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Análise Psicológica (2000), 1 (XVIII): 71-85

A força do pensamento deôntico: O


vitimizador feliz na atribuição de emoções
na criança (*)

ORLANDO LOURENÇO (**)

1. INTRODUÇÃO de, 1996) tem girado em torno das quatro se-


guintes questões, sendo as três primeiras essen-
Nos últimos dez anos, tem havido um enorme cialmente descritivas e a última fundamental-
interesse pela compreensão da criança relativa- mente explicativa: (1) Que tipo de emoções
mente às emoções experienciadas por aqueles (i.e., positivas, negativas, ou mistas) atribuem as
que praticam um acto que, embora desejem, é crianças ao transgressor envolvido em actos de
imoral (ver Arsenio & Lover, 1996). A maior vitimização?; (2) Existem padrões típicos nas
parte desta investigação (e.g., Arsenio & Kra- atribuições de emoções morais aos vitimizado-
mer, 1992; Lourenço, 1998; Murgatroyd & Ro- res?; (3) Mudam estes padrões em função da ida-
binson, 1993; Nunner-Winkler & Sodian, 1988; de da criança?; e (4) o que está em jogo na atri-
Yuill, Perner, Pearson, Peerbhoy, & van den En- buição de emoções pela criança aos transgresso-
res de normas morais?
Quanto ao tipo de emoções atribuídas aos
transgressores, as pesquisas efectuadas têm mos-
trado que quando as crianças são solicitadas a
(*) Expresso o meu agradecimento ao Colégio Mo- atribuir emoções a um transgressor que obteve
derno, em especial à sua directora e às crianças que
participaram neste estudo. Sem a sua colaboração, esta resultados tangíveis pelo facto de ter violado
investigação não teria sido possível. uma norma moral (e.g., roubar o chocolate de
Esta investigação foi efectuada no âmbito do Centro um companheiro; empurrá-lo de um baloiço), en-
de Psicologia Clínica e Experimental: Desenvolvi- quanto as mais novas (4-6 anos) tendem a atri-
mento, Cognição e Personalidade (Unidade I & D,
Fundação para a Ciência e Tecnologia). buir-lhe emoções positivas (e.g., «o vitimizador
Correspondência relativa a este artigo deve ser en- sente-se bem e feliz»; Arsenio & Kramer, 1992;
dereçada a Orlando Lourenço, Faculdade de Psicolo- Barden, Zelko, Duncan, & Masters, 1980), as
gia e de Ciências da Educação, Universidade de Lis- mais velhas (8-9 anos) tendem a atribuir-lhe
boa, Alameda da Universidade, 1600 Lisboa (e-mail:
Orlando@fc.ul.pt).
emoções negativas (e.g., «o transgressor sente-se
(**) Faculdade de Psicologia e de Ciências da Edu- mal e infeliz»; Lourenço, 1993; Nunner-Winkler
cação, Universidade de Lisboa. E-mail: Orlando@fc.ul.pt & Sodian, 1988). Este quadro, contudo, é um

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pouco mais complicado quando a análise é mais sente-se mal porque pode ser descoberto e casti-
detalhada. Por exemplo, se há estudos onde não gado»; ver Murgatroyd & Robinson,1997).
ocorreu a atribuição de emoções positivas por No que concerne à relação entre a idade e o
parte de crianças entre os 5-8 anos (e.g., Harter padrão do vitimizador feliz/infeliz, os dados
& Whitesell, 1989), outros há onde a incidência obtidos no passado também não são lineares. Se
de tais emoções continua durante os anos escola- há estudos que referem uma mudança muito
res e mesmo na vida adulta (e.g., Murgatryod & forte associada à idade na orientação moral das
Robinson, 1993). Além disso, não há pratica- atribuições da criança («os transgressores são fe-
mente nenhuma pesquisa onde as crianças mais lizes porque obtêm o que desejam versus são in-
novas atribuam apenas emoções positivas, e as felizes por causa do mal infligido à vítima»; e.g.,
mais velhas apenas emoções negativas ou mistas Lourenço, 1993; Nuuner-Winkler & Sodian,
(e.g., Arsenio & Ford, 1985; Barden, et al., 1988), tal mudança é apenas subtil e moderada
1980; Keller, Schuster, Fang Fu-xi, Tang Hong, em outros estudos (e.g., Arsenio, 1988; Arsenio
& Edelstein, 1996; Nunner-Winkler & Sodian, & Kramer, 1992; Lourenço, 1997). Para compli-
1998; Yuill et al., 1996). car mais as coisas, em diversas pesquisas o fenó-
A atribuição de emoções aos vitimizadores meno do vitimizador feliz não desaparece por
tem sido classificada em três padrões distintos volta dos 8 anos, continuando mesmo além dessa
(ver Arsenio & Lover, 1996): o padrão do vitimi- idade (e.g., Murgatroyd & Robinson, 1993).
zador feliz (i.e., a criança espera que o transgres- Mais ainda, existe mesmo uma pesquisa (Yuill et
sor se sinta bem, não mal, sendo esta atribuição al., 1996) onde as crianças de três anos atribuem
tida como uma atribuição de emoções imorais); emoções negativas, as de quatro, positivas, e as
o padrão do vitimizador infeliz (i.e., a criança es- mais velhas, emoções negativas de novo. Em vez
pera que o transgressor se sinta mal, não bem, da típica mudança de emoções positivas para ne-
sendo esta atribuição tida como uma atribuição gativas (ou mistas), no estudo de Yuill e colabo-
de emoções morais); e o padrão do vitimizador radores houve um mudança dupla: emoções ne-
misto (i.e., a criança espera que o transgressor se gativas, positivas, negativas. Os autores conclu-
sinta bem e mal ao mesmo tempo). De novo, este em que, em termos de desejo, as crianças mais
quadro é mais complicado do que parece à pri- jovens são «objectivistas», centrando-se exclusi-
meira vista. Primeiro, embora as crianças mais vamente nas más consequências, enquanto as de
novas e mais velhas tendam a seguir, respectiva- quatro anos são «subjectivistas», centrando-se
mente, o padrão do vitimizador feliz e infeliz, exclusivamente nas intenções do protagonista.
por vezes acontece o contrário (e.g., Arsenio, Nas suas palavras (Yuill et al., 1996), «dado um
1988; Morgatroyd & Robinson, 1997; Yuill et protagonista com um desejo objectivamente mau
al., 1996). Segundo, pesquisas há onde o padrão (querer magoar alguém), as crianças de três
do vitimizador misto nem sequer aparece nas anos pensam que ele se sente mal quando obtém
crianças mais velhas (e.g., Nunner-Winkler & o resultado desejado porque este é mau objecti-
Sodian, 1988), e outras onde tal padrão é bem vi- vamente. O saber que alguém quer que tal resul-
sível (e.g., Arsenio & Kramer, 1992). Terceiro, a tado ocorra ainda não o torna desejável. É ape-
mesma criança pode exibir padrões diferentes nas mais tarde que as crianças compreendem o
quando é confrontada com transgressões várias desejo em termos subjectivos (...), isto é, a emo-
(e.g., Lourenço, 1997). Finalmente, parece que ção sentida por um protagonista é julgada em
existe apenas um tipo de vitimizador feliz – i.e., termos da sua conformidade ou não com o dese-
emoções positivas justificadas por razões orien- jo interno» (p. 458).
tadas para o resultado (e.g., «o transgressor sen- Pelo exposto até aqui, há quatro aspectos que
te-se bem porque conseguiu o que queria»; ver parecem claros. Primeiro, os dados contraditó-
Nuner-Winkler & Sodian, 1988) –, ao passo que rios na atribuição de emoções aos vitimizadores
existem, pelo menos, dois padrões de vitimiza- sugerem que este fenómeno é determinado por
dor infeliz: um atento à dor e perda da vítima múltiplas variáveis e processos psicológicos.
(e.g., «o vitimizador sente-se infeliz por causa do Semelhante asserção é aliás uma ideia central no
mal feito à vítima»); o outro atento aos interesses modelo de quatro passos proposto por alguns au-
do próprio transgressor (e.g., «o vitimizador tores (Arsenio & Lover, 1996) para dar conta dos

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principais resultados relativos à compreensão e do. Trata-se de um objectivo que merece ser ex-
desenvolvimento das emoções em actos de viti- plorado, na medida em que permite obter uma
mização (i.e., experiências afectivas e sócio- melhor compreensão dos resultados relativa-
-morais da criança, passo 1; o seu desenvolvi- mente contraditórios que já referimos, clarificar
mento e limitações cognitivas, passo 2; a sua o significado moral da atribuição de tais emo-
maturidade sócio-moral, passo 3; e a coordena- ções e, portanto, desafiar ou fortalecer certas
ção dos seus conhecimentos relativos aos actos teses de teorias actuais de desenvolvimento no
de vitimização, passo 4). que à competência moral das crianças diz respei-
Segundo, os resultados contraditórios referi- to. Por exemplo, a atribuição de emoções pela
dos atrás também mostram que estamos ainda criança aos vitimizadores tem sido tomada como
longe de um conhecimento relativamente seguro um indicativo do seu desenvolvimento e moti-
sobre tal forma de desenvolvimento emocional e, vação moral (Asendorpf & Nunner-Winkler,
portanto, que a atribuição de emoções pela crian- 1992; Lourenço, 1997; Nunner-Winkler & So-
ça aos vitimizadores está aberta a posteriores dian, 1988) e, portanto, também como um dado
pesquisas empíricas e reflexões conceptuais (Sa- com implicações, quer em relação à tese de
arni, Mumme, & Campos, 1998). Por exemplo, Kohlberg (1984) da imaturidade moral da crian-
parece natural que, pela sua maior maturidade ça, quer a respeito da posição de Turiel (1983)
social, cognitiva e emocional, as crianças mais que proclama que, em idade relativamente pre-
velhas tendam a atribuir ao transgressor, não coce, a criança possui já um conhecimento mo-
emoções positivas (e imorais), mas negativas (e ral bastante sofisticado. Para o significado de tais
morais), o oposto do que geralmente se passa nas implicações ser mais claro, contudo, é desejável,
mais novas. Mas como explicar que isto não seja necessário mesmo, que os dados relativos à atri-
sempre o caso? Dir-se-á, então, que não pode- buição de emoções ao transgressor pela criança
mos esquecer o papel da motivação, cultura, ve- sejam obtidos numa perspectiva deôntica e de
locidade de desenvolvimento, detalhes metodo- dever, de preferência a uma perspectiva factual e
lógicos, etc. Mas sendo assim, como explicar, de ser.
então, as regularidades já referidas e verificadas Em geral, tem sido assumido que a atribuição
em diversos países, como, por exemplo, na Ale- de emoções positivas ao transgressor revela uma
manha (Nunner-Winkler & Sodian, 1988), Es- criança a fazer atribuição de emoções imorais,
tados Unidos da América (Arsenio & Kramer, não morais (ver Arsenio & Lover, 1996). Atri-
1992) Portugal (Lourenço, 1997) e Reino Unido buísse a criança emoções morais, não imorais, ao
(Morgatroyd & Robinson, 1993), e mesmo em transgressor, ela esperaria que ele se sentisse
culturas muito diferentes (Keller et al., 1996)? mal, por causa da perda imposta à vítima (e.g.,
Terceiro, até agora nenhuma pesquisa analisou ficar privada de um chocolate que lhe foi rou-
ainda quanto é que o fenómeno do vitimizador bado), não bem, por causa do benefício material
feliz é moral ou imoral para as próprias crianças. que ele obteve (i.e., a posse do chocolate rouba-
De outro modo, até agora os investigadores têm do). Contudo, esta linha de raciocínio seria rela-
estudado tal fenómeno segundo uma perspectiva tivamente desafiada se se verificasse que a atri-
descritiva, factual, ou do que é, não segundo um buição de emoções positivas pela criança ao viti-
ponto de vista prescritivo, deôntico, ou do que mizador em perguntas descritivas (e.g., «Como
deve ser. Basta dizer aqui que nas pesquisas se sente o protagonista?») diminuía quando ela é
mencionadas atrás as crianças foram sempre so- questionada em perguntas prescritivas (e.g.,
licitadas a responder a questões descritivas ou de «Como se deve sentir o protagonista?»). Devido
ser (e.g., «Como se sente o vitimizador depois a um possível desencontro linguístico entre a cri-
da transgressão, bem ou mal, e porquê?»), nunca ança e o experimentador, pode bem acontecer
a perguntas prescritivas ou de dever ser (e.g., que, quando são confrontadas com a questão
«Como se deve sentir o vitimizador depois da descritiva tradicional, diversas crianças assumam
transgressão, bem ou mal, e porquê?»). que lhes está a ser colocada uma questão fun-
Considerar, de um ponto vista deôntico ou de damentalmente cognitiva, numa tarefa igual-
dever, as emoções que as crianças atribuem aos mente cognitiva (i.e., «Como se sente o vitimi-
transgressores é o primeiro objectivo deste estu- zador quando obtém o chocolate que queria?»),

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não um pergunta predominantemente moral, nu- gressor torna-se mais claro quando sabemos algo
ma tarefa igualmente moral (i.e., «Como se sen- a respeito da sua possível influência sobre duas
te o vitimizador quando obtém o chocolate que formas importantes de comportamento social, o
roubou a um companheiro?») (Ver Grice, 1975, e comportamento moral e o comportamento pró-
também Siegal & Beattie, 1991, para uma -social. Além disso, nas teorias funcionalistas da
análise das normas linguísticas assumidas no dia emoção, «as emoções são concebidas como im-
a dia da interacção verbal e violadas muitas ve- portantes reguladores, algo que avalia os acon-
zes em contexto experimental.) A esta luz, faz tecimentos e motiva a acção humana» (Brether-
sentido argumentar que, para ser tomada como ton, Fritz, Zahn-Waxler, & Ridegay, 1986, p.
um real (e imoral) vitimizador feliz, uma criança 530). Contudo, conhecemos apenas duas pesqui-
tem de atribuir emoções positivas ao vitimizador sas que relacionaram a atribuição de emoções ao
em perguntas deônticas, mais do que em pergun- transgressor pela criança com o seu comporta-
tas factuais. Emoções positivas atribuídas em mento moral (i.e., não fazer batota numa situa-
perguntas descritivas correm o risco de ser atri- ção de resistência à tentação), embora não com o
buições de vitimizador feliz mais aparentes que seu comportamento pró-social (Asendorpf &
reais. Nunner-Winkler, 1992; Lake, Lane, & Harris,
Esta investigação, contudo, não foi projectada 1995). Ambos os estudos constataram que as
para testar a hipótese do possível desencontro crianças que atribuíam emoções negativas ao
linguístico acabado de mencionar. O seu primei- transgressor fizeram menos batota do que aque-
ro objectivo é examinar as possíveis diferenças las que lhe atribuíam emoções positivas. Deve
na atribuição de emoções ao vitimizador por par- referir-se que embora os domínios moral e pró-
te da criança em duas condições distintas (i.e., social sejam domínios relacionados, a sua distin-
numa questão descritiva ou de ser e numa pres- ção faz sentido em termos empíricos (i.e., deve-
critiva ou de dever), e analisar se estas diferen- res negativos versus deveres positivos) e em ter-
ças variam em função da idade. Com base na li- mos conceptuais (Eisenberg, 1998). Com base
teratura desenvolvimentista relativa à competên- nos resultados de pesquisas anteriores (Asen-
cia linguística, cognitiva, emocional e moral da dorpf & Nunner-Winkler, 1992), na ideia de
criança (Damon, 1998), fazemos duas previsões. que as emoções são motivadores da conduta hu-
Primeiro, as crianças caem mais facilmente no mana (Bretherton et al., 1986), e na tese de que a
padrão do vitimizador feliz na condição factual cognição moral influencia o comportamento mo-
que na condição deôntica. Segundo, esta discre- ral e pró-social (Blasi, 1980), prevemos que, na
pância «ser-dever» é maior nas crianças mais situação de altruísmo, as crianças de tipo vitimi-
novas que nas mais velhas. Para este estudo, es- zador feliz (i.e., as que atribuem emoções positi-
colhemos crianças de 5-6 anos e crianças de 8-9 vas ao transgressor) são menos altruístas que as
anos, dois níveis de idade muito usados em estu- de tipo vitimizador infeliz, sendo que esta dife-
dos similares a este (e.g., Arsenio & Kramer, rença será maior na condição deôntica ou norma-
1992; Nunner-Winkler & Sodian, 1988). tiva que na factual ou descritiva.
Finalmente, uma análise sumária dos estudos Nesta pesquisa, as crianças foram confronta-
relativos às atribuições pela criança de emoções das com histórias que envolviam roubar (i.e.,
aos transgressores revela também que, com pou- roubo de chocolates), causar mal físico a outrem
cas excepções (e.g., Asendorpf & Nunner-Wink- (i.e., empurrar um colega do baloiço para nele
ler, 1992), a possível influência de tais emoções brincar de seguida) e não ajudar (i.e., não con-
no comportamento social da criança tem sido fortar um amigo em necessidade). Trata-se de
ignorada na maioria dessas pesquisas. Relacionar transgressões que são familiares à criança, usa-
estas emoções com uma medida de comporta- das também em pesquisas deste tipo, e que ape-
mento moral positivo ou pró-social das crianças lam para formas de moralidade negativa (não
numa situação de altruísmo é o segundo objec- roubar) e positiva (ajudar quem precisa).
tivo desta investigação. Dado que a moralidade Embora pareça artificial e laboratorial, a opor-
envolve aspectos cognitivos e comportamentais tunidade de altruísmo apresentada às crianças
(Kohlberg & Candee, 1984), o significado moral deste estudo tem sido usada em várias pesquisas
das emoções que as crianças atribuem ao trans- sobre o desenvolvimento do comportamento

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pró-social na criança (e.g., Bar-Tal, Raviv, & chocolate do bolso do companheiro (i.e., a víti-
Leiser, 1980). Dado que as emoções mistas ten- ma). No cartão 3, o dono do chocolate vem
dem a ser raras no processo de atribuição espon- buscá-lo à hora do lanche, mas não o encontra
tânea de emoções ao transgressor pelas crianças porque tinha sido roubado pelo colega. Os car-
(Arsenio & Kramer, 1992; Nunner-Winkler & tões foram utilizados para tornar as transgressões
Sodian, 1988), nesta investigação as crianças fo- mais salientes e concretas para a criança. Em ca-
ram solicitadas a optar por emoções positivas ou da história, o transgressor e a vítima eram descri-
negativas. Este formato de escolha forçada deve- tos como sendo do mesmo sexo e idade da cri-
se ainda ao facto de estudos anteriores mostra- ança entrevistada.
rem que perguntas de tipo aberto, ou levam ao
completo silêncio da criança (Murgatryod, 2.3. Procedimento, plano experimental e co-
1993), ou então, quanto isto não acontece, ela dificação
tende a dizer que o vitimizador se sente bem, fe-
liz e contente, ou mal, triste e infeliz (Nunner- As crianças foram entrevistadas individual-
Winkler & Sodian, 1988). mente num gabinete da própria escola. Cumpri-
mentada a criança, o experimentador explicava-
lhe que estava a fazer um trabalho para conhecer
2. MÉTODO o modo como as crianças pensam a respeito de
certas coisas, acentuando que ali não havia res-
postas certas ou erradas, no sentido em que as
2.1. Participantes há, por exemplo, em matemática. Apresentava,
depois, cada uma das três transgressões, bem co-
Participaram neste estudo 54 crianças, 27 das mo os respectivos cartões, e pedia então à crian-
quais eram de 5-6 anos (5:3 a 6:0; M = 5:6), e as ça para atribuir emoções positivas ou negativas
outras 27 de 8-9 anos (8:1 a 9:0; M = 8:5). Em ao vitimizador, quer na condição factual, quer na
cada grupo etário havia aproximadamente o condição deôntica. Finalmente, a criança era
mesmo número de meninas e meninos. As crian- colocada numa situação de dádiva anónima, na
ças estavam matriculadas num colégio da área de qual podia dar algumas das guloseimas que tinha
Lisboa, e a maioria delas provinha de famílias da recebido pela sua participação na presente pes-
classe média elevada. Todas elas eram de etnia quisa (i.e., seis gomas coloridas, formato de tipo
branca. As mais novas frequentavam o primeiro ursinho). De modo mais específico, em cada his-
ano de escolaridade; as mais velhas eram do ter- tória a criança era solicitada a responder às se-
ceiro ano. guintes questões (a questão 4 refere-se à situação
de altruísmo e era apresentada apenas no fim da
2.2. Material entrevista):
O material era constituído por três histórias 1. «O menino/menina desta história (i.e., o vi-
(i.e., transgressões morais), semelhantes às uti- timizador) portou-se bem, ou portou-se
lizadas em pesquisas deste género: roubar um mal? Porquê?»
chocolate de um companheiro; empurrar um co- 2. «No fim da história ele/ela sente-se bem e
lega de um baloiço; e não confortar um amigo alegre, ou mal e triste? Porquê?» [Nos
magoado, para não se perder uma festa de anos. poucos casos em que a criança dizia que o
Cada transgressão era ilustrada por uma sequên- vitimizador se sentia bem e mal ao mesmo
cia de cartões (15 X 10 cm), e descrita através de tempo – nunca, nas crianças mais novas;
um curto texto. Havia uma versão feminina e ou- nove vezes, em todas as transgressões, nas
tra masculina. Por exemplo, na história relativa crianças mais velhas –, era-lhe perguntado
ao roubar, uma criança vai para a sala de aulas de seguida: «E pensas que se sentiu um
depois de ter deixado o seu casaco no vestiário e pouco mais alegre ou um pouco mais tris-
um chocolate (visível) num dos bolsos (cartão te? Porquê?»]
1). No cartão 2, aparece um colega (i.e., o trans- 3. Disseste há pouco que este menino/menina
gressor) que, sem ninguém ver, está a roubar o se sentiu bem/mal no fim da história. «Está

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correcto que ele se tenha sentido bem/mal, nista sentiu-se bem e contente»), negativas (e.g.,
ou devia antes sentir-se mal/bem? Por- «o protagonista sentiu-se mal e triste»), ou mis-
quê?» tas (e.g., «o protagonista sentiu-se um pouco
4. A criança era introduzida então na situação bem e um pouco mal»). No que respeita a esta
de dádiva anónima. O experimentador classificação, houve um acordo de 100 por cento
agradecia-lhe a sua participação, oferecia- entre os dois avaliadores envolvidos (o autor
lhe, de seguida, seis gomas coloridas, e in- deste estudo e um segundo juiz independente).
formava-a que, se ela quisesse, poderia dar Das nove emoções mistas atribuídas inicialmente
algumas dessas gomas para os meninos/
(i.e., na pergunta 2) pelas crianças mais velhas
/meninas que não tinham sido escolhidos
em todas as transgressões, seis mudaram para
para fazer aquelas brincadeiras, mas que
negativas e três para positivas, quando a criança
também gostavam de comer algumas go-
mas. Na sala experimental, havia uma cai- foi solicitada a optar finalmente por emoções po-
xa, com uma pequena ranhura, onde as sitivas ou negativas. Na pergunta 3, houve ape-
crianças podiam deixar a sua dádiva. Era- nas três emoções mistas (não confortar, crianças
-lhes dito que podiam ficar com todas as mais velhas). Por razões de simplicidade, e com
gomas recebidas, dá-las para os compa- base no que aconteceu na pergunta 2, as duas
nheiros que não vieram fazer as brincadei- primeiras foram tomadas como negativas, e a
ras, ou ficar com algumas e dar outras. An- terceira como positiva.
tes de sair da sala e deixar a criança só em As justificações das crianças para as suas atri-
frente da caixa, o experimentador frisava buições de emoção ao vitimizador foram classi-
que ninguém viria a saber o número de go- ficadas em uma das três seguintes categorias ex-
mas que ela metia na caixa, e pedia-lhe clusivas, categorias usadas também em pesquisas
também para não falar da brincadeira aos similares (e.g., Nunner-Winkler & Sodian,
seus colegas. Quando a criança voltava pa- 1988): orientadas para o resultado tangível, para
ra a sua sala de aula, o experimentador con- a moral, e para as sanções externas. Eram orien-
tava o número de gomas que a criança tinha tadas para o resultado se a criança justificava a
colocado na caixa. emoção do vitimizador dizendo que ele se sentiu
A ordem inicial de apresentação das trans- bem porque obteve o que desejava (e.g., «sentiu-
gressões à criança, roubar, empurrar, não con- se bem porque ele agora tem o chocolate»).
fortar, foi determinada por tiragem aleatória. Eram orientadas moralmente, se a criança disses-
Depois, a ordem de apresentação destas histó- se que o vitimizador se sentia assim porque tinha
rias, bem como a das duas alternativas nas ques- violado uma norma moral ou pró-social, porque
tões 1, 2 e 3, foi contrabalançada nas entrevistas tinha sido mau, ou porque tinha receio de san-
feitas às crianças. As respostas destas foram co- ções internas (e.g., «sentiu-se mal porque está er-
piadas textualmente para codificação posterior. rado roubar»; «porque foi feio e mau»; «porque
A primeira pergunta, uma pergunta de contro- vai sentir pena e remorso»). Eram orientadas pa-
lo, quis saber se as crianças percebiam como ra as sanções externas se a criança dissesse que
transgressões efectivas os actos imorais que lhes
as emoções do vitimizador eram devidas ao re-
eram descritos. As perguntas 2 e 3, essenciais
ceio pela possível ocorrência de consequências
neste estudo, destinavam-se, respectivamente, a
negativas (e.g., «sentiu-se mal porque o outro [a
avaliar o tipo de emoções (i.e., positivas ou ne-
gativas) que as crianças atribuíam ao transgres- vítima] pode ficar zangado e mais tarde fazer-lhe
sor, quer na condição factual (pergunta 2), quer mal e vingar-se»). O acordo entre os juízes foi de
na condição deôntica (pergunta 3). Finalmente, a 95 por cento. Os poucos casos de desacordo fo-
oportunidade de dádiva anónima pretendia obter ram resolvidos por consenso. Nos raros casos
uma medida do comportamento pró-social das onde ocorria uma justificação com mais de um
crianças. tipo de razões (apenas três casos nas crianças
As emoções atribuídas nas questões 2 e 3 fo- mais velhas), classificou-se apenas a primeira ra-
ram classificadas de positivas (e.g., «o protago- zão que aparecia.

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3. RESULTADOS quatro testes de Cochran que foram calculados,
apenas foi significativo o relativo à condição fac-
Análises preliminares mostraram que não ha- tual para as crianças mais novas, Q (27,2) = 9.60,
via diferenças estatisticamente significativas no p < 0.01, tendo as emoções positivas sido signifi-
que concerne ao sexo das crianças, pelo que os cativamente mais frequentes que as negativas pa-
resultados dos meninas e das meninas aparecem ra o roubar (p < 0.05), mas não para o não con-
aglutinados nas análises que se seguem. fortar (testes binomiais). Para a transgressão do
empurrar, as emoções negativas das crianças mais
3.1. Compreensão dos actos imorais como novas nessa condição foram mesmo mais fre-
efectivas transgressões quentes (15) que as positivas (12), mas esta dife-
rença não é estatisticamente significativa.
Todas as crianças de ambas as idades respon- No que à relação entre idade e tipo de emo-
deram que o vitimizador se tinha portado mal, e ções atribuídas diz respeito, fosse qual fosse a
foram capazes de apresentar razões apropriadas transgressão e a condição, as crianças mais
para os seus juízos de avaliação moral relativos à velhas atribuíram mais emoções negativas e me-
pergunta 1 (e.g., «ele portou-se mal porque rou- nos positivas (81% e 19%, respectivamente; per-
bou o chocolate do amigo, e não se deve roubar centagens globais) do que as mais novas (53% e
o que é dos outros»). Portanto, todas as 54 crian- 47%). Testes de qui-quadrado (ou valores bino-
ças consideraram que os actos apresentados miais quando os primeiros não eram possíveis)
eram, de facto, transgressões morais. mostram que a influência da idade no tipo de
emoções atribuídas é (a) significativa para todas
3.2. Emoções atribuídas ao vitimizador as três comparações da condição deôntica,
[χ2 (27,1) = 5.24, p < 0.05 (roubar); χ2 (27,1) =
A Tabela 1 apresenta a frequência das emoções 4.08, p < 0.05 (não confortar; valor binomial); e
positivas e negativas atribuídas ao vitimizador p < 0.01 (empurrar, valor binomial)]; e (b) signi-
em função do tipo de transgressão (roubar; em- ficativa ou marginalmente significativa para du-
purrar; não confortar), idade (5-6 anos; 8-9 anos) as das três comparações da condição factual,
e condição (ser ou factual; dever ou deôntica). χ2 (27,1) = 4.78, p < 0.05 (não confortar), e
No que concerne ao tipo de transgressão, dos χ2 (27,1) = 3.81, p < 0.10 (roubar). Testes bino-

TABELA 1
Frequência de emoções positivas e negativas em função da transgressão, idade e condição

Transgressão e idade

Roubar Empurrar Não Confortar

5-6 anos 8-9 anos 5-6 anos 8-9 anos 5-6 anos 8-9 anos

Condição: P N P N P N P N P N P N

Factual 20 7 13 14 12 15 6 21 16 11 8 19

Deôntica 10 17 2 25 9 18 0 27 9 18 2 25

Nota: Cada célula podia variar entre 0 - 27 (N = 27, para cada nível de idade).
P = Emoções positivas; N = Emoções nagativas.

77
miais mostram que enquanto a prevalência das mo vitimizadoras felizes na condição deôntica.
emoções negativas sobre as positivas nas crian- Ao invés, o número de mudanças «regressivas»
ças mais velhas só não é significativa em uma (i.e., emoções negativas e depois positivas) no
das seis comparações possíveis (i.e., roubar, grupo das crianças mais velhas (dois casos em
condição factual), a prevalência das positivas todas as transgressões) foi menor que no grupo
sobre as negativas nas crianças mais novas ocor- das crianças mais novas (sete casos). Além dis-
reu apenas duas vezes na condição factual (i.e., so, enquanto na condição factual 11 das 27 crian-
roubar e não confortar), sendo, contudo, signifi- ças mais novas e 3 das 27 mais velhas foram vi-
cativa apenas para a transgressão do roubar, timizadores felizes consistentes em todas as
mas não para a transgressão do não confortar. Ao transgressões, na condição deôntica apenas três
invés, na condição deôntica, as próprias crianças das crianças mais novas e nenhuma das mais ve-
mais novas também atribuíram sempre ao vitimi- lhas foram vitimizadores felizes consistentes
zador mais emoções negativas que positivas (i.e., atribuindo emoções positivas nas três trans-
(p < 0.10, para as três comparações possíveis). gressões).
Nesta pesquisa era essencial comparar as emo- Em resumo, a atribuição de emoções ao viti-
ções positivas e negativas atribuídas ao vitimi- mizador por parte das crianças revela que (a) as
zador na condição factual (a questão de teste tra- mais velhas atribuíram mais emoções negativas
dicional em estudos anteriores) com as atribuídas que as mais novas; (b) independentemente da
na condição deôntica (uma questão de teste teo- idade e da transgressão, as emoções negativas
rizada e usada nesta investigação). Os resultados foram muito mais frequentes na condição deôn-
apoiam claramente as duas hipóteses que formu- tica que na factual, embora esta diferença seja
lámos, que as crianças atribuiriam mais emoções mais acentuada nas crianças de 8-9 anos; e (c) o
negativas na condição deôntica que na factual, e tipo de transgressão influenciou de modo signifi-
que esta diferença seria mais acentuada nas cri- cativo a atribuição de emoções na condição fac-
anças de 8-9 anos que nas crianças de 5-6 anos. tual, embora só nas crianças mais novas, mas
Como se pode constatar pelos dados da Tabela 1, não na condição normativa ou deôntica.
independentemente do tipo de transgressão, o
número de emoções negativas aumenta substan- 3.3. Justificações das crianças para a sua
cialmente da condição factual para a deôntica em atribuição de emoções ao transgressor
ambas as idades. Na deôntica, as crianças mais
velhas acabaram mesmo quase todas a atribuir A Tabela 2 apresenta a frequência das justifi-
emoções negativas ao vitimizador. Testes de cações das crianças para as suas atribuições de
McNemar (ou valores binomiais quando esses emoção ao vitimizador nas questões 2 (questão
não eram adequados) mostram que o aumento de factual) e 3 (questão deôntica). A análise dos da-
emoções negativas da condição factual para a dos desta Tabela revela que o padrão das justifi-
deôntica é (a) significativo para todas as trans- cações das crianças é muito consistente com o
gressões nas crianças mais velhas – χ2 (27, 1) = padrão relativo às suas atribuições de emoção.
7.69, p < 0.01 (roubar); p < 0.01 (empurrar); e Primeiro, enquanto as crianças mais novas de-
p <0.05 (não confortar) –, e (b) significativo ou ram mais justificações orientadas para o resulta-
marginalmente significativo nas crianças mais do tangível que as mais velhas (47% vs 20%,
novas para o roubar, χ2 (27,1) = 6.75, p < 0.01) e percentagens globais), estas últimas apresenta-
o não confortar, χ2 (27,1) = 3.27, p < 0.10), res- ram mais justificações orientadas moralmente
pectivamente, mas não para o empurrar. Uma que as primeiras (77% vs 48%). Segundo, da
análise mais detalhada revela ainda que, en- condição factual para a deôntica, houve um de-
quanto das 20 (roubar), 12 (empurrar) e 16 (não créscimo substancial da percentagem de justifi-
confortar) crianças vitimizadoras felizes iniciais cações materiais (i.e., orientadas para o resulta-
no conjunto das mais novas, houve 9, 5 e 7 que do; de 46% para 20%), e um aumento igualmen-
permaneceram assim na condição deôntica, no te substantivo da percentagem de justificações
conjunto das mais velhas, das 13 (roubar), 6 morais (de 49% para 76%). Finalmente, esta di-
(empurrar) e 8 (não confortar) vitimizadoras fe- minuição e este aumento foram maiores nas cri-
lizes iniciais, apenas 2, 0 e 2 permaneceram co- anças de 8-9 anos que nas 5-6 anos (27% vs

78
TABELA 2
Frequência das justificações das crianças em função da idade e condição

5-6 anos 8-9 anos

Justificações: Factual Deôntica Factual Deôntica

Resultados 48 28 27 5

Morais 29 48 50 75

Sanções 4 5 4 1

Total 81 81 81 81

N = 27, para cada nível de idade. As células podiam variar entre 0 - 81 (27 sujeitos x 3 transgressões).

24%; e 30% vs 23%, respectivamente). O núme- positivas que negativas. Os vitimizadores infe-
ro de justificações orientadas para as sanções ex- lizes, ao contrário, são as crianças que atribuíram
ternas foi muito reduzido em ambas as idades mais emoções negativas que positivas através
(6% e 3%, para as crianças mais novas e mais das três transgressões apresentadas em cada con-
velhas, respectivamente). dição. Dado que nenhuma das crianças mais ve-
Em resumo, as justificações das crianças para lhas atribuiu mais emoções positivas que nega-
as suas atribuições de emoção aos vitimizadores tivas na condição deôntica, por razões de compa-
são muito consistentes com essas mesmas atri- ração foram tomadas como vitimizadores felizes
buições, dando as crianças mais velhas mais todas as crianças mais velhas (apenas quatro)
justificações morais e menos justificações mate- que, nesta condição, atribuíram emoções positi-
riais que as crianças mais novas, e havendo em vas em qualquer uma das transgressões.
ambas as idades mais justificações morais e me- De modo não surpreendente, as crianças mais
nos materiais na condição deôntica que na condi- velhas colocaram na caixa mais gomas (M = 1.33)
ção factual. Estes dados reforçam a ideia de que
que as mais novas (M = 0.66), t (54,52) = 2.79,
o padrão do vitimizador feliz declina com a ida-
p < 0.01. Em termos da relação entre as atribui-
de, e que tal padrão é menos provável quando as
ções de emoção pela criança e o seu comporta-
crianças são confrontadas com questões norma-
mento altruísta na situação de dádiva anónima,
tivas, deônticas e prescritivas, em vez das tradi-
previmos que os vitimizadores infelizes seriam
cionais questões neutras, factuais e meramente
mais altruístas que os vitimizadores felizes, e
descritivas.
que esta diferença seria maior na condição deôn-
tica que na factual. Não há apoio para nenhuma
3.4. Atribuição de emoções e comportamento
destas previsões. Embora na condição factual os
pró-social das crianças
vitimizadores infelizes sejam, em ambas as ida-
A Tabela 3 mostra as médias das doações das de, um pouco mais altruístas que os vitimizado-
crianças na situação de altruísmo em função do res felizes, testes da estatística t mostram que tal
tipo de emoções atribuídas (i.e., positivas ou ne- diferença não é significativa em nenhum grupo
gativas) e da condição envolvida (factual ou de idade. Na condição deôntica, os vitimizadores
deôntica). Os vitimizadores felizes são as crian- infelizes mais jovens, se bem que não os mais
ças que, no conjunto das três transgressões rela- velhos, foram mesmo um pouco menos altruístas
tivas a cada condição, atribuíram mais emoções que os seus companheiros vitimizadores felizes.

79
TABELA 2
Médias das doações das crianças em função da idade e tipo de emoção na condição factual
e na condição deôntica

Factual Deôntica

Idade Positivas Negativas Positivas Negativas Média global

5-6 anos 0.50 (16) 0.91 (11) 0.88 (9) 0.55 (18) 0.67 (27)

8-9 anos 0.85 (7) 1.50 (20) 1.00 (4) 1.39 (23) 1.33 (27)

Total 0.67 (23) 1.20 (31) 0.94 (13) 0.97 (41)

Nota: Os números entre parênteses referem-se ao número de crianças que atribuiram o tipo de emoção em causa. As médias de
doação podiam variar entre 0 - 6.

Estas diferenças, contudo, não são estatistica- cações destas pesquisas relativamente às diferen-
mente significativas. tes posições de teorias actuais de desenvolvi-
Em resumo, contrariamente ao que previmos, mento no que à competência moral da criança
não houve nenhuma relação significativa entre a diz respeito, temos de considerar tais emoções,
atribuição de emoções positivas ou negativas não apenas de um ponto descritivo ou factual –
pela criança ao transgressor e o seu comporta- i.e., o que a criança pensa que o vitimizador sen-
mento pró-social na situação de dádiva anónima. te depois de ter transgredido –, mas também, ou
sobretudo, segundo uma perspectiva normativa e
deôntica – i.e., o que a criança pensa que o viti-
4. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES mizador deve sentir depois de ter cometido algu-
ma transgressão. Além de diminuir a probabili-
Na Introdução, referimos que as pesquisas so- dade de um possível desencontro linguístico en-
bre a atribuição de emoções ao vitimizador por tre o que o experimentador quer perguntar e o
parte das crianças têm girado em torno de quatro que a criança pensa que lhe é perguntado, desen-
questões fundamentais: o tipo de emoções que as contro a que aludimos na Introdução, o apelo a
crianças atribuem aos transgressores; a existên- questões normativas na atribuição de emoções
cia de padrões típicos em tal processo de atribui- aos vitimizadores por parte da criança permite-
ção; a ocorrência ou não de mudanças associadas nos, por exemplo, distinguir entre transgressores
à idade neste processo de atribuição; e a explica- aparentemente felizes (as crianças que atribuem
ção dos principais resultados nesta área do de- emoções positivas ao vitimizador nas questões
senvolvimento cognitivo, moral e emocional da de tipo factual) e transgressores realmente felizes
criança, em particular a tendência das crianças (as crianças que lhe atribuem emoções positivas
mais jovens (i.e., entre os 4-6 anos) para serem em questões de tipo deôntico) e, portanto, com-
vitimizadores felizes, e das mais velhas (i.e., en- preender melhor o significado moral de tais
tre os 8-9 anos) para serem vitimizadores infe- emoções.
lizes (ver Arsenio & Lover, 1996; Nunner-Wink- Nesta pesquisa havia dois objectivos. Primei-
ler & Sodian, 1988). ro, analisar, sob uma condição factual e outra de-
Ao longo deste artigo, argumentei que, para se ôntica, o tipo de emoções atribuídas por crianças
ter uma melhor compreensão (a) das emoções de dois níveis etários a quem comete certas
que as crianças atribuem aos vitimizadores, (b) transgressões morais; segundo, relacionar esta
de alguns dos resultados contraditórios que têm atribuição de emoções com uma medida de com-
emergido nesta área de pesquisa e (c) das impli- portamento pró-social das crianças numa situa-

80
ção de dádiva anónima. Em relação ao primeiro centagem relativamente alta de crianças de 5-6
objectivo, previmos que o padrão do vitimizador anos que já foram capazes de atribuir emoções
feliz seria mais provável na condição factual que negativas ao vitimizador, e uma percentagem re-
na deôntica, e que esta discrepância ser-dever se- lativamente alta de crianças de 8-9 anos que ain-
ria mais acentuada nas crianças mais velhas. Re- da lhe atribuíram emoções positivas. À seme-
lativamente ao segundo, previmos que as crian- lhança de muitas outras pesquisas, contudo (e.g.,
ças de tipo vitimizador feliz seriam menos al- Arsenio & Kramer, 1992; Lake et al., 1995; Lou-
truístas que as de tipo vitimizador infeliz, e que renço, 1997; Nunner-Winkler & Sodian, 1988;
esta diferença seria mais forte na condição deôn- Yuill et al., 1996), o presente estudo também en-
tica que na condição factual. controu uma mudança significativa na orientação
São vários os resultados que apoiam clara- moral das crianças mais novas para as mais ve-
mente as duas previsões relativas ao primeiro lhas (i.e., os vitimizadores sentem-se bem por-
objectivo. Primeiro, fosse qual fosse a transgres- que obtêm o que desejam versus sentem-se infe-
são, as crianças de ambas as idades atribuíram de lizes por causa do mal feito às vítimas).
modo significativo mais emoções negativas na Contexto, cultura, motivação, aspectos meto-
condição deôntica que na condição factual (ver dológicos e desenvolvimento emocional, cogni-
Tabela 1). Segundo, o número de vitimizadores tivo e moral – ou diferenças nos vários passos do
felizes consistentes em todas as transgressões foi modelo de quatro componentes de Arsenio e Lo-
mais elevado na condição factual que na deônti- ver (1996) – são certamente algumas das variá-
ca, o oposto do que aconteceu aos vitimizadores veis que podem levar algumas das crianças mais
infelizes consistentes, cujo número foi maior na novas a serem já vitimizadores infelizes, e al-
condição normativa que descritiva. Terceiro, o ti- guns das mais velhas a serem ainda vitimizado-
po de transgressão nunca influenciou significa- res felizes. O que os dados deste estudo mostram
tivamente a atribuição de emoções negativas na claramente é que o número de crianças de tipo
condição deôntica, embora isto tenha acontecido vitimizador feliz diminui substancialmente quan-
no grupo das crianças mais jovens na condição do elas são questionadas em termos deônticos ou
factual (ver Tabela 1). Quatro, a existência de normativos.
emoções positivas no grupo dos 8-9 anos quase Este resultado é também parcialmente consis-
desapareceu na condição deôntica, embora este tente e parcialmente inconsistente (ver a seguir)
tipo de emoções ainda seja bem visível na mes- com certos pontos de vista de teorias actuais de
ma condição no grupo das crianças mais novas desenvolvimento, teorias que proclamam que,
(ver Tabela 1). Finalmente, as justificações das desde bastante cedo, a criança já possui um co-
crianças são consistentes com os resultados re- nhecimento moral relativamente sofisticado (Tu-
lativos à sua atribuição de emoções. Por um la- riel, 1983). Este resultado também revela que al-
do, da condição factual para a deôntica, houve gumas das crianças que foram tomadas em estu-
em ambas as idades uma diminuição substancial dos anteriores como vitimizadores felizes eram
das justificações orientadas para o vitimizador mais vitimizadores felizes aparentes que reais e,
feliz (i.e., orientadas para o resultado tangível) e portanto, que esta distinção aparece confundida
um aumento substantivo das justificações orien- em tais estudos. Se este for o caso, então algumas
tadas para o vitimizador infeliz (i.e., justifica- das descobertas destes estudos teriam sido ou-
ções morais); por outro lado, estas mudanças fo- tras, e algumas das contradições referidas na In-
ram mais nítidas nas crianças de 8-9 anos que trodução poderiam desaparecer. Por exemplo,
nas crianças de 5-6 anos (ver Tabela 2). Nunner-Winkler e Sodian (1988) argumentam
Os resultados deste estudo relativos à condi- que a atribuição de emoções aos vitimizadores
ção factual são parcialmente consistentes e par- por parte da criança está sujeita a uma forte mu-
cialmente inconsistentes com os de pesquisas an- dança associada à idade (de emoções positivas
teriores. Por exemplo, contrariamente a alguns para negativas) porque, na sua pesquisa, quase
estudos (e.g., Nunner-Winkler & Sodian, 1988), todas as crianças mais novas (4-6 anos) atri-
mas consonante com outros (e.g., Arsenio & buíram emoções positivas ao vitimizador, ao
Kramer, 1992; Murgatryod & Robinson, 1993; passo que quase todas as mais velhas (8 anos)
Lake et al., 1995), neste estudo houve uma per- lhe atribuíram emoções negativas. Contudo, esta

81
modificação associada à idade seria certamente portam de modo mais moral (i.e., resistem mais
mais subtil e moderada se, em tal estudo, as cri- à tentação numa situação onde é possível fazer
anças tivessem sido confrontadas com questões batota) que os vitimizadores felizes (e.g., Asen-
não descritivas ou factuais, mas normativas ou dorpf & Nunner-Winkler, 1992; Lane et al.,
deônticas. Dado que, nos estudos relativos à 1995). Deve notar-se, contudo, que a nossa in-
atribuição de emoções ao vitimizador, as pergun- vestigação relacionou as atribuições da criança,
tas factuais podem levar mais facilmente ao de- não com uma medida do seu comportamento
sencontro linguístico entre a criança e o experi- moral (também chamado comportamento social
mentador do que as perguntas deônticas, os «re- negativo), mas do seu comportamento pró-social
sultados factuais» parecem ser menos fidedignos (também chamado comportamento social positi-
que os «resultados deônticos», um aspecto que vo). Esta distinção entre os domínios moral e
deve ser tido tanto mais em conta quanto mais pró-social faz sentido de um ponto conceptual
ambos os resultados se referem a emoções com como empírico (ver Eisenberg, 1998).
significado moral. É possível pensar em várias explicações para
No nosso estudo, mesmo na condição deônti- compreender a não ocorrência da antecipada re-
ca, algumas das próprias crianças mais velhas lação significativa entre o tipo de emoções atri-
ainda atribuíram emoções positivas ao trans- buído pela criança e o seu comportamento pró-
gressor. Este aspecto mostra que o fenómeno do -social. Por exemplo, poder-se-ia dizer que este
vitimizador feliz não é redutível ao desencontro tipo de emoção não tem qualquer efeito sobre o
linguístico já referido e, por conseguinte, que as comportamento social da criança. Esta explica-
questões deônticas per se não o fazem desapare- ção, contudo, não é consistente, nem com a
cer por completo. Saber por que razões algumas ideia generalizada de que as emoções avaliam os
crianças de certa idade e nível de desenvolvi- acontecimentos e motivam a conduta humana
mento mudam ou não o seu padrão de atribuição (Bretherton et al., 1986), nem com os resultados
de emoções ao vitimizador quando são questio- de estudos anteriores, que mostraram que as
nadas em termos deônticos parece ser um tópico crianças que atribuíam emoções negativas ao vi-
interessante para futuras pesquisas. Este tipo de timizador foram mais morais que as do tipo de
pesquisa poderá aumentar também o nosso co- vitimizador feliz (e.g., Asendorpf & Nunner-
nhecimento sobre o desenvolvimento emocional Winkler, 1992). Uma explicação mais plausível é
da criança e a sua compreensão das emoções assumir que a situação de dádiva anónima foi de-
morais (Harris, 1989; Harter & Buddin, 1987; masiado abstracta e artificial para as crianças, ou
Saarni et al., 1998). As experiências afectivas e mesmo que, em tal situação, o receptor das pos-
sócio-morais da criança – que são o passo 1 no síveis doações das crianças não era alguém em
modelo de quatro passos de Arsenio e Lover necessidade. De referir, contudo, que esta situa-
(1996) – estão provavelmente também em jogo ção tem sido usada várias vezes para se estudar o
na atribuição, por parte da criança, de emoções desenvolvimento do comportamento pró-social
positivas ou negativas ao vitimizador em situa- da criança (e.g., Bar-Tal et al., 1980). Parece,
ções de questionamento deôntico. portanto, que o tipo de emoções que as crianças
Os resultados do nosso estudo não apoiam ne- deste estudo atribuíram ao vitimizador não teve
nhuma das previsões relativas ao seu segundo poder suficiente para influenciar significativa-
objectivo, relacionar o padrão de emoções atri- mente o seu comportamento altruísta.
buído pela criança com uma medida do seu Quais as implicações dos nossos resultados
comportamento pró-social numa situação de dá- para as teses de teorias actuais de desenvolvi-
diva anónima. Ao contrário do que foi previsto, mento, em particular para aquelas posições rela-
as crianças de tipo vitimizador infeliz não foram tivas à competência moral da criança? Como é
mais altruístas que as de tipo vitimizador feliz, sabido, a teoria de estádios de Kohlberg (1984) e
mesmo quando a comparação entre estes tipos de a abordagem da distinção entre domínios de Tu-
criança tinha em conta as suas atribuições na riel (1983) têm posições muito diferentes em re-
condição deôntica (ver Tabela 3). Este resultado lação ao desenvolvimento e competência moral
é inconsistente com os de estudos anteriores, que da criança. Enquanto para Kohlberg as crianças
mostram que os vitimizadores infelizes se com- são sujeitos de moralidade pré-convencional –

82
isto é, orientam o seu raciocínio moral por consi- ções ao vitimizador seguindo o padrão do vitimi-
derações heterónomas, como, por exemplo, me- zador feliz, diminui amplamente quando elas são
do de sanções externas e obediência inquestioná- questionadas em termos deônticos, prescritivos
vel às figuras de autoridade –, para Turiel, as cri- ou de dever, em vez dos tradicionais termos fac-
anças, mesmo de 4-5 anos, são já capazes de dis- tuais, descritivos ou de ser. Este resultado suge-
tinguir a moralidade da convenção, nisto mos- re, de modo bastante seguro, que muitas das cri-
trando que já possuem um conhecimento moral anças que foram consideradas vitimizadores feli-
relativamente sofisticado. zes em estudos anteriores eram mais vitimizado-
Há vários resultados deste estudo que pare- res felizes aparentes que reais. Semelhante re-
cem apoiar esta ideia de Turiel. Primeiro, todas sultado tem, por isso, implicações bastante im-
as crianças deram razões apropriadas para consi-
portantes para uma melhor compreensão (a) das
derarem que os actos imorais que lhes eram
concepções de emoções morais na criança; (b) de
descritos (roubar, empurrar, não confortar) eram
algumas descobertas relativamente contraditórias
efectivas transgressões. Segundo, em ambas as
nesta área de pesquisa; (c) e de algumas teses de
idades, as crianças que diziam que o vitimizador
se sentia (ou devia sentir) mal, tendiam a dizer teorias actuais de desenvolvimento moral, em
que ele se sentia assim, não pelo medo de san- particular as que se relacionam com a competên-
ções externas, mas por preocupações morais cia moral da criança.
aparentemente genuínas (i.e., justificações orien- Dado que a atribuição de emoções positivas
tadas moralmente). Finalmente, e mais importan- ou negativas ao vitimizador por parte da criança
te ainda, o número de emoções negativas atribuí- tem sido tomada como um indicativo do seu de-
das ao vitimizador aumentou substantivamente senvolvimento moral, é um pouco surpreendente
quando as crianças foram confrontadas com que, até aqui, os investigadores não tenham estu-
questões deônticas (ou explicitamente morais). O dado o fenómeno do vitimizador feliz ou infeliz
facto de uma percentagem relativamente elevada segundo uma perspectiva deôntica ou do dever.
de crianças mais novas ter ainda atribuído, mes- As pesquisas efectuadas mostram que parece não
mo na condição deôntica, emoções positivas ao haver dúvida de que este processo de atribuição
vitimizador, e o facto de as terem justificado pela de emoções depende, além de mais, do desenvol-
invocação dos resultados tangíveis que ele obte- vimento cognitivo, emocional e moral da crian-
ve, estão mais de acordo com as teses de Kohl- ça, mas também de variáveis não desenvolvi-
berg da pouca maturidade moral da criança, do mentistas. A minha esperança é que o estudo
que com a ideia de Turiel da sua elevada compe- destas atribuições segundo uma perspectiva de
tência moral. Contudo, se tivermos presente que, dever contribua para destrinçar o que, em tais
para Kohlberg, ao contrário de Turiel, o conheci- atribuições, é sobretudo desenvolvimento emo-
mento moral significa, não tanto conhecer nor-
cional, cognitivo, ou moral, e influência de va-
mas morais num sentido meramente informativo,
riáveis de tipo não desenvolvimentista. Estare-
mas vê-las como obrigações pessoais que levam
mos então em melhores condições para explorar
à conduta moral, o que neste estudo é mais con-
sistente com a teoria de Kohlberg é o facto de a relação entre o comportamento da criança e as
não ter havido uma relação significativa entre o suas reacções cognitivas e emocionais face a
padrão de emoções atribuídas ao vitimizador e o conflitos morais hipotéticos ou reais.
comportamento pró-social das crianças. Seja
como for, porque o significado do termo «conhe-
cimento moral» não é o mesmo para Kohlberg e REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Turiel, nada é mais natural do que existir uma
Arsenio, W. (1988). Children’s conceptions of the situa-
pesquisa cujos resultados são parcialmente con-
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sistentes e inconsistentes com ambas as aborda- Child Development, 59, 1611-1622.
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Tudo bem considerado, este estudo mostra information in social-cognitive development: Chil-
que a tendência frequente de muitas crianças, em dren’s differentiation of moral and conventional
especial das mais novas, para atribuírem emo- events. Merril-Palmer Quarterly, 31, 1-18.

83
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cultural context. Paper presented at the Conference
of the Association for Moral Education. Ottawa. Este artigo tem dois objectivos centrais. Primeiro,

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analisar as emoções positivas e negativas que as crian- ABSTRACT
ças atribuem a transgressores de normas morais em
duas condições distintas (i.e., factual e descritiva; This study examines children’s attributions of posi-
deôntica e prescritiva). Segundo, relacionar estas emo- tive and negative emotions to victimizers in an «is» or
ções com uma medida de comportamento pró-social factual, and in an «ought» or deontic condition, and
das crianças numa situação de altruísmo. Cinquenta e relates such emotions with a measure of children’s
quatro crianças de dois níveis etários (i.e., 5-6 anos; 8- prosocial behavior in an opportunity-to-donate situa-
-9 anos) foram (a) confrontadas com três exemplos de tion. Fifty-four children from two age levels (i.e., 5- to
transgressões morais; (b) solicitadas a atribuir emo- 6-year-olds, and 8- to 9-year-olds) were presented with
ções positivas ou negativas ao transgressor em ambas three moral transgressions, and asked to attribute posi-
as condições; e (c) colocadas depois numa situação tive or negative emotions to the victimizer in such con-
onde podiam doar algumas das guloseimas recebidas ditions. They were then given an opportunity-to-do-
pela sua participação na investigação. Os resultados nate situation in which they might donate some of the
mostram que (1) o número de vitimizadores felizes goods they had received for their participation in the
(i.e., crianças que pensam que o vitimizador se sentiu study. The results show that (1) the number of happy
bem depois de ter cometido a transgressão) foi muito victimizers was much lower in the deontic than the
menor na condição deôntica que na factual; (2) esta factual condition; (2) this difference was greater
diferença foi mais acentuada nas crianças mais velhas among the older than the younger children; and (3)
que nas mais jovens; e (3) não houve qualquer relação there was no significant relationship between chil-
significativa entre o tipo de emoções atribuídas pelas dren’s pattern of emotion-attribution (i.e., positive or
crianças e o seu comportamento altruísta na situação negative) and their prosocial behavior. These findings
de dádiva anónima. São ainda discutidas as implica- have important implications for a better understanding
ções destes resultados para uma melhor compreensão of (a) children’s conceptions of moral emotions; (b)
das emoções morais na criança, de dados contraditó- some of the contradictory findings in this area of re-
rios neste tema de pesquisa e de teses relativamente search; and (c) the somehow different claims of pre-
opostas de teorias actuais de desenvolvimento moral sent-day theories of development as far as the child’s
no que à competência moral da criança diz respeito. moral competence is concerned.
Palavras-chave: Emoções morais, vitimizadores Key words: Moral emotions, happy victimizers, de-
felizes, desenvolvimento, crianças. velopment, children.

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