituem importantes mecanismos de
enxergarem o programa. Para isso, os agentes fortalecimento da pequena propriedade,
se dispõem a mostrar suas respectivas contribuindo para o acesso igualitário as
propriedades aos demais tecnologias empregadas no setor, bem como, a
agricultores/agricultoras da comunidade distribuição equitativa dos recursos
mostrando na prática os resultados do financeiros.
programa. Como parte das ações desenvolvidas, a
O modelo de ATER pública praticada nos criação do programa dos Agentes
dias atuais é incapaz de realizar um trabalho Comunitários de Desenvolvimento e Crédito é
tão intenso como o que vem sendo praticado uma iniciativa que tem como propósito de
pelos agentes. No mesmo seguimento, a incentivar os pequenos agricultores rurais a

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produzirem alimentos com base no manejo [2] Holliday, O. J. (2006) “Para Sistematizar
agroecológico, a partir de processos educativos Experiências”, Ed.: Revista – Brasília: MMA
que promovam a recuperação dos recursos (Série Monitoramento e Avaliação), p. 21-22.
naturais e propciem a distribuição de renda na
propriedade.

Agradecimentos

Cresol – Verê
CNPq ao apoio do edital 033/2009
Programa Institucional de Extensão Bolsas
Fundação Araucária – Ações Afirmativas
(Pibexti);
UTFPR Câmpus Dois Vizinhos

Referências

[1] Rech, D. (2000), Cooperativas: uma


alternativa de organização popular, Rio
de Janeiro: DP&A, 2000.

Cadernos Infocos (Instituto de Formação do


Cooperativismo Solidário) III – Programa
dos Agentes Comunitários de
Desenvolvimento e Crédito “Refletindo a
Comunidade Onde Vivemos”, 2007.

Cadernos Infocos (Instituto de Formação do


Cooperativismo Solidário) IV – Programa
dos Agentes Comunitários de
Desenvolvimento e Crédito “Refletindo a
Cooperativa e Reconstruindo o Projeto
de Vida”, 2007.

7/7

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