Você está na página 1de 36

Curso de Comando e Direção Policial

Seminário
MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO
EM CIÊNCIAS SOCIAIS
ISCPSI
fevereiro-junho 2019
Prof. Doutora Lúcia G. Pais
Ciência
Do latim scientia – “conhecimento, doutrina, erudição ou prática”
(Arnal et al., 1992).

“Conjunto organizado de conhecimentos sobre a realidade e obtidos


mediante o método científico”
(Bravo, 1985).

O “conhecimento em si”.

“Modo de conhecimento rigoroso, metódico e sistemático que pretende


optimizar a informação disponível em torno de problemas de origem
teórica e/ou prática”
(Arnal et al., in Almeida & Freire, 2007, p. 16).
Investigação científica = Expressão tautológica

“a investigação ou é científica
ou não é investigação”

(Almeida & Freire, 2007, p. 21).


Conhecimento científico
Obtido por recurso ao método científico.
Objetivo
Empírico
Racional
Replicável
Sistemático
Metódico
Comunicável
Analítico
Cumulativo
A ciência
é uma atividade humana tendente para alcançar a verdade.

A verdade científica
é obtida por aproximação e através de flutuações!

História da Ciência -> Todos os modelos vêm a revelar-se falsos;


só podemos dizer que há uns melhores do que outros.
O conhecimento científico
é só parcialmente construído!

É necessário assumir a natureza politizada de qualquer


contexto de investigação.

A ciência coloca-se em causa a si mesma!!!


Conhecimento científico:
Como se constrói?
POPPER CIÊNCIA = corpo de proposições suscetível de refutação empírica.
(1959)
(processo contínuo de falsificação das teorias para nos aproximarmos da verdade.)

História da ciência abandono / reformulação de teorias que se


revelaram falsas.

As proposições que a ciência apresenta (do tipo se X então Y )


têm que ser operacionalizadas através de instrumentos.
MAS, a utilização de instrumentos não contempla aspetos como:
o erro de mensuração.
Conhecimento científico:
Como se constrói?
BACHELARD
(1971)

Os instrumentos constroem os dados.

Os instrumentos fazem emergir fenómenos que não existem,


naturalmente, na Natureza,
mas trazem para a ciência construtos
(operacionalização dos conceitos).
Conhecimento científico:
Como se constrói?
KUHN PARADIGMA CIENTÍFICO
(1962)
O progresso da ciência assenta na mudança
dos conjuntos de crenças que informam e enformam
as práticas das comunidades científicas:

(1) paradigmas dominantes e investigação normal;


(2) anomalias que criam um novo paradigma; e,
(3) instauração de uma nova era de investigação normal.
Conhecimento científico:
Como se constrói?
KUHN
(1962) A complexidade dos instrumentos utilizados pelos investigadores
(no âmbito dos paradigmas):

 provoca inércia na ciência


pela restrição do campo de visão que ela implica (parcialidade, enviesamento);

 possibilita a descoberta de anomalias nos paradigmas


levando à sua revisão ou abandono.
Teoria = representação abstrata de um segmento do mundo real

ESPECIFICAÇÃO DO MODELO HIPOTÉTICO TESTE DO AJUSTAMENTO DO MODELO


(INSTRUMENTAÇÃO DE MEDIDA) AO MUNDO REAL

CIÊNCIA

RESPECIFICAÇÃO DO MODELO
REVISÃO DA TEORIA
OU
ABANDONO DA TEORIA
Pressupostos epistemológicos

INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA


 Positivismo  Construtivismo
 Racionalismo Crítico  Construtivismo Social

 Realidade social Existe ‘lá fora’,  Realidade social construída e


objetiva e constante transformada por quem nela participa

 Analisável em termos de variáveis:  Analisável a partir do contexto em que as


decomposição analítica de comportamentos interações ocorrem: sondar significados
e outros fenómenos observáveis em criados pelas pessoas (e outros estados
contextos naturais ou artificiais (laboratório) internos) em contextos naturais
Pressupostos epistemológicos

INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

 Relações causais vistas como mecânicas  Relações causais vistas como intencionais
 Esquema analítico: Situação Resposta
 Esquema analítico:
 Conhecimento continuamente construído de
forma probabilística, porque não existe Situação Personalidade Resposta
correspondência direta entre teoria e  Conhecimento continuamente construído em
realidade situações sociais com significado partilhado
 Premissa de que o conhecimento é
contextualizado (local)
Estratégias metodológicas
orientadoras da investigação
INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

 Orientada para a corroboração/falsificação  Orientada para a exploração

 Lógica dedutiva: conceitos teóricos prévios  Lógica indutiva: partir de detalhes para
construir sentidos/significados
que orientam a pesquisa de informação
 Geração de hipóteses derivadas dos dados
 Teste de hipóteses derivadas da teoria (Descoberta de conceitos e teorias depois da
informação recolhida)
 Abordagens nomotéticas:  Abordagens ideográficas:
nomos (leis) + thesis (proposições/explicações) ideos (próprio/privado) + graphen (escrever/descrever)

 Mais típicas nas Ciências Naturais  Mais típicas nas Ciências Sociais
Estratégias metodológicas
orientadoras da investigação

INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

Estudos extensivos: populações/amostras - Estudos intensivos: casos individuais, de


recolhe poucos dados sobre um número grande grupo, institucionais, de países
de sujeitos
Geração de informação verbal e pictórica para
Geração de informação numérica para representar o ambiente social (e.g. entrevista não-
representar a realidade (e.g. entrevistas estruturadas, diretiva, gravadores, fotografias)
testes e questionários)
Estratégias metodológicas
orientadoras da investigação

INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

Técnicas estatísticas para analisar a  Técnicas de indução analítica para codificar a


informação
informação
--- Descritivas: descrever o que já existe (e.g.
dados do INE) e/ou relacionar 2 ou + variáveis.
 Análise de conteúdo verbal (e.g. temática,
--- Inferenciais: influência de variáveis sobre
sintática) e/ou pictórico
outras variáveis
Generalização amostra -> população através  Generalização da informação sobre um caso
da inferência estatística (extrapolação/alta
replicabilidade) através da procura de outros casos similares
(transferibilidade/baixa replicabilidade)
Implicações para o papel do investigador
INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

 Sabem o que procuram Só grosseiramente sabem o que procuram


 Seguem um protocolo de investigação Seguem um protocolo de investigação
relativamente fechado relativamente aberto
 Distanciamento face aos participantes Envolvimento com os participantes
 Têm ferramentas e equipamento para São (os investigadores) os instrumentos de
recolha da informação recolha da informação (necessidade de juízes
externos)
 Objetivamente separados do objeto de
estudo nas últimas fases dos estudos Tendem a ficar emersos no fenómeno
que estão a estudar (mergulhados nas situações)
Implicações para o papel do investigador
INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA INVESTIGAÇÃO QUALITATIVA

Mais capacidades especiais exigidas


Mais treino
 Menos capacidades especiais exigidas Empatia/Simpatia
 Menos treino Decomposição dos problemas a posteriori
 Decomposição dos problemas a priori
Preocupação com os processos
 Preocupação com os produtos
Investigação QUANTITATIVA versus
Investigação QUALITATIVA
INV. QUANTITATIVA – PONTOS FORTES INV. QUALITATIVA – PONTOS FORTES
 Grande número de casos  Investiga em meio natural
estudados  Ênfase nas interpretações e significado
 Examina relações complexas entre atribuído pelos participantes
variáveis  Compreensão aprofundada do mundo dos
 Possibilidade de investigar participantes
relações de causa-efeito  Maior importância do papel do investigador
 Maior flexibilidade no processo investigativo
Investigação QUANTITATIVA versus
Investigação QUALITATIVA
INV. QUANTITATIVA – PONTOS FRACOS INV. QUALITATIVA – PONTOS FRACOS
 Falta de análise aprofundada dos  Problemas de fiabilidade – dificuldade de
dados recolhidos réplica dos estudos
 Ignora experiências e perspetivas  Subjetividade na recolha e análise dos dados
individuais  Porque se entra no mundo privado dos
 Possibilidade de vieses do participantes, colocam-se questões éticas
investigador na seleção, recolha e  Muito demorada (time consuming)
análise dos dados
Na condução de uma investigação

O investigador orienta-se por objetivos operacionais


que dependem

- da natureza dos fenómenos


- das variáveis em presença,
- das condições em que a investigação vai decorrer

(menos controlada – observação no terreno;


mais controlada – ambiente experimental, laboratório).
Objetivos
(mais descritivos, ou mais explicativos)
 Descritivos
Inventariação de características de 1 sujeito, 1 grupo, ou dos valores que uma variável pode
assumir;
Descrição de uma eventual relação entre fenómenos.

 Preditivos de categorias ou valores de fenómenos


Apreciação do grau ou da probabilidade de ocorrência de fenómenos ou variáveis.

 Explicativos
Explicação das relações de causalidade entre os fenómenos.
Investigação

 QUALITATIVA
descrição e compreensão dos fenómenos

 QUANTITATIVA
Correlacional
compreensão e predição dos fenómenos
(formulação de hipóteses sobre as relações entre variáveis)
Experimental
predição e explicação dos fenómenos
(testagem de teorias e hipóteses)
Investigação

 Investigação quantitativa
Estudos correlacionais
Estudos experimentais

 Investigação qualitativa
Estudo de caso
Investigação etnográfica
Investigação-ação
Histórias de vida
Focus grupo
Primeiras fases
(interdependentes)
do processo de investigação

(1) formulação do problema;

(2) definição das hipóteses; e,

(3) definição das variáveis.


Formulação do problema
É SEMPRE A 1ª ETAPA DE UMA INVESTIGAÇÃO
quando procuramos uma resposta para
uma pergunta, dificuldade ou problema.

Pode derivar:

“de uma teoria existente e que se toma como referência,


da observação diária dos comportamentos,
dos problemas práticos que (…) se gostaria de resolver e,
finalmente,
das propostas ou sugestões decorrentes de
investigações anteriores”
(Almeida & Freire, 2007, p. 38)
Formulação do problema
O problema deve

ser concreto ou real;


reunir condições para ser estudado;
ser relevante para a teoria ou para a prática; e,
estar formulado de forma clara para ser entendível por outros investigadores.

Deve ser acompanhado de pesquisa/revisão bibliográfica, para

 conhecer o estado da arte (por acaso este problema de investigação já foi colocado e
respondido?);
 saber quais as teorias existentes na área (também para definir o próprio posicionamento
teórico);
 conhecer os planos metodológicos mais usuais para lidar com o problema em causa; e,
 saber quais as questões deixadas em aberto ou os erros cometidos em investigação anterior.
Princípios éticos na investigação
em Ciências Policiais

Respeito pela dignidade e direitos da pessoa


Competência
Responsabilidade
Integridade
Beneficência e não-maleficência
Princípios éticos na investigação
em Ciências Policiais

Avaliação de riscos potenciais / Não causar danos (proteção do participante)


Participação informada e voluntária (capacidade de consentimento e
consentimento informado)
Anonimato (privacidade) e confidencialidade da informação recolhida
Uso do engano / mentira na investigação (esclarecimento pós-investigação)
Investigação com animais
Integridade científica
Apresentação de resultados verdadeiros
Comunicação de resultados de forma adequada (cientistas e público)
Crédito autoral de ideias e trabalho nos termos devidos
Tipos de estudos
i) Estudos empíricos [relatam investigação original, que incluem teste de hipóteses]
ii) Estudos teóricos [baseiam-se na análise de literatura científica existente e tentam
apresentar avanços teóricos; pesquisam o desenvolvimento de uma teoria para expandir
ou refinar construtos teóricos, ou apresentam uma nova teoria, ou analisam a teoria
existente apontando falhas, ou demonstram a vantagem de uma teoria sobre outra]
iii) Estudos de revisão [organizam, integram e avaliam investigação publicada, fazendo
a sua avaliação crítica, considerando o progresso da investigação na clarificação de um
problema. No fundo: definem e clarificam o problema; sumariam investigação anterior
para apresentar o ‘estado da arte’; identificam relações, contradições, falhas e
inconsistências na literatura; e, sugerem os passos seguintes para resolver o problema]
iv) Estudo de caso [relatam casos e seus materiais, recolhidos de forma aprofundada
relativamente a um indivíduo, grupo, comunidade, ou organização. Ilustram um problema,
indicam meios/estratégias para o resolver, e referem a necessidade de mais investigação
ou referem as aplicações que podem ser feitas]
Tipos de estudos

Estudos empíricos

Introdução (Objetivos, Pertinência, Estado de Arte e


Formulação do Problema)
Método (Hipóteses; Amostra/Corpus/Participantes;
Instrumentos; Procedimento)
Apresentação e Discussão de Resultados
Conclusão
Tipos de estudos

Estudos teóricos

Introdução (Objetivos, Pertinência)


Estado de Arte (Contextualização Teórica e Hipóteses
Teóricas ou Conceptuais)
Perspetivas/Diretrizes (Relações, Contradições e
Inconsistências)
Discussão/Conclusão (Implicações Teóricas e Práticas)
Tipos de estudos

Estudos de revisão

Introdução (Objetivos, Pertinência)


Estado de Arte (Contextualização Teórica e Hipóteses
Teóricas ou Conceptuais)
Perspetivas/Diretrizes (Relações, Contradições e
Inconsistências)
Discussão/Conclusão (Implicações Teóricas e Práticas)
Tipos de estudos

Estudos de caso

Introdução (Objetivos, Pertinência, Estado de Arte, e


Formulação do Problema)
Método (Participante/Evento/Organização; Instrumentos;
Procedimento)
Apresentação e Discussão de Resultados
Conclusão
Normas APA

Autor
Data
Título do artigo

Exemplos
REFERÊNCIAS

Almeida, L. S., & Freire, T. (2007). Metodologia de investigação em psicologia da educação (4ª ed.). Braga:
Psiquilíbrios.

American Psychological Association (2010). Publication manual of the American Psychological Association
(6 th ed., 4th print.). Washington, DC: APA.

Bardin, L. (1977). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Burgess, R. G. (2001). A pesquisa de terreno: Uma introdução (1ª reimpr.). Oeiras: Celta.

Ghiglione, R., & Matalon, B. (1993). O inquérito: Teoria e prática (2ª ed.). Oeiras: Celta.

Quivy, R., & Campenoudt, L. (2005). Manual de investigação em ciências sociais (4ª ed.). Lisboa: Gradiva.

Você também pode gostar