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Tabela

de Conteúdos
Dedicatótia
Um
Dois
Três
Quatro
Cinco
Seis
Sete
Oito
Nove
Dez
Onze
Doze
Treze
Catorze
Quinze
Dezesseis
Dezessete
Dezoito
Dezenove
Vinte
Vinte e Um
Vinte e Dois
Vinte e Três
Vinte e Quatro
Vinte e Cinco
Vinte e Seis
Epílogo
POSSÍVEIS GATILHOS
Ansiedade
Depressão
Sexismo
Álcool
Violência
Questões de abandono

REPRESENTAÇÕES
Protagonista branco bissexual meio italiano
Personagem secundário negro gay
Personagem secundária branca lésbica meio italiana
Personagem secundária branca meio italiana
Personagem terciária negra lésbica
Personagem terciária branca poliamorosa meio italiana
Personagens terciários poliamorosos bissexuais
Para todos que tiveram que esconder um pouco de si toda vez que
amarraram seus patins

AVISOS DE CONTEÚDO:
Descrições de depressão, ansiedade e dissociação
Leve ideação suicida
Abuso de álcool por menores
Uso breve de maconha
Violência esportiva
UM
AGOSTO

Então, ser depressivo e ansioso, ao mesmo tempo, é absolutamente


louco.
Não tenho vontade ou motivação para jogar hóquei ou fazer
qualquer coisa além de me familiarizar com meu novo colchão, mas
também tenho essa necessidade consumidora de estar no gelo. De provar
que sou digno do meu próprio nome.
Pelo menos tenho Delilah aqui para tornar toda a situação tolerável.
Sento-me em cima dos bancos, amarrando a lâmina do meu taco com
fita e ouvindo o raspar do gelo enquanto minha irmã ensina sua nova
namorada, Jade, a patinar. Não me pergunte como Delilah acabou com
uma não-atleta. A vida dela é ainda mais centrada no hóquei do que a
minha, e nas poucas horas que conheço Jade, ela deixou perfeitamente
claro que não sabe quase nada sobre o esporte.
Ainda assim, a maneira como Delilah sorri, segurando as mãos de
Jade e patinando para trás enquanto a guia pelo gelo, é quase o suficiente
para me fazer sorrir também.
Eu tento. Forço um pequeno levantar nos cantos da minha boca. Mas
com as faixas com meu nome penduradas no teto, sinto que estou
sufocando sob elas.
Bem, não exatamente meu nome. Eu sou o Mickey James III.
Pendurados nas vigas estão dois banners que dizem James e James II
acima dos agora-aposentados números 7 e 13. Esperando pelo meu
James III e 17 se juntarem a eles e completar o trio.
Pelo menos até eu produzir o Mickey James IV, e o IV gerar o Mickey
James V, e assim por diante até que não haja mais números para mais
ninguém e a Hartland University seja forçada a encerrar o programa de
hóquei masculino.
— Não me solte! — Jade diz com um leve sotaque sulista, seguido por
gargalhadas enquanto as duas caem no gelo. Graças a Deus Delilah está
usando shorts por baixo do vestido, ou eu teria que arrancar meus
próprios olhos.
Eu rasgo a fita e coloco o rolo ao meu lado no banco, trocando-o pelo
meu celular e descansando meu taco no colo. A obrigação me forçou a
subir a colina até a arena e colocar os meus patins, mas a apatia domina
sobre minha vontade de pisar no gelo.
Há algumas mensagens da minha melhor amiga, Nova, esperando
por mim quando desbloqueio meu telefone.
Nova: Oi querido
Como vai o primeiro dia?
Olho pelas janelas do chão ao teto atrás do gol dos adversários, a
lacuna nos assentos oferecendo uma vista do Lago Cayuga colina abaixo,
a luz do sol brilhando nele como vidro. Os velhos prédios de pedra e
tijolo de Hartland espreitando por entre as massas de árvores.
Se eu fosse qualquer outra pessoa, eu ficaria emocionado por estar
aqui agora. Neste lindo campus, dias antes do início do meu primeiro ano
de faculdade. Todo o meu futuro aos meus pés.
Mas porque eu sou eu, tudo o que posso pensar em dizer é:
Mickey: Me mate agora.
Eu pago para você voar de Paris ou onde quer que você esteja só para me matar
Nova: Perdão vossa majestade
Você não tem tanta sorte
Eu estreito meus olhos para o vossa majestade. Isso é novo. Nunca
deveria ter me juntado a uma equipe chamada Royals.
Eu levanto o olhar a tempo de ver Delilah levantar Jade. Ela tira a
neve de sua legging, e eu noto manchas de tinta em suas mãos, azuis e
vermelhos vibrantes em sua pele escura. É mesmo. Delilah mencionou
que ela era uma artista. Delilah, minha irmã totalmente atleta,
namorando uma artista que nem sabia o que era um celly até que Delilah
demonstrou sua comemoração usual de gol (o dice roll, porque ela é esse
tipo de atleta de hóquei) dez minutos atrás.
É um lado dela que eu nunca pensei que veria.
— Acha que você está pronta para alguns dois contra um? — Eu
chamo, minha voz áspera com o desuso.
Jade se assusta como se tivesse esquecido que eu estava aqui, o que
não posso culpá-la, mas seu choque se transforma em um sorriso fácil
quando ela segura o braço de Delilah como apoio e estica as costas.
— Com certeza! Eu só vou... sentar na rede ou algo assim. Porque eu
não consigo nem ficar em pé no gelo, aparentemente.
— Quando você superar o medo de cair, você vai aprender em pouco
tempo — diz Delilah. Ela guia Jade de volta ao banco para uma pausa e se
inclina contra os painéis ao meu lado.
— Estou mais interessada em observar vocês dois — Jade diz atrás
de mim no banco. — Quero ver jogadores de hóquei de verdade em ação.
Delilah olha para mim, a franja de seu cabelo rosa chiclete
excessivamente longo caindo em seu rosto. Eu vejo seu olhar permanecer
nas olheiras sob meus olhos, seus lábios pressionando juntos em uma
linha fina. Ela provavelmente pensa que vou desmaiar assim que meus
patins tocarem o gelo, mas, na verdade, é assim que eu pareço o tempo
todo agora.
Desde que o draft de entrada da NHL terminou em junho e o foco
mudou para as perspectivas do próximo ano. Para mim e Jaysen
Caulfield, os dois que todos projetam para estar no topo. Com minha
ansiedade no auge, o sono tem sido muito difícil de encontrar.
Mas eu não gosto do olhar preocupado que ela está me dando. Eu
deslizo para fora dos bancos e saio para o centro do gelo apenas para me
afastar dele.
O cheiro de uma pista de hóquei é praticamente universal. Fecho os
olhos e respiro o ar frio, limpo e com cheiro de hóquei, e eu poderia estar
em qualquer arena do mundo. KeyBank Center, onde praticamente fui
criado em Buffalo. USA Hockey Arena em Michigan, minha casa nos
últimos dois anos.
A Giancarlo Alumni Arena de Hartland é provavelmente o dobro do
tamanho da USA Hockey Arena, com seções alternadas de assentos
pretos e roxos em dois níveis e um jumbotron suspenso com quatro telas
para replays e jogabilidade ao vivo. Já joguei em arenas da NHL antes,
mas apenas para jogos especiais. Esta será a minha primeira temporada
tendo um rinque em casa tão bom quanto este.
Está tudo bem. Tudo está indo conforme o planejado. Não tenho
nenhuma razão para noites sem dormir, nenhuma razão para estar tão
miserável o tempo todo.
Assim que o pensamento passa pela minha mente, o riso ecoa do
túnel até o vestiário. Como um desafio o qual tenho que encarar.
Meus novos capitães saem do túnel primeiro. Veteranos chamados
Luca Cicero e Maverick Kovachis, conhecidos como Zero e Kovy, de
acordo com o grupo de mensagens da equipe que fui colocado contra a
minha vontade durante o verão. Eu meio que espero que todo o resto da
equipe venha correndo atrás deles, mas apenas um outro os segue.
O mundo se reduz a um ponto quando ele aparece, e pela primeira
vez na minha vida, eu realmente entendo como é ficar preso entre lutar
ou fugir.
Jaysen. Caulfield.
Devo ter cometido algum crime hediondo em uma vida passada para
ser punido assim. Preso em um time com meu maior rival. A maior
ameaça ao meu lugar número um no draft. A principal fonte da minha
ansiedade de cortar o coração.
Os capitães param no banco para conversar por um minuto com
Delilah e Jade, dando-lhes abraços e perguntando sobre seus verões.
Jaysen passa por eles, olhando ao redor da arena, observando-a com
admiração pura e olhos arregalados em seu rosto.
Quando seus olhos param em mim no centro do gelo, a curva suave
do seu sorriso se aguça em algo voraz.
Eu nunca me preocupei muito com a minha vaga no draft. Achei que
contanto que eu continuasse jogando meu jogo, eu estaria seguro. Mas
neste momento, com Jaysen olhando para mim como se estivesse pronto
para devorar todas as minhas esperanças e sonhos, começo a suar.
Este vai ser um longo ano.

A ÚLTIMA VEZ que eu compartilhei o gelo com Jaysen Caulfield, o


Programa de Desenvolvimento da Seleção Nacional e eu derrotamos o
Green Bay Gamblers por 6 a 1. Fiz um hat-trick e ele marcou o único gol
do Gamblers. Ele ainda deve estar guardando rancor porque não vai sair
da minha cola agora.
Eu pego um disco solto nos bancos, e ele chega perto de mim uma
fração de segundo depois. Eu me viro para colocar meu corpo entre ele e
o disco, e ele me segura com as mãos nas minhas costas, tentando um
poke check. Eu me viro novamente, movendo o disco pelos painéis
voltando na direção de onde vim. Ele se recupera bem rápido, mas minha
velocidade é um dos meus maiores trunfos. Eu faço o passe para Delilah
na linha azul, e Jaysen me empurra antes de sair para o backcheck.
Dessa vez, ele não se incomoda com o disco e apenas me empurra
contra os painéis. O vidro chacoalha, e eu ouço o suspiro de Jade do
banco. Eu mordo meu protetor bucal e prendo o disco contra os painéis
com meus patins para mantê-lo fora do alcance dele. Mas neste momento
ele está mais interessado em ser um idiota do que jogar hóquei de
qualquer maneira.
— Quando foi a última vez que você sorriu? — ele diz. Eu empurro
meu quadril nele e consigo espaço suficiente para mandar o disco para o
Zero.
Jaysen não desiste, me provocando sempre que está ao alcance dos
meus ouvidos e jogando seu corpo em mim sempre que pode. Delilah
bate no meu ombro enquanto eu recupero o fôlego depois de um golpe
particularmente duro.
— Eu acho que alguém está com um pouco de medo de você — diz
ela com uma piscadela.
Reviro os olhos, mas ela tem razão. Ele não ficaria preso em mim
assim se não estivesse pensando em nossas projeções no draft. Então eu
aguento o antagonismo dele, mesmo quando ele faz uma piada com o
meu tamanho e diz:
— Você tem que comprar patins de criança ou o quê?
Essa quase me pega. Não é como se eu fosse tão baixo. Perfeitamente
na média, na verdade.
Ok, talvez alguns centímetros abaixo da média. Para um não-atleta. A
maioria dos jogadores de hóquei tem algo como 20 centímetros a mais
que eu. Mas Jaysen só tem quinze, então não é como se ele fosse o cara
mais alto do gelo também.
Ele me dribla e coloca o disco na parte de cima, bem através de um
dos buracos no canto do alvo, e quando ele olha para mim, seu sorriso é
pequeno e arrogante, seu taco apoiado em seus quadris enquanto ele
desliza em um pé de volta para o resto de nós. Delilah está no banco com
Jade agora, explicando o jogo para ela enquanto ele se desenrola na
frente delas.
Poderia muito bem dar a ela uma lição de provocações.
— Quem te ensinou a fitar um taco? — Eu pergunto. Jaysen tem uma
única tira de fita preta ao longo da borda inferior da lâmina e fita branca
do meio ao dedo do pé. É o trabalho de fita mais atroz que eu já vi.
Ele finca a ponta de seu taco no gelo e praticamente embala a lâmina,
passando um dedo pela faixa preta.
— Isso me dá aderência suficiente para pegar um passe e, ao mesmo
tempo, é fino o suficiente para me dar uma melhor sensação do disco. —
Ele cutuca a ponta branca. — Isso segura o disco logo antes de sair do
lance e o dá um giro da hora.
Eu levanto uma sobrancelha para ele.
— Faz você parecer um espanador.
O canto de sua boca se contrai e meu coração falha como se eu
estivesse em perigo.
— Me faz jogar como a primeira escolha geral do draft.
Deixo escapar uma risadinha e balanço a cabeça, desviando o olhar
dele. Ele é absolutamente delirante.
— Então é isso que provoca uma reação de você, hein, Sua Graça? —
Jaysen inclina o queixo para cima, aproximando-se. — Um desafio ao seu
direito de primogenitura?
Meus olhos se estreitam com o título. Primeiro Nova, agora ele? Ele
não percebe que agora é um Royal também?
— Confie em mim — eu falo lentamente. — Você não é nenhum
desafio.
Ele invade meu espaço, elevando-se sobre mim, então eu tenho que
levantar o olhar para ele. Ele tirou seus piercings para jogar hóquei, mas
já vi fotos suficientes dele fora do gelo para saber exatamente onde eles
ficariam. Argolas pretas em seu nariz e lábio. A corrente prata de um
colar brilha contra sua pele marrom escura, e mesmo que ele esteja
zombando de mim, ele tem covinhas que me fazem querer me dar um
soco no rosto.
Eu me recuso a dar-lhe alguma chance, mesmo com meu coração
acelerado e palmas das mãos suando em minhas luvas.
Antes que ele diga uma palavra, Zero patina e diz:
— Esta é a hora do hóquei, rapazes. Vocês podem dar uns amassos
depois.
Jaysen se afasta de mim tão rapidamente que não tem como ele ver
como minhas bochechas coram.
Ele fica ainda mais agressivo com seus checks depois disso, e estou
feliz que todos nós decidimos nos equipar para isso. É preciso todo o
meu poder para manter minha expressão neutra. Estou fazendo um bom
trabalho, até que Jaysen me acerta no ombro depois de um gol e quase
me joga no chão. Eu mal me mantenho em pé e isso é o máximo que
posso aguentar dele.
— Qual é a sua? — Eu pergunto. Eu consigo manter minha voz tão
morta quanto ele espera que seja, mas eu torço meu aperto no meu taco,
o coração batendo forte. — Puto porque você não é mais o melhor
jogador do seu time?
Jaysen inclina a cabeça para o lado, colocando todo o seu peso em um
pé e relaxando os ombros casualmente.
— Não. Só pensando no quanto você não merece estar aqui.
Eu levo minha cabeça para trás, contorcendo meu rosto em confusão.
— O que isso deveria significar?
— Quero dizer, há centenas de outros caras que nunca estarão aqui
porque você está ocupando o espaço deles, com uma bolsa de estudos
que você não precisa, exposição que você não precisa. Você não tem
motivos para estar aqui.
Eu zombo. Ok, colega. Eu estou oficialmente farto disso. Eu me viro
para sair do gelo, mas Jaysen engancha os dedos enluvados sob minha
camisa de treino e me puxa de volta para ele. Sinto que estou prestes a
entrar em combustão. Agarro meu taco com tanta força que meus dedos
doem.
— Eu me esforcei para isso, também — eu vocifero.
Ele ri, mas é um som amargo e raivoso. Eu nunca tirei as luvas para
uma briga antes, mas cara, eu estou muito tentado agora.
— É — ele retruca. — Você tinha que se esforçar muito com um
nome como esse.
Eu o empurro. Um crosscheck completo no peito com todo o meu
peso. Ele mal se mexe. Ele empurra os dedos pela grade do meu capacete
e puxa minha cabeça em direção a ele. Eu mantenho meu taco em seu
peito, mas ele me puxa para perto o suficiente para que eu possa sentir o
cheiro de seu suor, vê-lo em seu rosto. Ele está carrancudo, mas não é tão
intimidante com o pedaço de plástico vermelho em sua boca.
O som de patins no gelo corta a adrenalina pulsando na minha
cabeça enquanto Zero e Kovy param ao nosso lado. Jaysen e eu
mantemos nossos olhos um no outro quando eles colocam seus braços
entre nós e nos separam. Jaysen não solta minha grade até que seja
absolutamente necessário, quase tirando o capacete da minha cabeça.
— Vocês superstars precisam de um pouco de privacidade? — Zero
pergunta. — Porque parece que alguma pegação bizarra está prestes a
acontecer aqui.
— Ou alguma mutilação grave — acrescenta Kovy.
Zero olha para ele e inclina a cabeça, encolhendo um ombro.
— Elas são intercambiáveis para algumas pessoas. — Ele se vira para
nós e balança a cabeça como se precisasse reativar sua capitania. Ele
ergue uma mão autoritária na frente dele. — O ponto é. Vocês dois
precisam largar essa merda de ego. As projeções dos drafts não
significam nada neste gelo, nestas camisas. Entenderam?
Jaysen endireita os ombros, ficando de pé em toda a sua altura, então
ele está me olhando abaixo do nariz.
— Estamos apenas nos conhecendo.
— Guarde o conhecer um ao outro para quando vocês tiverem
algumas bebidas. — Zero volta para o centro de gelo e gesticula para
seguirmos com outra inclinação de cabeça. Eu não me movo até que
Jaysen o faça, passando por mim esbarrando seu braço no meu.
Reviro os olhos e os sigo, observando Jaysen na minha frente o
tempo todo. Mesmo depois de tudo isso, ele patina com um tipo de graça
que quase poderia rivalizar com mamãe e minha irmã Nicolette, e ambas
são malditas patinadoras olímpicas com cerca de uma dúzia de medalhas
entre elas.
Jaysen pertence ao gelo. Ele adora hóquei. É óbvio na maneira como
ele inclina a cabeça para trás e inspira profundamente o ar frio, os
ombros relaxando como se sua frustração comigo pudesse ser purificada
apenas pelo cheiro do rinque.
Ele não foi criado para jogar hóquei. Ele escolheu. Absorveu-o em sua
pele, seu sangue, seus ossos por sua própria vontade. Há muitos outros
como ele que poderiam facilmente estar aqui neste gelo se não fosse por
mim.
Jaysen está certo sobre isso, eu acho.
Talvez se ele não fosse um idiota raivoso, eu poderia até dizer isso a
ele.
DOIS
Estou usando meu celular no chuveiro no primeiro dia de aula quando
me deparo com uma foto que Jaysen twittou ontem à noite. E por me
deparar, definitivamente não quero dizer que entrei especificamente no
feed dele para ver se ele está falando sobre o draft. É uma selfie com ele,
Dorian Hidalgo e David Barboza sentados juntos em um sofá que não
1
reconheço, a legenda “meus dois blueliners favoritos beijo”.
É estranho ver os três sorrindo juntos quando todos nós passamos os
últimos dois anos brigando no gelo nas ligas juniores. Dorian e Barbie,
pelo menos, têm sua amizade ao longo da vida para se apoiar. Ambos
nasceram no México, foram criados em Wisconsin e escolheram vir para
a mesma faculdade depois de um tempo separados na USHL. Se os
calouros tivessem como escolher seus colegas de quarto, eles
definitivamente estariam morando juntos.
Em vez disso, sou eu e Dorian. Não que eu tenha visto muito ele na
semana passada. Tenho certeza de que ele só esteve em nosso quarto
para se mudar e trocar de roupa, passando todo o tempo com Jaysen e
Barbie em eventos de orientação.
Eu juro que não estou com ciúmes. Eu tenho evitado ativamente os
outros calouros dos Royals. Eles vão à orientação durante o dia e passam
as noites bebendo na casa do hóquei, fora do campus, onde os veteranos
moram juntos. Eu passo o tempo no meu quarto ou no cais do lago
enquanto Delilah e Jade fazem seus deveres de líderes de orientação e
fico com elas quando terminam, e é assim que eu gosto.
Fazer amigos em Hartland seria inútil quando só estarei aqui por um
ano antes do draft. Além disso, quando papai trocou os Sabres pelos
Hurricanes, ele teve que sair naquele mesmo dia para um jogo naquela
noite com seu novo time. Teve menos de uma hora para se despedir de
um time e de uma cidade pela qual jogou por duas décadas. É para isso
que eu tenho que estar ansioso.
A única razão pela qual minha amizade com Nova sobreviveu a
distância é porque eu a conheço desde o dia em que nasci e morei com
ela depois que minha família se mudou de Buffalo. Eu ainda tenho um
quarto na casa dos pais dela. Não tenho como escapar dela neste
momento, e eu nem gostaria.
Percorro as respostas ao post de Jaysen enquanto volto para o meu
quarto. Há muitos do resto dos Royals, alguns dos outros defensores
fingindo estarem ofendidos pelo seu comentário de blueliners favoritos,
Zero comentando meus filhos com um monte de emojis de coração.
Depois, há os fãs de hóquei aleatórios competindo por um pouco de
atenção comentando como eles esperam que todos estejam se divertindo
na faculdade.
Estou encarando as covinhas irritantes do Jaysen no meu celular
quando entro no meu quarto.
Jaysen e Dorian estão sentados na cama do Dorian, um notebook
aberto com uma música raivosa saindo pelos alto-falantes.
Eu pulo tão alto que quase jogo meu celular no chão, mas eles estão
muito envolvidos em sua conversa para perceber. Eles parecem
melhores amigos com as suas roupas pretas e tatuagens.
— Cara, estou tão aliviado — diz Dorian. — Achei que estaria
perdendo shows aqui.
— É, parece que eles não têm uma barricada também — diz Jaysen,
semicerrando os olhos para a tela através dos óculos de aro preto. —
Podemos ficar bem na frente deles.
— Eu nunca estive em um local assim. Em todos lá de casa, os palcos
eram na altura dos ombros e as barricadas faziam uma lacuna enorme.
— Depois de conhecer um lugar como esse, os outros nem valerão a
pena para você. — Jaysen acena com a cabeça em minha direção. —
Vossa Graça.
Eu aperto a toalha em volta da minha cintura.
— Isso já não ficou batido?
Ele dá de ombros.
— É apropriado. O Zero quer te chamar de Terzo, mas você tem que
merecer isso primeiro. É terceiro em italiano, aparentemente.
Certo. Eu era Jamesy no meu último time. Pelo menos Zero é um
pouco mais criativo, transformando aquele pequeno III pretensioso no
final do meu nome em algo decente. Ainda assim, reviro os olhos.
— Ele traduziu isso no Google?
— A avó dele é da Itália. Você saberia disso se algum dia se juntasse a
nós para a reunião da equipe. Ele não para de falar sobre isso.
Eu olho para ele. Suas palavras são leves e despreocupadas, mas o
olhar tenso em seu rosto diz que ele prefere se barbear com uma
lixadeira elétrica do que continuar falando comigo.
— Espera, sua mãe não patinou pela Itália? — Dorian pergunta. —
Você sabe italiano?
Eu afirmo lentamente e ambos me olham como se estivessem
esperando eu entrar em algum monólogo em italiano ou algo assim. Eu
mantenho minha boca fechada e me abaixo atrás da minha cômoda para
ter um pouco de privacidade enquanto me visto. Estarei me trocando na
frente desses caras diariamente assim que os treinos começarem, mas
algo sobre estar no meu quarto em vez do vestiário faz parecer, eu não
sei, estranho. Sim, este é o quarto de Dorian, também, mas eu tive ele só
para mim enquanto ele passava suas noites na casa do hóquei, então
quase parece que ele está invadindo.
— Ok — Dorian diz, puxando o som por alguns segundos. A cama
range, e ouço o estalo de seu notebook fechando. Leva um momento para
a música morrer, e ele é rápido para preencher o silêncio. — Terzo é um
apelido bem maneiro, na real. Melhor que Hildy. Tipo, eu não entendo.
Não tem nem um L lá! Por favor, se você gosta de mim pelo menos um
pouco, apenas me chame de Dorian.
— Para constar — diz Jaysen —, eu sugeri Cara de Boneca.
Dorian bufa.
— Esse na real não é ruim. Eu tenho que sair, cara. A primeira aula
de todas da faculdade é física. Reza por mí.
— Isso é o que você ganha por cursar astronomia.
Dorian aperta as mãos na frente de si e faz uma careta que faz os
tendões do pescoço saltarem.
— Eu simplesmente... amo o espaço... muito! — ele diz
descaradamente. Ele se dirige para a porta com a mochila pendurada no
ombro. — Por que não posso pular matemática e só olhar para as
estrelas?
Há um panorama da Via Láctea no meio de todos pôsteres de bandas
de metal e de hóquei acima da cama do Dorian. Eu vi isso todos os dias na
semana passada e nunca percebi que era algo mais do que estético.
Passei dois anos com os mesmos jogadores em Michigan, mas não
tenho nenhum contato deles salvo no meu telefone ou adicionado nas
redes sociais. Honestamente, isso não me incomoda tanto quanto o
pensamento de não saber uma única coisa pessoal sobre meu próprio
colega de quarto. De desperdiçar meu primeiro ano de faculdade.
Não é até que Dorian sai pela porta que eu percebo que Jaysen não
está o seguindo.
— O quê? — Eu pergunto quando estamos sozinhos.
Jaysen suspira, um som longo, alto e dolorido.
— Nós temos álgebra juntos, aparentemente. Zero e Kovy estão me
forçando a ficar com você.
Eu pisco para ele. O que é isso, sistema de formação de amigos?
— Por quê?
Ele dá um olhar tão vazio quanto o meu, e eu não consigo resistir.
Viro-me para o espelho e passo os dedos pelo cabelo em uma tentativa vã
de domar meus cachos e enfio uma caneta atrás da orelha. Eu saio pela
porta sem avisar e a deixo fechar em Jaysen só para conseguir alguns
passos extras de distância. Ele parece indiferente quando me alcança,
caminhando ao meu lado.
Delilah e eu vamos fazer esta aula de álgebra juntos. Nós dois somos
péssimos em matemática, então não vai ajudar nenhum de nós, mas é
melhor do que sofrer sozinho. Agora vai ser pura tortura.
Eu tinha me acostumado com o campus sendo bem quieto com
apenas os calouros e atletas de outono aqui na maior parte do tempo.
Agora temos que nos espremer entre outras pessoas que se aglomeram
nos caminhos estreitos e curvos dos dormitórios. Hartland é pequena
para uma faculdade da primeira divisão, mas ainda tem gente gritando
ao ver outra pessoa, rindo e se abraçando como se estivessem separados
há anos, o que me dá dor de cabeça.
Os veteranos estão reunidos na colina em frente ao Centro Estudantil
Sommer com suas roupas pretas e óculos escuros ridículos, bebendo
álcool em suas canecas de turma e importunando os calouros. Eu
mantenho minha cabeça baixa depois de ver Zero e Kovy gargalhando, já
bêbados às dez da manhã.
Passamos da maior parte do barulho e começamos a subir a colina
até o prédio de ciências e matemática Stratton quando Jaysen finalmente
fala.
— Então, o que você está cursando?
Sabe o que é mais chato nisso? Eu sei que ele realmente não quer
saber. Sua voz está tão morta. Ele nem sequer olha na minha direção
enquanto pergunta. Eu sei que ele só está aqui porque nossos capitães
bêbados querem que paremos de ser tão hostis antes dos treinos
começarem. Mas isso não impede que meu coração falhe ou que minhas
palmas suem com o peso da sua atenção.
— Nada — eu digo.
— Então, o quê, indeciso por enquanto? Testando as águas?
Eu olho para ele. Ele tem um aperto firme nas alças da mochila,
mascando seu chiclete com força. Há uma sensação pesada no meu peito,
como se eu soubesse exatamente onde ele quer chegar.
— Não estou aqui por um diploma — eu digo lentamente, mantendo
meus olhos nele o tempo todo.
Ele reage exatamente como eu esperava, finalmente olhando para
mim com desdém por todo o rosto.
— Deveria ter ido pra CHL, então. Por que se incomodar em vir para
a faculdade se a NHL é uma coisa tão certa?
Ele meio que tem um ponto. Jogar na CHL me permitiria focar apenas
no hóquei em vez de perder tempo com aulas e deveres de casa. Mas
Hartland é uma tradição da família James. Eu não tive muita escolha.
Eu ajusto a caneta atrás da minha orelha e volto meus olhos para a
calçada. Meu rosto está começando a ficar vermelho, e não apenas por
causa do sol do final de agosto.
— Eu poderia perguntar o mesmo para você.
— A NHL nunca foi uma certeza para mim.
Eu rio.
— Você tem sido uma grande aposta por anos. É garantido.
— James. — Ele diz meu nome como se lhe causasse dor física, todo
tenso e rouco. — Já tive uma lesão que ameaçou minha carreira. Basta
um golpe ruim para eu perder isso. Também, há o fato de que menos de
um por cento dos jogadores de hóquei universitário masculino e dois por
cento dos jogadores da NHL são negros. Eu não fui criado para o
estrelato como você.
Respiro fundo e solto o ar pesadamente pelo nariz. Eu não posso
argumentar contra isso.
— Você percebe que metade da nossa equipe foi convocada nos
drafts, certo? — Jaysen continua. Eu me pergunto como ele teria surtado
comigo se eu tivesse respondido a primeira pergunta de forma diferente.
Porque este era obviamente o seu plano desde o início. — Merda, Dorian
foi no segundo turno para os Kings, e ele ainda está cursando
astronomia. Você também poderia ter um plano B para quando esse
legado explodir na sua cara. Uma atitude ruim pode afundar uma equipe
inteira. Ninguém vai arriscar isso pelo seu nome.
Reviro os olhos e paro de andar.
— Ouça, Jaysen.
Ele me encara com os braços cruzados e as sobrancelhas franzidas.
— Nós não temos que fazer isso — eu continuo, a voz rouca. — Você
não tem que me lembrar o quanto você me odeia toda vez que me vê. Eu
não esqueci.
Ele trava a mandíbula com força, os tendões saltando. Não lhe dou
tempo para pensar em outro insulto antes de ir embora.
O ar-condicionado em Stratton me atinge como uma parede, e
respiro aliviado o ar frio, enxugando o suor da minha testa. Eu deveria
ter trazido uma mochila apenas para carregar desodorante extra.
Eu escolho uma mesa no fundo da sala de aula e me afundo na
cadeira, a perna balançando enquanto vejo as pessoas entrarem. Jaysen
vem logo atrás de mim, mas ele se senta mais perto da frente, graças a
Deus. Eu apoio um cotovelo na mesa e esfrego com meu polegar um
desenho de um pau feito com uma caneta permanente enquanto espero a
Delilah aparecer. É bom saber que os estudantes universitários não são
mais maduros do que os do ensino médio.
A batida de um caderno na mesa ao meu lado me dá um susto
— Nós vamos sentar na frente da próxima vez — Delilah diz, Jade
afundando no banco do outro lado, vestindo uma camiseta que diz
Seventeen na frente e Woozi 96 atrás. Elas devem ter ficado juntas por
causa de k-pop. É a primeira coisa que vejo elas terem em comum até
agora. — Eu preciso passar nesta aula.
Eu suspiro.
— Tá bom.
Ela se senta ao meu lado e me passa um copo de plástico pingando.
— Você está na faculdade agora, garoto. Hora de tomar cafeína.
— Obrigado — murmuro, e tomo um pequeno gole de algum tipo de
café gelado amargo.
Ela ri da minha careta.
— Você tem que mexer primeiro. — Ela empurra o queixo em
direção à frente da sala. — Tente não fazer tantas caras feias, você tem
platéia.
Algumas pessoas rapidamente desviam o olhar quando olho na
direção que ela apontou.
— Que diabos.
— Eles estão vendendo isso no Sommer Center. — Delilah enfia a
mão na mochila e tira uma revista, jogando-a sobre a mesa na minha
frente. The Hockey News. A foto da capa me mostra com todo o uniforme,
minha nova camisa roxa e preta dos Royals, completamente sem sorrir.
— A Dinastia Continua: Apresentando Sua Majestade, Mickey James
III.
De repente o “Vossa Majestade” de Nova, e o Sua Graça, do Jaysen,
fazem muito mais sentido.
Minha combinação de revirar os olhos e suspirar é uma obra de arte
aperfeiçoada por anos de prática.
— Espere até você ler — diz Delilah.
Eu resmungo enquanto folheio até que eu encontro meu rosto
novamente, cercado por minhas irmãs no sofá da casa de mamãe e papai
em Raleigh. Meu rosto está tão vazio como sempre, mas minhas irmãs
olham para a câmera como se estivessem tentando quebrá-la.
Na época daquela sessão de fotos, eu estava amargurado com muitas
coisas. Meus pais moram em Raleigh desde que eu tinha dez anos, mas
essa foi apenas a terceira vez que estive lá. Eu pude ver minhas irmãs por
um dia, e era tudo sobre hóquei.
Mickey James estabeleceu recordes na NHL, diz o artigo. Mickey James
II os quebrou. Mickey James III foi criado para destruí-los completamente.
Suas cinco irmãs mais velhas são uma prova do desespero de seus pais em
ter um filho para continuar a dinastia de hóquei da família James.
Eu pisco. Leio essa última linha novamente. Então, uma terceira vez
antes de empurrar a revista para longe de mim.
— Porra, é sério?
Delilah assente.
— Essa é a única menção de qualquer uma de nós. Quero dizer, eles
dizem que Bailey e eu também estamos em Hartland. Mas eles não falam
sobre o trabalho no serviço de inteligência de Mikayla, ou as medalhas de
Nicolette, ou o campeonato de lacrosse de Bailey, ou o treinamento de
Madison.
— Ou o seu Patty Kazmaier? — Delilah foi literalmente nomeada
MVP do hóquei feminino da NCAA na última temporada. Esta é a The
Hockey News. Eles provavelmente deveriam mencionar algo assim.
Delilah balança a cabeça.
— Nada do que fazemos importa. Nós só existimos porque mamãe e
papai estavam desesperados por uma criança com um cromossomo Y.
Jade faz um tsk do outro lado, mexendo seu próprio café gelado com
um canudo de metal.
— Esse é um indicador impreciso de gênero e você sabe disso.
— Falando da perspectiva deles — Delilah corrige. As duas começam
a falar sobre uma aula de estudos de gênero que fazem juntas, e eu pego
a revista de volta para mim para fazer uma leitura furiosa enquanto
espero o professor aparecer.
Eu folheio as comparações entre papai e eu, como nós dois éramos
muito jovens para o recrutamento saindo do ensino médio, passando um
ano em Hartland nesse meio tempo. Claro que tem que mencionar minha
altura, porque a mídia do hóquei está tão obcecada com o quão pequeno
e adorável eles pensam que eu sou. O escritor parece confiante de que
meu nome e habilidade serão suficientes para garantir a escolha
principal em junho, apesar do meu tamanho. O terceiro Mickey James a
ser escolhido primeiro no geral.
Só começo a realmente absorver as palavras quando me deparo com
o nome de Jaysen.
Eles realmente o entrevistaram para isso?
Me mate agora.
Eu não vou deixá-lo tomar aquele lugar sem lutar. Colega de equipe ou
não, vou atrás dele.
— Esse idiota — eu murmuro.
— O quê, tá com medo? — Delilah diz. Ela levanta as mãos em falsa
rendição quando eu a encaro. — Ele está sentado bem ali. Quer que eu
entre na cabeça dele? Deixá-lo fora de forma?
— Não. — Eu quero merecer esse primeiro lugar geral. Eu preciso de
Jaysen no seu melhor quando eu o derrotar. Provar que não cheguei aqui
só pelo meu nome. Prove que eu sou apenas melhor do que ele.
— Eu não entendo como ele está disponível para o draft. — Diz Jade.
Ela toma um pequeno gole de café e volta a mexer. — Ele planeja se
formar, certo? Como alguém pode ser convocado se não estiver
disponível por quatro anos?
Delilah se senta mais reta, pronta para dispensar alguns
conhecimentos de hóquei.
— Seja qual for a equipe que o contratar, manterá seus direitos até
agosto, depois que ele se formar. Ele recebe seu diploma, sua equipe de
draft recebe algum desenvolvimento gratuito, todo mundo ganha.
Jade não parece convencida, mas meu telefone vibra, me distraindo
do resto da conversa. O Twitter oficial da NHL acabou de me marcar em
um post com uma foto anexada. A visualização mostra uma fileira de
mesas cinzas e metade de uma pessoa curvada sobre um notebook. Meu
estômago revira antes mesmo de eu clicar nela, expandindo a imagem
para revelar esta mesma sala de aula. Eu olho para cima, mas a sala está
cheia o suficiente agora que eu não consigo identificar exatamente quem
tirou a foto. Tudo o que vejo são cabeças curvadas sobre telefones
celulares e um livro de matemática que não me dei ao trabalho de
comprar.
Eu observo melhor a foto. Mostra Jaysen olhando para o telefone e eu
no fundo da sala virando uma página da revista com uma carranca no
rosto, Delilah e Jade sorrindo uma para a outra enquanto conversam.
Jesus. As redes sociais são assustadoras.
O post original marcou apenas a conta da NHL, mas quem a
administra adicionou o comentário “quem terá a melhor nota?” com um
emoji de rosto pensativo e marcou Jaysen e eu.
Impossível não ver Delilah com esse cabelo. Eles simplesmente não
se importam com ela. Então eu retuitei e disse “obviamente
@LilahJames23”.
O professor aparece quando as notificações começam a chegar.
Minha contagem de seguidores tem aumentado constantemente desde
que o foco mudou para minha classificação do draft. Eu mal uso a coisa,
mas vou ter que desativar as notificações em breve. Por enquanto,
silencio meu celular e pego o programa de aula que a garota a alguns
assentos de distância passou para mim. Não fazemos chamada. Em vez
disso, o professor dá a volta e faz cada um de nós se apresentar.
Em uma turma deste tamanho, levará quase uma hora inteira.
Todo mundo está falando seu ano, seus cursos, o que eles planejam
fazer com seu diploma. Minhas mãos estão úmidas, meu peito apertado.
O que diabos eu deveria dizer sem me fazer parecer um idiota?
Jaysen está certo. Eu não pertenço aqui. Eu deveria estar em alguma
equipe CHL, não desperdiçando meu tempo e de todos os outros nesta
sala de aula, ocupando espaço neste campus.
Jaysen se vira em seu assento para visualizar mais pessoas quando
ele se levanta, os olhos saltando sobre mim enquanto ele diz:
— Eu sou Jaysen. Calouro de Sociologia. Penso em trabalhar em um
escritório de advocacia algum dia.
Nem uma palavra sobre hóquei. Jaysen Caulfield é feito de coisas
mais importantes.
Agora eu tenho que fazer parecer que eu também sou. Só para tirá-lo
da minha minha cola.
Eu abafo o resto das introduções, me debatendo para chegar em algo
significativo. Qualquer coisa que eu goste que eu possa fazer como uma
carreira. Algo que me deixaria feliz em sair da cama.
Minha mente surge surpreendentemente em branco. Nada me deixa
feliz, na verdade. Sair da cama é uma tarefa árdua.
— Oi! — Delilah diz, toda sonora e alegre, me tirando dos meus
pensamentos. — Eu sou Delilah James. Cursando Gestão Esportiva. Vou
jogar pelo time de hóquei feminino dos EUA nas Olimpíadas no ano que
vem e trabalhar para eles depois que me formar.
Não há nenhuma esperança ou planejamento sobre isso. Ela fala
como se já fosse um fato. Quero dizer, claro que é. Ela é uma James,
afinal.
Então é minha vez. Quarenta e poucos pares de olhos em mim não
são nada comparados aos milhares quando estou no gelo. Mas isso é
muito mais estressante. Falar não faz parte do meu conjunto de
habilidades.
Minha boca está tão seca que minha língua faz esse som grosseiro e
pegajoso enquanto se move.
— Eu sou, uh… — Meus olhos percorrem a sala, procurando por
alguém seguro para focar, então não é como se eu estivesse falando com
todas essas pessoas. Seria estranho se eu olhasse para Delilah bem ao
meu lado. Então é claro que eu foco em Jaysen. Ele me observa através
das pálpebras pesadas, a cabeça inclinada para trás como um desafio.
Eu limpo minha garganta.
— Mickey. Calouro. Bacharelado em Ciências Marinhas.
E isso é tudo que eu tenho. Jaysen levanta uma sobrancelha para que
ela arqueie acima de seus óculos. Eu desvio o olhar.
A sala fica em silêncio por um instante antes de um cara gritar:
— Vai Sens!
Os Ottawa Senators são os favoritos a afundar nesta temporada e
ganhar a loteria do draft para essa cobiçada escolha. Suspiro
pesadamente e mal percebo a forma como o rosto de Jaysen fica azedo
quando ele se vira. Ele também é um candidato favorito, mas ninguém
fez nenhum comentário como esse para ele.
JaysenCaulfield @jaycaul21 • 32m
Respondendo a @NHL
Observe como @mjames17 está atrás de mim, assim como ele estará no dia do draft
TRÊS
SETEMBRO

Passo as primeiras semanas da faculdade sem trancar, mas isso é só


porque não quero lidar com o papai reclamando disso pelos próximos
vinte anos.
Fazemos o levantamento do time pela manhã, seguido do café da
manhã do time na sala dos jogadores. Almoço do time no refeitório após
as aulas da manhã e sofrimento durante as aulas da tarde apenas para
chegar ao treino dos capitães do time e jantar do time e sábados do time
no rinque e sala de estudos do time nas tardes de domingo. Mas mesmo
com toda essa merda do time, ainda não me sinto mais próximo de
nenhum deles.
Bem, talvez do Dorian um pouco, mas isso é só porque eu moro com
ele e ele é pelo menos tolerável. Ainda assim, não é como se eu movesse
um dedo para falar com ele. Há muitos silêncios constrangedores em
nosso quarto à noite.
Os treinos ficam cada vez mais sérios à medida que a temporada se
aproxima, e os capitães nos fazem trabalhar duro, executando os planos
de treino do treinador. Saio do rinque todas as noites sem fôlego e vou
para a sala de musculação todas as manhãs tão dolorido que mal consigo
me mexer.
E eu tenho feito isso toda a minha vida.
Talvez eu devesse ligar para o papai. Perguntar se ele se sentiu fora
de forma neste momento também, ou se eu estou irremediavelmente
despreparado para o hóquei universitário e todos finalmente verão que
não sou digno do meu próprio nome.
Meu corpo inteiro estremece com essa traição da minha mente. Só
me deixe ligar para meu pai e alimentar esse fogo da sua decepção. Certo.
Não é que ele seja um pai terrível. É só que... todo mundo diz que ele
teve cinco outras filhas só para chegar até mim. Sempre tenho medo de
que minhas irmãs fiquem ressentidas comigo por isso. Depois, há o fato
de que Delilah é uma jogadora de hóquei melhor do que eu, mas papai se
recusa a admitir.
Com nós dois jogando no mesmo nível nesta temporada, ninguém
poderá negar isso.
A energia no vestiário é completamente diferente antes do primeiro
treino oficial no final do mês. Os caras estão bem quietos enquanto nos
vestimos, essa alegria nervosa irradiando de todos. Não importa o
quanto trabalhamos duro nos treinos dos capitães, o quanto levamos
Zero e Kovy a sério, não é o mesmo que responder ao treinador que
determinará seu tempo no gelo.
Temos alguns minutos para nos aquecer e nos esticar no gelo antes
do treinador Campbell apitar e gritar:
— Na linha.
Há um sentimento coletivo de ugh, aqui vamos nós enquanto nos
aproximamos da linha de gol e outro apito nos manda correndo para as
linhas e de volta. Eu tenho uma desvantagem distinta com minhas pernas
mais curtas. Eu posso ser rápido no jogo, usando meu tamanho para me
esquivar de caras maiores e saltar sobre eles, mas quando se trata de um
sprint normal, é mais difícil para mim acompanhar.
É uma falha que os olheiros da NHL vão, sem dúvida, agonizar sobre
quando começarem a ficar procurando picuinhas entre Jaysen e eu. Não
vou deixar que ele me domine aqui. Eu me esforço até o ponto de
colapso, o gosto de ferro no fundo da minha garganta, mas ainda acabo
alguns passos atrás dele. Nós dois ofegamos por ar, curvados com nossos
tacos sobre nossas coxas, mas quando ele olha para cima e me pega
olhando para ele, ele parece tão satisfeito consigo mesmo que eu poderia
bater nele.
Nosso goleiro titular, Colie, está em outro nível quando passamos
para os treinos de arremesso. Ele foi muito bom durante os treinos dos
capitães, mas sob o escrutínio de seu treinador de goleiros medalhistas
de ouro olímpico, ele se superou. Seus reflexos são tão rápidos que chega
a ser assustador, e ele faz parecer tão fácil que estou meio tentado a
colocar as proteções e tentar eu mesmo. Estou tão impressionado que
nem consigo ficar frustrado quando ele bloqueia a maioria dos meus
arremessos.
Me ajuda que Jaysen não está tendo melhor sorte. Os veteranos estão
jogando com Colie há tempo suficiente para conhecer suas fraquezas e
serem capazes de explorá-las um pouco antes que ele os domine
também.
Depois disso, passamos para três contra dois, com o treinador
Campbell gritando o feedback em tempo real, como:
— Cicero, mantenha a cabeça erguida!
— Caulfield, mais pressão no disco ao longo das barreiras!
E:
— James, você tinha uma linha! Faça o one-timer da próxima vez!
Eu bufo, longe o suficiente para ele não poder me ouvir. Eu posso
fazer one-timers o dia todo, mas eu estava no ponto para isso, e eu nunca
estive confiante na minha tacada. Especialmente não em um disco em
movimento. Prefiro gastar um tempo para arrumá-lo do que arriscar
acertá-lo mal e fazer papel de bobo.
Temos mais uma boa uma hora e meia de tempo no gelo antes que o
treinador termine. Enquanto saímos do gelo, o treinador diz:
— Cicero, Caulfield, James. Esperem um minuto.
— Oh cara — Zero diz, me cutucando com um cotovelo. — Vocês dois
tentem não deixar seus egos muito próximos. Não precisamos de
nenhuma concussão.
Jaysen solta um tch, e eu me sinto franzindo a testa. Eu fui capaz de
evitá-lo durante a maior parte do treino, mas quando eu me ergo sobre
as barreiras, meus pés balançando sobre o gelo, ele para bem ao meu
lado. Ele se inclina contra as barreiras com os cotovelos levantados sobre
elas, quase me tocando. Zero está direto à minha direita, segurando o
taco sobre seus ombros para abrir seus pulmões.
O treinador para na nossa frente, folheando algumas anotações que
ele fez em uma prancheta. Ele tem a idade do meu pai, foi convocado no
mesmo ano, mas não foi nem de longe tão no topo quanto ele. Eu acho
que ele foi na quarta rodada ou algo assim. Ele não durou muito na NHL,
mas fez seu nome como treinador. Papai está feliz com ele, pelo menos,
ou ele estaria mais preocupado comigo vindo aqui, sendo uma
universidade de tradição ou não.
Minha coisa favorita é que o treinador não me mima por causa do
meu nome. Ele compartilhou o gelo com muitas estrelas, incluindo papai,
então ele não se intimidou com isso. Para ele, sou apenas mais um de
seus jogadores insolentes que basicamente precisa ser re-ensinado a
jogar hóquei do zero.
Eu gosto dele. Ele me faz sentir que mereço estar aqui, não importa o
que Jaysen Caulfield diga.
Mas então o treinador vai e diz:
— Quero vocês três em uma linha juntos.
E todo o meu respeito por ele vai pela janela. Antes que eu possa
expressar minhas preocupações, ele acrescenta:
— Cicero, ala esquerda, Caulfield, centro, James, ala direita.
Certo, espere um minuto, o quê? Eu não ouvi direito. Jogo no centro
desde que aprendi que nem todo mundo deve perseguir o disco ao
mesmo tempo. Eu sou o central. Eu sou o melhor no confronto da NCAA.
Eu tenho o melhor senso de hóquei de qualquer um neste time. Meu
nome também poderia estar escrito no gelo no slot e atrás da rede, isso é
o quanto eu possuo esses espaços. O centro é meu.
— Você quer dizer… — eu começo, mas o treinador me lança um
olhar como adagas e eu fecho minha boca.
— Caulfield é mais forte no backcheck — diz ele. — Preciso de
alguém com tamanho e uma boa mentalidade defensiva centralizando
minha linha superior. James, você estará em uma posição melhor para
sair na ala, que é algo em que você é especialmente bom. Você ainda
pode ter seu lugar no slot. Cicero, você sabe o que está fazendo.
— E os confrontos? — Eu pergunto. Eu nem me importo que eu
pareça um pirralho agora; ele não pode simplesmente me tirar a posição
que eu tenho jogado toda a minha vida e entregá-la a Jaysen. Ele pode
muito bem estar entregando a ele a primeira escolha no draft enquanto
ele está nisso.
— Vamos ver — diz o treinador. Ele me dá um olhar como se
estivesse me desafiando a continuar desafiando-o. Eu mordo minha
língua.
O treinador continua nos dando nossos papéis em jogadas de poder e
2
penalidades, e eu estou na segunda unidade PK , tipo, que desgraça? Eu
torço meu aperto em volta do meu bastão e me recuso a olhar o
treinador nos olhos. Eu praticamente posso sentir a presunção
irradiando de Jaysen.
Preciso de alguém com tamanho, disse ele, como se os times não
confiassem em mim apesar do meu tamanho a vida inteira. Como se eu
não fosse a principal possibilidade da NHL com 1,75m. Isso é inédito,
mas aqui ele está agindo como se soubesse mais do que o NHL Central
Scouting.
Isso me consome pelo resto do dia e até o seguinte. O que dá ao
treinador Campbell o direito de decidir onde eu jogo, como eu jogo? Ele
nem chegou a cinco temporadas na NHL. Sua equipe nada mais é do que
um trampolim para mim.
Agora eu sei o que as pessoas querem dizer quando dizem que seu
sangue está fervendo. Podemos muito bem estar fazendo exercícios no
treino do dia seguinte, mas meu rosto queima e o suor pinica minha
testa. A raiva passa por mim em ondas. Eu nunca estive tão bravo na
minha vida.
Mantenho o máximo de gelo possível entre mim e Jaysen, mas ele
está determinado a tornar minha vida um inferno. São provavelmente
vinte minutos de treino quando ele me empurra entre os treinos e bate
no meu patins com o taco.
— Pergunta séria — diz ele. — Quão longo é o seu taco? Trinta e oito,
certo?
— Sim — eu digo inexpressivo. Certo. Claro que eu uso um taco do
tamanho para crianças. Se eu jogar junto, ele vai ficar entediado e me
deixar em paz. É assim que funciona, certo?
Exceto que ele sorri. Inclina-se para trás para que seu peso fique em
um pé, todo casual e arrogante.
— Estou pensando em encurtar um pouco o meu. — Ele inclina a
cabeça e olha para mim do canto de seu olho, seu sorriso se tornando
perverso. — Pode me ajudar no centro.
O ódio surge em meu peito, um lampejo de calor que me faz ver
vermelho. Eu ataco antes que eu pudesse pensar melhor, o estalo
satisfatório do taco de Jaysen quebrando sob o meu é quase o suficiente
para me acalmar. Ele queria encurtar, bem, agora está encurtado.
Ele olha boquiaberto para a haste quebrada em suas mãos, a outra
metade no gelo a seus pés. Alguém está gritando: “Ei, ei, ei!” enquanto a
equipe se aproxima de nós, mas tudo o que vejo é Jaysen. Ele lentamente
levanta os olhos para mim. Seu lábio se curva um segundo antes de ele
jogar o que sobrou de seu taco e me empurrar com tanta força contra as
placas que minha respiração sai ofegante. Suas mãos torcem na minha
camisa e me prendem contra o vidro. Estico a mão, com o coração
disparado, e o agarro pela grade, puxando-o com força suficiente para
quebrar seu pescoço.
— Seu merdinha — ele rosna.
— Vai se foder! — Eu estalo.
Alguém tenta puxá-lo de cima de mim, mas nós dois apertamos
nossos braços, nem mesmo brigando, apenas nos empurrando e puxando
e enfurecidos e nos detestando até os braços passarem sob suas axilas e
puxá-lo de volta, nós dois segurando até não podermos mais. Os caras
preenchem o espaço entre nós, nos segurando, nos forçando a olhar à
distância.
Eu sei que Jaysen me odeia. Ele deixou perfeitamente claro desde o
momento em que nos conhecemos. Mas eu nunca vi isso assim, escrito
tão obviamente em seu rosto. Os tendões em seu pescoço saltando, seu
corpo inteiro se esticando como se ele estivesse pronto para atacar assim
que alguém lhe der alguma folga.
Há um flash de algo quente e perigoso no meu peito. Sinto meus
olhos se arregalarem, meu coração titubear.
Jaysen faz com que ficar violentamente irritado pareça bom.
Eu afasto o pensamento enquanto Zero empurra a equipe e fica entre
nós, com o rosto vermelho e furioso.
— Qual a porra do problema? — ele grita para nós dois. Nenhum de
nós responde. — Esqueceram que estão em uma equipe agora?
Ele olha para frente e para trás como se estivesse esperando que um
de nós fale apenas para que ele possa nos interromper e gritar um pouco
mais. Ele seria um bom treinador. Olho para além da multidão de meus
companheiros de equipe para ver a verdadeira equipe técnica reunida no
centro de gelo, os braços cruzados enquanto observam seu capitão lidar
com isso.
Jaysen deixa cair o escárnio, mas mantém os olhos apertados e
focados em mim.
Zero zomba com desgosto.
— Eu não posso acreditar que eu tenho que compartilhar uma linha
com uma dupla de crianças. Saiam do meu gelo.
Há um momento de silêncio inquietante, uma falta de som
totalmente fora de lugar em uma arena desse tamanho. Jaysen continua
me olhando com uma intensidade assassina. Faço tudo ao meu alcance
para retornar com apatia. Tenho mais satisfação em vê-lo se afastar
primeiro do que em qualquer outra coisa.
Ele encolhe os braços e agarra as metades quebradas de seu taco. Eu
o deixei dar alguns passos à minha frente antes de seguir, mantendo
meus olhos baixos enquanto passamos pelos treinadores. Eles nos
deixaram ir sem uma palavra, aparentemente confiando no julgamento
de Zero. Ficamos de costas um para o outro enquanto tiramos nosso
equipamento no vestiário.
O som dele perdendo aquela arrogância suave e silenciosa e jogando
seu equipamento em sua baia é a coisa mais reconfortante que eu já ouvi.
NOVA VINTER

Mickey: Você já odiou tanto alguém que quer sufocá-lo com sua própria língua
Nova: Você não se lembra da oitava série?
Mickey: ponto justo
Nova: Quem ganhou seu desejo de ódio desta vez
Mickey: Você age como se fosse uma coisa comum
Nova: Você odeia todo mundo mj
Então é uma coisa de cada vez
Mickey: Tanto faz
Apenas prometa não rir
Nova: Ah, isso vai ser bom
Mickey: Já me arrependo
Jaysen Caulfield
Nova: De jeito nenhum
KKKKKKKKKKKKK
Mickey: Eu te odeio.
Nova: Eu sei
Precisamos falar sobre a oitava série novamente?
Nunca pensei que veria o dia em que você se apaixonasse por um jogador de hóquei
Mickey: Eu não me apaixonei por ele
Ele é apenas gostoso
E irritante
Nova: Certo
Posso oficializar o casamento?
Mickey: Ok tchau falo com você, hum, nunca
QUATRO
Mesmo com fones de ouvido em meus ouvidos e minhas três irmãs mais
velhas falando umas com as outras na tela do meu laptop, ainda ouço a
batida de música pesada vindo de todas as direções. Do outro lado da
sala, Dorian está com seus próprios fones de ouvido, a cabeça balançando
levemente junto com qualquer bagunça gritante que ele está ouvindo
enquanto faz o dever de casa.
Minhas irmãs mais velhas são muito mais velhas e não conversamos
muito, mas ainda somos muito próximos graças aos grupos de bate-papo
e ao Snapchat. Mikayla é a mais velha, com trinta anos, nascida quando
mamãe e papai ainda eram adolescentes, menos de um ano depois de se
conhecerem no hospital nas Olimpíadas, quando mamãe torceu o
tornozelo no treinamento e papai levou um disco no rosto em um jogo
contra a Finlândia. Agora Mikayla é diretora de informação esportiva em
uma universidade no Arizona, noiva de Spencer Brimm, do Arizona
Coyotes, com um bebê a caminho. Sua vida é repugnantemente montada.
Nicolette e Madison tem vinte e oito, gêmeas idênticas que eu
provavelmente não conseguiria distinguir se não fosse por seus cortes de
cabelo, é o quão pouco eu as vejo. Nicolette mantém o dela longo e
trançado, sempre parecendo que ela está pronta para entrar no gelo
olímpico novamente. Madison tem o dela cortado no queixo. Ela foi para
a escola para ensinar, conseguiu um emprego logo após a faculdade e
treinou o time de hóquei em campo de sua escola para três campeonatos
estaduais desde então.
Estou constantemente impressionado e espantado com o quão
incríveis todas as minhas irmãs são em todas as coisas que fazem. A lista
de seus sucessos é interminável. Mas ninguém parece se importar com
eles. Porque são mulheres. Porque mulheres arrasando em seus esportes
significam menos para as pessoas do que um garoto de dezessete anos
que não é bom o suficiente e com nada para mostrar para si mesmo além
de um nome.
Às vezes. A maior parte do tempo. Eu realmente me odeio.
Eu seguro meus joelhos para esconder minha carranca deles. Agora
não é hora de entrar em um dos meus humores. Tenho planos esta noite,
e não vou deixar meu cérebro estragar minha diversão.
Na tela do meu laptop, Nicolette está comendo pizza e bebendo vinho
em seu apartamento em Colorado Springs. Madison está enrolada na
cama na casa de mamãe e papai com um cobertor puxado até o queixo, e
Mikayla está em seu escritório na universidade.
— Se você tivesse um emprego de verdade, você entenderia a luta,
Cole — murmura Mikayla. Seus olhos estão fixos em seu computador de
trabalho, os dedos voando sobre o teclado. O bocejo estridente de
Madison soa como um acordo. — O principal esporte desta escola é o
vôlei, e estou deixando meu departamento de atletismo nas mãos de um
cara que nem sabe o que é um líbero. Por seis semanas! Estou pensando
seriamente em dar à luz em meu escritório.
— E é exatamente por isso que nunca terei um emprego de verdade.
— Nicolette levanta sua taça de vinho em um brinde consigo mesma
antes engolindo um bocado. Ela ainda tem glitter nas pálpebras do dia no
rinque. — Olha isso, o que é, nove na costa leste? E Mad está meio
adormecida? É sexta à noite, cara, foda-se o trabalho de verdade.
— E você está bebendo vinho sozinha — diz Madison, a voz tão doce
e suave como sempre. — Nenhum de nós é vencedor aqui.
— Estou escolhendo beber vinho sozinha — insiste Nicolette. — Eu
tinha opções. Esta foi a mais atraente.
— E você, Mickey? — pergunta Mikayla. — Você não deveria estar
em uma festa com Bailey e Lilah?
— Estou esperando que elas cheguem aqui para que possamos ir
juntos — eu digo.
— É isso que você vai vestir? — Nicolette se inclina mais perto de
sua tela, apertando os olhos para mim com uma ligeira curva em seu
lábio.
Eu olho para minha camiseta cinza simples e jeans.
— O que há de errado com o que estou vestindo?
— Sem graça — diz Nicolette, desenhando as vogais. — Como você
vai arranjar universitárias assim?
— Nicolette — Madison a repreende.
— Eu não estou tentando arranjar ninguém — eu digo.
— Ah, certo. — Nicolette revira os olhos. — Hóquei acima de tudo.
Sem distrações.
Há uma batida na porta, alta e afiada. Antes que Dorian ou eu
possamos nos levantar para atender, a porta se abre e minhas outras
irmãs, Bailey e Delilah, entram como se fossem donas do lugar, Jade
seguindo atrás delas. As bochechas de Bailey estão vermelhas e seu
cabelo é um desastre. Ela tem bebido muito. O cheiro de álcool flutua
atrás dela quando ela dá uma olhada em mim e vai direto para o meu
armário sem dizer uma palavra, tirando as camisas e jogando-as no chão.
Eu não a vi muito na escola até agora. Ela é uma veterana de tese com
dois namorados – Sidney e Karim – que passaram o verão na Europa com
o Lacrosse dos EUA, então ela está ocupada conversando com eles
quando não está trabalhando. Mas eu estive em Buffalo com ela por
algumas semanas durante o verão, ajudando-a a organizar um
acampamento de lacrosse para jovens, então eu a vi mais do que
qualquer uma das minhas outras irmãs recentemente.
Delilah e Jade se amontoam na minha cama de cada lado meu, e
Delilah desconecta meus fones de ouvido quando vê com quem estou
falando. Eu entrego o computador para ela e saio da cama para
monitorar a bagunça que Bailey está fazendo no meu armário. Ela puxa
uma camisa de flanela preta e vermelha do cabide e a veste por cima da
regata preta, depois enfia de volta. Ela é minha única irmã mais baixa do
que eu, então as mangas da minha camisa ficam penduradas na ponta
dos dedos.
— O que você está fazendo? — Eu pergunto por cima do ombro dela.
Atrás de mim, parece que Jade e Dorian estão falando sobre os
pôsteres da banda na parede dele, e Delilah está reclamando de um de
seus professores para Mikayla, que tinha o mesmo curso que ela.
— Encontrando algo para você vestir que não faça você parecer um
desleixado — diz Bailey. Depois de tanto procurar e jogar roupas por
todo o meu quarto, ela finalmente escolhe uma camiseta branca simples
com decote em V. Seriamente. Como isso é melhor do que o que eu uso?
Ela o enfia em meus braços antes de abrir as gavetas da cômoda até
encontrar meu jeans.
— Nós devemos ficar em casa esta noite — Dorian diz hesitante,
como se estivesse com medo de entrar no lado ruim delas.
3
— Apenas diga a Zero que o levamos para a casa dos lax . — Delilah
ri e Jade lhe dá uma cotovelada nas costelas como se ela soubesse tudo
sobre a rivalidade hóquei-lacrosse. Delilah nem vacila, apenas coloca um
braço sobre os ombros. — Ele vai adorar isso.
— Ou não — eu murmuro. Bailey joga meu jeans preto mais
apertado em mim e faz um gesto para eu me trocar antes de cair no colo
de Delilah e Jade para participar do bate-papo por vídeo.
Sinto falta de estarmos todos juntos no mesmo quarto. É uma coisa
tão rara, até mesmo ser capaz de ouvir todas as vozes ao mesmo tempo
faz meu coração apertar.
Eu visto a roupa nova mais um moletom com capuz para a
caminhada, e Bailey rola para fora da cama para pentear as mãos pelo
meu cabelo até que ele atenda aos seus padrões de embriaguez. Ela e
Delilah mandam beijos para nossas irmãs mais velhas enquanto Jade
acena, e dou a Dorian um breve olhar antes de dizer: — Amo vocês, tchau
— fechando o laptop e saindo correndo da sala.
Eu sei que vou ouvir sobre essa demonstração de humanidade mais
tarde.

CAMINHAMOS dois quilômetros até a casa de lacrosse masculina fora do


campus, o braço de Bailey ligado ao meu enquanto Delilah dá a Jade uma
carona nas costas durante todo o caminho.
— Os esportes são realmente bons para alguma coisa! — Jade
aplaude, erguendo um punho sobre a cabeça.
Eu não posso deixar de sorrir para elas. Mesmo com a falta de
experiência esportiva de Jade, elas são tão ridiculamente perfeitas uma
para a outra que me dá vontade de vomitar.
— Como você vai sobreviver à noite cercada por atletas? — Bailey
pergunta. Ela encosta a cabeça no meu ombro e mesmo que suas pernas
e palavras estejam firmes agora, ela estará se esforçando para ficar de pé
com outra bebida ou duas.
— Estou namorando uma James — Jade diz. — Eu tenho que
sobreviver uma vida inteira cercada por vocês, amantes do esporte. —
Nenhum de nós pode argumentar com isso.
Assim que chegamos à entrada da casa lax, há o som de música
abafada e gritos. O cheiro de maconha fica mais forte à medida que nos
aproximamos, até encontrarmos seis pessoas debruçadas sobre a grade
da varanda dos fundos, passando uma caneta vape de um lado para o
outro. Alguns deles olham por cima dos ombros para o ranger de nossos
passos na madeira frágil. Um deles chama o nome de Bailey, longo e
lento.
— Guarde um pouco para mim — diz ela pouco antes de entrarmos
em casa.
Entramos em uma massa de corpos, pessoas gritando e rindo em
todos os cômodos, o cheiro de bebida quase insuportável. O baixo faz o ar
vibrar ao nosso redor, a música é tão alta. Uma das lâmpadas está
apagada, dando à sala de estar uma sensação de um clube sombrio e com
pouca luz.
A casa inteira está lotada com as equipes de lacrosse masculina e
feminina e alguns de seus amigos. Delilah e Jade abrem caminho em
direção à cozinha, mas Bailey fica comigo, me apresentando a suas
companheiras de equipe e os caras. Eu conheci alguns deles pelo campus,
e eles me dão tapas nas costas e me oferecem bebidas. Eles têm minha
irmã em um pedestal como capitã do time feminino e duas vezes
vencedora do Prêmio Tewaaraton, então fãs de hóquei ou não, eu não
sou nada mais do que o irmão de Bailey para eles.
Eu tenho essa sensação leve no meu peito. Uma rara felicidade que
vem de ver uma de minhas irmãs receber o respeito e o reconhecimento
que ela merece.
Depois de algumas horas, eu acabo espremido entre Delilah e Jade
em um sofá que afunda tanto que podemos muito bem estar no chão.
Cheira como se tivesse sido embebido em álcool e esfregado pelo menos
uma dúzia de vezes ao longo dos anos. Eu corro um dedo ao longo da
borda de uma lata de cerveja fechada enquanto um dos namorados da
minha irmã, Sidney, se inclina para frente para espalhar um baralho de
cartas virado para baixo em torno de um copo de colecionador dos
Panteras Negras, explicando as regras da casa da Copa do Rei. Bailey e
Karim sussurram um para o outro pelas costas dele, todos sorrisos e
olhos de coração. Os três estão espremidos no sofá na frente de nós, e um
monte de outras pessoas estão no chão ao redor da mesa, alguns
sortudos pegando uma poltrona para si. Isso não é nem metade das
pessoas nesta festa.
Mas mesmo com essa multidão, não consigo parar de olhar para
Bailey, Sid e Karim. Eles estão juntos desde o primeiro ano e ainda estão
fortes. Não Bailey e Sidney ou Bailey e Karim. Bailey, Sidney e Karim. Sid e
Karim mostram tanto carinho um ao outro quanto fazem com Bailey.
É tão natural e fácil com eles, e essa é a razão pela qual eles são os
únicos com quem me abri além de Nova. Nem Delilah sabe que sou bi.
4
Sid e Karim tiveram sorte com os Royals. A cultura Lax Bro e do
hóquei são notoriamente homofóbicas, mas todo o departamento de
5
atletismo de Hartland é super ativo em seu apoio ao You Can Play e
estabelece uma política de tolerância zero para qualquer tipo de
intolerância. Quase me faz sentir como se eu pudesse ser transparente
sobre mim mesmo um dia.
Exceto quando a mídia do hóquei ficou sabendo do relacionamento
poliamoroso de Bailey, foi o máximo que eles já falaram sobre ela. Tudo o
que ela fez no campo de lacrosse, todos os seus prêmios e campeonatos
não significaram nada. Era apenas uma questão de tempo até que Delilah
também saísse do armário. Ela recebeu uma única frase em um artigo
sobre hóquei universitário quando liderou a NCAA em pontos na
temporada passada, mas quando descobriram que ela é lésbica, de
repente as pessoas sabiam quem ela era. Bailey e Delilah, os escândalos
da família James... por enquanto.
Quando papai correu para defendê-las, foi o mais próximo que eu já
senti dele.
Abro minha cerveja e tomo um gole. Então eu abaixo minha cabeça e
vejo Karim se inclinar para frente para sussurrar no ouvido de Sid
enquanto Delilah e Jade trocam flertes de um lado para o outro sobre
minha cabeça, e pegam outro.
Eu juro que não estou com ciúmes. Eu praticamente tenho uma
namorada. Mais ou menos. Quero dizer, Nova e eu prometemos nos casar
se ainda estivermos solteiros aos trinta. Isso nunca vai acontecer, com
Nova sendo uma supermodelo com celebridades enviando rosas e
levando-a para jantar em diferentes países toda semana. Mas ela é minha
pessoa favorita no mundo. Eu não a mereço e teria muita sorte em tê-la.
Pego meu telefone e envio a Nova uma foto da mesa coberta de
cartas viradas para baixo e latas de cerveja enquanto uma das colegas de
equipe de Bailey, Marcie, vira um oito.
— Parceiro — diz ela, e imediatamente olha para mim. — Mickey
James.
Todos na sala têm algo a dizer sobre isso. Eu apenas levanto minha
bebida e alcanço a mesa para um brinde com minha nova parceira.
Marcie é uma atacante do segundo ano que ganhou o prêmio de caloura
do ano no ano passado e provavelmente assumirá a capitania de Bailey
quando ela se formar. Ela é uma ótima jogadora de lacrosse e tem
covinhas quando sorri para mim.
Viu? Não preciso ficar com ciúmes.

ESTAR PARADO logo no início do King's é uma maneira infalível de ficar


super bêbado super rápido. Karim estabelece uma regra de que todos
devem manter uma tampinha na cabeça durante o jogo, o que Marcie
continua falhando quando inclina a cabeça para mim ou ri muito. Então
Sid faz outra regra em que temos que dizer hashtag na frente de tudo o
que dizemos, o que eu simplesmente não quero fazer, então nós dois
estamos continuamente bebendo nossas bebidas. Marcie acaba no sofá
ao meu lado em algum momento, provavelmente na hora em que Jade
sobe no colo de Delilah. Ela está com o braço sobre meu ombro e sua
cabeça inclinada contra a minha.
Eu me viro para dizer algo a ela, aproximando nossos rostos o
suficiente para respirarmos o ar um do outro.
É quando a porta dos fundos se abre e Zero grita do outro quarto:
— Atenção, lax bros e brahs!
Zero. Como Lucas Cícero. Tipo meu capitão.
— Vocês tem algo que pertence ao time de hóquei masculino — diz
Zero. — Por favor, devolvam.
— Alguém me mata — murmuro enquanto o barulho de passos
encontra seu caminho para dentro. Zero e Kovy estão no arco, me vendo
com uma garota praticamente no meu colo. Eles parecem opostos totais,
com Zero em sua estampa floral padrão, desta vez com um botão aberto
e a aba de seu snapback, e Kovy em sua polo azul e calça chino cinza.
— Vamos. — Zero estala os dedos para mim como se eu fosse um
cachorro. — Andiamo. Você confraternizou com o inimigo por tempo
suficiente.
Eu olho para ele. Eu deveria dizer a ele que não, ficar bem aqui onde
estou.
Mas não posso me esconder da equipe para sempre. Depois do que
aconteceu no treino de hoje, seria melhor enfrentar o drama agora do
que deixá-lo ferver até o início da temporada.
Eu me empurro para fora do sofá e me preparo por um segundo
quando a adrenalina das minhas bebidas finalmente me atinge. Meu
corpo inteiro vibra enquanto caminho em direção aos meus capitães.
Eles sorriem para mim como se tivessem realizado alguma façanha
impossível e me levam para fora, longe de minhas irmãs, longe de Marcie,
longe de uma noite que eu estava realmente curtindo.
Kovy empurra uma garrafa de água para mim na varanda dos fundos.
— Fique sóbrio, Majestade. Você tem uma longa noite pela frente.
Eu pego a garrafa. Meu estômago está revirando e minha língua tem
gosto de vômito de uísque. Pelo menos estou andando em linha reta. Eu
acho.
— Você está me zoando? — Eu pergunto quando começamos a
descer a colina de volta para a estrada principal.
Zero parece horrorizado com isso.
— Você acha que correremos o risco de sermos suspensos com um
time tão bom? Fizemos Frozen Four três temporadas seguidas. Esta é
minha última chance de um campeonato, e não vou jogar fora por causa
de algum escândalo de trote.
— Nós não fazemos trote. Nós nos unimos — acrescenta Kovy. — E
você perdeu toda a nossa união de equipe.
— Eu não sou social — eu digo.
Kovy dá esse tipo de risada perplexa, curta e aguda.
— É por isso que acabamos de tirar você da casa lax. Onde Marcie
estava literalmente em cima de você.
Eu reviro os olhos.
— Que seja.
Zero fecha os olhos e balança a cabeça enquanto passamos sob um
poste de luz.
— Olha. Temos muito talento nesta equipe. Mas isso não importa se
um dos nossos melhores jogadores não estiver a bordo com o resto de
nós. É por causa da merda com o apelido de realeza? Se isso te deixa tão
desconfortável, vamos parar.
— Não é isso — eu digo rapidamente. Sua gentileza me faz sentir, sei
lá, culpado, eu acho?
— Então, o que é? Não podemos consertar se você não nos contar.
Eu chuto uma pedra morro abaixo. Há uma vista perfeita do lago a
partir daqui. Inferno, há uma visão perfeita do lago da maioria dos
lugares dentro e ao redor do campus. Parte de mim gostaria de poder
ficar aqui e me formar, só para poder continuar vendo isso todos os dias.
— Cauler? — Kovy pergunta de um jeito que diz que eles sabem, eles
só estavam esperando que eu dissesse.
— Não — eu digo com firmeza. De jeito nenhum vou admitir que o
antagonismo de Jaysen me atinge. — Não é algo que vocês possam
controlar. Apenas é. Às vezes eu preciso de uma pausa no hóquei. Não
consigo ficar com jogadores de hóquei o tempo todo.
Parece a coisa errada a dizer. É por isso que geralmente não falo.
Nada do que eu digo está certo.
Zero zumbe.
— Vou lhe contar um pequeno segredo, Mickey. Somos mais do que
apenas jogadores de hóquei. Também sou estudante de psicologia e
bombeiro voluntário no verão. Maverick aqui? Ele escreve fanfiction de
Dragon Age…
— Cara! — diz Kovy.
—… e já tem um trabalho alinhado com um desenvolvedor de jogos
após a formatura. E muitos de nós também são grandes nerds que jogam
D&D uma vez por mês.
— Sou um bárbaro mestiço — Kovy diz, erguendo o queixo com
orgulho.
— Se você passasse algum tempo conosco, você saberia de tudo isso.
Porque dificilmente falamos de hóquei fora do treino. Também
precisamos de pausas.
Kovy suga o ar entre os dentes com uma careta exagerada.
— Sim, sobre isso. Esta noite pode ser um pouco centrada no hóquei.
Só porque temos algumas coisas para resolver.
— Ótimo — eu murmuro.
A casa de hóquei fica à direita no lago. Tão perto que posso ouvir a
água contra a costa enquanto passamos pela porta da frente. É mais
bonita do que a casa lax, com uma entrada de verdade e um arco que se
abre para uma sala de estar com um grande seccional e uma daquelas
TVs curvas. O chão parece madeira, mas parece mais plástico quando tiro
os sapatos. Há tantos tênis empilhados na porta que duvido que consiga
encontrar o meu quando sair.
Zero e Kovy vão direto para as escadas, mas eu sigo atrás,
observando o lugar. Eu pego um vislumbre de uma cozinha limpa,
armários brancos e aço inoxidável, bancadas de granito e portas de vidro
deslizantes para uma varanda sobre a água.
Se eu ficasse aqui mais alguns anos, eu moraria nesta casa. Um dos
quartos que passamos no segundo andar seria o meu.
Eu me pergunto como a mídia do hóquei reagiria a isso. Se na
reunião do draft eu disser a cada time que me entrevistar que vou ficar
na escola por mais três anos. Tudo porque eu fiquei bêbado uma noite e
decidi que o campus era bonito demais e meus capitães agradáveis
demais para me afastar.
Isto é que é um escândalo da família James.
Parece que as pessoas estão lutando acima de nossas cabeças, e meu
coração faz esse tipo de palpitação ansiosa quando Kovy abre a porta do
sótão, como se eu estivesse prestes a me deparar com uma sala cheia de
estranhos. Colie está gargalhando lá em cima. Já ouvi o suficiente no
treino para distingui-lo de todas as outras risadas que desciam as
escadas.
Metade do tapete do sótão está pintado como um rinque. Eles estão
jogando um jogo de hóquei de joelho três contra três. Meus joelhos doem
só de lembrar de brincar com minhas irmãs no chão de concreto do
nosso porão quando crianças. Eu me pergunto se mamãe e papai ainda
têm a coleção de minibastões que construímos ao longo dos anos.
A equipe está amontoada em sofás do outro lado da sala, torcendo e
gritando enquanto assistem. Os calouros estão todos embalados no
menor. A cabeça de Jaysen está jogada para trás, rindo tanto que ele está
com as mãos presas na própria camisa.
Pelo amor de Deus, por favor, me mate agora.
Há caixas de cerveja empilhadas no chão e algumas garrafas meio
vazias de vodka espalhadas.
Dorian é o primeiro a nos notar. Ele levanta o punho no ar e grita:
— Sua Majestade chegou!
Meu rosto fica quente quando todos olham para mim e começam a
aplaudir. Não ajuda quando vejo as covinhas de Jaysen antes que seu
sorriso desapareça ao me ver.
— Coloque-o no rinque! — alguém grita. O jogo de hóquei de joelho
parou com nossa interrupção. Alguns dos caras que estavam jogando
deitam sem fôlego no chão enquanto o resto deles vai para o álcool. —
Ele está acostumado a ficar tão perto do chão!
Todos eles riem novamente. Eu reviro os olhos. Zero empurra meu
ombro e diz:
— Junte-se ao resto dos novatos no sofá de merda, se isso agradar a
Sua Majestade.
Jaysen mantém seus olhos em mim enquanto eu faço o meu caminho,
uma pitada daquela raiva ardente de mais cedo faiscando neles enquanto
eu tento manter minha expressão em branco. Meus olhos estão muito
arregalados e minha boca está seca, meu coração ainda faz aquela coisa
de borboleta doente como uma criança de dez anos enfrentando sua
primeira paixão de verdade.
Eu culpo o álcool.
Sento-me no braço do sofá e tento não parecer muito surpreso
quando Dorian se inclina e me dá um soco no ombro.
— Que bom que você apareceu, mano — diz ele com seu nível padrão
de excitação.
— Claro — eu digo. Como se eu tivesse uma escolha.
Zero bate palmas para chamar a atenção de todos, mas leva um
minuto ou dois para que as gargalhadas e risadinhas desapareçam.
— Aqui está o acordo. A temporada nem começou e já estamos com
um começo difícil. Vamos participar da NCAA este ano, mas apenas se
aprendermos a operar como uma unidade coesa. Há rivalidades e
panelinhas e atitudes de merda por todo o time, e temos que superar
isso. Então vamos jogar um joguinho, tirar um pouco dessa tensão.
Maverick, você gostaria de demonstrar?
Kovy abre um sorriso enorme.
— É claro. Colie? Gostaria de se juntar a mim?
Colie fica de pé cambaleando e quase tropeça em alguns dos caras
em sua pressa para chegar a Kovy. Eles se encaram, segurando as mãos
um do outro no espaço entre eles. Algum dos caras uivam e assobiam
para eles, e Colie pisca seus cílios para Kovy para brincar.
Zero está sorrindo o tempo todo em que ele explica as regras.
— Este jogo é sobre honestidade. Colocar seus problemas à tona,
ouvir o que os outros têm a dizer.
Ugh, Deus. Eu já posso ouvi-lo dizer.
Você nunca sorri.
Você acha que é melhor do que nós.
Seu pai era um jogador de hóquei melhor do que você.
Não preciso ouvir tudo de novo.
— Para cada negativo — Zero continua —, você tem que dizer algo
positivo para equilibrar. Quando alguém diz algo sobre você, você não
pode argumentar. Você aceita e segue em frente. Rapazes? — Ele
gesticula para Kovy e Colie começarem.
Kovy ajusta seu aperto nas mãos de Colie e estufa o peito.
— Colie, quando você se debate pensando que se parece com
Dominik Hasek, na verdade você parece um linguado em agonia.
— Claro — Colie diz sem hesitar, mesmo que não seja verdade. — Às
vezes, seu hálito matinal é tão atroz que me faz sonhar em afogar você
em antisséptico bucal.
— Não duvido. Essa nova pintura em que você está trabalhando para
o seu portfólio é excelente, mano. Eu iria a um museu de arte para vê-la.
Eu nem sabia que Colie estava em uma aula de arte. Ele está se
especializando nisso? Vou ter que perguntar a Jade.
— Eu aprecio isso, Kovy. Aquela jogada que você fez no treino hoje
foi uma beleza. Você deveria tentar em um jogo.
— Acho que vou fazer isso.
Eles se soltam e encontram lugares nos sofás para que o próximo par
possa subir. Eu quebro minha cabeça para encontrar qualquer elogio que
eu possa dar a Jaysen e não encontro nada. Eu quase posso sentir seus
olhos perfurando o lado da minha cabeça, pensando em todas as coisas
que ele quer me dizer. São principalmente coisas mesquinhas para o
resto deles, tipo, você tirou minhas roupas da máquina de lavar e as
deixou no balcão para que elas cheirassem mal, e você é um jogador de
hóquei, como sua bunda é tão ossuda, e você ainda deve me cinco dólares
daquela viagem para Boston no primeiro ano. Mesmo quando eles ficam
mais sérios, como um problema consistente na prática ou sentimentos
reais de mágoa, eles são seguidos com algum elogio exagerado para que
as coisas não fiquem muito pesadas.
É óbvio que Jaysen e eu somos a verdadeira razão disso estar
acontecendo. Barbie e Dorian grudam um no outro como cola, e os
veteranos estão mais próximos daqueles com quem vieram, mas a equipe
não é muito grupal.
Com certeza, quando Jaysen se levanta do sofá e me agarra pelo
ombro do meu moletom, os caras enlouquecem. Já tomei mais algumas
cervejas a essa altura, e tudo sobe à minha cabeça assim que me levanto.
Minha visão fica atrás dos meus olhos enquanto sigo Jaysen para o centro
das atenções de todos.
— O momento pelo qual todos estávamos esperando — alguém diz
dos sofás. Eles se acalmam enquanto Jaysen e eu nos encaramos. Seus
jeans pretos são tão apertados, eu não sei como diabos ele conseguiu
colocá-los. Ele cortou as mangas de sua camiseta da banda, então eu dou
uma boa olhada em sua pele através dos lados abertos de sua camisa, a
tatuagem preta ousada ao longo de sua caixa torácica. Uma árvore de
aparência morta erguendo-se de arbustos negros cobertos de vegetação,
as sombras de mais árvores mortas ao fundo, corvos subindo dos galhos.
Parece cenário de filme de terror, mas também é meio sexy. Isso em cima
das argolas pretas em seu nariz e lábio inferior, os óculos de aro preto, as
orelhas esticadas, e meu Deus, minha boca está seca e ele está
literalmente me observando checá-lo.
Desvio os olhos para o chão entre nós, limpo a garganta e tento
acumular um pouco de saliva na boca. E é então que as mãos de Jaysen se
aproximam, palmas para cima, me convidando a segurá-las. Ele tem calos
nas palmas das mãos, logo abaixo dos dedos. Seus dedos são longos o
suficiente para provavelmente envolver todo o meu pulso, e as veias em
seus antebraços se projetam, atraindo meus olhos até a curva de seus
bíceps e... Não é o momento.
Suas mãos estão quentes, seu aperto forte quando eu finalmente as
alcanço. Deus, espero que ele não possa me sentir tremendo.
— Vossa Graça — diz ele. Eu olho para o rosto dele. — Sua tacada é a
coisa mais patética que já vi no hóquei.
Ok, sim, eu não posso discutir isso.
Eu lambo meus lábios. Tente não deixar minha voz rouca demais
quando digo:
— Certo. Jaysen, sua hesitação em ir atrás de discos soltos nas
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boards vai nos fazer perder jogos.
Seus olhos se estreitam. Eu atingi um ponto dolorido logo de cara.
— Claro — diz ele entre os dentes, como se ele tivesse que se conter
para não bater em mim. — Delilah é uma jogadora de hóquei muito
melhor do que você.
Eu zombo. Essa é a coisa mais verdadeira que alguém disse esta
noite.
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— Obviamente. Você é fraco no backhand .
— Certo. Você patina como se estivesse tentando cortar o gelo com
suas lâminas.
— Totalmente. Você é muito confiante em suas habilidades de
manuseio de bastões.
— Você tem o pior caso de síndrome do homenzinho que eu já vi.
— Você masca seu chiclete muito alto.
— Você não tem alma.
— Você é um idiota.
Nós balbuciamos um golpe após o outro, mal parando para recuperar
o fôlego, mal absorvendo as palavras um do outro antes de jogar as
nossas próprias costas. No momento em que tiramos todo o nosso ódio,
nossas mãos estão suadas e nós dois estamos respirando como se
estivéssemos dando socos em vez de insultos. Jaysen está me encarando
com olhos semicerrados que provavelmente são um espelho dos meus.
O resto da equipe está quieto ao nosso redor. Não houve nenhum
riso ou provocação como havia quando todo mundo estava aqui. Se não
fosse pelo estouro das latas de cerveja se abrindo, eu provavelmente
teria esquecido que eles estão aqui.
Alguém limpa a garganta, mas Jaysen e eu só temos olhos um para o
outro.
— Vocês devem um ao outro, tipo, trinta elogios agora — Zero diz.
Jaysen engole em seco. Eu vejo sua garganta se mover enquanto ele
ajusta seu aperto em minhas mãos. Eu quase tento me afastar, enxugar o
suor no meu jeans, para tornar isso menos estranho. Mas ele não está me
soltando. Meu moletom não está me fazendo nenhum favor, prendendo o
calor que aquece meu corpo toda vez que reconheço o fato de estar
segurando as mãos de Jaysen Caulfield. Só espero que todos culpem a
raiva por quão vermelhas minhas bochechas devem estar.
Nenhum de nós diz nada por um minuto. Eu não estou prestes a
começar. Ele começou com os insultos, ele pode começar isso também.
— Você, uh… — Jaysen muda seu peso de um pé para outro. — Você
faz um passe de pulso decente. Eu acho.
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— Você é muito bom no backcheck — eu digo lentamente.
Ele limpa a garganta.
— Seus passes geralmente vão de fita para fita.
— Às vezes você faz jogadas muito boas.
— Você tem uma boa presença no slot.
Os insultos vieram rapidamente, mas isso é como arrancar dentes.
Há um bom atraso de cinco segundos entre cada elogio, e Jaysen tem
suor brotando na testa por causa do esforço. Ficamos sem coisas para
dizer sobre o hóquei depois de alguns minutos lentos e torturantes, e
então ficamos ali em um silêncio desconfortável.
Eu olho para Zero como por favor, deixe isso acabar, mas ele levanta
as sobrancelhas e torce o pulso como se vocês ainda não terminaram.
Alguém. Me mate. Agora.
Eu respiro fundo pelo nariz e solto o ar com raiva antes de olhar para
Jaysen. Ele funga, franze o nariz e mantém os olhos no chão entre nossos
pés quando diz:
— Seus olhos são de uma cor bonita.
Hum. Quê?
— Agora sim! — Kovy grita. Há palmas, e a caçoagem recomeça e
minha cabeça parece que está prestes a entrar em combustão
espontânea. Meu estômago se revira e tenho que engolir em seco para
não vomitar no peito de Jaysen.
— Uh… — eu começo. Como vou seguir isso sem me entregar?
Porque os únicos elogios que vêm à mente agora são coisas como esses
piercings fazem coisas comigo e esses jeans se encaixam muito bem em
você, por favor, tire-os.
Jaysen mastiga seu chiclete quase agressivamente, evitando meus
olhos a todo custo. Certo. O chiclete. Isso é seguro, sim?
— Seu hálito sempre cheira a canela? — Eu tento.
A risada chorosa de Colie começa de novo, e eu tenho certeza que
meu rosto está literalmente pegando fogo agora.
— Seu corte de cabelo funciona para você — diz Jaysen.
— Você tem um estilo decente? — Tudo o que digo sai como uma
pergunta, o que acho que ajuda a ilusão de que não tenho ideia do que
estou falando. Pode ser. Provavelmente não.
— A voz grave meio que combina com você.
— Sua tatuagem é meio legal.
Jaysen levanta um pouco os olhos. Eu juro que eles se agarram onde
minha manga é empurrada para cima, logo abaixo do meu cotovelo,
então lentamente seguem meu antebraço até o meu pulso e de volta para
o meu bíceps.
— Você está bem em forma para alguém tão baixo.
Acho que posso desmaiar. Ele estava apenas me verificando? Não,
claro que não. Ele estava apenas procurando algo para dizer. Isso
definitivamente não foi o mesmo tipo de olhar que eu fiz com ele minutos
atrás de um jeito maldito você é gostoso. Nem mesmo perto.
— Você tem... covinhas? — Eu meio que cuspo isso, e é isso, eu
terminei. Eu tiro minhas mãos das de Jaysen e esfrego-as contra meu
jeans. Ele é rápido em se afastar de mim, e eu mantenho meu rosto
virado para o chão na tentativa mais vã de esconder meu rubor.
Os caras torcem e aplaudem para nós como se tivéssemos alcançado
algum tipo de avanço impressionante. Zero estende as doses para nós
dois e eu viro a minha para dentro assim que ela está na minha mão,
então estendo o copo para outra. Zero a derrama com um sorriso
orgulhoso no rosto. Encontro um lugar vazio em um sofá longe dos
outros calouros e bebo na esperança de esquecer que isso aconteceu.
Honestamente, eu preferia ser zoado.
CINCO
Estou preso aqui esta noite, então é melhor me divertir.
Dorian e Barbie acabam no sofá comigo, me apertando tão perto
deles que mal consigo mover meus braços. Minha visão fica lenta
enquanto olho ao redor da sala para meus companheiros de equipe,
rindo e bebendo.
Eu danço. Alguém dança comigo. Acho que é Barbie, a julgar pela
altura que ele parece nas minhas costas. Por um segundo tenho certeza
que Colie vai sufocar de tanto rir.
Todos nós olhamos para Dorian quando ele grita:
— Ei, escute. Pessoal, ouçam! Cadelas rudes. Enfim. Espaço. Não me
olhem assim, caras. Me deem o fodido espaço. Pensem sobre isso. O
universo é interminável, sim? Isso é assustador. Mas tem que ser
interminável porque se acabasse, o que estaria do outro lado?
Assustador, certo?
E eu digo:
— Não, você sabe o que é mais assustador do que o espaço? O
oceano, cara. É o que, tipo, setenta por cento do planeta, mas mal vimos
cinco por cento dele. Pode haver monstros marinhos em todos os lugares
e nem saberíamos disso.
— Falando do oceano — diz Colie. — Você sabe como a água salgada
queima seus olhos? E o suor? Nossas lágrimas são salgadas, então por
que não queimam nossos olhos também? Wicker, você está pré-
medicado. Eu preciso de respostas!
Eu jogo algumas partidas de hóquei de joelho, me esforçando tanto
quanto no gelo.
Eu me levanto e caio em cima de Dorian e Barbie e todos riem.
Acho que posso ser feliz.
Eu não durmo no sofá com Jaysen.
Mas é lá que eu acordo. Estamos deitados para direções opostas com
nossas pernas entrelaçadas, os dedos dos pés dele cavando
dolorosamente na parte interna da minha coxa. Seu rosto está enterrado
nas almofadas traseiras, as mãos enfiadas nas axilas.
Os veteranos devem ter todos encontrado o caminho para seus
quartos, porque são apenas calouros no chão e sofás aqui. Dorian e
Barbie estão no mesmo sofá que eu compartilhei com eles a maior parte
da noite, Dorian enrolado em uma bola para compensar o tamanho do
Barbie.
Todos os outros ainda estão dormindo. Alguém está roncando.
Minha língua parece grossa e seca e meu estômago rola enquanto eu
lentamente me levanto. Jaysen se mexe quando tento mover minhas
pernas, então paro. Não estou pronto para enfrentar o constrangimento
quando ele acordar. Minha cabeça deve ter sido enrolada em um
cobertor e espancada repetidamente pela forma como lateja. A ressaca
furiosa ainda não sobrepõe a dor nos meus joelhos do hóquei de joelho.
Mas o mais preocupante é o fato de eu estar seminu enrolado em um
sofá com Jaysen Caulfield. E eu realmente tenho que fazer xixi.
Encontro minha camiseta e moletom em uma pilha no chão a alguns
metros de distância. Meu jeans aperta dolorosamente meus quadris
enquanto tento me levantar novamente, tomando cuidado para não
empurrar muito Jaysen, parando sempre que ele se mexe.
Quanto tempo estou perdendo? Eu tropecei neste sofá depois de cair
em cima de Dorian e Barbie? Ou eu ainda estive acordado por horas
depois disso? É a última coisa de que me lembro, mas nem sei que horas
eram naquele momento. Por mais que eu ame beber, eu nunca desmaio
assim. Eu odeio isso. Eu odeio não saber. O que eu disse? O quanto eu me
envergonhei? Que tipo de segredos eu revelei?
Assim que me liberto das pernas de Jaysen e meus pés descalços
tocam o chão, ele acorda assustado com uma respiração afiada e um
chute forte no meu quadril. Eu assobio de dor e bato em seu pé enquanto
ele me olha com os olhos turvos. Ele pisca algumas vezes, e eu coloco
meu rosto em minhas mãos, esfregando minhas têmporas. Esta casa
inteira está girando.
— Bom dia, Jesus — diz Jaysen, a voz toda sonolenta. Eu viro minha
cabeça e dou a ele um olhar que diabos. Ele revira os olhos. — Vamos,
você não se lembra disso? Você subiu no encosto do sofá, afirmou ser
Jesus e exigiu ser crucificado apenas para poder se levantar novamente.
Então você desmaiou.
Certo, antes de tudo, preciso parar de beber. Mas também, se eu
desmaiei neste sofá, isso significa que eu estava aqui primeiro, então
Jaysen escolheu compartilhar comigo.
— Bem, merda. — Eu limpo minha garganta. Pego uma das garrafas
cheias de água espalhadas pelo chão. — Sou branco demais para ser
Jesus.
— Sim você é. — Jaysen se senta e estica os braços acima da cabeça.
Eu bebo minha água e mantenho meus olhos fixos na parede. — Você
também é muito mais tolerável bêbado.
Meu rosto queima. Não sei se é humilhação ou raiva ou talvez um
pouco de ambos. Eu cambaleio em meus pés e vou até o resto das minhas
roupas. São necessárias cinco tentativas para colocar minha cabeça no
buraco certo da minha camiseta.
— A boa notícia é que você ganhou o apelido de Terzo — Jaysen
acrescenta quando eu fico em silêncio. Sua voz é um pouco mais suave,
como se ele realmente se sentisse mal por me insultar pela primeira vez.
— Não há mais 'Sua Graça', então? — Eu pergunto mais ou menos.
Ele dá de ombros. Ele se esticou no sofá agora, uma mão atrás da
cabeça, a outra descansando em seu estômago. Eu tento não olhar para
ele diretamente.
— Ainda gosto — diz. — Mas Terzo combina com você.
Ok, sim, ele definitivamente ainda está bêbado. Ou talvez a
sonolência o torne estranho, porque esse não é o comportamento normal
de Jaysen Caulfield.
Eu coloco meu moletom e enfio as duas mãos pelo meu cabelo
enquanto procuro minhas meias. Elas podem ser uma causa perdida. Por
um segundo penso em me jogar de volta no sofá e dormir mais, mas isso
significaria me preparar para ainda mais constrangimento quando todos
acordarem.
Não importa que eu não saiba o caminho de volta para o campus
daqui. Não importa que cada passo pareça que estou andando na areia.
Eu preciso ficar o mais longe possível desta casa, Jaysen e ontem à noite.
Jesus. Você tem covinhas. Eu realmente disse isso, não disse? E Jaysen
gosta da cor dos meus olhos, do meu corte de cabelo e da minha voz.
Agora vou ficar pensando nisso o dia todo.
— Ei. — Jaysen me para no meio do caminho até a porta. Ele está
quieto o suficiente para não acordar os outros, mas honestamente com a
aparência de todos eles, eu provavelmente poderia começar a gritar
agora – como eu meio que quero – e eles nem vacilariam. — Desculpe
por ser um idiota o tempo todo.
Eu pisco para ele.
— Ok? — eu resmungo.
Ele inclina a cabeça um pouco, coça o peito. Olha para mim como se
estivesse esperando por algo.
Eu franzo a testa, mas leva apenas um segundo antes de perceber o
que ele quer.
— Desculpe por quebrar seu taco.
Jaysen sopra ar pelos dentes.
— Você tem sorte que esta escola está pagando pelo meu
equipamento agora. Ah, e pare de me chamar de Jaysen. Você parece
minha mãe.
Eu saio fora. Eu deslizo do sótão e desço as escadas, tanto quanto eu
adoraria me jogar no fundo neste momento. Coloco a mão na boca e
aperto. Eu me sinto além de doente. Como se eu tivesse morrido mil
vezes.
Pelo menos quando Jaysen... ou Cauler, eu acho, está sendo um idiota,
eu tenho algo para moderar minha atração por ele. Se ele começar a ser
legal comigo, está tudo acabado.
Alguns dos veteranos estão na sala de estar quando desço, caídos nos
sofás assistindo desenhos animados, comendo cereais e tomando café.
— Sim, Terzo! — Zero diz com a boca cheia de cereal. Leite escorre
pelo queixo.
— Jesus ressuscitou! — Kovy chama.
Todos eles riem. O som é uma broca no meu crânio. Eu continuo
andando, gemendo algum tipo de saudação ininteligível de ressaca que
só os faz rir um pouco mais.
E com isso, deixo minha equipe para trás.
Meu time.
Merda.

SÓ PORQUE SÃO minha equipe não significa que sejam meus amigos.
Eles parecem ter perdido esse memorando.
Eu não sei se há algum grande desabafo enterrado em minhas
memórias apagadas da noite passada, mas os outros não olham para
mim como se estivessem esperando que eu vá embora para que possam
falar merda sobre mim, não mais. Eles agem como se quisessem falar
comigo. Como se eles quisessem que eu me sentasse com eles no
refeitório e ficasse na sala da equipe entre as aulas. E como eles me
9
querem no gelo por mais do que meu wrist shot .
É absolutamente horrível. Sempre que um deles me chama de Terzo,
tenho palpitações no coração.
Cauler bate no meu ombro enquanto patina ao meu lado no treino
uma noite. Seu sorriso é menos cruel do que costumava ser, mas ainda é
tão presunçoso. Ele se inclina para dizer:
— Percebi algo em você, Terzo.
— O que é? — Eu mantenho meu tom plano e entediado, mas ele tem
minha atenção.
Nós olhamos juntos para o gelo da linha azul enquanto os exercícios
acontecem ao nosso redor. Cauler muda seu peso nos patins, batendo no
meu ombro repetidamente. Eu não sei se ele percebe, mas tem meus
nervos todos enrolados dentro de mim, calor corando minhas bochechas.
— Você prefere festejar com os laxers do que conosco — diz ele. — E
você joga hóquei como se fosse lacrosse.
Eu zombo.
— Como?
— Você acampa atrás da rede na metade do tempo. E sua jogada
ensaiada favorita é Michigan. Eu acho… — Ele bate um dedo enluvado na
gaiola da grade de seu capacete, bem acima do queixo, olhando para as
vigas. — Eu posso ter descoberto algo que você gosta. Pena que tinha que
ser lacrosse. Os meninos vão evitar você com certeza.
Eu torço meu nariz para ele, e então é a minha vez de dar e ir. Eu
trabalho com isso sem esforço, passando para Dorian na linha de gol
enquanto corro para as marcas de hash. Eu recebo o passe de retorno de
Dorian e mudo de direção sem problemas, curvando-me em direção à
fenda baixa com meus olhos fixos nos de Colie através de seu capacete.
Eu finjo de um jeito, então coloco o disco por cima do outro ombro dele
com um chute no pulso tão rápido que faz todo o time gritar. Eu tomo
meu lugar na linha de alimentação na parte de trás da rede e espero
Cauler voltar para mim.
Meu coração está martelando contra minha caixa torácica.
O tiro de Cauler ressoa no cano em sua vez, mas ele não parece
preocupado quando se junta a mim.
— Você está conseguindo — eu digo. — Até Gretzky acampava.
— Você poderia se comparar com Gretzky. — Aquele toque de
desdém está de volta em sua voz e meu coração afunda com isso. Ele tem
sido menos óbvio com seu ódio desde sábado, mas ainda aparece de vez
em quando. — Mas isso não ajuda no seu caso. Ele também jogava box
lacrosse.
—Você está dizendo que nunca pegou um taco de lacrosse no verão?
— Claro que sim. — Ele dá de ombros com desdém. — Muitos
jogadores de hóquei fazem isso.
— Então qual é o problema?
— Lealdade, Vossa Graça.
Eu tomo a minha vez de receber o passe e devolvê-lo antes de ir para
a linha azul. Meu pulso ainda está zumbindo sob minha pele quando
Cauler está ao meu lado novamente.
— Então — ele diz. — Você gosta das minhas covinhas, hein?
Quase engasgo com minha própria saliva.
— O que… — eu gaguejo, deslizando para trás dele um passo. Fale
sobre uma mudança de assunto abrupta e ridícula.
Cauler ri, apenas este único ha! na minha reação. Seu sorriso coloca
aquelas covinhas em suas bochechas, e eu tenho que desviar o olhar.
— Esse jogo é feito para constranger as pessoas a se superarem.
Todo esse rubor prova que pelo menos você tem uma alma.
— Eu? — Eu mantenho meu nível de voz, lutando para recuperar o
que resta da minha dignidade.
— É muito pequena e manchada além do reparo, mas sim, a alma
está lá.
Ele joga o taco nos ombros e coloca os braços sobre ele. Eu coloco
minha bunda no gelo, mãos segurando a lâmina, e descanso meu queixo
nas luvas. Nós nos encaramos. Cauler mastiga seu protetor bucal, metade
dele enrolado em sua bochecha como um anzol. Ele é um dos poucos
Royals que escolhem usar um. Provavelmente por causa daquela
concussão que quase acabou com sua carreira de jogador alguns anos
atrás.
Mesmo com todos aqueles insultos que joguei nele outro dia, a
cautela com que ele joga agora é realmente sua única falha como jogador
10
de hóquei. Ele ainda tem garra e pode aceitar um check tão bem quanto
qualquer um, mas ele não gosta de arriscar um check por trás e ir atrás
de discos soltos ao longo das boards, a menos que um oponente chegue
lá primeiro. Especialmente pelos bancos.
Não que eu realmente o culpe. Quando você leva um golpe por trás
tão forte que o som de sua cabeça ecoando na escora pode ser ouvido em
toda a arena, fraturando uma vértebra e deixando você para fora por
meses, seria mais preocupante se você não tivesse algum medo
persistente.
Cauler respira fundo, levantando os ombros com ele, e abre a boca
para falar.
— Vocês dois espanadores vão parar de fazer olhos de coração um
para o outro e atirar algum maldito disco? — alguém chama da linha de
gol.
Os outros juntam-se ao chilrear até que o Treinador possa recuperá-
los. Eu uso a distração para colocar alguma distância entre mim e Cauler.
Juro que o ar entre nós estava começando a ficar perigosamente elétrico
por um segundo, mas sei que está tudo na minha cabeça. Alguns elogios
forçados não vão fazê-lo de repente se apaixonar por mim. Ainda há
maldade mal contida por trás de cada olhar e palavra que ele tem para
mim.
Mas eu o pego olhando para mim novamente alguns minutos depois.
SEIS
OUTUBRO

A primeira semana de outubro traz oficialmente os treinadores para o


nosso dia a dia. Nosso treinador de força e condicionamento faz um
balanço do nosso progresso na sala de musculação pela manhã.
Começamos a fazer todas as nossas refeições na sala dos jogadores com
os treinadores adjuntos para garantir que estamos seguindo o plano de
nutrição e não nos empanturrando de bacon e batatas fritas caseiras. A
treinadora de goleiros de Colie, treinadora Hein, enfia a cabeça em
nossas aulas ao longo do dia para ver se realmente vamos a elas.
A temperatura lá fora tem caído constantemente durante toda a
semana, a ponto de não ser mais um alívio entrar na arena fria. Ainda
assim, outubro é meu mês favorito do ano, não apenas porque é o início
da temporada de hóquei. A floresta está ficando vermelha e laranja, e o ar
cheira a Halloween.
Tenho uma reunião com o treinador alguns dias antes da nossa
exibição de abertura para avaliar o progresso e definir as expectativas, e
ele me diz que preciso me esforçar mais na academia. Eu tenho que me
conter para não revirar os olhos. Não é como se papai não estivesse me
dizendo a mesma coisa a cada telefonema ou qualquer coisa.
Só não vejo espaço para melhorar. Eu sou muito forte para alguém do
meu tamanho. Então Cauler patinou até mim no treino um dia e disse:
— Sabe, eu posso levantar 40 quilos a mais do que você.
Eu estreito meus olhos para ele. Ele tem falado com o treinador ou
algo assim? Conspirando contra mim?
— Rede NHL — Cauler explica quando eu não digo nada. — A última
comparação deles.
Eu aperto meus dedos em volta do meu bastão e faço questão de
olhar para ele, depois para mim, tipo, olá? Ele tem o dobro do meu
tamanho, claro que pode levantar mais.
— Quero dizer... duh?
Cauler ri, cheio de covinhas e olhos enrugados, e eu quase derreto no
gelo. É bom, fazê-lo rir. Ele pode fazer qualquer emoção parecer boa, mas
esta é a minha favorita.
Por mais que eu afaste o rosto dele, porém, ainda fica sob a minha
pele. Papai e treinador apontar isso é uma coisa. Uma vez que a NHL
Network e o cara mais gostoso que eu já vi se apegam a isso, é o
suficiente para me tirar da cama no domingo de manhã, o único dia que
tenho para me recuperar, para ir à academia.
Eu adiciono mais peso à barra e me deito no banco, enrolando meus
dedos ao redor da barra. A academia é silenciosa. Mesmo aquelas
pessoas que basicamente vivem de shakes de proteína e postam fotos
diárias no espelho do vestiário não querem estar aqui tão cedo em um
domingo. O estudante trabalhador está adormecido atrás de sua mesa.
Fecho os olhos e respiro fundo algumas vezes, e quando os abro
novamente, assim que estou prestes a levantar o peso, Cauler aparece
acima de mim. Ele olha para mim e franze a testa. Eu relaxo meu aperto
na barra, mas o resto de mim permanece tenso.
— Eu sei que você não está prestes a levantar sem alguém
observando — diz ele. Ele se move para me ajudar a levantar a barra do
suporte, como se realmente se preocupasse com minha segurança ou
algo assim. Eu me deixaria ser esmagado pela barra antes de admitir,
mas ele está certo. Levantar sozinho era uma má ideia. Especialmente
com o peso adicionado.
Eu mantenho meus olhos no teto além da cabeça de Cauler e tento
manter a tensão fora do meu rosto enquanto passo pelo set.
— Por quê você está aqui? — ele pergunta.
— Por que não? — Eu digo em uma expiração pesada.
— Estou aqui na maioria dos domingos desta vez. Você nunca coloca
essas horas extras.
Termino minhas repetições e deixo que ele me ajude a recolocar a
barra no rack. Meus braços estão gelatinosos. Eu descanso minhas mãos
no meu peito para deixá-los se recuperar. Meu coração bate na ponta dos
dedos, e fico focado no teto enquanto recupero o fôlego. Cauler mantém
as mãos na barra, inclinando-se sobre meu rosto, olhando para mim,
esperando.
Ele provavelmente está esperando que eu o ignore. Provavelmente é
por isso que eu não faço.
— Você sabe porque.
Os olhos de Cauler em mim estão pesados. Estou distintamente
consciente da subida e descida do meu próprio peito, o suor na minha
pele aparecendo através dos lados cortados da minha camisa, os arrepios
subindo em meus braços quando um dos ventiladores oscilantes sopra
sobre mim. Eu me sinto mais presente em meu corpo do que em
semanas, com ele olhando para mim.
Suas sobrancelhas são grossas. Mandíbula e maçãs do rosto afiadas.
As argolas no nariz e no lábio são tão atraentes quanto os buracos nos
lóbulos das orelhas. Seu rosto está educado e calmo agora, mas eu vi o
quão intensamente expressivo ele pode ser com os olhares no treino e
em todo o campus. Sinto um cheiro daquele chiclete de canela que ele
está sempre mascando, e juro que ele poderia soltar os pesos bem na
minha garganta e eu nem perceberia.
Quando finalmente olho em seus olhos, ele não está olhando para o
meu rosto. Há essa fração de segundo em que eu juro que ele está
realmente me verificando, aproveitando-se de que estou deitado assim,
mas então seus olhos estão fixos nos meus, e ele está olhando para mim
tão inexpressivamente que devo ter imaginado.
Pensamento positivo e tudo mais.
— Por que você odeia tanto? — ele pergunta. Não preciso perguntar
sobre o que ele está falando.
Eu tiro meus olhos dele e olho de volta para o teto.
— Eu não odeio.
Mesmo na minha visão periférica, vejo seu rosto mudar. Suavizando
em algo quase como compreensão. Por um segundo ele percebe que eu
não sou apenas um idiota tirando a glória dele sem merecer.
— A mídia vai fazer um tumulto sobre nós em uma linha juntos —
diz ele, levantando-se em linha reta para apontar meu próximo
levantamento. Ele espera até que eu esteja muito ocupado com os pesos
para responder e acrescentar: — A primeira vez que alguém tentar dar
crédito a você pelo meu sucesso, eu vou te destruir.

NÃO CONSIGO FOCAR na sala de estudos naquela tarde. Sento-me no


meu canto rabiscando círculos preguiçosos nas margens do meu trabalho
de casa de italiano. Eu levei um bom tempo para melhorar a primeira
língua da minha mãe, mas é ruim para a minha capacidade de atenção.
Especialmente com a exibição em alguns dias. O momento da
verdade. Uma prévia da temporada que vai me fazer ou quebrar quando
chegar a hora do draft.
Eu mantenho minha cabeça erguida com um cotovelo na mesa e
começo a rabiscar furiosamente no meu dever de casa. Não importa o
quão arruinado o papel esteja. Eu nunca vou ser capaz de me concentrar
o suficiente para terminá-lo.
Um dos meninos ri, definitivamente não por causa da sua lição de
casa, e Zero grita com ele:
— Trabalhando duro ou mal trabalhando?
Suspiro e abro meu laptop para ver o ranking de expectativa da NHL.
Ainda estou no topo da North American Skaters, com Cauler logo abaixo
de mim. O número três é um cara chamado Alex Nakamoto. Sua posição é
praticamente segura, mas abaixo disso, os caras estão sempre mudando.
Clico na altura para classificar a lista do mais alto para o mais baixo, e
agora estou em último lugar. O próximo cara mais baixo tem um metro e
setenta e oito, e ele está classificado na casa das duzentas. O patinador
europeu mais baixo tem 1,75m.
Não sei porque faço isso comigo.
Meu telefone acende na minha mesa, silenciado para evitar a ira de
Zero. Eu aperto os olhos para a notificação que aparece, porque de jeito
nenhum eu estou vendo isso direito. Uma mensagem. De Jaysen Caulfield.
Jaysen: Vamos tentar encontrar algum terreno em comum Terzo
Eu engulo em seco, descansando minha cabeça no meu braço na
mesa e segurando meu telefone na minha mão livre. Eu poderia ignorá-
lo. Deveria ignorá-lo. Eu deveria estar fazendo minha lição de casa, me
mantendo elegível para jogar.
Mas aparentemente sou masoquista.
Mickey: Por que
Jaysen: Então não nos matamos antes do dia do draft
Mickey: Com certeza, competir para ser a primeira escolha é um terreno comum o
suficiente
Jaysen: Fora do hóquei
Mickey: Zero e Kovy colocaram você nisso?
Jaysen:… talvez
Zero disse que o treinador ameaçou sua capitania se não conseguisse fazer a gente se
dar bem
Mickey: Dramático
Jaysen: É o seu trabalho para unir a equipe
Mickey: Eu não achei que ainda houvesse um problema depois daquela festa
Jaysen: Ele quer ter certeza, eu acho
Fecho os olhos e respiro fundo. Pelo menos conversar com alguém
vai passar o tempo até que a sala de estudos termine. Mesmo que esse
alguém seja Cauler.
Mickey: Uh.
Certo.
Jaysen: Ok então
Banda favorita?
Mickey: Tragically hip
Jaysen: Você está brincando comigo?
Você odeia hóquei
Mas sua banda favorita
é o hip
Meus olhos se estreitam. Só porque eles são canadenses e têm
algumas músicas sobre hóquei e são um marco nas arenas e quase todos
os times da NHL homenagearam Gord Downie quando ele morreu, não
significa que eu não seria capaz de gostar deles e odiar hóquei ao mesmo
tempo. Por que ele está tão convencido de que eu odeio hóquei de
qualquer maneira?
Isso levaria muito tempo para digitar.
Então eu só digo:
Mickey: eu te disse
Eu não odeio hóquei
Qual é a sua
Jaysen: The amity affliction
Mickey: Nunca ouvi falar deles
Jaysen: Pq você não tem cultura, obviamente
Sua vez
Mickey: Cor?
Jaysen: Preto.
Duh
Mickey: Azul
Jaysen: Filme?
Não diga miracle ou eu vou acabar com você
Mickey: eu ñ sei
homem aranha com tom holland
Jaysen: Agora sim
Thor ragnarok
Mickey: programa de TV
Jaysen: Eu não assisto muita TV
Mas
FMA:brotherhood
Droga. Esse é o meu favorito também. Mas eu não quero admitir isso
para ele. Eu meio que quero parar de gostar completamente. Primeiro ele
assume minha posição no hóquei, e agora meu programa favorito
também? Eu nunca vou assistir de novo se isso significa me distanciar
dele.
Mickey: não sei, eu só assisto hgtv
Jaysen: qual é o seu nome do meio?
Mickey: Você realmente acha que vamos ter o mesmo nome do meio
Jaysen: Não
Apenas curioso
o meu daniel
Mickey: Liam
Jaysen: É o mesmo com os mickeys antes de você?
Mickey: Sim
Jaysen: Droga.
A individualidade é realmente desaprovada para vocês, homens james, hein
Mickey: Você acha
Eu olho para o meu telefone até que ele se bloqueie. Então eu encaro
meu reflexo na tela preta. Ele não responde. Eu acho que tecnicamente é
minha vez de fazer uma pergunta, mas não sei como... conhecer as
pessoas, eu acho? Como fazer amigos ou o que fazer com eles depois. Eu
tenho Nova, sim, mas isso é porque fomos forçados a entrar na vida um
do outro quando crianças e eu morei no corredor dela durante toda a
puberdade. Nós não poderíamos nos livrar um do outro se tentássemos
neste momento.
Mas quero dizer, não é como se Cauler estivesse tentando ser meu
amigo aqui. E eu não estou tentando ser dele. Nós apenas temos que nos
dar bem pelo bem de Zero.
SETE
Meu mundo inteiro se reduz ao hóquei no dia da nossa exibição.
Meu corpo me carrega para as aulas, me leva para o rinque e me
coloca no ônibus para Ontário para meu primeiro jogo de hóquei na
faculdade, mas minha cabeça não participa de nada disso, apenas
ganhando vida quando eu piso no gelo em meu uniforme preto-e-roxo.
Hartland no meu peito acima de uma coroa. James III sobre meus ombros
sobre o número 17.
É apenas mais um jogo de hóquei.
Nem conta para as estatísticas.
Eu só tenho que jogar o meu jogo e tudo ficará bem.
É um mantra que repito para mim mesmo durante os aquecimentos,
até o jogo comece para me manter calmo. Toda vez que vejo Cauler,
compartilhando o gelo e uniforme, tenho que começar de novo.
A mídia de hóquei de verdade não vai se incomodar com uma
exibição, mas um repórter com cara de estudante com um microfone
Mustangs me puxa de lado no corredor do lado de fora do vestiário dos
visitantes depois de um primeiro tempo sem gols. Meu cabelo está
alisado com água e suor que escorre do meu queixo e arde em meus
lábios e queima meus olhos, mas eles colocam uma câmera no meu rosto
e começam a fazer perguntas como se esperassem que fosse minha
segunda natureza.
A maioria dos Royals continua andando normalmente, mas Cauler e
Zero param atrás do cara da câmera. Cauler parece tão irritado quanto
sempre fica quando recebo atenção especial, mas Zero cruza os braços e
me observa atentamente enquanto garanto ao garoto com o microfone
que vinte minutos de hóquei não vão determinar todo o resultado de
nossa temporada.
O resto das perguntas são fáceis de responder com o mínimo de
poder cerebral, e depois de um tempo, percebo que estava olhando por
cima do ombro do cara da câmera enquanto falava. Para Cauler. Eu pisco
de volta ao foco, e ele sorri para mim. Levanta uma sobrancelha. Eu
limpo minha garganta e olho de volta para o entrevistador enquanto ele
inclina o microfone de volta na minha direção.
— Desculpe — eu digo. — O que é que foi que você disse?
Ele se atrapalha por um segundo antes de tomar fôlego e começar de
novo.
— Os analistas têm dito recentemente que as ações do Jaysen
Caulfield estão subindo. Isso faz você se sentir ameaçado de alguma
forma?
Meu rosto se contorce. Vejo Cauler se mexer com o canto do olho,
mas me recuso a olhar para ele. Não quero ver o quão presunçoso isso o
deixou.
— Claro que não — eu digo lentamente, dando de ombros. — Ele é
um grande jogador de hóquei e qualquer time que o pegue, o primeiro ou
o segundo terá muita sorte. Não importa em que ordem somos
convocados. Ele é meu companheiro de equipe; tudo o que importa é
como trabalhamos juntos no gelo.
A risada de Cauler chama minha atenção de volta para ele assim que
ele e Zero passam ao redor do cara da câmera. Zero pega minha camisa e
começa a me puxar para longe.
— O que importa é que você está perdendo o discurso de intervalo
do treinador — diz ele. O estudante repórter está muito desprevenido
para dizer qualquer coisa.
Zero nos leva pelo resto do caminho até o vestiário, e Cauler se
aglomera contra mim quando a porta se fecha atrás de nós. Eu posso
senti-lo contra minhas costas, pairando sobre meu ombro enquanto ele
diz:
— Eu sou um grande jogador de hóquei, hein?
Reviro os olhos, mesmo quando meu coração aperta com sua voz
quase no meu ouvido.
— Tenho que falar bem para as câmeras.
Ele ri novamente. Às vezes eu não posso dizer se ele está zombando
de mim ou se ele realmente gosta de me ver ser derrubado um pouco.
Provavelmente ambos.
— Legal de vocês três se juntarem a nós — o treinador diz enquanto
eu afundo na minha banca emprestada. Eu não respondo, mantendo
meus olhos no quadro branco que ele usou para elaborar uma nova
jogada.
— O aspirante a repórter esportivo estava tentando deixá-lo em
coma — diz Zero, apontando para a TV sem som na parede oposta,
reproduzindo um atraso da entrevista. Quase não me reconheço na tela.
O rubor nas minhas bochechas de quase dez minutos de tempo de gelo
não pode esconder a aparência de doente do resto de mim. As bolsas
escuras sob meus olhos, o vazio em minhas bochechas. Eu me vejo
fazendo besteira através das perguntas, e não tenho ideia de como
ninguém mais percebeu todos esses anos. Minha máscara não é nem de
longe tão boa quanto eu pensava.
Eu absorvo cada uma das palavras do treinador e sei que poderei
pegar a nova jogada quando pisar no gelo, mas não presto exatamente
atenção. Meu batimento cardíaco é uma vibração muito rápida,
respirações muito superficiais para encher meus pulmões. Piscinas de
suor nas pontas dos dedos de minhas luvas até que eu as tire e limpe
minhas mãos na minha camisa encharcada.
Isso faz você se sentir ameaçado?
Eu fecho meus olhos. Claro que isso me faz sentir ameaçado. Só me
disseram que eu seria a melhor escolha desde o dia em que nasci. É como
se o que vier da minha carreira depois daquele dia não importa, desde
que eu seja escolhido primeiro, assim como papai e vovô.
Como vou jogar normalmente, na mesma linha com o cara que tem
uma boa chance de tirar tudo pelo que trabalhei? A coisa para a qual eu
fui literalmente feito. Cada passe que lhe dou tem a chance de arruinar
minha vida.
Abro meus olhos para encontrar Cauler olhando diretamente para
mim. Ele não se vira quando eu o pego olhando. Apenas inclina a cabeça e
abaixa as sobrancelhas. Não sei o que ele pensa que está vendo.
Nós observamos um ao outro, Cauler sólido e calmo e eu lutando
para nos mantermos juntos, até que nossos companheiros de equipe nos
empurram de pé para uma torcida antes de voltar para o gelo. Eu
11
marquei uma vez em nossa vitória por 3 a 0, mas meu celly não é nada
mais do que um suspiro de alívio em direção às vigas.
Não importa que Cauler tenha dado a assistência.

MEU CORAÇÃO BATE FORTE quando meu telefone acende no ônibus


para casa, e desaba quando vejo que é Delilah no bate-papo em grupo.
Não sei por que esperava que fosse Cauler.
A mensagem de Delilah é apenas uma série de pontos de exclamação
e emojis e eu estou gritando na prévia. Suspiro quando abro. Ela enviou
um artigo com uma foto de um cara velho em um terno sorrindo, a
manchete mostrando apenas “Ex-NHL All-Star Com…” antes que fique
sem espaço.
Levo um segundo para fazer a conexão entre essa declaração cortada
e a excitação de Delilah, porque eu honestamente nunca pensei que veria
o dia. Eu clico no link e, com certeza, é um artigo sobre um jogador
aposentado da NHL chamado Aaron Johansson se declarando gay.
Ele fala sobre a cultura machista do hóquei, a homofobia
desenfreada, o medo. Ele está aposentado há mais de vinte anos e só
agora está confortável em se assumir publicamente por causa de pessoas
como Harrison Browne, Jessica Platt, Yanic Duplessis.
Não me incomodo com os comentários. Tenho certeza de que há
muitas pessoas gritando seu apoio como Delilah, mas sempre haverá os
trolls. Não sou muito masoquista.
Eu leio o artigo novamente, esperando para sentir alguma coisa.
Algum tipo de camaradagem. Alívio. Excitação. Esperança. Saio de volta
para o bate-papo em grupo enquanto os comentários das minhas irmãs
chegam, todas dizendo o quão incrível é. Eu deveria estar concordando.
Eu deveria estar vivendo. Em vez disso, eu digo:
Mickey: Fale comigo quando um jogador ativo se assumir
Sim, é bom termos algo. Mas eu quero mais. Eu não quero ser o cara
para descobrir em primeira mão se a NHL está falando sério quando
dizem que o hóquei é para todos. Não sou nenhum pioneiro. Eu não sou
corajoso o suficiente. Eu ouvi o jeito que algumas pessoas no campus
falam sobre Sid e Karim, muito obviamente e abertamente bissexuais.
Mas as pessoas agem como se Bailey fosse algum tipo de, eu não sei,
voyeur em seu relacionamento? Como se sua atração um pelo outro
anulasse sua atração por ela. Se você é um cara e gosta de caras, isso é
tudo que as pessoas veem.
Todas as minhas cinco irmãs veem minha mensagem, mas o fluxo
constante de respostas morre instantaneamente. Depois de alguns
segundos, mostra Delilah digitando e depois parando. Em seguida,
digitando novamente. E parando. Ela não envia nada por alguns minutos.
Delilah: Você pode parar com suas atitudes de hétero?
Deixe-me ter isso
Por um segundo eu considero mandar de volta eu sou bissexual sua
idiota como você não percebeu que eu sou tão óbvio, mas em vez disso, eu
saio do chat e vou compartilhar o artigo no Twitter.
Grande passo para o hóquei masculino, digo. Porque, objetivamente,
eu sei que é.
Cauler é o primeiro a gostar curtir.
OITO
Abrimos nossa temporada regular com uma viagem ao Colorado. Estou
no pico da ansiedade agora. Eu continuo tentando dizer a mim mesmo
que esta temporada de ápice é como qualquer outra temporada de
hóquei que joguei na minha vida. Estar em uma pista diferente com uma
camisa diferente não faz diferença. Ainda é hóquei, e ainda sou um dos
melhores jovens jogadores de hóquei por aí.
Mas Cauler também. Não posso deixá-lo ser melhor do que eu nesta
temporada.
Sento-me entre Dorian e Barbie no voo para Denver. Tecnicamente,
eu deveria ter o assento do corredor, mas como aparentemente sou tão
pequeno, eles me colocaram no meio. O avião está praticamente quieto,
exceto por algumas conversas sussurradas, e Cauler está dormindo do
outro lado do corredor, relaxado em seu assento com as mãos cruzadas
sobre o estômago, a cabeça inclinada para trás, a boca aberta. Ao lado
dele, Zero destaca uma frase em seu livro.
Eu tenho um pequeno trabalho para entregar até meia-noite, meu
laptop aberto em meu colo e dezenas de páginas de pesquisa que
continuo clicando sem um plano de ação real.
Dorian está se mexendo ao meu lado. Tamborilando os joelhos,
levantando a persiana para espiar pela janela um segundo antes de
fechá-la novamente. Ele estala os dedos e volta a batucar e bater o pé.
É extremamente distrativo.
Eu escrevo dois parágrafos dolorosos, provavelmente incoerentes,
antes que ele puxe os fones de ouvido em volta do pescoço e diga:
— Você já foi a um show?
Eu balanço minha cabeça.
— Vamos ver esses caras em algumas semanas. — Dorian estende
seus fones de ouvido para mim. Eu olho para ele com ceticismo. —
Vamos, eles são bons! — Ele puxa a perna de sua calça jogger – o mesmo
preto com ROYALS HOCKEY escrito na perna em roxo que o resto de nós
está vestindo – e torce para me mostrar a tatuagem preta em sua
panturrilha. Uma bomba com uma flor no lugar do pavio. — Eles têm
uma música chamada 'Flowerbomb', então.
Ele se recosta em seu assento enquanto coloco os fones de ouvido em
meus ouvidos. Quando ele aperta o play em seu telefone, eu juro que
meus tímpanos se rompem. Existe um homem. Literalmente gritando
comigo. Eu afasto os fones de ouvido e olho para Dorian até que ele sorri
e pede desculpas. Barbie bufa uma risada.
— Você também ouve essa merda, Barbie? — Eu pergunto a ele uma
vez que a música está baixa o suficiente para que meus ouvidos não
estejam sangrando.
— Desculpe? — Dorian zomba. — Merda?
Barbie encolhe os ombros. Ele está com o chapéu puxado para baixo
sobre os olhos, voz sonolenta.
— Difícil evitar com Dori e Cauler por perto. Você aprende a gostar.
— 'Você aprende a gostar' — Dorian zomba dele. — Como se você
não fosse fanboy quando percebeu que era Ahren gritando no fundo de
'Beltsville'.
— Eu prefiro meu pop punk e banda, obrigado.
Dorian toca várias músicas da mesma banda, traduzindo os gritos e
rosnados em palavras faladas para mim. É muito mais significativo do
que eu esperava. Mais esperançoso do que os gritos fazem parecer. É
francamente relacionável. Eu posso ver o apelo. A entrega pode levar
algum tempo para acontecer, mas quero dizer. As pessoas que parecem
ouvir esse tipo de música são o meu tipo, todos aqueles piercings e
tatuagens, então eu posso dar uma chance.
— O cara que ta gritando, Joel? Ele escreve as letras — explica
Dorian. — Ele tem depressão e ansiedade, então ele coloca tudo isso em
sua música.
Meu estômago revira. Não é à toa que parecia tão significativo. Eu
limpo minha garganta e tiro os fones de ouvido de Dorian.
— Então você quer ir vê-los com a gente?
— Quem vai? — Eu pergunto, a voz um pouco áspera.
— Eu, Barbie, Cauler, Zero, Kovy. — Ele as conta nos dedos. — Sua
irmã e a namorada dela podem vir também, mas acho que depende de
quanto trabalho Jade fizer em algum projeto que ela tem.
— Ok — eu digo, e imediatamente me arrependo. Sair com Dorian e
Barbie é uma coisa; Barbie está sempre no nosso quarto de qualquer
maneira, então é basicamente como sair já. Mas Cauler? Num show?
Assim que eu concordo com isso, eu sei que vou recuar no último
segundo. Dizer a eles que não me sinto bem ou que tenho uma tarefa
importante ou algo assim.
— Legal! — diz Dorian. — Vou te mandar algumas músicas deles
para que você possa conhecê-los melhor. É mais divertido quando você
pode cantar junto.
Recebo uma mensagem cheia de links de vídeo dele mais tarde
naquela noite, deitado em uma cama de hotel bem acordado enquanto
Colie ronca do outro lado do quarto. Eu coloco fones de ouvido e ligo a
música apenas o suficiente para abafá-lo. Cada música chega cada vez
mais perto de casa, como se eu pudesse ter escrito essas letras sozinho.
Tomo um banho frio para me acordar de manhã, mas meus olhos
ainda doem e nada do que faço me livra daquela sensação suja e insone
ao redor deles.
— Você parece mau, mano — Dorian me diz quando encontramos a
equipe no andar de baixo para o café da manhã.
Eu dou de ombros, servindo-me uma xícara de café de cortesia.
Desde que Delilah começou a me trazer cafés gelados em todas as aulas
de matemática, comecei a confiar nele para funcionar. Pelo menos eu
desenvolvi um gosto por isso, porque eu preciso desesperadamente
agora.
— Colie ronca — eu digo, embora tenha muito mais a ver com a
música. Dorian faz uma careta. Os veteranos nos avisaram sobre isso.
Kovy sobrevive morando com ele na casa de hóquei porque ele
provavelmente dormiria durante o apocalipse e faria todo o caminho
para sua primeira aula antes de perceber que algo estava errado.
Estou acostumado a correr dormindo pouco, mas isso é extremo.
Pego meu telefone no ônibus para o campus rival. Nova postou uma
foto de si mesma com o rosto nu, vermelho ao redor dos olhos, cicatrizes
de acne visíveis, uma espinha de aparência raivosa no vinco do seu nariz,
cabelo bagunçado cortado até o queixo, ao lado de uma foto dela toda
maquiada e impecável com suas extensões na cintura. Ela legendou nada
é real, e ela tem milhares de pessoas comentando, agradecendo pela
transparência e dizendo que ela é igualmente bonita em ambos.
Eles estão certos, obviamente. Mas é meu trabalho mantê-la humilde.
Mickey: Você parece uma bruxa do pântano
Nova: Droga.
Eu estava indo para uma vibe mais banshee
Por mais horrível que o dia tenha começado, por mais miserável que
eu me sinta, ainda me faz sorrir, mesmo que um pouco.
— Você está escondendo uma namorada de nós, Terzo? — Zero
pergunta atrás de mim, inclinando-se sobre a parte de trás do meu
assento para espreitar no meu telefone. Saio das mensagens por reflexo,
como se tivesse sido pego olhando para algo sujo.
— Não é minha namorada — eu murmuro, mas isso se perde no grito
de Zero de: — Nova? Nova Vinter? Terzo!
— Qual é o seu negócio? — Kovy pergunta ao lado dele.
— Esse idiota está literalmente mandando uma mensagem para
Nova Vinter!
— Eu vivi com ela — eu tento lembrá-los. Achei que era de
conhecimento geral que fiquei com os Vinters depois que minha família
partiu para Raleigh, mas toda a equipe está gritando sobre isso agora.
Reviro os olhos e afundo no meu assento, desbloqueando meu telefone
novamente.
Mickey: Muito obrigado
Você colocou minha equipe em um frenesi
Nova: Assista-os ter o melhor jogo de suas vidas
Quando descemos do ônibus para ir para a arena, os meninos me
fazem tirar uma selfie com eles em nossos uniformes para enviar de volta
para ela, Dorian e Kovy sorrindo ao meu lado, Zero fazendo o que ele
provavelmente pensa ser uma cara sedutora do outro lado, e Barbie
elevando-se sobre mim por trás, parecendo um pouco menos entediado
do que o habitual com um lado da boca virado para cima.
Nova: Quem é o alto???
Mickey: Eles são todos altos para mim
Nova: Mickey.
Mickey: Barbie.
Nova: Hmmmm
Chegamos ao vestiário antes que ela possa acrescentar mais alguma
coisa. Enfio meu telefone na minha mochila e começo a me preparar para
o jogo.
Estamos enfrentando uma equipe brutal. Eu tenho um blueliner
enorme em cima de mim durante todo o jogo, tentando me matar com a
maneira como ele joga seu peso em seus choques e ultrapassa a linha de
defesa, o que deveria ter gerado suspensões e penalidades. É irritante,
mas não deixo que ele me instigue à retaliação. Eu nunca fui de sentar no
banco por causa de penalidades.
No meio do segundo tempo, Kovy joga o disco ao longo das meias-
boards e eu o pego atrás da rede, desviando um cheque antes de passá-lo
para Zero. Eu chego a frente do gol, protegendo o goleiro e lutando pela
posição com o defensor agressivo. Cauler vai direto ao ponto, tomando o
lugar de Kovy. Eu vejo o cronômetro chegando assim que Zero faz o
passe. Quando Cauler termina, eu empurro meu quadril com força no
meu defensor, virando meu corpo e estendendo a mão com meu taco. O
disco sai da minha lâmina e ressoa no cano a caminho da rede. A luz do
gol pisca em vermelho, e meus companheiros de equipe me empurram
contra as boards para dar socos e tapinhas no capacete.
O blueliner não aceita bem. Da próxima vez que estamos juntos no
gelo, ele enfia a ponta de seu taco no suporte da lâmina do meu patins
enquanto eu bato em seu goleiro. Ele puxa minhas pernas debaixo de
mim, me deixando esparramado. Eu atingi os antebraços no gelo
primeiro, e o resto de mim me seguiu tão forte que me deixou sem fôlego.
Eu deslizo de cabeça nos protetores de perna do goleiro, fazendo-o
tropeçar para que ele caia bem nas minhas costas.
Por um segundo, com seu peso sobre mim, incapaz de respirar, juro
que minhas costas estão quebradas e estou morrendo. Apitos soam e os
caras estão gritando e as almofadas do goleiro me empurram com mais
força enquanto ele luta para ficar de pé.
O idiota do blueliner é banido para o banco, e eu estou preso no
12
banco para o power play enquanto o treinador se preocupa comigo.
Vencemos o jogo por 5 a 1, e tudo o que quero fazer é chegar ao
próximo hotel e dormir. Mas os meninos têm outros planos. Temos um
jantar de equipe cedo em um restaurante com mesas altas e banquetas
sem apoio para as costas, depois vamos para uma praça com um cinema
e o que parece ser uma loja de departamentos fechada com uma casa
mal-assombrada para a temporada. Eu prefiro ir ao cinema e sentar em
uma cadeira confortável por algumas horas, mas a maioria da equipe e
treinadores vão para a casa mal-assombrada. Dorian não me dá muita
escolha quando diz:
— Estou me escondendo atrás de você, Terzo. Os monstros
provavelmente terão mais medo do seu brilho do que você deles!
Ele não está errado sobre o último ponto, pelo menos. Eu nunca me
assustei facilmente. E quando fico com medo, não grito ou pulo, apenas
meio que congelo. Eu posso parecer imperturbável, mas essa falta de
uma resposta de luta ou fuga me mataria primeiro em qualquer situação
de filme de terror.
Eles tentam me colocar na frente, mas Cauler argumenta contra isso
porque, aparentemente, eu sou tão baixo que eles acabariam me
atropelando. Então ele assume a liderança enquanto Dorian estica meu
zíper Royals Hockey, me sufocando com a gola e se curvando para
enterrar o rosto no meu pescoço antes mesmo de encontrarmos um ator.
As coisas mais surpreendentes que acontecem são quando a Barbie grita
assassinato sangrento pelas costas, e quando Cauler chega atrás de mim
para me agarrar quando uma garotinha em um vestido esfarrapado e
ensanguentado vem cambaleando da escuridão à nossa frente.
Sua mão em volta da minha faz meu coração disparar mais do que
qualquer susto que este lugar poderia me dar.
É legal ter uma criança real trabalhando em uma dessas coisas?
De todos os zumbis e assassinos e demônios que este lugar jogou na
nossa frente, é isso que finalmente o assusta?
Será que ele percebe que está segurando minha mão agora? Ele não
solta o resto do caminho pela casa. Eu seguro meu corpo tão tenso que,
quando saímos dele, tenho certeza de que triplicou qualquer dano que
aquele goleiro fez nas minhas costas. Parece que alfinetes estão sendo
enfiados entre todas as minhas vértebras.
Assim que saímos no meio da multidão, Cauler me solta e coloca pelo
menos três passos de distância entre nós. Esfrego minhas mãos, tentando
me livrar da sensação de sua mão na minha. Dorian não solta a minha
jaqueta até que estejamos no meio do prédio, longe da casa e dos atores
aterrorizando as pessoas que ainda estão na fila. Ele tenta suavizar isso
para mim, mas neste momento provavelmente precisaria de um serviço
completo de lavagem a seco para consertá-lo.
Dorian e Barbie falam em espanhol atrás de mim em nosso caminho
para encontrar o resto da equipe, e mesmo que eu entenda apenas
algumas palavras aqui e ali – principalmente as ruins – tenho a sensação
de que eles estão tirando sarro das reações um do outro. Eles não
notaram o aperto mortal de Cauler, e ele parece pronto para fingir que
isso nunca aconteceu.

CHEGO AO TREINADOR Hein no saguão do hotel com o chapéu cheio de


papéis e pego um.
Qualquer um menos Cauler.
Por favor, pelo amor de Deus, qualquer um menos Cauler.
Eu até consideraria o ronco de Colie pelo constrangimento de dividir
um quarto com Jaysen Caulfield.
Eu desdobro o pequeno pedaço de papel, e escrito na caligrafia do
treinador Hein está Caulfield.
Por que o universo me odeia?
Um dos assistentes técnicos me entrega a chave do quarto e eu olho
para Cauler que já olhando para mim. Calor ansioso sobe pela minha
espinha e eu inclino minha cabeça em direção ao elevador, mostrando-
lhe o papel antes de enfiá-lo no meu bolso.
Eu posso sentir sua presença nas minhas costas. Ouvi-lo respirar ao
meu lado no elevador para o quarto andar. Meu coração palpita quando
destranco nossa porta.
Entrar em um quarto de hotel com ele é como cruzar um território
desconhecido, e estou sendo absolutamente ridículo. Já compartilhei
quartos de hotel, até mesmo camas com muitos companheiros de equipe
antes. Não há absolutamente nada de diferente ou especial nisso.
Eu preciso esticar minhas costas, fazê-la estalar ou algo assim, e
relaxar o suficiente para adormecer, então estarei pronto para o jogo de
amanhã. Mas não posso fazer nenhuma dessas coisas quando estou tão
consciente dos movimentos de Cauler pelo quarto.
Até ele parece tenso, praticamente na ponta dos pés enquanto se
prepara para dormir. Como se ele estivesse tentando não chamar minha
atenção. O que é estranho porque geralmente ele preenche todos os
espaços que ocupa como se fosse seu dono. Não funciona de qualquer
maneira, porque ele tem toda a minha atenção, mesmo se eu mantiver
minha cabeça baixa enquanto pego minha escova de dentes da minha
mochila.
Eu tenho que passar por ele no meu caminho para o banheiro, nossos
peitos a centímetros de distância, nós dois prendendo a respiração e nos
afastando com nossas cabeças viradas. Eu escovo meus dentes
lentamente, olhando para a porta a cada poucos segundos. Como se ele
fosse entrar aqui a qualquer momento e me empurrar para cima do
balcão e dar uns amassos comigo e com minha boca cheia de pasta de
dente.
Meu rosto queima e meu estômago se revira só de pensar nisso.
Jogo água fria no rosto até meu coração voltar ao normal e meu
estômago se acalmar, depois volto para o quarto com os olhos no chão.
Eu espero que ele entre no banheiro antes de tirar minha camisa e vestir
shorts de ginástica. Estou na cama com meu laptop aberto, fingindo ler
para uma tarefa, quando ele sai.
Deus, esta é a estadia de hotel mais desconfortável de todos os
tempos, e uma vez eu tive que ficar com um colega de equipe do NTDP
uma noite depois de ficar com sua irmã gêmea.
Cauler se acomoda em sua cama e abre seu próprio laptop, colocando
os fones de ouvido sem dizer uma palavra para mim. Ainda assim, o
silêncio estranhamente tenso é melhor do que o banho de sangue que
teria sido se tivéssemos ficado juntos algumas semanas atrás.
Sentar debruçado sobre o meu computador não ajuda a rigidez nas
minhas costas. Eu o coloco no meu colo e me inclino contra a cabeceira
da cama, mas não é muito melhor. Estou com meu corpo muito tenso
desde aquela colisão no gelo e sei que não há nada de errado com isso,
mas se eu não estalar minha coluna nos próximos cinco segundos, vou
enlouquecer.
Eu deixo meu laptop de lado, sento ereto e torço, usando minhas
mãos em meus quadris para me puxar mais longe. Não funciona. Então
eu empurro meus punhos na parte inferior das minhas costas e arqueio.
Nada ainda. Sinto que tenho oitenta anos.
— Precisa de ajuda?
Eu congelo com minhas costas arqueadas e meu rosto tenso, certo de
que estou ouvindo coisas. Mas quando eu relaxo e olho para Cauler, ele
está olhando para mim. Eu pisco.
— Huh?
— Passei tempo suficiente no quiroprático para aprender alguns
truques — diz ele.
Eu meio que... olho para ele por um segundo. O que, ele está
planejando quebrar minhas costas ou algo assim? Me tirar do draft em
execução?
Ele levanta uma sobrancelha.
— Ok? — Eu digo.
Cauler afasta seu laptop e se desembaraça dos cobertores, apontando
para o chão entre nossas camas.
— Deita.
Eu saio da cama lentamente, minha frequência cardíaca acelerando
como se algo muito mais monumental do que ter minhas costas
quebradas estivesse prestes a acontecer. Limpo as mãos no short e
engulo em seco antes de deitar de bruços no tapete áspero, cruzando os
braços sob a cabeça e enterrando o rosto neles para que ele não possa
ver o rubor em minhas bochechas.
— Abaixe os braços.
Merda. OK. Eu estico meus braços ao meu lado e coloco o lado do
meu rosto no chão. Eu mantenho meus olhos abertos. Isso é estranho?
Seria mais estranho fechá-los? Deus, eu espero que eu não tenha
nenhuma espinha nas costas nascendo.
Prendo a respiração ao primeiro toque de suas mãos na minha pele.
Ele esfrega círculos entre minhas omoplatas com as palmas de suas
mãos, então empurra para baixo. Toda a metade superior da minha
coluna estala como plástico-bolha. Eu fecho meus olhos e gemo.
Meus olhos se abrem.
Cauler hesita.
Me mate agora.
Mas então ele move as mãos e faz o mesmo na parte inferior das
minhas costas. Eu consigo segurar o gemido neste momento. Parece que
seus dedos permanecem na minha pele por um momento antes de ele se
levantar, mas isso é definitivamente minha imaginação.
— Melhorou? — ele pergunta enquanto eu me coloco de joelhos.
Eu me estico, sentindo os alfinetes e agulhas na minha espinha
desaparecerem no mesmo momento.
— Sim. — Minha voz está tensa. — Obrigado.
Eu me levanto, mas ele não volta para a cama. Nós nos encaramos,
espremidos em um espaço da largura de uma mesa de cabeceira pelo que
parecem minutos, mas é provavelmente apenas um segundo e meio
antes de Cauler limpar a garganta.
— Eu, uh… — Ele coça a mandíbula. — Estou roubando a Netflix do
meu irmão. Eu ia dormir assistindo o Homem-Aranha se você quiser… —
Ele para e evita olhar para mim.
Eu engulo novamente. O que está acontecendo agora?
— Versão de Tom Holland?
Ele revira os olhos, sorrindo.
— Existem outras?
Eu me acomodo na beirada de seu colchão e mantenho meus braços
cruzados, pernas penduradas para que eu não esteja totalmente na cama
com ele. Ele desconecta seus fones de ouvido para que o som seja
reproduzido em seu laptop e o configura entre nós. Ele realmente se
deita na cama, embaixo dos cobertores e tudo mais.
— Você precisa da tela inclinada? — ele pergunta.
— Não — eu digo, mesmo que o filme esteja sombreado quando ele
aperta PLAY. Eu realmente deveria ir para minha própria cama. Isso não
é confortável, provavelmente está desfazendo todo o trabalho que ele fez
nas minhas costas, e é simplesmente estranho.
— Você pode deitar na cama — diz ele depois de alguns minutos. —
É grande o suficiente.
Eu hesito por um segundo antes de lentamente puxar minhas pernas
para cima, mantendo-as afastadas dele. Braços ainda cruzados e minhas
costas retas contra a cabeceira da cama. Eu nem estou prestando atenção
no filme, na verdade. Eu já vi isso tantas vezes, eu provavelmente poderia
representar a coisa toda sozinho. Estou prestando muito mais atenção
em Cauler, com um de seus braços atrás da cabeça e a outra mão apoiada
no peito.
É por isso que vejo quando Zero lhe envia uma selfie no espelho em
um roupão de banho branco e chinelos, uma toalha em volta da cabeça e
o pé apoiado na borda da banheira, fazendo um sinal de paz ao contrário.
Cauler está sorrindo enquanto digita algo de volta.
— Não sabia que você e Zero eram tão próximos — eu deixo escapar.
Ele não para de digitar, imperturbável pela minha bisbilhotice.
— Isso é porque você não presta atenção em nada além de si mesmo
— diz ele, mas não há calor em sua voz.
— Porquê? Ele é um veterano.
Ele bloqueia o telefone e o coloca em seu peito.
— O pai dele treinou minha equipe de squirt. Me ensinou a andar de
patins.
É claro. Ambos são de Boston. Ambos têm um leve sotaque da Nova
Inglaterra depois de anos jogando hóquei longe de suas cidades natais.
Odeio ser lembrado de que ele nem amarrou um par de patins até os
nove anos de idade. Que ele joga hóquei há menos de nove anos e é tão
bom quanto eu. Talvez ainda melhor.
Eu não sei se é ódio ou ciúme ou um pouco de ambos arranhando
meu peito, mas eu faço o meu melhor para enterrá-lo.
— Você veio aqui por causa dele? — Eu pergunto, me forçando a não
desligar enquanto estamos progredindo na tolerância.
Há uma longa batida de silêncio entre nós. Sua respiração soa
superficial. Na tela, o Homem-Aranha de Tom Holland está fazendo um
discurso constrangedor no abrigo de sua tia.
Por um segundo, tenho medo de ter cruzado algum tipo de linha e
Cauler não dizer mais nada pelo resto da noite.
Ele engole em seco, como se estivesse se preparando para algo.
— Eu superei meu crush há muito tempo, se é isso que você está
perguntando — diz ele baixinho. Ele segura a voz no fundo da garganta
enquanto acrescenta: — Sr. Cícero é como meu segundo pai. Quando eu
disse a ele que fui observado por Hartland, ele basicamente escreveu
uma tese sobre por que eu deveria vir aqui. A razão número um era Zero.
O Sr. Cícero achou que seria mais fácil se estivéssemos no mesmo time
para que ele não tivesse que viajar por todo o lugar para nos ver jogar.
Eu ouço suas palavras, mas meu cérebro continua em curto-circuito,
repetindo a primeira frase repetidamente. Crush. Cauler tinha uma
queda por Zero. Quer dizer, pode não ser nada. Garotas heterossexuais
têm suas paixões; como é que um cara hétero não pode ter uma paixão
por um cara?
Cauler acabou de falar, mas não tenho nada a dizer em resposta. Olho
para a tela do computador sem realmente vê-la. Estou pensando demais
nisso. Cauler é meu inimigo jurado e nunca me revelaria algo que
pudesse prejudicar suas chances de tirar meu lugar.
Esse silêncio constrangedor cresce entre nós, a ponto de eu chorar
de alívio quando meu telefone vibra no bolso do meu short. É uma
notificação sobre a foto que enviei para a Nova horas atrás. Abro minhas
mensagens com ela e digo:
Mickey: Você realmente fez uma captura de tela
Nova: EColírio para os olhos
Mickey: Eu poderia
Você sabe
Dar a ele seu número
Ele é muito parecido comigo embora eu sinta como
Apenas muito mais alto
E um pouco menos rabugento
Nova: Você percebe que eu te amo certo?
Então ser como você não é necessariamente um desligamento
Mas sim por favor
Me dê o número dele
Estou enviando o número de Barbie quando Cauler diz:
— Não acredito que você está trocando mensagens de texto com
Nova Vinter.
Eu franzo a testa para o meu telefone. Não vou explicar minha
história com Nova novamente. Em vez disso, eu falo para ele.
— O que, você não é amigo de nenhuma de suas ex?
— Isso não foi o que eu quis dizer. Mas sim, eu sou.
— Então o que você quis dizer?
— Ela é famosa.
— Sabe, algumas pessoas diriam o mesmo sobre nós, certo?
Cauler faz uma careta.
— O hóquei não é popular o suficiente para nos considerar famosos.
— Famosos entre os fãs de hóquei.
— Não conta.
Reviro os olhos e volto a enviar mensagens para Nova. Ela está na
Austrália por uma semana, no local para um programa em que ela é
estrela convidada. Eu meio que entendo por que as pessoas ficam
surpresas com nossa amizade. Quero dizer, ela está fora do meu alcance.
Mas eu a vi em todos os seus piores e mais embaraçosos momentos.
Compartilhamos todas as nossas estreias juntos. Eu estava lá quando ela
recebeu a ligação que ela conseguiu a divulgação que a levou onde ela
está agora. Ela quase me estrangulou até a morte com a força com que
me abraçou.
Eu sinto falta dela. Deus, eu sinto falta dela.
— Ele pode vir nos visitar nas férias de primavera — diz Cauler.
— Hum?
— Meu ex eu ainda sou amigo.
Paro no meio da minha mensagem para Nova. Eu ouvi isso certo?
Quer dizer, eu não estava prestando atenção, mas tenho certeza que ele
disse ele.
Ele está, tipo, tentando se assumir para mim agora?
Não tem jeito.
Viro a cabeça e olho para ele. Ele apenas levanta uma sobrancelha e
espera que eu quebre o silêncio. Eu fecho minha boca e engulo,
mantendo contato visual com ele por mais tempo do que nunca.
— Você é…
— Eu sou o quê, Mickey?
O som do meu nome em sua voz é quase o suficiente para me fazer
pular nele aqui. É a primeira vez que o ouço dizer meu primeiro nome, e
ele faz parecer áspero, sedutor, enfurecedor.
— Você é gay? — Eu respiro. Parece errado perguntar tão sem
rodeios. Mas tenho certeza que ele quer que eu pergunte. Ele está
liderando essa conversa aqui desde o início.
Seus olhos percorrem meu rosto, hesitando sobre meus lábios antes
de encontrar meu olhar novamente.
— O que você faria se eu dissesse sim?
Sem chance.
De jeito nenhum ele me daria esse tipo de munição contra ele. De
jeito nenhum ele iria olhar para mim assim. Como se eu me inclinasse um
pouco, ele me beijaria.
Quando eu já dei a ele a impressão de que eu estaria nisso de
qualquer maneira? Quer dizer, eu sou óbvio, mas eu sou tão óbvio?
Não olhe para os lábios dele. Pelo amor de Deus, Mickey, não olhe
para os lábios dele.
Eu olho para seus lábios, ligeiramente separados, apenas esperando
por mim.
Eu mordo meu próprio lábio e olho de volta para seus olhos. Ele
ainda está me observando, esperando por uma resposta. Imagino me
permitir isso. Alguém no hóquei que realmente me conhece.
Alguém com quem eu possa me divertir entre correr mal para este
esporte.
Mas. O hóquei não é o ambiente mais acolhedor para pessoas que
não são héteros brancos. Eu pelo menos tenho uma dessas coisas me
protegendo. Cauler não tem nenhum.
Seria uma má ideia para nós dois.
Eu limpo minha garganta e olho para longe, de volta para Tom
Holland e Zendaya, o sonho de um bissexual. Eu quase posso ouvir a
tensão entre nós estalar.
— Quero dizer — eu digo. Minha voz soa muito alta. — Eu não seria
estranho sobre isso, se é isso que você está perguntando. Minha irmã é
gay e os namorados de Bailey são bi.
Não vejo sua decepção, mas ouço no jeito que ele suspira, curto e
suave como se estivesse tentando esconder.
— Eu sei — diz ele. — Por que você acha que eu me senti seguro em
contar a você?
É mentira. Pode ser parte do motivo, mas não é tudo.
Jaysen Caulfield gosta de mim. Talvez tanto quanto eu goste dele.
Quem teria pensado?

É PERIGOSO me deixar adormecer na mesma cama que ele, mas eu faço.


Ficamos acordados até tarde, falando sobre Nova e sua ex Jisung e como
é continuar amigos depois de terminar.
Eu acordo de frente para ele, o laptop aberto entre nós, tela escura.
Eu verifico meu telefone para ver que é pouco depois das cinco da
manhã, ainda falta uma hora para dormir. Mas não vou conseguir voltar a
dormir agora. Não neste quarto, nesta cama, ao lado dele.
Me deixo olhar para ele por um momento, do jeito que ele não se
moveu, exceto para virar o rosto na minha direção. Uma mão ainda na
barriga, a outra atrás da cabeça, provavelmente dormente agora.
Eu poderia tê-lo beijado ontem à noite. Eu deveria tê-lo beijado
ontem à noite.
Com um suspiro, saio da cama para usar o banheiro e levo meu
laptop para a mesinha perto da janela.
É hora do jantar ou algo assim na Austrália. Nova tem que ouvir
sobre isso.
Mickey: Ei, então problema
Nova: Ai menino
Deixe-me colocar meus óculos de terapeuta
E aí
Mickey: Ok então
Cauler
Jaysen
Lembra dele
Certo
Ele está tipo
Totalmente na minha
Ela começa a digitar e para algumas vezes antes que uma mensagem
finalmente chegue.
Nova: Desculpe, mas não estou conseguindo ver o problema aqui?
Ele tá na sua
Você tá na dele
Então faça a coisa
Mickey: Nova
Você percebe que ele é um jogador de hóquei
E tipo
MEU MAIOR CONCORRENTE OLÁ
Nova: Ainda não vejo o problema.
Mickey.
Quantas vezes eu tenho que te dizer
Deixe-se ter algo que não é sobre hóquei
Mickey: Seria mais fácil se o que eu quisesse
não fosse uma pessoa que poderia estragar tudo
Nova: Você está sendo dramático
Mickey: Você está subestimando o poder dos homofóbicos
Não é que eu ache que Cauler me tiraria do armário. Isso o colocaria
na mesma posição que eu. Mas as pessoas têm uma maneira de descobrir
essas coisas. Quero dizer, olhe para Bailey e Delilah. A notícia sobre elas
se espalhou por causa de idiotas que postaram seus negócios online.
Meu telefone vibra na mesa e, um momento depois, a foto de Nova
aparece em uma chamada de vídeo. Olho para Cauler, ainda dormindo, e
vou para o banheiro.
Nova está de óculos escuros e maiô quando atendo. Ouço o fraco
bater das ondas ao fundo e o som de pessoas rindo.
Ela está em uma praia na Austrália, e estou instantaneamente com
ciúmes.
— Vou precisar que você faça algo por mim, Mickey — ela diz antes
que eu tenha a chance de dizer oi.
— Ok? — Eu digo.
— Pense na sua felicidade, por um segundo. O que te faria feliz neste
exato momento? Não pense nas consequências ou no que poderia dar
errado. Basta pensar no que você quer.
— Quero dizer, não é como se eu estivesse infeliz agora.
— Mas você também não está feliz.
— Eu nunca estou feliz, Nova — eu digo. Eu cutuco os hematomas
sob meus olhos no espelho, evidência física permanente dos anos
passados acordados à noite, olhando para as paredes, o teto, o interior
das minhas pálpebras.
Quando está muito ruim, juro que pareço um cadáver. E as pessoas
ainda não percebem o que está acontecendo. Acho que não posso culpá-
las. Às vezes eu até sento lá e digo a mim mesmo que sou privilegiado
demais para estar deprimido e que preciso engolir isso.
Nova ajusta seus óculos escuros, ombros caídos quando ela se inclina
sobre o telefone e olha para mim.
— O que ajudaria você a chegar lá? Não precisa ser algo enorme, não
precisa curar você da sua depressão aqui e agora. Apenas, o que tornaria
mais fácil de lidar?
No quarto, o alarme de Cauler dispara. Olho para a porta.
— Tipo, eu ficaria completamente tonta se você estivesse aqui nesta
praia comigo — acrescenta Nova. — Ou se eu tivesse uma amora
silvestre em uma mão e uma tampa gelada de Tim Horton na outra.
Podem ser pequenas coisas assim.
Nova é iluminada pelo sol, sua pele pálida ficando rosa. Risadas
surgem ao fundo, e ela olha para cima por um segundo antes de olhar de
volta para mim. Eu ficaria feliz se estivesse naquela praia com ela
também.
Eu ficaria feliz em estar no gelo sem o peso da corrente de ar
pairando sobre mim.
Eu ficaria feliz em sair para almoçar com todas as minhas cinco
irmãs.
Eu ficaria feliz em tirar um A em uma aula que não seja italiano neste
semestre.
O fato de eu poder pensar em coisas que ajudariam é um bom sinal,
certo? Se eu fosse uma causa perdida, nada viria à mente.
Eu abro minha boca para dizer isso, mas antes que eu possa, há uma
batida na porta.
— Terzo? — Cauler diz, com a voz sonolenta. — Você está
terminando?
— Só um segundo — eu respondo rápido demais, desconfiado.
Nova coloca a mão sobre a boca por um segundo antes de acenar
animadamente e murmurar é ele? Eu aceno, e ela salta sobre os
calcanhares, sorrindo largamente.
— Eu vou deixar você ir — diz ela baixinho. Ela me manda um beijo e
a ligação termina.
Eu suspiro, dando outra olhada no espelho em meus olhos cansados
antes de deixar o banheiro para Cauler. Estou me vestindo para o café da
manhã quando Nova me manda uma mensagem novamente.
Nova: Eu quero que você faça uma coisa por si mesmo hoje
Prometa-me
Temos o último jogo deste roadie hoje, depois voltamos para casa em
um avião hoje à noite. Amanhã, estaremos de volta às aulas, onde as
provas intermediárias estão chegando rapidamente.
Mas hoje, acho que consigo.
Mickey: Eu prometo.
CAULER E EU trabalhamos muito bem juntos.
Mesmo com nossas posições trocadas, nos entrelaçamos e trocamos
de lugar e sabemos exatamente onde o outro está sem planejar com
antecedência e mal nos falando. Zero se adapta a nós facilmente, mas os
oponentes não conseguem acompanhar.
Eu honestamente odiaria jogar contra nós.
Ainda assim, o jogo é apertado, e eu tenho minha promessa para
Nova presa na minha cabeça o tempo todo. Estou pensando nisso quando
sou golpeado contra as boards com força suficiente para meus ossos
doerem. Estou pensando nisso quando contornei um defensor e dou um
chute no cano.
Fazer uma coisa por mim hoje.
Ainda estou pensando nisso quando Kovy marca. Quando ele e os
outros meninos no gelo patinam para bater os punhos contra os nossos
no banco. Estou muito ocupado pensando para sequer sorrir.
Quando eu era criança, eu estava sempre sorrindo no rinque. Não
importa o que eu estivesse fazendo, estar no gelo me fazia a criança mais
feliz do mundo. Foi divertido. Isso me fez gostar do papai.
Talvez seja isso que eu possa fazer por mim hoje. Divertir-me no gelo
novamente. Não tratar isso como um trabalho ou um direito de nascença.
Divirtir-me no gelo com os primeiros amigos que fiz em anos.
A próxima vez que minha linha passa por cima das boards, eu me
jogo na peça com o tipo de intensidade febril com a qual eu costumava
brincar no lago com minhas irmãs quando éramos crianças. Como se
fosse novo e excitante e eu ainda não sabia o que significava ser um
Mickey James.
Eu rio quando tiro o disco de um cara como um batedor de carteiras
e ele dá dois passos antes de perceber que o disco se foi. Eu sorrio
quando Cauler me oferece um soco depois. Sorrio e suporto quando
bloqueio um tiro com o tornozelo que me deixa mancando pelo resto do
turno. Chamo meus companheiros de equipe no gelo e grito de
encorajamento do banco. O treinador me dá um tapinha no ombro depois
de um turno enquanto estou jogando água no meu rosto e me chacoalha
um pouco, gritando no meu ouvido:
— Ótimo trabalho, James!
Isso é bom. Não é perfeito – eu arranco uma segunda foto do poste e
tenho que fechar os olhos e respirar para não me repreender
internamente – mas é alguma coisa.
— Tornando-se um homem do povo, Sua Graça? — Cauler me
pergunta enquanto patinamos até o ponto de confronto depois de um
apito. Ele sorri.
Eu dou de ombros.
— Passe bastante tempo com os camponeses, eles começam a passar
para você.
Seu sorriso se abre em um sorriso completo, covinhas em ambas as
bochechas, olhos enrugados.
— Seu merdinha.
Estou levando o disco para a zona ofensiva no final do segundo
turno, e sei que Cauler está logo atrás de mim. Um defensor entra no meu
caminho, e eu ajo como se fosse tentar contorná-lo, mas em vez disso
deixo o disco para trás. Um segundo depois, há o estalo do cronômetro
de Cauler. O defensor que eu enganei grita — Merda! — quando o disco
atinge o fundo da rede.
Não é meu objetivo, e Cauler é meu inimigo jurado. Mas foi uma bela
assistência, e não terei medo de reconhecer meu bom trabalho hoje. Vou
ter uma crise amanhã. Por enquanto, eu me viro para onde Cauler
levantou os braços, assim como Zero e nossos blueliners se aproximam
dele para abraços e tapinhas no capacete. Normalmente eu apenas
ofereço socos depois dos gols. Eu nunca fui um abraçador no hóquei.
Agora? Agora eu me jogo nele. Eu pulo para colocar meus braços ao
redor dos ombros de Zero e Cauler, puxando-os para o meu nível
enquanto meus patins atingem o gelo novamente.
— Que diabos? — Zero diz, rindo. — Bom garoto, Terzo!
Cauler não diz nada. Mas ele sorri. E, oh, eu estou tão fodido.
Seu sorriso nunca foi mais bonito do que agora. Tímido. E genuíno. E
pelo menos em parte por minha causa.
NOVE
Tenho me sentido bem ultimamente. Cauler e eu não estamos mais na
garganta um do outro. No máximo, estamos circulando um ao redor do
outro, esperando para ver quem dará o primeiro passo.
Como é a minha vida, certo?
A temporada começou muito bem, 2-0, e estou acompanhando
Delilah em pontos e tentando muito me divertir. Nem sempre funciona.
Mas pelo menos não sou um robô no gelo o tempo todo.
As coisas têm sido boas.
O que, claro, significa que o universo tem que puxar o tapete debaixo
de mim.
Estou com os pés em cima da cadeira na sala de fitas, capuz sobre a
cabeça, Dorian sentado à minha esquerda, e estou contente.
Kovy está falando sobre um ataque esquisito no arsenal do nosso
próximo oponente quando meu telefone vibra no meu bolso. Eu o pego,
mantendo meu foco em Kovy até que eu possa verificar a notificação.
Há um tweet marcado da NHL Network.
Eu deslizo a notificação sem lê-la e rebloqueio meu telefone assim
que um dos caras diz:
— Ei, olhe para nossos superstars! — Ele aponta para a TV sem som
atrás dos capitães. Há uma cena de ação minha com meu equipamento
dos EUA em frente a uma de Cauler quando ele jogava pelos Gamblers.
Abaixo de nós está um gráfico comparando nossas estatísticas USHL.
Quando ela desaparece, ela é substituída por dois analistas da NHL
Network, Hugh e Alyssa, parados na frente de fotos ampliadas de tela
verde minhas e de Cauler.
Alguém me mate.
Alguém liga a TV no meio com Hugh dizendo:
—... situação única com os dois principais prospectos dividindo um
time universitário. Estou curioso para saber como você acha que isso
afetará o resultado do draft, se for o caso, Alyssa.
A coisa sobre Alyssa? Ela nunca foi influenciada por todo o legado de
Mickey James. É por isso que ela é minha analista favorita no hóquei. Ela
estava em um segmento sobre o futuro do Hóquei nos EUA uma vez,
falando sobre os talentos mais empolgantes alinhados para os próximos
jogos de inverno, e ela é a única que deu a Delilah o hype que ela merece
enquanto todos se concentravam no time masculino.
Então eu sei que ela vai me destruir. Eu só queria que não tivesse que
ser na frente dos Royals.
— Honestamente, Hugh? — ela diz. Eu me preparo. — Acho que
veremos o valor de Jaysen ultrapassar o de Mickey no final.
— Realmente agora? — Hugh ergue as sobrancelhas, fingindo
surpresa. Como se isso não fosse tudo planejado com antecedência. —
Por que você diz isso?
— Não é nenhum segredo que Mickey esteve… distante de suas
equipes no passado.
Meu coração cai direto no meu estômago e instantaneamente começa
a se dissolver. Então é por aí que ela está indo com isso.
— Todo mundo sempre deu a ele o benefício da dúvida — ela
continua —, culparam a dinâmica da equipe. Agora que ele está dividindo
um time com Caulfield, os mesmos jogadores, a mesma dinâmica, não há
desculpas a serem feitas. Ficará claro que é uma questão de
personalidade.
Sinto meu peito afundar, sugado pela abertura do buraco negro onde
meu coração estava apenas alguns segundos atrás.
— Severa — diz Dorian. Eu esperaria muita zoação dos caras depois
de um comentário como esse, mas eles estão quietos, focados na TV.
— Esse é um ponto muito bom — diz Hugh enquanto a tela faz a
transição para a filmagem do jogo. — Eles têm estatísticas muito
semelhantes. Mickey tem uma leve vantagem, mas ele não parece ser um
jogador de equipe.
— Jogadores com sua habilidade geralmente são vistos como líderes
de equipe, mas não Mickey — diz Alyssa. Bem na hora, um clipe é
reproduzido onde meu companheiro de linha marca um gol, e enquanto
o resto dos jogadores no gelo se reúnem para o celly, eu patino passando
por eles até o banco sem abrir o menor indício de um sorriso.
Eu lembro desse jogo. Foi no meio de um trecho de três semanas em
que passei cada momento do tempo livre deitado na cama, olhando para
a parede. Não comi nada além de sopa enlatada e pão com manteiga,
falhei em dois testes importantes porque nem apareci, quase fui
internado por minha família de alojamento e não senti absolutamente
nada o tempo todo.
Naquele momento, mal se registrou que um gol foi marcado.
Eles tinham que escolher esse, não é? Toda vez penso naquelas três
semanas, posso sentir aquele vazio se abrindo dentro de mim
novamente.
Na TV, ele muda para Cauler agrupado com seu time comemorando
uma vitória, seus companheiros de equipe olhando para ele em busca de
orientação durante uma interrupção do jogo. O C de capitão em sua
camisa Gamblers com apenas dezessete anos. Tudo isso enquanto Alyssa
e Hugh falam sobre suas habilidades de liderança e sua paixão geral pelo
jogo e como isso o torna muito mais valioso do que eu a longo prazo. Eu
assisto a coisa toda sem piscar, até meus olhos ficarem embaçados e eu
ter que fechá-los.
Os caras começam agora, e mesmo sabendo que há gritos e risos e
todos falando uns com os outros, tudo é abafado pelo som da minha
própria respiração, áspera e instável.
Eu abaixo minha cabeça e pressiono meus dedos em minhas
têmporas.
É tão óbvio. Eu sou tão óbvio. Por que ninguém pode ver o que
realmente está acontecendo? Eu amo hóquei. Eu amo. Juro. Meu cérebro
simplesmente não me deixa mostrar ou sentir ou... ou...
— Você está bem, cara? — A voz abafada de Dorian corta minha
névoa, me fazendo estremecer. Ele se virou para mim, inclinando-se para
perto. A TV está muda novamente, e Zero e Kovy chamaram a atenção de
todos, mas eu noto os olhares de lado que os meninos continuam
atirando em minha direção.
— Se estou bem? — Minha língua parece lenta. Como se levasse um
minuto inteiro para dizer três palavras.
— Quero dizer, eu não te culparia se você não estiver. Não é fácil
ouvir um par de adultos rasgando sua personalidade.
Eu pisco para ele. Ele começa a se mexer quando eu não digo nada,
apenas olhando para ele sem expressão.
— Não é como se eles estivessem errados — eu digo, tentando tornar
menos embaraçoso para ele. A julgar pela forma como sua mandíbula
afrouxa, não funcionou.
Meu telefone vibra novamente. Dorian olha para baixo antes de mim,
os olhos se arregalando e um sorriso se abrindo naquele olhar triste que
ele estava me dando.
— Seu pai está ligando — diz ele, todo tonto e chocado.
Meu cérebro parece confuso.
O telefone toca mais duas vezes antes de eu me levantar lentamente
e atender a chamada ao sair da sala de fitas. Ninguém tenta me impedir.
— Oi. — Minha voz está a quilômetros de distância. Eu saio para o
corredor onde todos os ex-alunos do Royals que já fizeram alguma coisa
na NHL ou nas Olimpíadas são homenageados. Incluindo murais enormes
de papai e vovô quando adolescentes.
— Ei, Mick! — Papai diz. — Como vão as coisas? Como está a equipe?
— Bem.
— Bem?
— Sim.
Uma longa pausa.
— Dê-me alguns detalhes, amigo — diz ele. — Fale-me sobre as
práticas. Você está animado para a estreia da sua casa neste fim de
semana?
— Certo.
Outra pausa.
— Como você está se adaptando à ala? — Sua voz está tensa como se
ele estivesse tentando desesperadamente manter a conversa.
— Ok.
— O treinador Campbell conhece o jogo. Ele não colocaria você em
um papel que ele não achasse que você poderia se destacar.
— Eu sei.
— Sua mãe e eu estamos planejando sair para um jogo no próximo
mês.
— Oh — eu digo, um pouco mais de vida entrando em minha voz. Eu
bato a mão na minha testa e a arrasto pelo meu rosto. Mamãe e papai
costumam ir a pelo menos um jogo por temporada. Você pensaria que
sendo atletas aposentados eles teriam tempo livre para fazer mais do
que isso. Mas eles assumiram o treinamento de jovens. Tento não deixar
isso me incomodar, mas foi papai quem me ensinou a andar em patins.
Como colocar meu equipamento. Como segurar um taco. E agora ele está
ocupado demais para estar lá para ver no que deu seu trabalho. Depois
do papai, tive meus próprios treinadores de jovens, e quando eu tinha
dez anos, ele nem morava mais no mesmo estado que eu.
Ele está passando mais tempo com essas crianças agora do que ele já
passou comigo.
Ainda assim, a perspectiva de eles virem me ver jogar me faz sentir
como uma criança novamente, ansioso para impressionar meus pais,
desesperado para que eles me vejam bem.
— Ok — eu digo.
— Alguma coisa que você queira falar? — ele pergunta.
Penso em Hugh e Alyssa analisando minha atitude como analisam
uma jogada. Como Cauler disse que estou ocupando espaço e dinheiro e
exposição que não preciso. Como a porcaria do Hockey News tratou
minhas irmãs como contratempos e a mim como destino.
— Não — eu digo.
— Ok, amigo, bem, me ligue se precisar, certo? Boa sorte neste fim de
semana. Eu te amo.
— Amo você também.
Minhas pernas me levam para fora, me levam para o cais, me sentam
na beirada, penduram meus pés sobre a água. Eu deixo cair meu rosto
em minhas mãos e respiro.
O sol está se pondo quando eu saio dele. É como se minha visão
voltasse ao foco. Como se eu tivesse quebrado algum tipo de barreira
dentro da minha própria cabeça.
Eu começo a tremer.
Droga. Eu estava indo tão bem ultimamente, também.
Minhas pernas estão pesadas quando me coloco em pé. Esfrego
minhas coxas para recuperar um pouco de vida e aqueço minhas mãos.
Eu passo as costas da minha mão sob o nariz antes de ir para o
dormitório.

ENTÃO AQUI ESTÁ UMA coisa que acontece quando minha depressão
fica especialmente ruim.
Eu começo a dissociar.
Escrevo meu nome na minha aula de álgebra na quarta-feira de
manhã, e as letras não fazem sentido. Tipo, como essa bagunça de linhas
inventadas soletra uma palavra que representa toda a minha existência?
Passo a hora inteira olhando para o meu nome e tentando me ver
nele.
Delilah esbarra em mim quando se levanta e me dá um olhar por
cima do ombro enquanto se dirige para a frente da sala com sua mochila
e teste. Jade está esperando por ela na porta, e a sala está quase vazia.
O pânico surge no meu peito quando olho para o meu papel em
branco.
— Merda, merda, merda — eu digo baixinho, lutando para fazer algo.
Eu só respondo duas equações, provavelmente nem mesmo certas, antes
que a professora Morris dê tempo. Eu coloco meu rosto em minhas mãos
e respiro fundo.
Alguém me mate.
Há mais duas pessoas na sala e, claro, uma delas é Cauler. Ele coloca
seu teste na mesa e olha para mim. Meus olhos estão pesados com a
sensação suja de lágrimas não derramadas e falta de sono.
Ainda assim, eu consigo segurar seu olhar. Ele inclina a cabeça e dá
um olhar curioso e de olhos estreitos para o papel apertado em meu
punho.
— Vou levar isso, Sr. James — diz a professora Morris.
Meu coração dá uma guinada. Eu dou a Cauler mais um olhar como se
preocupe com seus malditos negócios e me viro para encarar meu
primeiro F do semestre.
— Então, uh… — eu começo uma vez que Cauler está quase fora da
porta.
— Eu notei um monte de olhares — diz a professora Morris quando
eu não continuo. — Não há muita escrita.
— Sim, eu… — Olho para todo o espaço em branco na minha prova.
— Eu tenho essa... essa coisa do cérebro. Acontecendo. Eu acho.
— Que tipo de coisa do cérebro?
Eu não posso encontrar seus olhos. Ela não parece brava ou irritada
nem nada. Mais como preocupada. Não é algo que eu esteja acostumado.
— Eu não estou tentando forçar — ela acrescenta. Ela se inclina para
frente e cruza os braços sobre a mesa. — Você está bem?
Há um nó na minha garganta. Como ter essa pessoa com quem nunca
falei se importando o suficiente para perguntar se estou bem me deixa
todo emocionado. Eu deveria mentir. Eu mal posso falar sobre isso com
Nova, e eu a amo. No segundo que eu digo a uma pessoa de autoridade
com o que estou lidando, eles estarão me checando o tempo todo e eu
nunca conhecerei a paz.
— Quero dizer. — Minha próxima respiração é aquosa. Eu olho para
os meus sapatos para que ela não possa ver meus olhos lacrimejarem.
Como se ela não pudesse ouvir na minha voz. — De verdade?
— Você esteve no centro de aconselhamento?
Eu balanço minha cabeça.
— Você deveria considerar isso. O ano de calouro é difícil, e ser atleta
só torna mais difícil.
Eu dou de ombros.
— Não há nada de vergonhoso em procurar ajuda. Você também
pode deixar seus outros professores saberem que você está com
dificuldades e eles devem trabalhar para acomodá-lo melhor. Nós somos
seus professores. Estamos do seu lado.
— Ok.
Ela estende a mão para o meu teste. Hesito por um segundo antes de
passar. Ela nem olha para isso. Basta dobrá-lo ao meio e rasgá-lo.
— Meu horário de expediente na segunda-feira é das onze às uma e
das quatro às seis. Qualquer um desses momentos funciona para você?
— Onze, eu acho.
— Por que você não passa por aqui e faz seu teste então. Vou me
certificar de que você mantenha o foco. Parece bom?
Eu fico boquiaberta para ela por um momento antes de gaguejar:
— Uh, sim. Bom. Soa bem. Obrigado.
Ela me dá esse sorriso triste.
— Cuide-se, ok?
— Ok. Obrigado.
Quase tropeço na minha pressa de sair. Eu mantenho minha cabeça
baixa e contorno as pessoas no caminho de volta ao meu quarto,
palpitações no coração me fazendo sentir tonto e enjoado todo o
caminho. Mas pelo menos eu volto para o meu quarto antes de
desmoronar completamente, de costas deslizando contra a porta até que
estou sentado no chão com o rosto nas mãos, soluçando.
Se eu não conseguir passar por um semestre da faculdade, como vou
conseguir na NHL?

PROFESSORA MORRIS ME dá o número do centro de aconselhamento


quando vou refazer meu teste. Até se oferece para me levar até lá, mas
não, obrigado. Eu tenho o número digitado no meu telefone mais tarde
naquela tarde, o polegar pairando sobre o botão de chamada, mas Dorian
e Barbie entram e eu limpo e não tento novamente.
Eu fui de me sentir ótimo, amando o hóquei, amando os caras no gelo
comigo, de sentir que talvez eu ficaria bem, para então me sentir tão mal
quanto eu já me senti em questão de dias. É como se aquele único dia de
contentamento tivesse colocado meu cérebro em modo de
autodestruição porque ele não sabia o que estava acontecendo.
Talvez seja porque minhas notas são tão limítrofes.
Talvez seja porque eu poderia ter beijado Cauler e, em vez disso, eu o
coloquei na zona da amizade.
Talvez seja porque meus pais estão vindo para um jogo em algumas
semanas.
Era para ser apenas mamãe e papai, mas então eu mencionei isso em
um bate-papo por vídeo em grupo com minhas irmãs mais velhas e elas
decidiram vir. Eu quase chorei. Eu não as vejo há tanto tempo e sinto
muita falta delas e essa coisa toda será muito mais fácil de lidar com elas
aqui.
O jogo está sendo transmitido pela ESPNU. Os olheiros da NHL
analisarão cada segundo do tempo de gelo. Deve ser uma vitória fácil,
mas a pontuação final não importa tanto quanto o meu desempenho.
Cauler está apenas alguns pontos atrás de mim, com melhores
estatísticas defensivas. Não posso me dar ao luxo de um único turno
ruim. Eu tenho que aproveitar todas as chances para melhorar minhas
estatísticas, colocar floreio no meu jogo, ser o superstar que todos
esperam que eu seja.
Fingir que não estou morto por dentro por sessenta minutos.
Isso é apenas um exagero.
Sempre que penso em Alyssa e Hugh, ou na música relacionável de
Dorian ou no rosto de Cauler quando ele disse o que você faria se eu
dissesse sim, fico tão cansado que quero rastejar na cama e não sair por
cinco anos. Não é nem tristeza. É o nada.
O hóquei é a coisa mais importante da minha vida além de minhas
irmãs e Nova, mas quando fica assim, a única coisa que me deixa no gelo
é minha ansiedade, meu medo de fracassar.
Não ajuda quando a professora Morris me puxa de lado depois da
aula um dia e pergunta se eu já entrei em contato com o escritório de
aconselhamento. Tenho certeza de que ela sabe que estou mentindo
quando digo:
— Sim, estou cuidando disso. Obrigado.
Pelo resto da semana, se não estou na aula ou no gelo, fico no meu
telefone lendo sobre depressão e ansiedade e tentando me convencer de
que posso me sentir assim mesmo com todos os privilégios que tenho,
mesmo que nada realmente ruim tenha acontecido comigo.
Eu sobrevivi ao nosso único jogo da semana na sexta-feira. Até
consegui fazer um gol. Mas não é divertido como no Colorado. Sinto-me a
mil quilômetros de distância dos meus companheiros de equipe, mesmo
no meio do nosso amontoado de celly.
Eu tento me forçar a sair disso no sábado, pelo menos por muito
tempo o suficiente para fazer algo em um trabalho que devo entregar na
segunda-feira, mas acabo com a cabeça entre as mãos, cotovelos na mesa,
exausto depois de uma única frase.
Não sei quanto tempo fico sentado assim antes que a porta se abra
para Dorian e Barbie, porque é sempre Dorian e Barbie. Não me lembro
da última vez que os vi separados um do outro, o que não faz sentido com
as aulas de ciências de Dorian e as aulas de idiomas da Barbie em lados
opostos do campus.
— O que você está fazendo? — Dorian pergunta, quase
freneticamente, quando ele olha para mim. Eu provavelmente pareço
patético, chafurdando na minha mesa, sem camisa e em calças de
moletom com livros e papéis por todo o lugar. — Temos que sair!
Eu pisco para ele. Do que ele está falando?
Ele agita as mãos para mim assim, oh espere. Show. Certo. Ele me
convidou para este show. Não me lembro de concordar em ir.
Eu praticamente desinflo na minha cadeira.
— Me mate.
— É divertido! Até Kovy está vindo, e ele gosta de música country.
Country, Terzo.
— Você pode empurrar as pessoas e ninguém fica bravo — Barbie
oferece.
— Eu não sei — murmuro.
— Você não tem escolha — Dorian diz, rapidamente trocando de
roupa. — Você não vai apodrecer nesta sala por toda a eternidade.
Levante-se, vista-se, escove o cabelo. Escove seus malditos dentes. Você
não precisa usar tudo preto. Não somos uma seita.
Eu não quero ir. Mas também não quero fazer esse trabalho, nem
ficar sentado no meu quarto, nem existir, na verdade. Então acho que não
faz diferença. Eu suspiro pesadamente e me empurro para fora da minha
cadeira para procurar jeans na pilha de roupas sujas do meu armário.
Leva um minuto para encontrar uma camiseta que não cheira como se
estivesse no chão há semanas, mas Dorian ainda me oferece seu spray
corporal de qualquer maneira. Eu coloco meu moletom Royals e os sigo.
— Por que você não está vestindo aquela camisa do Amity que eu
comprei para você? — Barbie pergunta quando chegamos às escadas.
Dorian estala a língua e aponta um dedo para ele.
— Quantas vezes eu tenho que te dizer isso, Barbs? Nunca use a
roupa de uma banda em seu show. Isso faz você parecer com sede.
— Ou como um fã.
— Estar lá faz você parecer um fã.
Do meu lugar, alguns passos atrás deles, vejo Barbie virar a cabeça
para dar a Dorian um olhar incrédulo.
— Eu vi um cara empurrando seu caminho para o palco só para que
ele pudesse pirar a banda o tempo todo. Estamos trazendo pessoas para
este show que decididamente não são fãs. Eu não acho que uma camisa é
uma má ideia.
— Usei tanto essa coisa que tem um buraco na axila, você realmente
acha que eu não gostei? — diz Dorian.
Barbie cantarola como se tivesse sido apaziguado, e eu me sinto
completamente vazio por dentro.
Delilah e Jade estão esperando no estacionamento. Jade está vestindo
jeans desbotados em vez de suas leggings habituais, e o vestido típico de
Delilah é combinado com um gorro preto, jaqueta jeans, meias até o
joelho e botas de combate. O cabelo dela está azul pastel em vez do rosa
que ela manteve durante todo o semestre.
— Seu cabelo vai cair — murmuro.
Delilah revira os olhos como se já tivesse ouvido isso mil vezes.
— Não é como se eu pintasse toda maldita semana.
— Só porque eu mostro fotos de cabelo queimado toda vez que você
quer pintar — diz Jade. Dorian faz um barulho como bacon fritando em
uma panela.
Zero e Kovy aparecem com Cauler, e eu não deveria me surpreender
ao vê-lo porque nós vamos literalmente ver sua banda favorita, mas meu
coração ainda hesita ao vê-lo.
Eu. Deveria ter. Beijado ele.
Ele estava sorrindo e rindo andando com Zero e Kovy, mas quando
ele me vê, ele morde um pouco o sorriso, enfiando as mãos nos bolsos de
sua jaqueta, sem encontrar meus olhos. Não falei muito com ele fora do
hóquei esta semana. Ele provavelmente está recebendo tantos sinais
confusos de mim que não sabe o que pensar.
Eu sou um idiota. Eu sei como é receber essas vibrações de um cara,
correr o risco de devolvê-las apenas para ser desligado. Eu sei como é e
eu fiz isso com ele de qualquer maneira.
Por causa do hóquei.
Eu olho para trás em direção ao dormitório. Eu não deveria ir a esse
show e estragar a noite dele. Esta é a música dele, a coisa dele, e minha
presença definitivamente só complicará as coisas.
— Mickey, ei — Delilah diz. Eles estão todos indo em direção ao SUV
de Zero. — Você vai voltar com a gente.
Ela e Jade entram antes que eu tenha tempo de recuar. Dorian e
Barbie já entraram do outro lado, deixando Cauler esperando por mim
na porta. Eu o olho bem nos olhos enquanto ando até ele, como se ele
fosse capaz de ver a verdade em meu olhar. Ele não desvia o olhar, mas
sua mandíbula aperta e ele engole em seco. Eu subo na parte de trás e
alcanço para puxar o assento para cima ao mesmo tempo que Cauler o
faz.
Nós dois hesitamos, observando um ao outro nesse estranho impasse
gay. Delilah e Jade estão conversando uma com a outra, e Dorian está
inclinado entre os bancos da frente para conectar seu telefone ao
Bluetooth do carro, e ninguém está prestando atenção em nós. Então,
quando Cauler finalmente faz o movimento, coloco minha mão ao lado da
dele, nossa pele se tocando enquanto puxamos o banco para trás.
Sinto que estou no ensino médio, compartilhando um contato
"acidental" com Nova na mesa de jantar na casa dos pais dela. Pequenos
toques que poderiam ser considerados acidentes se fôssemos
questionados.
Cauler suga os lábios na boca enquanto entra no carro, sem olhar
para mim. Mas eu vejo o sorriso lutando para sair.
EU NUNCA FUI a um show antes. Assim que entro no local, nada mais
parece real. E também não quero dizer isso de uma forma dissociada.
Mais como uma parada de descanso na estrada no meio da noite ou uma
arena silenciosa e vazia com as luzes apagadas. É escuro, úmido e um
pouco claustrofóbico.
Ainda não há música, apenas o zumbido pesado e vagamente
assustador do ruído ambiente através dos alto-falantes enquanto
algumas pessoas lotam o bar e outras se dirigem ao palco. Zero e Kovy
são os únicos com idade suficiente para beber, e eles nos abandonam
assim que entramos. Esfrego distraidamente os X pretos em minhas
mãos, mas mesmo se eu encontrasse uma maneira de tirá-los, os
bartenders provavelmente dariam uma olhada em mim, presumiriam
que eu tenho doze anos, e me expulsariam completamente do show.
— Eu vou me contentar com pouco, vamos para a frente — Dorian
diz. — Todo mundo se segura! — Ele pega a mão de Barbie. Barbie paga a
de Jade, Jade fica com Delilah e Delilah fica com o minha. Deixando-me
com…
Eu olho para Cauler. Estendo minha mão. Ele olha para ela por um
segundo, depois para o meu rosto. Delilah me puxa e eu cambaleio junto
com ela, a mão ainda estendida, até que Cauler avança para agarrar antes
que nos percamos na multidão. Dorian nos leva para o palco, apertando
entre as pessoas e forçando nossos apertos um ao outro a ponto de eu ter
certeza de que todos os nossos dedos vão quebrar antes de chegarmos
aonde estamos indo. Eu meio que me sinto um idiota, forçando meu
caminho através de um monte de estranhos, mas a maioria deles parece
não se incomodar com isso.
Nós nos alinhamos bem contra o palco, e a mão de Cauler permanece
na minha mesmo enquanto a multidão se aperta ao nosso redor, fazendo
com que eu me sinta menor do que nunca. Eu sinto falta assim que ele me
solta, mas ele não está exatamente longe. Não há barricada entre nós e as
bandas. Meu rosto está bem na altura da cintura com eles.
Dorian disse que as bandas que abrem o show eram nomes bem
pequenos, mas a multidão ainda reage... violentamente é a única palavra
que consigo pensar para descrever. Estou completamente fora do meu
elemento. O vocalista está gritando bem na minha cara, eu posso sentir o
baixo no meu peito como se meu coração estivesse sincronizando com
ele, eu estou sendo literalmente esmagado contra o palco por trás, e eu
até levei um chute na cabeça de um surfista da multidão.
Quando a primeira banda termina, eu sinto como se estivesse em
uma guerra.
— O que você achou, Terzo? — Dorian chama do outro lado da linha.
Sua voz soa abafada.
— É alguma coisa — eu chamo de volta.
— É divertido — ele insiste.
E ele está certo. É diferente. Leva algum tempo para se acostumar.
Mas acho que é melhor do que ficar sentado no meu quarto desejando
estar morto.
Eu até balanço minha cabeça junto com a batida quando a próxima
banda começa. Não é nem de longe tão agressivo quanto Cauler ao meu
lado com um braço para cima, socando o ar no tempo com as palavras
que ele grita. Eu me sinto meio mal ocupando espaço na frente de
pessoas que realmente poderiam entrar nisso, mas pelo menos eu sou
baixo o suficiente para eles verem por cima de mim. Não é o caso de
alguém preso atrás de Barbie.
— Olhe para Maverick! — grita Jade. Eu me viro, ficando na ponta
dos pés para ter um vislumbre de Kovy no meio de uma grande brecha
na multidão com um monte de pessoas se empurrando e balançando os
braços ao redor. A polo de Kovy está encharcada, seu cabelo
escorregadio em sua testa enquanto ele joga seu corpo ao redor como se
estivesse no rinque. Zero está ao longo da borda da brecha, torcendo por
ele.
Eu sorrio. Até rio. E quando olho para frente novamente, encontro
Cauler me observando como eu estava observando Kovy. Ele desvia o
olhar assim que eu percebo.
Após a segunda banda, com os assistentes do ato principal fazendo a
passagem de som, Cauler coloca os antebraços no palco e a cabeça baixa.
A multidão diminuiu um pouco com as pessoas indo para reabastecer no
bar, então aproveito a chance para esticar as pernas atrás de mim.
Delilah e Jade estão conversando com Dorian e Barbie, mas meus ouvidos
estão entupidos e não consigo ouvir o que estão dizendo.
Eu deveria trocar com Cauler. Deixar que ele se aproxime deles para
que ele possa falar também, em vez de agir como uma porta entre eles.
Quer dizer, acho que posso falar com ele?
Há um pensamento.
Eu me inclino ao lado dele, combinando-o com meus braços no palco.
Eu o sinto tenso contra meu ombro.
— Ei — eu digo. Como se não estivéssemos um ao lado do outro na
última hora e minutos. Bom começo.
Ele fica quieto por um segundo, arrastando uma unha por uma
costura nas tábuas do piso do palco.
— Ei.
Ok. Hora de colocar minhas habilidades de conversação inexistentes
à prova.
— Então esse é o tipo de merda que você ouve por diversão. — Eu
me encolho ao mesmo tempo em que Cauler zomba. Uau. Eu sou ótimo
nisso. Poderia muito bem continuar arando. — Quero dizer, não que seja
uma merda, apenas - você sabe o que quero dizer.
— Na verdade, aquela banda era uma merda — diz ele.
Eu pisco para ele.
— Você estava literalmente cantando junto.
— Bem, sim.
— Isso não faz sentido.
Ele dá de ombros.
— Talvez não para você. Mas alguns de nós gostam de se divertir.
Não digo nada. Ele não queria, mas atingiu um nervo. Claro que gosto
de me divertir. É que às vezes meu cérebro não quer me deixar. Espero
que a conversa morra aqui, mas então ele diz:
— Nós ficamos nos trends do Twitter por sete minutos no caminho
até aqui. Tem milhares de pessoas discutindo sobre nós.
Agora sou eu quem zomba.
— Novamente?
— Tenho a sensação de que vai ser assim até o dia do draft, Terzo.
Poderia muito bem se acostumar com isso.
— Aposto que você está adorando — murmuro.
— Na verdade. — Uma batida alta e constante começa quando o
baterista começa sua verificação. Eu me inclino para mais perto para
ouvir Cauler melhor. — Pessoas costumava falar de mim pela minha
habilidade. Agora eles só querem me comparar com você. Alguém
realmente sentou lá e disse que se você fosse alguns centímetros mais
alto, essas conversas nem estariam acontecendo.
Eu reviro os olhos. Pela primeira vez, minha altura não tem nada a
ver com isso. Apenas, você sabe, quem eu sou como pessoa.
— Sorte sua, eu puxei à minha mãe.
Ele ignora isso, remexendo seu piercing no lábio de uma forma que
me lembra que estamos em seu elemento aqui. As orelhas esticadas
podem estar fora de lugar em uma pista de gelo, mas são praticamente
padrão aqui.
— Eu tenho falado com sua irmã sobre você — diz ele depois de um
momento.
Excelente.
— Eu tenho cinco delas — eu digo. — Você terá que ser mais
específico.
Ele realmente ri. Apenas esta pequena lufada de ar através de seu
nariz, mas ainda assim. Uma risada e uma ligeira elevação no canto de
sua boca.
— Seu merdinha. Aquela ao seu lado. Delilah.
— Ok.
Ele respira para continuar, mas faz uma pausa com a boca aberta,
como se estivesse repensando o que ia dizer. Ele fecha a boca e engole
antes de dizer:
— O que seus pais teriam feito se você fosse uma merda no hóquei?
Ok, não era isso que eu esperava. Falar dos meus pais? O que somos,
amigos?
— Pagar por mais tempo de gelo? — Eu digo.
— E se você disser não?
Eu rio amargamente.
— Isso nunca foi uma opção.
— Vamos lá. É um esporte. Não é vida ou morte.
— É mais do que isso para eles.
— O que é isso para você? — Ele se vira para mim, apoiando seu
peso em um cotovelo. — Você não estaria fazendo isso se não fosse pelo
seu nome. Todo mundo sabe disso. Então por que se incomodar?
— Porque eu fui criado para isso. — Espero que ele se lembre
daquele artigo do Hockey News, ou eu soei super assustador.
— Estou falando sério. — Cauler torce a gola do meu moletom em
seu punho e puxa o suficiente para eu sentir. Minha respiração fica presa
na garganta. Olho para ele, perto o suficiente para sentir o cheiro de
chiclete de canela e loção de coco acima do suor e do álcool no ar. Eu
quero fechar a pequena distância entre nós, perseguir esses aromas
nitidamente Cauler com minha boca.
Mas estamos em público, e ele é um jogador de hóquei, e devemos
ser rivais.
Eu lambo meus lábios secos. Olhe-o bem nos olhos.
— Eu também estou.
A multidão começa a nos pressionar novamente quando a passagem
de som termina. Cauler me solta e eu me levanto, pressionando as
palmas das minhas mãos em meus olhos e respirando fundo. Eu sinto
Cauler se endireitar ao meu lado e abaixar meus braços bem a tempo de
me firmar contra o palco enquanto as pessoas atrás de nós se
aproximam. O cara nas minhas costas é alto o suficiente, ele
praticamente se inclina sobre mim para estar mais perto do palco, sua
axila perigosamente perto do meu rosto.
Cauler está olhando para mim. Mesmo quando a banda para a qual
estamos aqui, sua banda favorita, corre para o palco e se lança em sua
primeira música. Ele continua me olhando com essa ruga entre as
sobrancelhas.
Eu me inclino para ele. Ele abaixa a cabeça para que eu possa falar
em seu ouvido.
— Você está errado, você sabe.
Sua respiração na minha orelha é quente, mas envia calafrios pelo
meu pescoço.
— Sobre o quê?
— Eu ainda estaria fazendo isso sem meu nome. Eu apenas estaria
gostando muito mais.
— Então pare de jogar pelo seu nome e comece a jogar por você
mesmo. Eu sei que você pode. Eu vi isso no Colorado.
Eu realmente não sei como responder, mas eu não tenho escolha de
qualquer maneira com um colapso pesado na música enviando uma onda
de energia pela multidão. Estamos ambos esmagados contra o palco com
tanta força que tenho medo de ficar fora do treino na segunda-feira.
Eu me sinto mais livre, de alguma forma, admitindo algo assim para
Cauler. Talvez não seja a grande revelação que ele está esperando.
Mas é um começo.
DEZ
Estou saindo do banho quando Cauler me envia um link para um tweet
junto com a mensagem como se atreve?
O tweet mostra duas fotos espontâneas lado a lado, uma de mim ao
lado de uma garota na fila da estação de crepe no refeitório, e outra de
Cauler e a mesma garota andando perto um do outro no campus. O
próprio tweet diz o mesmo lugar no draft, a mesma garota? Deve ser um
vestiário desconfortável.
Eu reviro os olhos. Isso é hóquei, não Hollywood.
Eu coloco um par de shorts de ginástica e caio na minha cama
enquanto digito uma resposta. Isso se tornou uma rotina na semana
passada desde o show. Cauler e eu mandamos um para o outro tudo o
que encontramos online sobre nós e nossa rivalidade e rimos disso. Às
vezes até vamos ao Twitter e respondemos às postagens para tentar
atiçar as chamas.
O que posso dizer? É divertido.
Mickey: Eu nem sei o nome dessa menina
Eu só queria uma bomba de crepe
Jaysen: Eu acho que é carol?
Sei lá
Caminhamos pelo mesmo caminho para a aula
Mickey: Escandaloso
Nunca pensei que seria o assunto de fofocas de tablóides
Jaysen: Você tem certeza disso?
Quero dizer
Você é amigo de Nova Vinter
Mickey: Merda tem razão
Jaysen: De qualquer forma, somos um caso especial Terzo
A coisa mais interessante que aconteceu ao hóquei em anos
Mickey: A barra estava bem baixo então
Jaysen: Eu acho que você é muito interessante
Isso é outra coisa que vem acontecendo. Cauler obviamente flerta
comigo, e eu morro por dentro enquanto tento agir alheio.
Mickey: Pfft
Como
Jaysen: Muitas maneiras
Meu peito está pesado. Eu não deveria enganá-lo. Eu deveria deixá-lo
no vácuo, deixar claro que isso não vai acontecer. Mas eu gosto. Eu gosto
dele.
Mickey: Você tem padrões muito baixos então
Jaysen: Tem certeza disso?
O que aconteceu com a álgebra intermediária?
Esse sentimento de culpa é socado para fora do meu peito. Sento-me
na cama e olho para o meu telefone, a ansiedade subindo no meu sangue
com um estalo de estática. Dorian sai de seu chuveiro, esfregando
violentamente o cabelo com uma toalha. Eu tento manter meu rosto o
mais neutro possível.
Minhas notas intermediárias não eram ótimas. Quer dizer, eu ainda
sou elegível, mas elas poderiam ser melhores. Muito melhor. Acabei com
um C em álgebra, o que eu não esperava. Um C+ em biologia, o que seria
pior se eu realmente planejasse ficar e fazer ciência marinha. Um A em
italiano, naturalmente, e um D em redação universitária, deixando-me
com 2,32. Por pouco elegível para o hóquei, mas seguro por enquanto.
Eu quero fazer melhor com a segunda metade do semestre.
Eu também não quero Cauler bisbilhotando sobre isso.
Mickey: O que você quer dizer
Jaysen: Não tentando ser invasivo nem nada
Mas eu sei que você não terminou
Mickey: Professora Morris me deixou refazer
Eu já tive minha bunda mastigada pelo treinador, não se preocupe
— Cara — Dorian diz, e eu me assusto um pouco. Quase esqueci que
ele entrou no quarto. — Nunca fique tentado a preencher sua exigência
científica com astronomia. — Seu livro dá um baque forte quando ele o
deixa cair em sua mesa.
— Estou na bio — eu digo, olhando para os três pontos que mostram
a digitação de Cauler. — Achei que você adorasse o espaço.
— Eu adoro. E eu amo essa aula. Mas há tantos veteranos lá só para
ganhar o crédito porque acharam que seria fácil e divertido. É irritante.
Ele apoia a cabeça com um cotovelo na mesa e curva os ombros
sobre o livro. Eu nunca o vi tão rabugento antes.
— Você está bem? — Pergunto-lhe.
— Bem. Só cansado.
Há uma pontada de familiaridade em minhas entranhas, mas antes
que eu possa realmente entender, meu telefone vibra.
Jaysen: Não vou dar um sermão. Estou apenas preocupado.
Odiaria ver você não poder jogar no próximo semestre.
Mickey: Sério?
Porque se eu estiver fora, o lugar superior é seu, sem contestação
Jaysen: Eu não quero nenhum concurso
Eu quero derrubar o império
Mickey: Dramático
Jaysen: Diga isso para quem coroou seu avô imperador todos esses anos atrás
Mas realmente
Você está bem?
Mickey: estou bem
Eu olho para Dorian assim que envio. Pela maneira como ele está
caído em sua mesa, uma mão segurando seu próprio cabelo. Totalmente
bem.
Mickey: É só
Difícil às vezes
Jaysen: O que é?
Mickey: Eu ñ sei
Vida? Viver? A procura da felicidade? Claro, posso me abrir um pouco
com Cauler, mas não posso sentar aqui e dizer a ele que estou
profundamente deprimido quando eu tenho muito mais privilégio do que
ele. Eu sou branco. Com passagem hétero. De uma família rica. Não tenho
o direito de reclamar com ele sobre o quão difícil é a vida.
Jaysen: Terzo.
Eu não respondo. Apenas olho para o meu telefone até que ele volte a
travar, depois olho para o meu reflexo na tela. Cauler não é um idiota. Ok,
não um idiota completo. Eu não acho que ele seria rude sobre isso se eu
dissesse a ele que estou deprimido. Ainda assim, parece demais.
Então eu levo a conversa em um 180 completo.
Mickey: Zero sabe que vc é gay?
Meu coração bate. Este quarto está muito quente. Eu realmente
espero não estragar isso.
Jaysen: Uhhh não sei talvez?
Eu não disse a ele
Mas eu não acho que sou tão sutil
Por quê
Minha boca está seca. Eu lambo meus lábios e engulo em seco.
Mickey: Ele só fala muito sobre nós nos beijando
Tipo toda vez que discutimos
É como se ele igualasse ódio com luxúria
Isso foi muito longe? Claro que isso foi longe demais. Isso é coisa
minha, não de Zero.
Jaysen: Acho que tinha algo a ver com
'Seus olhos são de uma cor bonita'
E
'Eu gosto das suas covinhas'
Mickey: Eu nunca disse que gostava delas.
Eu indiquei sua existência
Jaysen: Também pode ter a ver comigo pegando sua camisa o tempo todo
Acho que grita tensão sexual
Mickey: Estranho
Eu pensei que gritava idiota insuportável
Jaysen: Ainda bem que alguém entendeu
Ok. Eu brinquei com sucesso com Jaysen Caulfield sobre o texto. O
que agora? Deixo ele sem resposta? Isso mostra controle, certo? Deixe-o
pensar que foi apenas uma confusão genuína, uma simples curiosidade
que me levou a fazer essa pergunta. Ele nunca vai suspeitar de nada.
Mas então Cauler manda uma mensagem dupla, e eu juro que tenho
um ataque cardíaco completo.
Jaysen: Para ser justo
Eu acho você muito bom de olhar
Toda aquela coisa de morto por dentro que você tem?
Perfeito pra mim
Minha alma ascende. Jesus assume o volante porque eu. Não posso.
Estou sonhando ainda. Dorian provavelmente está deitado do outro lado
da sala com o travesseiro apertado sobre as orelhas para que ele não
possa ouvir minhas reações inconscientes a isso. Estou tossindo.
Aja. Friamente. Mickey.
Mickey: Você parece bom também, eu acho
Jaysen: Mesmo com as tatuagens e piercings?
Minha avó diz que me fazem feio
Mickey: Especialmente com as tatuagens e piercings
Esse é o meu tipo
Pergunte a Nova
É por isso que nunca daríamos certo
Jaysen: Bom.
Agora eu sei que a dor valeu a pena
Mickey: Como você as conseguiu se ainda não tem 18 anos
Jaysen: Meu primo tem uma loja
Faz o trabalho de graça
Mickey: Como é a sensação na língua
Jaysen: Primeiro você está pensando em me beijar e agora você está
pensando no meu piercing na língua?
Começando a pensar que você não me despreza tanto quanto diz
Qual é o equivalente verbal de um keymash? Porque é isso que estou
sentindo agora.
Mickey: Só tentando fazer você baixar a guarda
Jaysen: E você quase conseguiu
Nós continuamos assim até eu adormecer segurando meu telefone.
Quando acordo de manhã, espero que nada disso apareça nas minhas
mensagens, totalmente convencido de que foi um sonho muito detalhado
e muito bom.
Mas está tudo lá. Sem volta agora.
ONZE
NOVEMBRO

Cauler e eu completamos dezoito anos na primeira semana de novembro,


e eu sou convocado para uma entrevista antes do nosso próximo jogo em
homenagem a me tornar elegível para o draft. Com um monte de
gravadores na frente do meu rosto, um dos repórteres diz:
— Houve rumores de aumentar a idade do draft para dezenove anos.
Não entraria em ação em breve para ter um efeito sobre você, é claro,
mas o que você pensa sobre isso?
Eu estreito meus olhos para ela. É a primeira vez que ouço sobre isso,
mas, novamente, não tenho prestado atenção ao hóquei fora do meu time
e dos nossos adversários.
Aumentando a idade do draft para dezenove anos. Esse seria mais
um ano com os Royals. Mais um ano em Hartland. Mais um ano para
descobrir quem eu realmente sou como pessoa. Zero e Kovy teriam ido
embora. Assim como Bailey, Sid e Karim. Mas seria mais um ano com
Dorian e Barbie. Delilah e Jade.
Mais um ano com Cauler.
— Eu gosto disso — eu digo. Os repórteres piscam para mim como se
fosse exatamente o oposto do que eles esperavam. — É difícil o suficiente
ter dezessete, dezoito anos, entrar na faculdade e ser forçado a escolher
o que quer fazer do resto da vida antes mesmo de conhecer todas as suas
opções. Fazer isso com um contrato na cabeça? Pior ainda.
— Você está dizendo que prefere ficar mais um ano na NCAA do que
ir direto para a NHL?
Essa é uma pergunta perigosa. Cauler já deixou claro que está
terminando o curso. Minha resposta aqui poderia realmente fechar a
lacuna em nosso lugar no draft. Tenho certeza de que grande parte da
minha vantagem sobre ele é que estarei disponível na próxima
temporada.
E a coisa é, eu quero ficar. Mas também quero começar minha
carreira no hóquei. Eu quero os dois ao mesmo tempo, mas isso não é
possível.
— Estou dizendo — começo devagar, com cuidado —, que já aprendi
muito mais nestes últimos meses em Hartland do que em dezessete anos
de nada além de hóquei.
Cauler trava o braço em volta do meu pescoço e bate nossos
capacetes juntos em nosso caminho para fora do vestiário, como se
estivesse orgulhoso de mim ou algo assim.
Agora estou notando aqueles olhares de lado que os meninos nos dão
sempre que estamos a menos de um metro um do outro. Como se
estivessem esperando que eu pule em seus braços ou que ele me prenda
na parede ou algo assim.
Meu cérebro está em um loop constante de você parece bom de se
olhar e perfeito pra mim e uau, o cheiro de canela agora é o suficiente
para me fazer ir.
Eu sou patético.
Chegou ao ponto em que eu nem me importo que as pessoas
descubram. Agora, algumas ações boca-a-boca com Jaysen Caulfield
valeria tudo e qualquer coisa.

CAULER JOGA AINDA melhor do que o habitual nesse jogo. Ele faz uma
jogada onde ele está cortando atrás da rede e joga o disco de volta para
mim com este passe sexy como o inferno. Eu quase não aproveito isso
porque estou muito ocupado indo hhnnnngg. Eu me ajeito bem a tempo
de colocar um único gol no fundo da rede antes do cronômetro acabar, e
juro que estou desmaiando quando encontro Cauler contra as boards
para celly.
— Puta merda — eu respiro, então imediatamente me afasto porque
posso ser mais óbvio? Tipo, relaxe, James, vamos lá.
Ficamos perto um do outro quando se trata de pontos, mas ele ganha
mais tempo no gelo do que eu com penalty kills. Começo a me esforçar
mais na defesa, nos jogos e nos treinos, para acompanhar. É quase como
se ele estivesse me empurrando para fazer melhor.
Para ganhar minha vaga.
Mas eu nunca diria isso a ele.
Barbie se ajoelha ao meu lado durante o aquecimento de sábado. Ele
estica uma das pernas e murmura:
— Isso é embaraçoso.
A fita chegou à escolha da música de Kovy, o que acho que é
problema para Barbie. É algum tipo de rap country, forte no país. Não é
terrível, mas definitivamente não é o estilo de Barbie.
— Esta é a música favorita de Nova, cara — eu digo categoricamente,
cruzando uma perna sobre a outra e torcendo para esticar minhas costas.
Ele olha para mim com os olhos arregalados, protetor bucal saindo
de sua boca escancarada. Eu sorrio, e ele aperta sua mandíbula, olhando.
— Desde quando você faz piadas?
— Dario e Diana me ensinaram esta manhã — eu digo, apontando
para as arquibancadas onde o irmão e a irmã de Dorian estão discutindo
sobre um Nintendo Switch. Sua família o surpreendeu ao vir para este
jogo, e eu juro que ver o reencontro deles quase me fez chorar. O Sr. e a
Sra. Hidalgo apontam coisas um para o outro na arena, acenando quando
percebem que eu e Barbie estamos olhando para eles.
Barbie ri um pouco.
— Sim, eles são crianças engraçadas. Pequenos demônios, mas
engraçados.
— Ei ei. — Dorian patina e se senta do outro lado da Barbie,
esticando as pernas e se curvando para tocar os dedos dos pés. — Olha
para os tornozelos no número oito.
— Seja legal, Dori — Barbie impassível. — Nem todos nós tínhamos
alguém para nos ensinar a amarrar nossos patins enquanto crescia.
Dorian não morde a isca.
— O cara está jogando D-I. Ele deveria saber amarrar seus malditos
patins.
— Talvez ele tenha tornozelos fracos.
— Talvez ele simplesmente sopre.
Barbie cantarola, e nós nos alongamos em silêncio até que Cauler se
junte a nós.
— Isso vai ser uma explosão — diz ele enquanto se ajoelha ao meu
lado. — Você viu o número oito?
— Viu! — diz Dorian. Há uma explosão de barulho e aplausos da
multidão enquanto a equipe feminina entra em fila para preencher as
fileiras logo atrás do banco. Elas vêm de uma grande vitória e sua energia
é alta. Preciso de três pontos esta noite para alcançar Delilah.
Eu empurro minhas mãos e joelhos e cruzo uma perna na frente da
outra para um alongamento de glúteo. Cauler limpa a garganta. Sua voz
soa um pouco apertada quando ele começa a divagar sobre uma nova
música de Amity. Dorian e Barbie também não percebem ou ignoram
enquanto eles se juntam, mas dou-lhe um olhar por cima do ombro.
Ele está de pé, apoiado nos ombros, torcendo para frente e para trás
para esticar as costas. Assim que Dorian e Barbie começam a falar, os
olhos de Cauler se voltam para mim. Mas não por acaso. Nem mesmo na
minha cara. Tenho cerca de 99,9% de certeza de que Jaysen Caulfield
acabou de olhar para minha bunda. Minha bunda obscurecida pelas
calças de hóquei, mas ainda assim.
Eu me sento um pouco surpreso, e seus olhos se movem para o meu
rosto, arregalando quando encontram os meus. Sua boca se abre um
pouco, e o apito do treinador soa, chamando-nos para tiros em Colie
antes do início da partida.
Começamos cruelmente e implacavelmente no segundo em que o
relógio começa a contar. Dorian tem um de seus melhores jogos até
agora, bloqueando chutes antes que Colie possa tocá-los, tirando o disco
dos jogadores do Lakers sempre que eles cometem o erro de aproximá-lo
dele, dando cheques desagradáveis e ajudando em gols para mim e Zero.
Toda vez que ele faz algo impressionante enquanto estou no banco, olho
por cima do ombro para sua família.
Eles estão amando cada segundo disso.
Na metade do terceiro período, eu faço dois gols e uma assistência,
Cauler faz um gol e uma assistência, e estamos vencendo por 7 a 0. E
estou me divertindo. Toda vez que eu marco e Cauler coloca a mão em
cima da minha cabeça e me puxa para um abraço, sinto meu coração
parar.
Os Lakers, no entanto, decididamente não estão se divertindo. Seus
temperamentos aumentam a cada segundo que passa. Os cheques vêm
mais tarde e com mais força, os empurrões depois dos apitos são mais
prolongados e violentos.
O treinador forma nossa linha sobre os quadros com alguns minutos
restantes e as palavras:
13
— Faça aquele hatty James. Não importa como você faz isso,
apenas faça acontecer. — Cauler e Zero colocam o disco no meu taco
sempre que podem, deixando de lado os tiros diretos em favor de
entregá-lo para mim.
Não preciso de mais pontos. Estou à frente de Delilah e Cauler agora,
e os Lakers estão começando a parecer homicidas. Mas meus
companheiros de equipe querem muito esse hat-trick para mim, eles vão
perder pontos para conseguir isso para mim. Até Cauler. Meu maior rival.
Então, quando uma raia se abre, eu faço o tiro, suave e rápido, como um
laser no canto superior esquerdo do gol.
A arena entra em erupção, chapéus chovendo no gelo enquanto eu
me viro, jogando meus braços para cima. Estou rindo, esperando que
Cauler e Zero me levantem do gelo em comemoração. Em vez disso, estou
cara a cara com um jogador do Laker de cara vermelha chamado
Clarkson. Ele dá uma olhada no meu sorriso no meio da celly e esbarra
em mim com força suficiente, eu tropeço para trás, tropeçando na perna
de alguém e desmoronando em uma pilha no gelo.
Ok, ai.
Assobios soam quando os caras se chocam acima de mim. Estou
esparramado, sem fôlego, piscando para Cauler com as mãos torcidas na
camisa de Clarkson, as grades de seus capacetes pressionadas juntas
enquanto lançam insultos de um lado para o outro. Eu não acho que
Cauler vai dar um soco, mas Deus, eu adoraria ver isso. Zero me ajuda a
ficar de pé quando um árbitro o puxa para longe do caos, mas não ouço o
que ele me diz. Clarkson enfia os dedos na grade de Cauler e o sacode,
empurrando sua cabeça para trás e se recusando a soltar, mesmo quando
Cauler ergue as mãos em sinal de rendição.
Eu me jogo nele, surpreendendo-o o suficiente para quebrar seu
domínio sobre Cauler. Eu o empurro para trás outro passo.
— Ta brincando né? — Clarkson diz, percebendo imediatamente. —
Eu não vou brigar com você.
Eu o empurro novamente.
— Sério, eu não vou brigar com você, James. Eu seria esfaqueado por
Gary Bettman.
Eu chego perto o suficiente para que eu tenha que olhar quase para
cima para manter contato visual, sem dizer nada, apenas desafiando-o a
recuar de um cara quase trinta centímetros mais baixo que ele.
— Cristo — ele bufa. — Tudo bem! Tudo bem! — Ele me empurra de
volta para fora da confusão na frente da rede, os árbitros distraídos
enquanto tentam separar outros quatro grupos de empurrões.
Zero diz meu nome, um aviso em sua voz, mas isso não me impede de
pegar Clarkson pela camisa e dar um soco. É difícil, mas ainda consigo
colocá-lo na grade e me levantar sozinho em um momento de raiva. Eu
puxo meu punho para trás e faço isso de novo, colocando todo o meu
peso contra dele. Eu nunca estive em uma briga antes. Eu só quero
quebrar os dentes de Clarkson, fazê-lo pensar duas vezes antes de
colocar as mãos em Cauler assim de novo.
Ele mal reage aos meus socos, seu capacete e minha falta de
experiência em luta protegendo-o de qualquer dano. Mas quando ele dá
um golpe por conta própria, eu sinto isso. Meu capacete absorve a maior
parte, mas ainda é o suficiente para me atordoar por um segundo, me
forçar a morder com força meu protetor bucal.
Sinto o estrondo da multidão mais do que ouço, como uma linha de
baixo batendo no meu peito. Há um flash de preto e branco na minha
visão periférica, os árbitros se aproximando de nós, mas não posso
deixá-los nos separar antes de machucá-lo. Eu dou outro soco no seu
queixo e levo mais três no lado da minha cabeça.
Meu rosto lateja. Sinto gosto de sangue na boca. Parece que levei um
taco de beisebol no crânio. A única coisa que me mantém de pé é o aperto
de Clarkson na minha camisa, minhas mãos torcidas nas dele. Dou-lhe
outro empurrão fraco.
— Muito obrigado, James — diz ele. Sua voz soa como se estivesse
vindo através da água. — Agora eu sou o idiota que bateu na merda da
estrela.
— Foda-se — eu cuspo de volta.
— Ok, noite noite, pequenino. — Ele me empurra de volta, me
levando para o gelo quase suavemente e jogando as mãos para cima em
rendição quando os árbitros descem sobre ele. — Um pouco tarde, sim?
— ele diz enquanto eles o levam para o banco.
Juro por Deus, se todos não pararem de gritar, minha cabeça vai
explodir.
Eu afasto o bandeirinha que está me ajudando a levantar e rolo de
joelhos, tirando meu capacete. Sangue pinga no gelo, caindo logo abaixo
da minha sobrancelha. Baba rosa pende de meus lábios. Tudo está
rolando como se eu tivesse a oito tiros de profundidade. Não é como se
eu estivesse acostumado a levar socos na cabeça. Não ajuda que Clarkson
é enorme.
Um braço cai sobre meus ombros, e Cauler se ajoelha na minha
frente.
— Terzo, sua lenda. Você precisa do treinador?
Eu balanço minha cabeça. Péssima ideia. Estou prestes a vomitar nos
joelhos de Cauler e ele nunca mais vai olhar para a minha bunda. Eu
alcanço seu braço e o deixo me ajudar a levantar. Ele mantém o braço em
volta da minha cintura enquanto os árbitros nos seguem até os bancos.
— Você parecia um Chihuahua enfrentando um mastim — diz Cauler.
— Como um cachorrinho raivoso. Adorável.
Não consigo segurar meu sorriso, mesmo que doa. Ele permanece
enquanto eu saio do gelo e cambaleio pelo túnel em direção à sala de
treinamento, batendo minhas mãos contra as mãos dos fãs que se
estendem até mim.
A adrenalina começa a diminuir assim que chego a instrutora e ela
começa a enxugar o sangue no meu rosto, os aplausos abafados por
camadas de concreto e distância.
Acabei de me colocar no banco. Porque um cara estava sendo um
idiota com Cauler. Nem mesmo porque ele me derrubou. Por causa de
Cauler.
Cauler, meu rival. Cauler, a quem provavelmente acabei de entregar a
melhor escolha.

TENHO PONTOS acima da sobrancelha e uma contusão no maxilar, mas


nenhum deles dói tanto quanto minha cabeça depois de lidar com o
colapso do treinador após o jogo. Esse homem pode gritar.
Recebo uma mensagem de Nova quando estou de volta ao meu
dormitório.
Nova: Isso foi quase sexy
Mickey: Você está dizendo que gostou de me ver levar uma surra?
Nova: Mickey
Você viu a fanfic que eu li
Eu não posso deixar de bufar com isso. Nova lê estritamente fics
dolorosas envolvendo seus caras fictícios favoritos. Se houver alguma
dica de conforto nisso, ela não lê isso. Às vezes eu me preocupo com ela.
Estou tentando descobrir o que enviar de volta quando o bate-papo
em grupo com minhas irmãs aparece.
Nicolette: Cara, isso foi RUIM. IDIOTA.
Eu sorrio e deito na minha cama, segurando o telefone sobre o meu
rosto.
Mickey: Teria sido melhor se eu ganhasse
Bailey: Se você pudesse ter vencido sua primeira briga
contra um cara 20x seu tamanho você estaria no esporte errado
Madison: Espera o quê? Briga?
O que eu perdi?
Nicolette: Você não verificou o twitter hoje à noite?
nosso irmãozinho é um arruaceiro
Mickey: Meu rosto dói
Delilah: não desafie caras 30 centímetros mais altos que você idiota
Mickey: 28 centímetros no máximo.
Mikayla: Uma diferença importante
Madison: Explica por que o pai está reclamando de você
não atendendo seu telefone
Mickey: Oops telefone morto
Bailey: Você está literalmente usando
Agora mesmo
Mickey: Ops sem serviço
Bailey: Basta ligar para ele
Ele provavelmente está preocupado
Mickey: Sim, sobre o meu lugar no draft
Bailey: Você sabe que está começando a ficar velha a forma como você choraminga
sobre ele só se importar com o draft
Sério, eu me jogaria na frente de um Zamboni agora se não parecesse
que já fui atingido por um.
Mickey: O que é irritante é verdade
Bailey: Não, literalmente não
Mickey: Certo.
Certo.
OK.
Mikayla: HEI, VAMOS FALAR SOBRE NOMES DE BEBÊS
Spence sugeriu Keith.
KEITH.
Você pode imaginar um recém-nascido chamado Keith?
Esse é o nome de um homem adulto trabalhando em um cubículo
E não me faça começar a falar sobre seus nomes de garotas
QUERO GÊNERO NEUTRO
Deixo meu telefone cair no chão ao lado da minha cama. Não sei por
que Bailey sempre sente a necessidade de defender a honra do papai
assim. Ela me faz ser o cara mau nesse relacionamento e eu não entendo.
Talvez porque ele defendeu ela, Sid e Karim?
Talvez porque ela esteja certa.
No fundo, eu sei que ela está. Mas não estou pronto para abrir mão
de sete anos de problemas de abandono.
Eu dou um suspiro e alcanço acima de mim para a minha agenda.
Sim, uma agenda real onde eu escrevo minha lição de casa e datas de
entrega. Tenho de fazer alguma coisa para salvar a minha nota de meio
de semestre. Tenho leituras a fazer para biologia e redação universitária,
e um diário para escrever em italiano.
Meu telefone vibra no chão.
Eu rolo para fora da minha cama e jogo a agenda de lado, sento na
minha mesa e abro meu laptop. Mas não entro na minha conta Hartland e
não começo nenhuma leitura. Em vez disso, vou ao Twitter para ler o que
estranhos aleatórios têm a dizer sobre mim.
Estou esperando ver coisas sobre como eu finalmente mostrei algum
espírito de equipe na forma de raiva violenta e como isso é uma
responsabilidade e como talvez eu precise de ajuda para começar. Como
eu arrumo brigas que não tenho chance de ganhar.
Mas a primeira coisa que vejo é um tweet dizendo, Mickey James III
poderia se chamar Zé Ninguém e ele ainda seria a primeira escolha. Ele
poderia ter 1,50cm —e ainda ser a escolha número 1. Ele se conecta a um
artigo falando sobre por que minha altura não deve assustar as equipes.
Meu telefone não para de tocar.
Outro tweet diz que entrar naquela briga era exatamente o que eu
precisava para solidificar minha posição no número um.
Há centenas de pessoas falando sobre como os caras vão saber que
eu não vou aceitar a merda deles agora, mesmo que eu não ganhe. Eu
poderia ter marcado seis gols naquele jogo e ser derrotado em uma briga
ainda teria sido a coisa mais foda que eu já fiz.
Eu cutuco o hematoma no meu queixo e mal o sinto. Estou
imaginando tudo isso, certo? Tive uma concussão e agora meu cérebro
está vendo o que quer ver. Há ainda mais quando atualizo a página.
Eu sorrio. Pequeno e doloroso, mas ainda assim, um sorriso.
Alguém bate no meu chão por baixo e eu quase caio da cadeira, o
coração pulando na minha garganta. Os gritos abafados de uma garota
me dizem para atender meu maldito telefone. Eu praticamente vou na
ponta dos pés para não incomodá-la ainda mais e vou silenciar o bate-
papo em grupo. E sim, há dezenas de mensagens das minhas irmãs. Mas
também cinco de Cauler.
Jaysen: As pessoas estão dizendo que você conquistou sua vaga no draft hoje
Não fique muito confortável Terzo
Ainda tenho 7 meses para lutar
Tudo que eu tenho que fazer é conseguir um hat-trick de Gordie Howe amanhã e
estou de volta
mas com inveja do clarkson
Eu caio na minha cama e mando de volta:
Mickey: Ele não estava muito feliz com isso, então não é
tão bom quanto parece aparentemente
Jaysen: Estou mais com ciúmes do jeito que acabou
Eu olho para o meu telefone. Eu não entendo. Acabou com ele
chutando minha bunda. Não era sobre isso que já estávamos falando?
Mickey: Você teve muitas chances
Ele lê imediatamente, como se ainda não tivesse encerrado o bate-
papo, e começa a digitar. Posso sentir meu coração batendo forte,
observando aqueles três pontinhos. É estranho. Como quando eu tinha
uma namorada por cinco segundos no terceiro ano, os nervos que eu
ficava esperando que ela me mandasse uma mensagem.
Estamos falando sobre brigar um contra o outro, mas ele me mandou
uma mensagem primeiro. Parece bom.
Eu sou literalmente um desastre bissexual.
Os pontos desaparecem, mas nenhuma mensagem chega. Ele começa
a digitar novamente antes que meu coração tenha a chance de cair, então
para antes que eu possa recuperar minhas esperanças. Ele faz isso mais
duas vezes antes de eu bloquear a tela e segurar meu telefone no meu
peito, olhando para o teto. Quando finalmente vibra, cerro os dentes e me
forço a não abri-lo imediatamente. Eu não quero que ele pense que eu
estava sentado aqui esperando por sua resposta.
Fecho os olhos e respiro fundo.
Auto-controle. Não abra. Não seja suspeitosamente ansioso para ler
as mensagens dele. Reprima todas as emoções.
Não posso. Eu não aguento nem um minuto.
Jaysen: Você não diria isso se estivéssemos na mesma página aqui.
Meus polegares pairam sobre a tela, mas não digito nada. Ainda não.
Ele gostou de me ver sendo levado para fora do gelo pelo resto do
jogo? Me vendo ser suspenso, sabendo que ele tem um jogo inteiro
amanhã onde ele pode se exibir e as pessoas não podem me creditar pelo
seu sucesso?
Mas isso não o deixaria com ciúmes de Clarkson. Talvez tenha sido a
maneira como ele me deitou no gelo como se eu fosse a coisa mais
patética com a qual ele já havia entrado em contato.
Talvez seja apenas a maneira como ele me deitou no gelo.
Oh.
Minhas mãos tremem enquanto digito.
Mickey: Acho que podemos estar
Jaysen: Prove
Eu bato meu telefone contra minha testa. Eu realmente vou fazer isso
agora? Posso estragar tudo.
Mas eu mereço uma vida fora do hóquei, certo? Nem mesmo mereço
– preciso de uma vida fora do hóquei.
Respiro fundo e forço o ar através dos dentes.
Mickey: Me encontre no rinque

ESTOU ENFIANDO MEUS pés nos patins quando Cauler aparece. Ele se
senta em sua cabine e começa a colocar o seu próprio.
— O que estamos fazendo?
Eu aperto meus cadarços.
— Praticando one-timers.
Ele bufa.
— Não vai ajudar no draft, você sabe. Eles sabem o que estão
recebendo de nós neste momento.
Eu olho para ele enquanto coloco minhas luvas.
— O que aconteceu com sete meses para lutar?
Uma de suas sobrancelhas se ergue, e eu quero pular nele agora. Mas
meus nervos estão formigando e meu coração mal está acompanhando a
adrenalina e ainda não estou pronto. Pego meu taco na prateleira de
tacos e saio antes que possa agir por impulso. Seus passos seguem atrás
de mim. Eu empurro a pilha de discos para fora das boards e os
encurralo em um dos círculos de face-off. Vou para o ponto oposto, e
Cauler está de pé com os discos quando olho para trás.
Ele está me observando com curiosidade, vestindo uma calça jogger
preta e um moletom com capuz, óculos. Minha boca enche de água ao vê-
lo. Ele inclina a cabeça e espera que eu acene antes de me mandar passe
após passe.
Eu vislumbro na maioria deles. Slap shots não são meu forte. As que
eu consigo são altas ou largas ou mal têm força atrás delas para alcançar
a rede.
Para meu crédito, estou extremamente distraído.
Cauler está mandando seus passes cada vez mais fracos, me puxando
para mais perto dele. Meu coração dispara e mal consigo respirar e
finalmente... estou a um passo de distância. Eu olho para ele, sem fôlego e
elétrico, e ele olha para mim com a cabeça inclinada para o lado.
— Esses foram alguns dos piores passes que eu já vi de você — eu
tento. Minha voz treme.
— O que estamos fazendo aqui, Terzo?
Eu lambo meus lábios. Mudo meu peso de patins para patins.
— Não sei. Eu só… — Eu me sinto confortável aqui? Não preciso me
preocupar com a invasão de Dorian e Barbie? Olho para o espaço entre
nós. Juro que minha respiração ecoa por toda a arena vazia.
Ele se aproxima, deixando seu taco cair no gelo. Ele tira a mão direita
da luva e estende a mão, arrastando os dedos pela minha bochecha e
empurrando-os de volta para o meu cabelo. Cada segundo dura mais do
que os momentos finais de um jogo apertado. Posso sentir o cheiro de
canela em seu hálito, o suor de dentro de suas luvas.
— Mesma página? — ele pergunta baixinho, um leve tremor em sua
voz.
— Mesma página — eu quase sussurro.
Ele tira a outra luva e envolve o braço em volta da minha cintura, me
puxando. Eu deixo cair meu taco e quase tropeço nele quando me
aproximo, muito ansioso.
Mas ele não me beija. Ele nos vira de costas para as boards, e eu
agarro sua camisa enquanto ele me guia até que eu esteja pressionado
contra o vidro.
E então sua boca está na minha, seu peso total me prendendo e
ambas as mãos empurrando meu cabelo. Eu sinto isso em todos os
lugares. É preciso de tudo de mim para me segurar.
Eu solto sua camisa para alcançar a parte de trás de sua cabeça e
puxá-lo para o meu nível. Seus patins raspam no gelo enquanto ele luta
para se equilibrar, mas ele não para de me beijar. Dói, com todos os
hematomas no meu rosto, mas a dor não é nada comparada ao êxtase
total de sua boca na minha. O aro de metal em seu lábio estala contra
meus dentes, e é um pouco estranho, um pouco confuso e muito
frenético, mas é facilmente o melhor beijo que já recebi. E eu beijei um
monte de gente.
Não sei se é o jeito que ele me deixa tremendo, ofegante, meus dedos
dormentes, ou se é só porque é Jaysen Caulfield.
Suas mãos deslizam até meus quadris, deslizam sob minha camisa,
enviam calafrios pelo meu núcleo enquanto roçam minha pele nua. Eu
suspiro em sua boca, agarro punhados de sua camisa novamente para
segurar firme.
Minha cabeça está confusa quando ele se afasta, minha respiração
irregular. Se não fosse por seu peso contra mim, eu estaria derretendo no
gelo agora.
É uma sensação com a qual eu poderia me acostumar. Antes de
qualquer um de nós recuperar o fôlego ou dizer algo estúpido, eu me
inclino e o beijo novamente.

OK, MAS pegar os discos juntos depois disso é extremamente estranho.


Minhas pernas estão fracas, como se eu tivesse acabado de andar de
patins ou algo assim, e estou fazendo o meu melhor para ficar longe de
Cauler. Esses corredores realmente não escondem nada.
Minha boca ainda está dormente e seca e minha frequência cardíaca
só volta ao normal quando estou de tênis e meus patins são guardados.
Eu deveria dizer algo. Seria estranho sair sem dizer nada. Certo?
Como admitir a derrota. Ou talvez dizer algo o deixasse todo convencido.
Ainda mais do que o normal. Eu deveria agir como se nada tivesse
acontecido. Não mudou nada. Deixe-o pensar que eu não me importo de
uma forma ou de outra.
— Ah, Terzo? — Cauler está segurando a porta aberta, olhando para
mim. — Você planeja passar a noite aqui ou o quê?
A gola de seu moletom está esticada de onde eu estava puxando. É
óbvio o que ele estava fazendo. Eu me sinto corar só de olhar para ele e
abaixo a cabeça para escondê-lo enquanto o sigo para fora.
Andamos perto o suficiente para que nossos braços se toquem.
Quando ele tem certeza de que ninguém está olhando, ele até desliza a
mão ao longo das minhas costas, enviando calafrios através de mim.
Tenho algumas mensagens de Dorian exigindo que eu vá à casa de
hóquei.
Dorian: Terzooooooooo
Onde está você?
Casa de hóquei agora
Você perdeu o jantar da equipe
Que significa.
Meu quarto.
Está vazio.
Meu coração está batendo forte à medida que nos aproximamos do
meu prédio. Ele tem que passar pelo meu para chegar ao dele. Minha
janela de oportunidade está se fechando.
Como você convida um garoto de volta ao seu dormitório? A última
vez que fiquei com um cara, foi meu parceiro de laboratório no último
ano, e estávamos estudando no quarto dele enquanto os pais dele
estavam do lado de fora, então não tive que fazer nada de estranho, sei lá,
propor algo?
Passamos pela entrada da frente do meu prédio. Meu quarto fica nos
fundos, então não é totalmente óbvio que estou enrolando. Enfio a
cabeça ainda mais no capuz quando passamos por um grupo de bêbados
cantando a alma mater no estacionamento.
Assim que eles estão atrás de nós, eu engulo em seci.
— Você... — digo ao mesmo tempo em que Cauler diz: — Você vai...
Paramos do lado de fora da última porta do meu prédio e nos
encaramos. Eu olho para ele e espero que ele termine o que estava
dizendo. Ele lambe os lábios, olha ao redor do estacionamento. Coloca as
mãos nos bolsos e levanta os ombros.
Eu posso sentir seus nervos.
Ele não olha para mim quando finalmente diz:
— Você ia para a casa de hóquei?
— Nah — eu digo. — Perdemos o jantar.
Ele engole.
— Ah.
Eu mudo de pé para pé.
— Você ia?
— Acho que não.
O ar entre nós parece perigosamente carregado. Ou talvez seja a
ansiedade. Está congelando, mas minhas mãos suam nos bolsos da minha
jaqueta e meu rosto está quente.
— Você quer… — Eu paro, apontando vagamente em direção à porta
com meu cotovelo.
Cauler olha para mim, encontra meus olhos. Não desvia o olhar. Eu
não consigo respirar. Meu corpo inteiro treme, e não é só de frio. Acho
que nunca fiquei tão nervoso quando se trata de algo assim.
Talvez com Nova, mas foi porque era a primeira vez. Eu nem estava
tão nervoso na minha primeira vez com um cara. Também não é como se
eu tivesse sentimentos por Cauler.
Ele é apenas... muito gostoso.
Cauler acena com a cabeça.
— Sim — diz ele. Sua voz falha e ele tem que limpar a garganta. —
Sim, tudo bem.

MAL PASSAMOS PELA porta antes que Cauler tire minha camisa e
coloque seus lábios no meu pescoço.
— Tudo bem? — ele pergunta quando minhas costas batem no
colchão.
— Eu posso? — Eu pergunto com minhas mãos no cós de sua calça
jogger.
— Você quer? — ele pergunta com uma camisinha embrulhada na
mão.
Sim sem fôlego a cada progressão. Ele é gentil quando precisa ser.
Menos quando peço a ele que não o faça. Ele me beija como se quisesse
dizer isso. Me mantém perto dele.
É o suficiente para rasgar meu peito vazio.
NOVA VINTER

Mickey: Notícia de última hora


Ficar com um cara gostoso não cura a depressão
Nova: Eu poderia ter te dito isso
Mickey: Bem, por que você não fez??
Nova: Você nunca perguntou?
Mas se arrepende?
Mickey: Quero dizer, literalmente aconteceu
Tipo ele acabou de sair
E ainda não voltou para me morder na bunda, então ainda não
Nova: Então o que importa
Nada vai curar sua depressão, mas
você pode encontrar coisas que facilitam o manuseio
Se é Jaysen Caulfield e vocês dois gostam disso
então faça o que quiser
Mickey: Quem disse que foi Jaysen Caulfield?
Nova: Mickey.
DOZE
Cauler sai antes que Dorian volte.
Eu não consigo dormir. Eu posso ouvir a música vindo dos fones de
ouvido de Dorian do outro lado da sala, e eu não entendo como ele
consegue dormir com isso tão alto.
Mas não é a música dele que me mantém acordado. Não sei o que é,
só me sinto meio... não sei, solitário, acho. Estou acostumado a ficar
sozinho. Não tão acostumado a me sentir sozinho assim.
Um colchão de solteiro não deveria parecer tão grande.
Eu puxo os cobertores sobre minha cabeça e fecho meus olhos. Eu
preciso dormir. Não poderei jogar, mas ainda tenho que estar no jogo
amanhã. Além disso, tenho dois trabalhos para escrever e estou
perigosamente perto da liberdade condicional acadêmica. O treinador e o
diretor de atletismo não se importam com quem eu sou, eles ainda me
colocarão no banco. Eu vou ter que me ferrar no próximo semestre se eu
quiser jogar no Frozen Four.
O que me lembra. Eu só tenho quatro meses com os Royals. Seis em
Hartland. Então estarei sozinho em qualquer cidade que me designe e
determine todo o meu futuro.
Eu tiro os cobertores e procuro um moletom limpo do chão antes de
correr para o frio, indo para o prédio de Delilah. Entro atrás de um
residente antes que a porta possa se fechar e me trancar e subo as
escadas de dois em dois para o segundo andar. Eu bato na porta de Jade e
Delilah sem me preocupar em ficar quieto sobre isso.
O RA reage primeiro, colocando a cabeça para fora de seu quarto no
final do corredor curto e me encarando.
— Sério, mano, são três da manhã, não é?
Eu olho para ele sem expressão, mantendo contato visual enquanto
dou mais três batidas lentas e pesadas na porta. Ele balança a cabeça e
revira os olhos antes de voltar para a escuridão de seu quarto. Eu
também não gostaria de lidar com minhas besteiras mesquinhas.
Jade atende a porta com um sutiã esportivo e calça de moletom, um
lado do cabelo pressionado contra o crânio, o outro esvoaçando. Seus
olhos estão semicerrados, e ela leva alguns segundos antes que ela seja
capaz de focalizá-los em mim.
— Ah — ela diz. Seus olhos descem para o meu pescoço, e de repente
ela está bem acordada. — Ah.
Eu franzo a testa, tocando minha garganta. É como pressionar uma
contusão. Ah. Não. Eu me espremo passando por Jade no quarto e corro
para o espelho em cima de uma das cômodas. Há um chupão enorme e
escuro no lado esquerdo da minha garganta.
— Me mata. — Não há nenhuma maneira que eu esteja escondendo
isso.
— Acho que você teve uma boa noite — diz Jade, bocejando. Ela se
inclina contra a cômoda com os braços cruzados.
— Me mata — eu digo mais alto.
— Eu vou se você não calar a boca — Delilah resmunga da cama
gigante que eles criaram empurrando os dois juntos. Ela nem é visível
sob a massa de cobertores e travesseiros empilhado em cima dela. Eu
rastejo para a cama ao lado de onde eu acho que ela pode estar deitada.
— Por favor — murmuro.
Eu posso me esconder no meu quarto com um capuz puxado sobre a
minha cabeça a maior parte do dia, mas haverá câmeras no jogo.
Câmeras e milhares de pessoas com celulares. Depois, há sala de estudo
no domingo e fita de jogo e um skate leve na segunda-feira. Dois jogos na
próxima semana, mais câmeras em mim, e meus pais aqui, e de jeito
nenhum isso vai desaparecer com o tempo.
Jade se senta do meu outro lado, me ensanduichando entre elas
enquanto Delilah luta para sair de seus cobertores apenas o suficiente
para ver. Ela aperta os olhos na luz e empurra a cabeça para trás nos
travesseiros para um ângulo melhor quando ela olha para mim. Ela faz
uma careta.
— Isso é repulsivo. Você é meu irmãozinho, apague isso da minha
mente.
Sinto que estou dissolvendo. Eu rolo de bruços e enterro meu rosto
em um travesseiro, os braços dobrados sob mim.
É muito. Estou cheirando a saliva. Eu preciso de um banho. Eu
preciso dormir. Eu preciso de água. Preciso trabalhar nos meus papéis.
Preciso voltar ao ringue. Eu preciso.
Passei duas temporadas completas com o NTDP e nunca me apeguei
a nenhum dos meus companheiros de equipe. Alguns meses com os
Royals e já estou temendo o dia em que nossa temporada terminar e eu
os perder. Eu nem sei como aconteceu ou quando, mas eu me importo
com eles.
E em breve todos eles serão adicionados à minha lista de ex-
companheiros de equipe, Dorian e Barbie e Cauler ainda aqui, ainda uns
com os outros, com salas de estudo do time e festas na casa de hóquei e
eu estarei em qualquer cidade que me convocar. Sozinho.
— Eu não quero sair — eu digo. Eu puxo o travesseiro sobre minha
cabeça para me esconder deles.
— O que você quer dizer? — Delilah pergunta lentamente.
— Hartland. Eu quero ficar.
— Você pode — diz Jade. Ela coloca a mão no meu ombro, e eu tento
parar de tremer para que ela não sinta. Lutar contra isso só piora. —
Você tem total direito. Você pode ter quatro anos se quiser. Você não
precisa sair.
— A NHL vai esperar por você — diz Delilah.
Mas ela está errada. Se eu ficar, há uma boa chance de eu perder a
primeira escolha. O objetivo que estabeleci para mim toda a minha vida.
A única coisa que eu quero mais do que tudo.
Não posso abrir mão disso por nada.
Nem mesmo Jaysen Caulfield.

NÃO ESTOU PERMITIDO no banco com o time para o próximo jogo,


então me sento com Jade na fileira atrás de onde o time feminino se
sentará assim que terminar de trocar. Tudo o que todo mundo quer falar
é sobre a minha briga, e eu mastigo a borda do meu copo de plástico
como se fosse me esconder de tudo o que eu fiz na noite passada. Delilah
passou maquiagem no meu chupão e honestamente que Deus a abençoe,
porque eu não precisava adicionar isso aos hematomas espalhados por
toda a internet agora.
A maioria das pessoas recua quando Jade começa a me contar tudo
sobre seus planos para seu portfólio de arte final, mas alguns ainda são
rudes o suficiente para tentar interromper.
Eu os ignoro.
— Eu não sei, mas estou preocupada — ela diz quando as primeiras
jogadoras começam a se sentar em seus assentos. — Sinto-me como se
nada mais fosse original, como se qualquer coisa que eu invente, alguém
já fez, e fez melhor, e mesmo que não tenha, as pessoas vão dizer que
fizeram porque eu sou uma mulher negra. As pessoas não gostam de
admitir quando uma mulher negra pode fazer algo melhor do que elas.
— Vai ser muito difícil negar isso com o trabalho que você faz — eu
digo. Eu não sei nada sobre arte, mas eu sei quando algo parece bom, e a
dela parece bom.
Jade suspira, observando Delilah fazer seu caminho em nossa
direção.
— Eles sempre dão um jeito.
É estranho ver Delilah em algo que não seja um vestido ou
equipamento de hóquei, combinando com seu time em seus moletons
pós-jogo. Ela afunda no assento bem na frente de Jade, e quando digo
afunda, quero dizer que ela afundou tão baixo que mal está no assento.
Jade se inclina para frente e oferece a ela o chá que ela trouxe em uma
caneca de viagem e uma pílula sobre os ombros. Delilah inclina a cabeça
para trás e diz:
— Deus, eu te amo. Obrigada.
Jade beija sua têmpora e se recosta enquanto Delilah toma a pílula
com um gole curto de chá.
— O que há de errado com ela? — Eu pergunto.
Jade franze a testa.
— Cólicas.
Eu estive em um bate-papo em grupo com minhas irmãs tempo
suficiente para saber que não é algo para zombar. Especialmente não
com Delilah. Ela tem algo chamado endometriose e aparentemente é pior
do que um ataque cardíaco.
— Mas você acabou de jogar um jogo! — Eu digo. E ela dominou
diretamente o gelo.
— Assim é a vida quando se tem um útero — resmunga Delilah.
Eu faço uma careta, voltando minha atenção para o gelo onde minha
equipe está terminando o aquecimento. Dorian, Barbie e Cauler patinam
em direção ao banco juntos. A visão de Cauler torna difícil respirar, e
quando ele olha para mim e sorri, acho que morro um pouco.
Passo a maior parte do primeiro período conversando com Jade e
respondendo perguntas dos fãs sentados ao nosso redor, a ponto de sem
dúvida ser repreendido pelo treinador novamente por não prestar
atenção.
Ver os Royals jogar do lado de fora é quase uma experiência
religiosa. Nós estabelecemos algo rápido e fluido e bonito e
completamente digno de nosso recorde de 10–3–1. Nosso talento está
meio que carregado na linha superior, mas os outros três não estão
muito atrás. Nossos blueliners são facilmente os melhores da NCAA, e
Colie tem sido uma fera no gol.
Minhas antigas equipes eram boas. Perdi a conta do número de
campeonatos que ganhei ao longo dos anos. Ganhei uma Clark Cup com o
NTDP U17 e uma medalha de ouro com o U18 no Mundial IIHF na
temporada passada. Mas nunca senti nada por essas vitórias ou pelos
caras que as compartilham comigo. Eu nunca senti orgulho enchendo
meu peito tão completamente que literalmente dói, especialmente não
para um time que está na metade da temporada.
Não há dúvida em minha mente que eles vão adicionar um novo
banner do campeonato às vigas no próximo outubro. Eu quase posso me
imaginar de pé neste gelo, vendo a bandeira subir com Cauler, Dorian e
Barbie ao meu lado. Na verdade, estarei em qualquer cidade que me
convocar em junho, assistindo a uma transmissão ao vivo no site dos
Royals, se tiver sorte.
Toda vez que minha linha vai para o gelo, meu coração salta. Wicker
foi retirado da segunda linha para me substituir, e não demorou muito
para que todos se adaptassem. Wicker adiciona essa pequena camada
extra de areia à velocidade e estilo de flash que desenvolvemos juntos.
Ele faz esse passe de gelo cruzado doentio para Zero no terceiro que teria
sido uma assistência se Zero não o tirasse do cano.
Eu soltei uma respiração ofegante.
— Você tem medo de que Wicker roube seu lugar? — pergunta uma
das jogadoras do time feminino, virando-se na cadeira para sorrir para
mim.
— Não — eu minto. Eu nunca estou preocupado com alguém
tomando o meu lugar. No gelo, no draft, neste campus, nas vidas de
Dorian, Barbie e Cauler. O treinador já deu meu lugar uma vez, então eu
sei que ele não tem medo de fazer mudanças. Deus. E se eu não me
encaixar em outra linha e meu jogo se prejudicar? E se todo mundo
decidir que foi Cauler me fazendo parecer bem, e não o contrário?
Porque Cauler está jogando tão bem sem mim quanto joga comigo.
Eu não consigo parar de olhar para ele mesmo quando ele está sem o
disco. A maneira como ele se move no gelo faz minhas palmas suarem
tanto que estou quase constantemente limpando-as no meu jeans. É pior
– melhor – quando ele faz essa jogada totalmente desagradável,
praticamente quebrando os tornozelos de dois blueliners separados. Eles
parecem que nunca jogaram hóquei antes em suas vidas enquanto ele
tece através deles a caminho da rede. Ele abaixa a barra de puck e se joga
no copo em comemoração.
E então. Quando ele se separa do grupo dos meninos, a caminho do
banco. Ele me encontra na arquibancada e aponta um dedo diretamente
para mim, com um pequeno sorriso presunçoso em seu rosto. E ele pisca.
Eu sinto isso na minha alma.
Eu derreto no meu lugar e seguro meu copo na frente da minha boca,
rosto inclinado para baixo. Eu realmente não preciso do meu rubor
transmitido pelo jumbotron.
Jaysen: Esse gol parecia tão sexy quanto senti?
Eu bloqueio meu telefone antes que Delilah ou Jade possam dar uma
olhada nele. É estranho sair da arena com os fãs, mas o treinador
aparentemente quer mexer com a minha cabeça ou algo assim, porque
ele me baniu do vestiário em cima da minha suspensão de um jogo.
Está funcionando também. Eu costumava estar ansioso para fugir, ir
para longe do hóquei o mais rápido possível, para aproveitar o máximo
de uma pausa que pudesse. Mas agora sinto falta do meu time. Eu deveria
estar lá.
Eu puxo meu telefone de volta e deixo Delilah e Jade dar alguns
passos à minha frente.
Mickey: Difícil dizer
quero dizer que foi bonito sim
Mas eu não estou exatamente excitado por jogadas de hóquei
Jaysen: KKKKKKKKK
Explique ontem à noite então
Enfio meu telefone no bolso e escondo meu rosto em chamas no
capuz.

POR MELHOR que as coisas estejam indo, os dias estão ficando mais
curtos, então minha depressão não dá a mínima. Está ficando muito frio
para fazer a lição de casa no cais entre as aulas, mas assim que entro no
meu quarto, tudo o que quero fazer é deitar na cama e assistir a vídeos
do YouTube de experiências de quase morte capturadas pela câmera.
Assim que eu bati no colchão, acabei. Eu nem percebo quanto tempo
perdi até que Dorian irrompe pela porta e se joga na cama, gemendo. Isso
significa que já passou do meio-dia.
— Você já entrou em uma sala silenciosamente? — Eu pergunto. É
bastante comum neste momento que eu não tenha mais um ataque
cardíaco toda vez que ele volta, mas ainda assim.
— Não. — Sua voz é abafada pelos travesseiros.
Ok, então eu posso ter zero habilidades sociais, mas até eu posso
dizer quando Dorian, literalmente uma bola de sol, está mal. Ainda assim,
tudo o que posso pensar em dizer é:
— Você está bem?
A cabeça de Dorian aparece dos travesseiros em um instante,
olhando para mim como se ele não percebesse que eu estava na sala
mesmo depois de falar comigo. Ele me encara por um momento com a
boca aberta antes de rolar dramaticamente de costas, jogando um braço
sobre os olhos para garantir.
— Hoje foi o pior dia da minha vida. Quero me jogar no lago.
A sala parece velha e deprimente e, se eu não tomar um pouco de ar
fresco logo, posso sufocar. Portanto, não é totalmente altruísta quando
digo:
— Não sei quanto a se jogar, mas sentar à beira do lago sempre me
ajuda. Eu vou com você. Evito que você se afogue, se quiser.
Dorian abaixa o braço para olhar para mim novamente. Eu não o
culpo pelo olhar surpreso em seu rosto. Quero dizer, quando eu já fiz
uma sugestão sociável? Estou prestes a dizer para ele esquecer e voltar
para a minha espiral do YouTube quando ele se levanta da cama e inclina
a cabeça em direção à porta.
— Ok. Vamos lá.
Não falamos no caminho para o cais. Enfio as mãos nas mangas e
cruzo os braços com força sobre o peito para bloquear um pouco do frio.
Dorian anda ao meu lado, perto o suficiente para compartilhar o calor do
corpo. Ele enfia as mãos nos bolsos da calça e leva os ombros até as
orelhas. Não vamos durar muito no cais com esse frio, mesmo com
moletons por baixo dos casacos. O céu parece pronto para despejar dois
metros e meio de neve sobre nós.
É tentador deixar o silêncio se estender quando estamos sentados
um ao lado do outro no cais. Eu poderia usar o silêncio. O cheiro do ar
frio e o tempo para pensar apenas com os sons do vento na água. Mas eu
trouxe Dorian aqui porque ele é meu amigo e eu vou ajudá-lo, caramba.
Então eu digo:
— Fale comigo.
A próxima respiração de Dorian é afiada. Ele a segura por um longo
tempo, observando-se chutar os pés sobre a água, antes de soltá-la em
um suspiro lento.
— Assim que acordei, eu sabia que seria um dia ruim.
— Aconteceu alguma coisa?
Ele passa os dedos pelo cabelo.
— Não. Acabei de acordando tão... cansado. E então foi apenas uma
profecia auto-realizável a partir daí. Eu estava atrasado para a aula.
Esqueci meu livro. Tão no mundo da lua que eu não tinha ideia do que
estava acontecendo quando meu professor me chamou. Cheguei à minha
próxima aula e percebi que tínhamos uma tarefa que eu esqueci
completamente.
Ele mantém os olhos na água enquanto fala, mesmo quando
finalmente levanta as pernas e as cruza, mesmo quando ele começa a
puxar ansiosamente seu cabelo, mesmo quando as ondas distorcem seu
reflexo.
— Achei que estava melhor — diz ele, quase para si mesmo. — Não
sei o que aconteceu.
— É um dia difícil — eu digo, embora eu tenha certeza de que há
muito mais do que isso. — Não se culpe por isso.
Ele suspira pesadamente e deixa cair as mãos no colo, torcendo-as
juntas.
— É mais do que isso, porém. Tipo, eu sei que pareço uma pessoa
super feliz o tempo todo, mas eu só... não sou. Estou deprimido pra
caralho. E não é como se eu tivesse alguma razão para isso. Minha família
é perfeitamente equilibrada e chata. Ambos os meus pais são
professores. Eles sempre foram solidários e atenciosos e cuidadosos. Eu
não passei por nenhum grande trauma ou algo assim. Meu maior sonho
de estar na NHL está se tornando realidade e, enquanto isso, posso
estudar algo que realmente amo, então por que estou tão infeliz?
— Você não precisa de um motivo para estar deprimido — eu digo
automaticamente. — É química.
Dorian dá uma risada sem humor.
— Sabe, logicamente eu sei disso. Mas quando você está nisso, seu
cérebro usa tudo o que pode para derrubá-lo, e esse é um deles. Que
outras pessoas estão muito pior do que eu e estou sendo egoísta por
estar tão triste.
Jesus. É como se ele estivesse tirando as palavras da minha cabeça.
— Eu sei o que você quer dizer — eu digo com cautela. Isso não é
algo que eu realmente fale, mas qual é o mal quando Dorian passa pela
mesma coisa?
Ele puxa as mangas sobre as mãos e as pressiona contra os olhos.
— Você também, hein?
— Sim.
— Sabe, eu imaginei. Como você lida com isso?
Eu rio pelo nariz, observando um pequeno veleiro com velas em
preto e roxo do Royals deslizar pelo lago não muito longe.
— Eu deito na cama e assisto ao YouTube.
Há um momento de silêncio antes que ele diga:
— Melhor do que arrancar o cabelo.
Ele estende a mão e escova para trás o grosso tufo de seu cabelo
escuro, revelando alguns pedaços de couro cabeludo quase nu acima de
sua orelha direita. Ele o segura ali por um segundo antes de deixar seu
cabelo cair de volta no lugar, então se inclina para frente com os
cotovelos nos joelhos, olhando para o lago, os dedos cruzados na frente
dele. Ele pressiona os polegares nos lábios e fala ao redor deles.
— Isso é o que eu faço quando fica muito ruim. Eu não posso evitar. É
uma coisa real que eu sou diagnosticado. Tricotilomania. Então não é
apenas um problema meu, é uma coisa real.
— Você não tem que justificar isso para mim — eu digo. — Eu sei
que a depressão funciona de maneira diferente para todos.
— Sabe quando fica ruim e parece que você não tem controle? Bem,
isso me faz sentir que tenho um pouco de controle sobre alguma coisa,
mesmo sabendo que é exatamente o oposto. — As palavras saem dele
como se ele estivesse aliviado apenas por dizê-las. — Metade do tempo
eu nem estou ciente de que estou fazendo isso. Como é esse controle,
sabe? É como eu me faço passar por essa pessoa super feliz e
borbulhante, então eu decido como as pessoas me veem. Mas é exaustivo,
cara.
— Você tem conversado com o Barbie sobre isso? Quero dizer, Nova
é a única pessoa com quem realmente falo sobre meus problemas, e
vocês dois parecem tão próximos quanto nós.
Dorian joga a cabeça para trás e olha para o céu, gemendo. Sua
mandíbula aperta e ele engole em seco.
— Sim, normalmente. Mas... não quero dizer a ele que... tive uma
recaída, acho. É embaraçoso.
— Você realmente acha que ele julgaria?
— Não, mas. — Ele dá de ombros e enfia as mãos nas axilas. Nós
realmente não deveríamos ficar aqui muito mais tempo. Vamos acabar
com pneumonia. — Ainda é difícil. Ele tenta, mas não entende como
outra pessoa que passa por isso entenderia.
Eu o observo em silêncio por um longo momento. Não gosto do tom
impotente em sua voz ou de me sentir completamente impotente para
ajudá-lo. Não sei confortar as pessoas. Mas Dorian fez o seu melhor por
mim e devo a ele tentar.
— Você deveria dizer a ele — eu digo suavemente. — Ele se importa
com você. Tenho certeza que ele faria qualquer coisa por você.
— Eu sei.
— E, tipo, eu sei que nunca seremos tão próximos quanto vocês dois,
mas farei o que puder também. Eu posso nunca realmente saber o que
dizer, mas sempre posso ouvir.
Ele bate no meu ombro com o dele, me dando um meio sorriso.
— Ah, Terzo. O mesmo vale para você, sabe.
Nós dois estremecemos quando o vento aumenta, alguns flocos de
neve soltos flutuando para derreter no lago. Eu não quero ser o primeiro
a me mexer. Eu me ofereci para sentar aqui com Dorian, então eu vou
ficar aqui até nós dois morrermos congelados, se é isso que ele quer.
Mas não demora muito para que ele diga:
— Estou congelando meus mamilos aqui fora, cara. Quer correr para
o saguão primeiro, tomar um café?
Ele começa a se levantar, mas eu alcanço sua manga e o seguro no
lugar. Dorian me observa, esperando. Eu gosto de Dorian. Se há alguém
além de Cauler com quem eu gostaria de manter contato depois que eu
for embora, é ele. Contei-lhe um dos meus segredos. Por que não o outro?
— Você nos considera amigos? — Eu pergunto. Minha voz é áspera,
meus nervos chegando.
Ele sorri. É pequeno e um pouco triste, mas me dá minha resposta
antes mesmo dele dizer:
— Duh. Que tipo de pergunta é essa?
— Então, posso te dizer algo que apenas algumas pessoas sabem?
Agora seu sorriso se abre e ele tem esse brilho de conhecimento em
seus olhos. Meu rosto queima apesar do frio. Claro que ele já percebeu
isso.
— Absolutamente.
Eu suspiro.
— Você já sabe com certeza.
— Pode ser. Me teste.
— Sou bi. — Sai sem rodeios, todos os nervos aniquilados por seu
sorriso.
— Isso é ótimo, Terzo. — Ele torce a mão para agarrar meu
antebraço e me colocar de pé. — Obrigado por confiar em mim o
suficiente para me dizer.
— Como você descobriu?
— Pf. Você já viu como você olha para Cauler? Eu vou te mostrar uma
foto em algum momento.
Ele passa o braço no meu ombro e o mantém lá enquanto
caminhamos para o refeitório, minhas mãos nos bolsos.
— Isso significa que posso enviar memes de depressão agora? — ele
pergunta, e eu me sinto mais livre do que nunca.

DORIAN E EU realmente agimos como colegas de quarto pela primeira


vez, ficando no nosso quarto só nós dois. Ele se senta ao meu lado na
minha cama e me mostra o projeto em que ele e a Barbie estão
trabalhando para a aula de cinema e mídia. É alguma coisa do tipo
documentário falso, como The Office ou Parks and Rec, mas com os times
de hóquei do Royals. Há entrevistas com um monte de jogadores, até um
pouco com Delilah falando sobre mim quando criança e Cauler fazendo
impressões exatas de nossos treinadores.
Dorian está um desastre por causa do treino naquela noite, parece
desleixado, nem de longe tão falador como sempre. Ele não consegue
nem olhar Barbie nos olhos. Eu tenho que empurrá-lo fisicamente em
direção a Barbie enquanto saímos da arena para ele finalmente puxá-lo
de lado. Ele diz algo em espanhol calmo, então me dá um sorriso nervoso
por cima do ombro e o segue em direção ao seu dormitório.
Eu me sinto um pouco vazio, vendo-os partir, ombros levantados e
braços roçando como se estivessem compartilhando o calor um do outro.
Os meninos estão rindo ao meu redor enquanto descemos a colina, mas
nenhum deles está rindo comigo. Mesmo que eu possa chamar alguns
deles de meus amigos agora, eu não tenho nada como eles.
Fico no meio do nosso quarto por alguns minutos quando volto lá,
absorvendo o silêncio. Eu não gosto disso. Mesmo quando Dorian está
aqui, fazendo a lição de casa silenciosamente enquanto eu trabalho
sozinho, pelo menos eu sei que tenho outra pessoa por perto.
Ele não volta antes de eu ir para a cama, e eu acordo na manhã
seguinte com um puxão, Barbie acariciando minha orelha.
— Você está babando, Terzo — diz ele.
Eu resmungo, passando a mão pela boca apenas para que ela volte
seca. Eu olho para ele enquanto ele desaba sobre a cama de Dorian,
encostado na parede, de costas para o quarto. Eu esfrego o sono dos
meus olhos e verifico a hora no meu telefone. Sete da manhã
— Nós não dormimos — Dorian murmura, de pé nas proximidades.
— Você está bem? — Eu sussurro.
Dorian solta um suspiro longo e lento, olhando para Barbie por cima
do ombro.
— Não realmente. Mas ficarei.
Eu aceno e saio para tomar um banho. Quando volto para o quarto,
Dorian também está dormindo, encolhido com os joelhos e a testa
encostados nas costas de Barbie. Eu me preparo para a aula o mais
silenciosamente possível para não acordá-los.
TREZE
A última Simulação do Draft da NHL tem Cauler em primeiro.
Não vou deixar isso me incomodar. Ainda temos sete meses até o
draft; é tudo especulação neste momento.
Mas então o YouTube tem que recomendar um vídeo chamado
"Opinião Impopular Re: NHL Draft". É deste vlogger de hóquei chamado
Rhys Sarnac que se orgulha de ser fã de hóquei em geral e não apenas de
um time. Ele tem um boné para cada time da NHL pendurado na parede
atrás dele em cada vídeo e um armário cheio de camisas de todas as
cores. Exceto que desde que Seattle entrou na liga, ele está comprando
cada vez mais de seus produtos e mostrando dicas do viés de homer pelo
qual ele sempre critica os outros vloggers. Ele também faz questão de
falar mal de mim. Como se fosse muito mainstream para pensar que eu
sou bom ou algo assim, eu não sei.
Eu sou inscrito dele de qualquer maneira, porque gosto de sofrer.
Hoje, ele está vestindo um boné do Canucks e uma camisa do Blue
Jackets. Ele começa o vídeo falando sobre os últimos rankings do draft,
como ele concorda com quase tudo, exceto a ordem dos três primeiros.
— Eu sei que vou receber muito ódio por isso — diz ele. — Mas as
pessoas não estão prestando atenção suficiente em Alex Nakamoto. O
cara fez 161 pontos em 68 jogos na temporada passada e está a caminho
de bater isso nesta temporada. Na verdade, ele está a caminho de
ultrapassar o recorde de pontos de uma temporada da OHL que Doug
Gilmour detinha desde 1983. Ele tem o tamanho de Jaysen Caulfield e as
mãos de Mickey James, e a única razão pela qual ele é o número três é
porque todo mundo está tão obcecado com essa rivalidade que eles têm
acontecendo na Hartland University.
Eu me inclino para trás em meus travesseiros e apoio meu laptop em
meus joelhos. Essa vai ser boa.
— Esta é a NHL que estamos falando aqui — Rhys lembra a seus
telespectadores. — Não é um reality show de TV. Não existem legados
familiares no hóquei. Um cara não pode entrar na liga na cola de seu pai.
— Ele ergue as mãos e abaixa a cabeça levemente como se já estivesse
tentando acalmar a seção de comentários. — Eu entendo que James é um
bom jogador. Mas ele não é material de primeira escolha. Seu tamanho
pode não ter sido um grande problema no hóquei de nível inferior, mas
ninguém está entrando no Show com 1,65m e causando um impacto
duradouro. O hóquei é muito físico. É um dos esportes mais brutais do
planeta. Há momentos em que alguém está se aproximando de James e
eu tenho que desviar o olhar porque tenho medo de testemunhar um
ferimento fatal, só estou dizendo. Eu sei que está além do controle dele,
mas ainda assim.
Ok, então este deveria ser um vídeo sobre Alex Nakamoto e se tornou
mais uma sessão de torração. Ele passa quatro minutos inteiros falando
mal de mim antes de finalmente chegar ao ponto.
— Nakamoto deve ser um candidato à primeira escolha, mas eu
ficaria bem se ele ficasse em segundo, desde que fosse para Caulfield e
não para James. Ele está recebendo o eixo porque as pessoas querem
algum tipo de história de conto de fadas.
Desço até os comentários enquanto ele continua falando. A primeira
diz que um baixinho roubou sua garota ou? Outro diz você provavelmente
tem um santuário para mickey james em seu armário, mano. você fala
sobre ele o suficiente.
Há centenas de comentários, alguns assim, alguns concordando com
Rhys. Há um ensaio inteiro prevendo como Nakamoto vai se aproximar
de nós enquanto Cauler e eu estamos muito ocupados insultando um ao
outro no Twitter e uma tese completa sobre o quão superestimado eu
sou.
Melhorei em não deixar coisas como essa me afetarem à medida que
a temporada avançava, então só fico um pouco irritado quando o vídeo
termina. Eu rolo para cima para dar meu polegar para baixo habitual e
me deparo com a imagem mais pessoalmente desrespeitosa de Cauler
que já vi na minha vida.
A miniatura de um dos vídeos recomendados é uma foto espontânea
de Cauler. Ele está de óculos, um chapéu virado para a frente e um
daqueles moletons com golas estranhas e desleixadas. Sua cabeça está
inclinada para o lado, mostrando a curva de seu pescoço, e seu sorriso é
brilhante e torto e sexy como o inferno. Eu ainda posso sentir aquele
piercing no lábio contra meus dentes, a forma como aquele sorriso
parecia pressionado contra minha garganta.
Oh Deus.
Clico no vídeo, um resumo dos jovens mais gostosos do hóquei. Eu
sou o primeiro a aparecer, o que tecnicamente é o final da lista, com
certeza, mas também mais do que um pouco surpreendente. A narradora
parece uma universitária, falando sobre como eu fui abençoado por
minha mãe italiana por minha aparência e amaldiçoado por ela por meu
tamanho e que se eu fosse apenas 15 centímetros mais alto, eu estaria
morto. Não importa. Pulo para Cauler.
Ele é o número um. Claro que ele é o número um. Vença um monte de
novatos e caras da NHL que já foram convocados.
E eu fiz sexo com ele. Uma vez, mas ainda assim.
Meu rosto fica mais quente a cada foto que aparece enquanto a
garota fala. Cauler no gelo em seu equipamento de Jogo. Cauler em suas
roupas pretas de rua. Cauler com intensidade em seus olhos, queimando
através da grade de seu capacete Real. Cauler suando na academia.
Cauler, por algum motivo desconhecido, completamente desnecessário,
sem camisa.
Ok, sim, isso é demais. Eu me levanto e tranco a porta pelos próximos
cinco minutos.
Eu tenho que ir ao banheiro depois e jogar água no meu rosto para
esfriar. Como vou olhar Cauler nos olhos agora? Fazer sexo com alguém é
uma coisa; isso é algo completamente diferente.
Pego meu telefone para acompanhar as fotos de Nova, assistindo a
um vídeo dela falando sobre um idiota na fila na frente dela em um café
com um filtro espremendo seu rosto enquanto volto para o meu quarto.
Não está vazio do jeito que eu deixei. Cauler está de pé no meio do
meu quarto. Ele vira a cabeça no meio de um sorriso, polegares
enganchados nas alças de sua mochila, e por um segundo ele é uma
réplica exata da foto que acabou de me arruinar.
Seu sorriso muda quando ele me vê, como se ele não tivesse certeza
do que fazer com seu rosto. Ou como ele pode dizer. Meu rosto fica
quente. Novamente. Porque perdi minha capacidade de esconder meus
sentimentos em algum lugar em meados de outubro.
— Ok, então — Dorian diz ao lado de sua cama, onde eu não posso
ver da porta. Cauler se vira para ele, e corro para fechar a porta e voltar
para o meu laptop. Graças a Deus não deixei nada incriminador na tela.
— Estou meio inclinado para a institucionalização da morte, mas há toda
a negação do luto no capitalismo em estágio avançado que também é
muito interessante.
— Tem certeza de que não quer pesquisar a logística de lançar
cadáveres em órbita para economizar espaço na Terra? — Barbie diz
impassível. Ele está deitado de costas na cama de Dorian com o telefone
bem acima do rosto com um sorriso vertiginoso. Eu mando uma foto
rápida dele para Nova com a legenda para quem ele está mandando
mensagem.
— Ugh, Deus, você poderia imaginar? — Dorian faz uma careta. —
Seríamos como Saturno, mas com um círculo de pessoas mortas.
— Metal pra caralho — diz Cauler. — Eu serei o primeiro a ir.
— E agora você tem seu tópico de papel — diz Barbie. A julgar pela
selfie astuta que Nova manda de volta, eles definitivamente estão
flertando neste exato momento. — De nada.
— Não estamos fazendo nosso projeto final sobre anéis de cadáveres
— diz Dorian definitivamente, sentando-se no chão e abrindo um livro.
Eu finjo não notar quando Cauler olha para mim antes de sentar no chão
ao lado da minha cama.
— O que está acontecendo? — Eu finalmente pergunto. Voltando de
uma crise existencial no banheiro para uma conversa sobre morte e
cadáveres espaciais. Não como eu esperava que minha noite de quinta-
feira fosse.
— Cauler e eu estamos fazendo nosso projeto Death and Dying
juntos — diz Dorian. — Barbie está aqui porque ele está obcecado por
mim e eu não consigo me livrar dele.
Barbie está muito ocupado sorrindo para o telefone para retaliar. Ele
está tão feliz que faz meu peito doer. Saber que é Nova do outro lado é o
suficiente para me fazer querer chorar. Se apenas uma coisa boa e
duradoura vem de eu estar em Hartland, espero que sejam eles.
Eu pego a bagunça emaranhada dos meus fones de ouvido ao lado do
meu travesseiro e trabalho para consertá-los.
— Por que fazer isso aqui?
Dorian arruma seu laptop, livro, papéis e cadernos ao redor dele no
chão no caos mais preciso que eu já vi. Suas anotações são limpas,
organizadas e detalhadas e exatamente o que eu esperaria de um
estudante de astronomia que estava com 4,0 no meio do primeiro
semestre da faculdade.
— Os veteranos estão fazendo teses na sala dos jogadores, e a
biblioteca está fodidamente iluminada esta noite por algum motivo — ele
diz.
— Por quê? — Cauler pergunta. Ele inclina a cabeça para o lado,
esticando a linha de seu ombro e pescoço longa e convidativa. — Você
não nos quer aqui?
Seu cabelo está começando a crescer em cima. Ele tem uma sarda
escura atrás da orelha direita. Os plugues que ele tem hoje são rosas
negras, um presente de aniversário que ele ganhou de Zero. Ele cheira a
roupa limpa.
— É o quarto de Dorian também — eu digo. Cauler ri e somos tão
óbvios, como ainda não fomos descobertos?
Eu desembaraço os fios e coloco os fones em meus ouvidos,
conectando-os ao meu laptop. Tenho uma tarefa de italiano para amanhã.
Algo simples que levará dez minutos e então não terei que me preocupar
com isso pela manhã. Mas não consigo me concentrar com Cauler
literalmente encostado na minha cama quando não consigo nem tocá-lo.

MAL ESTOU ACORDADO quando Cauler e Dorian terminam a noite.


Barbie adormeceu há uma hora, e Nova começou a me enviar mensagens
sobre o quão perfeito ele é, o que é simplesmente estranho quando posso
vê-lo dormindo com a mão na metade da calça e a boca escancarada do
outro lado da sala.
— Sim, então, com esse esboço, provavelmente poderíamos entregar
isso mais cedo — diz Dorian enquanto junta seus livros e papéis. —
Pegue esse crédito extra, caraaa.
— Podemos trabalhar nisso depois do jogo amanhã — diz Cauler. Ele
fecha a mochila e a joga por cima do ombro e não olha para mim.
— Boa ideia, cara. Festa sem culpa depois.
Eu tenho o YouTube aberto na minha frente e pilhas de lição de casa
para fazer e me sinto um lixo absoluto. Todos esses caras têm futuro na
NHL, assim como eu. Eles ainda levam a faculdade a sério. Eles são meio
que superdotados sobre isso, na verdade.
Dorian sacode Barbie para acordar.
— Saia daqui, Flojo. Você não tem lição de casa para fazer?
Barbie boceja, esticando os dois braços acima da cabeça.
— Estou todo preso. Até mais, Terzo.
— Tchau.
Cauler não me olha enquanto sai, o que é provavelmente,
definitivamente, o melhor, mas ainda parece um soco no estômago.
— Vocês não precisam se esconder perto de mim e da Barbie, certo?
— Dorian diz quando a porta se fecha. — Nós não somos idiotas.
— Nós não estamos escondendo nada — murmuro.
— Claro — diz ele, tirando-o e revirando os olhos enquanto se vira
para sua cama.
Meu telefone vibra. Eu olho para ele, esperando outra mensagem de
Nova.
É Cauler.
Jaysen: Podemos conversar?
Lavandaria?
Eu respiro fundo. Toco meu telefone contra minha testa algumas
vezes. Meu estômago não vem comigo quando me levanto.
— Indo ao banheiro — eu digo.
Dorian nem olha para cima quando diz:
— Pense em mim.
Eu hesito no meu caminho para a porta, piscando para ele por um
momento antes de balançar a cabeça e voltar com: — eu sempre penso.
Sinto-me doente de ansiedade ao descer as escadas.
Podemos conversar.
As possibilidades do que ele vai dizer são tão imensas e
aterrorizantes que provavelmente vou ter uma parada cardíaca se tentar
me agarrar a uma.
Hesito no topo da escada que leva ao porão. Eu posso ouvir a TV na
sala, alto o suficiente para saber que alguém está assistindo Diga Sim ao
Vestido. E não, não é culpa das minhas irmãs ou de Nova que eu saiba
disso.
Desço alguns degraus na ponta dos pés e me agacho até ver duas
garotas amontoadas nos cantos do sofá com laptops no colo, sem prestar
atenção nas escadas ou na lavanderia. Eu silenciosamente faço meu
caminho pelo resto do caminho e no quarto imediatamente à direita,
facilitando a porta fechada atrás de mim.
Eu mantenho uma mão na maçaneta e a outra contra a madeira por
um momento, ouvindo. O som da TV é abafado pela porta, mas não há
sinal de movimento na sala. Deixo escapar um suspiro pesado e descanso
minha testa contra a porta por um momento antes de me virar.
Cauler está encostado em uma pilha de máquinas de lavar, braços e
tornozelos cruzados, sem olhar para mim. Eu me inclino contra a porta
com as mãos atrás das costas e espero. Olhando-o de cima a baixo, a
primeira coisa que noto é que ele não está mascando chiclete. Sua
mandíbula está apertada e ele continua engolindo como se estivesse
nervoso, o que só me deixa ainda mais desconfortável. Minha boca seca e
então eu tenho que engolir também.
Eu o vejo olhar para seus próprios pés, a água corrente de um ciclo
de enxágue zumbindo ao fundo por um minuto inteiro antes que eu não
aguente mais.
— Você está bem? — Eu pergunto.
Ele se assusta como se tivesse esquecido que eu estava aqui. Ele
descruza as pernas e muda seu peso e meus nervos estão estalando. Ele
está prestes a me cortar?
— Sim, apenas… — Ele respira fundo e, ao expirar, diz: — Para onde
vamos a partir daqui, Terzo?
Oh. Não era isso que eu esperava. Tipo, de jeito nenhum.
Minha respiração está audivelmente instável, liberando
completamente os nervos que prefiro manter escondidos. Esse idiota me
arruinou totalmente. Dezoito anos e ninguém jamais poderia descobrir
quem eu realmente era. Alguns meses em uma equipe com Jaysen
Caulfield e não posso me esconder por nada.
— O que você quer dizer? — Eu pergunto.
Cauler zomba, revirando os olhos.
— Você sabe exatamente o que quero dizer. Quero saber onde
estamos.
— E é tudo por minha conta?
Ele puxa as duas mãos para o peito e se inclina para frente em suas
palavras.
— Eu sei o que quero. Preciso saber em que página você está.
Com duas frases, ele me empurrou para a beira do precipício. Eu
posso me virar e ir embora, manter Cauler à distância que ele deveria
estar esse tempo todo, proteger a mim mesmo, meu nome e meu futuro.
Ou eu poderia me deixar cair, só um pouco, e esperar que haja um galho
para me segurar antes de bater nas rochas.
Ou eu não poderia fazer nenhum dos dois. Apenas continuar fazendo
o que estamos fazendo, mantendo as emoções fora disso e seguindo
caminhos separados em maio.
Eu dou um passo à frente. Esfrego uma mão sobre minha boca,
mantendo meus olhos fixos nos dele. Ele se endireita e abaixa os braços.
Eu o apoio contra as arruelas assim como ele me apoiou contra as
boards. Enrolo um braço em volta de seu pescoço e puxo-o para mim.
E eu o beijo.
Duramente.
Forte o suficiente para fazê-lo sentir toda a raiva, ciúme e desejo que
eu tenho por ele há anos. Forte o suficiente para doer quando nossos
dentes batem juntos.
Seus braços deslizam em volta da minha cintura e me puxam
apertado contra ele, curvando minha coluna quando ele se inclina mais
para perto de mim. Eu mordo seu lábio, sinto seu piercing entre meus
dentes, e sua língua pega a minha.
Ele enfia a mão no meu cabelo e me puxa para trás com um punhado,
apenas o suficiente para dizer:
— Eu te odeio.
— Prove.
Eu faço esse som assustado, totalmente nada sexy, quando ele
engancha os braços sob meus joelhos e me levanta do chão, e Deus, pela
primeira vez na minha vida eu sou grato pela minha altura. Ele me coloca
na mesa dobrável, pressionado contra uma pilha de roupas que alguém
deve ter tirado da lavadora e jogado aqui. Elas estão frias e úmidas
contra minhas costas, mas essa é a última coisa em minha mente quando
Cauler me beija novamente.
Eu dei a ele uma total não-resposta. Eu só tenho que mantê-lo
distraído o suficiente para que ele não questione isso.
CATORZE
As pessoas não estão deixando de lado essa coisa de rivalidade.
Há um tweet hilário em que alguém tirou uma foto minha logo após
cheirar sais aromáticos, então estou fazendo essa cara totalmente
enojada, e por acaso estava olhando para Cauler naquele exato momento.
Os fãs estão tendo um dia de campo com isso.
Eu mando para ele. Mais combustível para nossa rivalidade na
internet.
Minha família vai ao meu jogo e de Delilah neste sábado. Será a
primeira vez que estarei com todos eles ao mesmo tempo em muito
tempo, e tudo o que consigo pensar é em me assumir para eles. A mídia
social ainda está por toda parte com Aaron Johansson se assumindo, e eu
ainda estou preso em Delilah me chamando de hetero. Se vou viver uma
mentira o resto da minha vida por causa do hóquei, posso pelo menos ser
real com minhas irmãs.
Eu fico acordado na noite anterior ao jogo agonizando e vasculhando
o Twitter até encontrar outra foto minha e de Cauler. Ele tem um
punhado da minha camisa, como costuma fazer, curvado para que nossas
grades fiquem juntas, parecendo que ele está reclamando de mim
quando na verdade provavelmente estávamos falando sobre alguma
peça doentia que ele queria tentar.
Eu mando essa para ele também, e ele responde com:
Jaysen: Grande festa depois do jogo amanhã
Pronto para ficar bêbado e tolerável novamente?
Mickey: Depende de como o jogo for
Se eu preciso beber até ficar em coma ou não
Jaysen: Cara.
Isso vai ser uma derrota pra eles
O goleiro das águias é a definição de uma peneira
Então prepare-se para beber para se divertir.
Ele fica acordado comigo a maior parte da noite, falando sobre tudo e
nada.
O tipo de conversa que as pessoas fazem no início dos
relacionamentos.
Quando ele finalmente adormece e sou apenas eu sozinho no escuro,
não é só em me assumir que eu estou agonizando. Agora é sobre ele
também.

O TREINADOR PARA DE ANDAR quando me vê no café da manhã do


nosso time na sala dos jogadores.
— Você está doente, James?
— Não.
Só cansado.
Ele estreita os olhos para mim.
— Tire uma soneca antes da hora do jogo.
— Ok.
Eu não fiz.
Quando minha família aparece, estou adormecendo em pé.
Eu obedientemente passo para os braços de papai no átrio da arena e
abraço mamãe de bom grado, mas quando se trata de minhas irmãs, eu
me lanço direto para elas. Eu aperto Madison com força suficiente para
quebrar sua espinha, e Nicolette diz:
— Oh, eu, a seguir! Esse foi o voo mais longo da minha vida e eu voei
para a Nova Zelândia. — Faço o que ela pede, e ela me abraça de volta
com força suficiente para fazer o mesmo. Quando chego a Mikayla, coloco
minha testa em seu ombro e tomo um momento para respirar.
Eu amo minhas irmãs. Se estou sendo honesto, eles são a única razão
pela qual ainda estou por perto. Parei de ligar para meus pais quando
percebi que eles nunca mais voltariam para mim. Papai só liga para falar
sobre hóquei, mamãe só em aniversários e feriados, colocando papai no
telefone também. Mas estou sempre em contato com minhas irmãs,
mesmo quando estou apenas espreitando no bate-papo em grupo.
Eu deveria responder mais. São principalmente memes e discussões
inúteis e pequenas informações sobre seus dias, mas elas devem saber
que estou prestando atenção e me importo.
Mikayla se afasta apenas para ser imediatamente substituída por
Nova.
Espera.
— Que diabos? — Eu digo sem fôlego, enterrando meu rosto na
curva de seu pescoço e puxando-a para mim.
— Surpresa — diz ela. Há uma risada em sua voz e um sentimento
pesado atrás dos meus olhos. Eu ouço quando Bailey aparece com Sid e
Karim, Jade com eles já que Delilah já está se preparando para seu jogo.
Este momento seria absolutamente perfeito com ela aqui. Todo mundo
com quem me importo aqui pessoalmente, em vez de milhares de
quilômetros de distância, no telefone ou na tela do meu computador.
Nova e eu nos abraçamos por alguns longos momentos antes de ela
se afastar e me segurar no comprimento do braço, seu sorriso largo e tão
diferente dos de suas fotos de modelo. Ela está mostrando seu apoio à
Royals com um batom roxo escuro e sombra de olho preta e roxa
brilhante. Seu cabelo loiro na altura da cintura está trançado sobre um
ombro. Ela é dez centímetros mais alta e quatro semanas mais velha que
eu, o que costumava me incomodar quando éramos uma coisa, antes de
eu crescer e perceber que não importava.
— Não vou mentir — diz ela. — Estou muito animada para isso.
— Quando foi a última vez que você me viu jogar? — Eu pergunto.
— Em pessoa? — Ela leva um momento para pensar, dedos batendo
em meus ombros. — Pelo menos dois anos atrás, certo? Eu vim para
Michigan em sua primeira temporada lá.
Minhas irmãs já tiveram o suficiente do nosso momento,
aglomerando-se ao nosso redor para me dar uma olhada.
— Novo time, nova gravata, hein? — Mikayla diz, virando a parte de
baixo da minha gravata roxa para cima, quase me acertando no rosto.
— Voce está bem? — Madson pergunta.
— Sim, cara, você tem ignorado o bate-papo mais do que o habitual
— diz Nicolette. — E você parece calmo como o inferno. Parece
enganoso.
Eu não me sinto calmo como o inferno. Eu meio que sinto que vou
chorar.
Bailey e os outros entram, dando abraços e é bom ver você enquanto
a conversa continua. Jade e Sidney se emocionam com Nova, e há um
rubor em suas bochechas pela atenção, mas seu sorriso ainda é genuíno.
— Se isso ajudar — Mikayla diz —, nós vamos a uma loja de bebidas
antes do jantar. Vou comprar para você o uísque mais chique que
encontrar.
— Escocês? — Nicolette suspira. — Isso será desperdiçado com ele!
— Se ele bebe, não é um desperdício.
— A festa é na casa de hóquei dos homens — diz Bailey. — Vocês
estão todos convidados.
— Laxers não estão — digo a ela.
— A piada é sua, idiota, Zero já disse que poderíamos vir.
— Quebrando suas próprias regras.
— Ele chamou de evento familiar — acrescenta Karim.
A voz de Dorian é a última coisa que espero ouvir neste momento,
mas os gritos são suficientes para me fazer olhar por cima do ombro.
Minha equipe está caindo sobre minha família como um enxame,
parecendo todo oficial em ternos e gravatas e relógios de pulso e gel de
cabelo. Eles me fazem sentir como uma criança brincando de se vestir a
cada jogo.
— Muitas pessoas famosas em um só lugar! — Dorian grita. — Não
aguento!
Metade da minha equipe vai bajular meus pais – papai pode ser uma
lenda absoluta, mas mamãe ainda é Lucia Russo, medalhista olímpica e
quase lendária – e a outra metade cerca minhas irmãs e Nova.
Há muitas pessoas falando ao mesmo tempo, e está ficando mais alto
à medida que os fãs começam a se infiltrar, alguns de nossos colegas
gritando e cantando para nós no caminho, outros parando para olhar
abertamente para a minha família. Quando penso que toda a atenção está
fora de mim, pego Cauler olhando para cá.
Eu nunca vou me acostumar a vê-lo em um terno. Me pega
desprevenido toda vez. Todos os pretos e cinzas, com uma gravata que
eu gostaria de usar. Traga-o de volta por todas as vezes que ele me levou
pelas minhas roupas. Ele me dá aquele mesmo sorriso tímido que me faz
querer morrer todas as vezes.
— Não me diga que o treinador estava certo, Terzo — diz ele. Sua voz
soa fora. Como se ele estivesse escondendo algo. Eu não o culpo,
considerando a companhia. — Você está doente?
— Eu estou bem — eu digo.
— É por isso que você está tão pálido.
— Sou extremamente branco, Cauler, isso não é novidade.
— Os tons esverdeados são.
Eu tenho que me impedir de cutucá-lo no braço, porque iria parecer
muito menos mano e muito mais namorado. A multidão começa a se
mover em direção ao rinque quando a campainha soa no final do
aquecimento, nos engolindo e colocando corpos entre nós.
Mamãe e papai me encontram na massa de pessoas, mamãe
enganchando seu braço no meu e papai colocando a mão no meu ombro.
— Próximo a Caulfield? — ele pergunta.
Meu coração pula, mas mantenho a calma do lado de fora.
— Na verdade. Ele só gosta de me zoar.
— Parece uma distração.
Eu zombo.
— Nem mesmo perto.
— Ele pode ter amigos, Junior — mamãe diz. Quase posso ouvir o
revirar de olhos em sua voz, e nunca me senti mais perto dela. Ela
acaricia minhas costas antes de subirem para a fileira atrás do meu time.
Não vou mentir, estou um pouco desapontado por ter Barbie e
Dorian entre mim e Cauler. Mas é o melhor. Não há maneira que eu
sobreviveria mais de quarenta minutos batendo cotovelos no descanso
de braço com ele, inalando canela e coco. As luzes se apagam antes
mesmo de eu me sentar, meu time se levanta enquanto o time feminino
se alinha no banco. O locutor nomeia os iniciantes enquanto eles correm
para o gelo para ficar na linha azul.
— Claro que sim, Delilah! — grita Nicolette. Eu dou meu próprio
grito de alegria, e Delilah sorri em nossa direção.
Vê-la jogar hóquei e jogar eu mesmo são duas experiências
completamente diferentes. Assistir me deixa na ponta da cadeira,
pulando e gritando a cada cinco segundos, segurando meu rosto nas
mãos após cada defesa impossível da goleira dos Royals, gemendo de
frustração quando a ponta de Delilah é bloqueada por uma zagueira
mergulhadora. Estou de pé um segundo antes do disco cruzar a linha de
gol para nós e afundando no meu assento quando é o oposto.
Delilah recebe uma assistência no primeiro período e, durante o
intervalo, Dorian se inclina para frente e diz:
— Ei, Terzo, aposto vinte dólares que Delilah destrói você em pontos
esta noite.
— Por que eu aceitaria uma aposta já perdida? — Eu digo de volta.
Delilah está atrás da rede no início do segundo, olhos para cima,
esperando alguém abrir. Ela passa para a esquerda e desliza para a
direita. A defesa tira os olhos dela, e eu tenho meus punhos cerrados na
minha frente, meio fora do meu assento. A rede está aberta para ela, o
passe direto no stick, a jogada perfeitamente executada e o gol fácil. Eu
pulo o mais alto que posso, punhos jogados no ar, garganta em carne viva
com o quão alto eu grito.
Eu me viro para Barbie sem pensar e ele está tão animado quanto eu,
me dando um toca aqui que eu tenho que alcançar e faz minha mão
arder. Eu dei um toca aqui em todas as minhas irmãs que eu consegui na
fila atrás de nós, e quando Nova envolve seus braços em volta dos meus
ombros por trás, eu me inclino para trás e seguro suas mãos.
Toda a minha equipe está enlouquecendo. Eu não sei quando todos
eles se tornaram grandes fãs de Delilah, mas eu nunca estive tão
orgulhoso na minha vida. Eu quero ficar e assistir o resto do jogo dela,
mas no meio do segundo, temos que sair para nos preparar para o nosso.
Papai me dá um tapinha nas costas, mamãe me dá um abraço rápido,
mas tenho certeza de que a única coisa que todos os meninos percebem é
o jeito que Nova me beija na bochecha antes de eu ir.

ESTÃO EM CIMA DE MIM assim que estamos no vestiário.


— Você disse que não estava com ela! — Kovy grita. Ugh, Deus, me
mate. Olho para Barbie, esperando que ele entre e diga algo sobre suas
constantes mensagens de texto com Nova, mas ele balança a cabeça
levemente. Aparentemente, isso é um segredo por enquanto.
— Eu não menti. — Eu chego à minha barraca e saio dos meus
sapatos sociais, afrouxando minha gravata.
— Cara, ela literalmente te beijou! — Kovy argumenta.
— Você age como se ela tivesse enfiado a língua na garganta dele —
diz Cauler. Ele chuta os sapatos com um pouco de força demais, então
eles batem contra o fundo de sua baia.
Acho que sou o único que percebe. Estão todos muito ocupados
especulando, ruidosamente e sem vergonha. Tudo em que posso me
concentrar é no modo como Cauler está com a mandíbula apertada.
Ele está com ciúmes.
— O garoto tem as habilidades sociais de uma pedra, mas ele ainda
tem a maluca da Nova Vinter — Colie diz em um ponto.
Estou prestes a dizer algo como não, seu idiota, eu não tenho Nova,
Nova não é uma coisa para se ter, mas Cauler me vence.
— Você percebe o quão assustador você está sendo? — ele diz. Ele
deixa a faixa de sua bermuda de compressão bater contra seus quadris, e
eu olho para longe.
— Isso é ciúme que estou sentindo, Cauler? — Zero diz. É um
comentário passageiro ao qual ninguém presta muita atenção, ainda
tentando me fazer admitir a coisa inexistente que está acontecendo entre
mim e Nova. Estou quase tentado a contar a eles sobre a oitava série,
primeiro ano, o verão intermitente antes de eu ir para Michigan só para
calá-los. Mas isso não é da conta deles e provavelmente os irritaria ainda
mais.
A buzina do gol e o estrondo de uma multidão aplaudindo sacode o
vestiário, abafado, mas o suficiente para fazer todos olharem para a TV
onde Delilah está com o taco erguido acima da cabeça enquanto seus
companheiros de linha a pressionam contra as tábuas.
— São três pontos esta noite, Terzo — Dorian anuncia. — Você tem
um trabalho duro.
Isso é bom para mim. Eu sorrio enquanto a câmera se move sobre a
multidão, as fileiras que acabamos de desocupar são os únicos lugares
vazios no prédio, esperando para serem preenchidos pelo time feminino
assim que entrarmos no gelo. Uma coisa sobre o corpo estudantil de
Hartland, eles saem em apoio a todas as suas equipes, tanto masculinas
quanto femininas. A câmera mostra minha família por um segundo, Jade
segurando as mãos sobre o peito e olhando para Delilah com esse tipo de
adoração que faz meu coração apertar. Minhas irmãs gritam ao redor
dela.
Fazemos nosso aquecimento na pista de treinos enquanto o jogo
feminino termina. A energia está alta, os caras estão prontos para ir, e até
eu estou meio empolgado para entrar no gelo.
Até voltarmos ao vestiário para nossa última conversa pré-jogo e
papai estar lá esperando por nós. O treinador Campbell está com um
olhar presunçoso no rosto, como se estivesse prestes a abençoar este
time com o melhor momento de suas vidas.
A julgar pela forma como a maioria deles reage, eles concordam.
— Alguém me mate — murmuro.
Dorian se inclina para mim e sussurra:
— Se eu te matar, posso ficar com seus patins? Eles são doentes, cara.
— Seus pés nunca caberiam neles — diz Barbie do outro lado de
Dorian. — Ele tem pés de bebê.
O treinador realmente apresenta papai, como se fosse realmente
necessário, antes de passar a palavra para ele. Eu tento desconectá-lo
quando ele começa seu discurso motivacional, mas não há muito o que
fazer com toda a minha equipe extasiada por ele. A maioria deles
provavelmente o admira desde que amarraram um par de patins pela
primeira vez, da mesma forma que seus pais admiravam vovô, Wayne
Gretzky, Gordie Howe.
Ele parece muito mais velho do que eu me lembro. Talvez porque eu
tenha visto mais dele em vídeos de tributo e nas paredes desta arena na
minha idade do que pessoalmente nos últimos sete anos.
É difícil me ver nele. Nem mesmo porque me pareço mais com
mamãe, com seus cabelos e olhos escuros e pele oliva. Mas na maneira
como ele se comporta, todos os sorrisos convidativos e ombros retos.
Nós nem jogamos hóquei da mesma forma. Eu tive que aprender a
adaptá-lo ao meu tamanho por conta própria, e isso faz com que nossos
estilos de jogo não sejam nada parecidos.
As pessoas gostam de papai por mais do que seu nome e sua
habilidade. Eles nunca têm uma palavra ruim a dizer sobre ele, porque
ele não é uma pessoa ruim. Só não é um grande pai.
Quando ele termina seu discurso, meus companheiros de equipe
estão de pé, completamente impressionados e prontos para o começo da
partida. Estou mais lento para ficar de pé, todo o acúmulo de
aquecimentos queimou em mim. Os meninos se aproximam, todos
colocando uma mão no centro do amontoado. O melhor que posso fazer é
colocar a mão nas costas de Dorian e Barbie na minha frente enquanto os
capitães nos conduzem em um grito alto o suficiente para fazer meus
ouvidos zumbirem.
Papai me puxa de lado ao sair.
— Temos aqui o Escoteiro Central da NHL e um olheiro dos Sabres
— diz ele. Sua excitação é tangível quando ele coloca a mão no meu
ombro e treme.
Meu coração se contorce. Sinto suor frio na nuca. Estar em Buffalo
tornaria uma vida de hóquei muito mais fácil de lidar. Buffalo é minha
casa. É onde eu cresci. É onde Nova está quando não está trabalhando. É
onde eu pertenço.
Não há como os Sabres conseguirem a primeira escolha este ano, a
menos que façam grandes negociações sem precedentes. Não vai
acontecer. Não tem como isso acontecer.
Mas ainda preciso mostrar a eles que valeria a pena.
QUINZE
O mundo se reduz a nada além do ponto de confronto direto e do disco
na mão do árbitro. O pivô dos Eagles está prestando mais atenção em
mim do que no disco, praticamente me dando a vitória no confronto
direto. Eu puxo o disco de volta para Dorian à minha esquerda e nós
explodimos no gelo, nossos passes de fita para fita poderosos e sem
falhas.
Zero encontra uma abertura nos primeiros dez segundos, disparando
um foguete através de uma lacuna na defesa que se alarga. Ela
ricocheteia no vidro, direto na minha luva. Eu deixo cair o disco no gelo
aos meus pés e mando um pulso em direção à rede. Um defensor pega
um patins e deixa para seu goleiro cobrir enquanto Zero e Cauler o
atacam. Cauler vence o próximo confronto direto para Barbie,
preparando-o para um gol único que atinge o fundo da rede um segundo
depois.
Nós cinco vamos para o banco com a torcida torcendo como se
tivéssemos marcado cinco gols. Dorian praticamente me dá um soco no
punho quando eu ofereço a ele.
— Agora isso é hóquei! — ele aplaude.
Sento-me entre Cauler e Zero no banco, nós três olhando para o
replay do jumbotron e recuperando o fôlego. Parece algo saído de um
carretel de destaques da NHL. Nem vinte segundos depois, os Eagles já
estão trocando seu goleiro em favor de seu calouro reserva, Ralph Lu.
Cauler me dá uma cotovelada e se inclina para dizer:
— Já estava na hora de trocar a peneira.
O fato de ele estar reconhecendo a mensagem da noite passada faz
meu rosto corar.
Após esse primeiro turno, os Eagles se curvaram na defesa e
recuaram com mais força do que esperávamos. Não ajuda que Ralph Lu
seja algum tipo de prodígio das redes. Os olheiros devem estar amando
ele agora. Lançamos quinze discos nele no primeiro período e vamos
para o intervalo sem nada para mostrar além daquele gol.
Eu olho para as arquibancadas no meu caminho para o túnel. As
gêmeas estão tirando uma selfie juntas. Mikayla, Bailey, Sid e Karim estão
todos reunidos para conversar sobre a multidão. Jade está inclinada para
a frente para colocar os braços sobre os ombros de Delilah na fila à sua
frente, e Nova está conversando animadamente com algumas das
mulheres da equipe. Mamãe e papai olham para mim, sorrindo e
acenando quando têm minha atenção.
Estou andando rápido demais e, quando os vejo, já estou saindo de
vista sem acenar de volta. Eu meio que me sinto mal com isso.
Temos que reavaliar todo o nosso plano de jogo durante o intervalo.
Chegamos esperando andar de patins em círculos em torno desses caras,
mas a mudança de goleiro os transformou em um time completamente
novo. Como eles viram do que Lu era capaz depois daquele primeiro
turno e isso os inspirou.
O pânico se instala na metade do segundo tempo. Existem
profissionais olheiros nos vendo ser derrotados por um dos piores times
que enfrentaremos nesta temporada. Os Eagles aproveitam-se da nossa
frustração. Em cada confronto, eles têm algo a dizer sobre minha
personalidade, sobre meu rosto. Cada verificação nos quadros é seguida
por um comentário sobre minha altura e como seria fácil me quebrar ao
meio. Cada interrupção no jogo traz a previsão de que nunca serei tão
bom quanto meu pai.
Meu silêncio só os estimula, mas eu nunca fui muito bom em chilrear.
Cauler finalmente coloca o disco para longe com cinco minutos
restantes do segundo tempo, sem ajuda e absolutamente lindo com um
arrasto do pé através da dobra e um movimento do pulso que envia o
disco direto para trás e para a garrafa de água em cima da rede,
quebrando-a para que se espalhe por todo Lu.
É a coisa mais horrível que já vi. Posso imaginá-lo caminhando para o
palco no draft depois de ser escolhido como o primeiro. Levantando um
dedo em todas as fotos da imprensa para mostrar sua posição comigo ao
lado dele sendo o número dois.
Eu sei que é ridículo. Eu sei que um único objetivo não vai
determinar nossa ordem de convocação. Mas quando vejo o replay, com
Cauler ao meu lado sorrindo e absorvendo os elogios de nossos
companheiros de equipe, sinto-me mal do estômago.

FICA PIOR.
É tarde no terceiro tempo e estou desesperado. Não tenho pontos e
há olheiros do Sabres nas arquibancadas, e Cauler está me mostrando à
esquerda e à direita. Ficamos confortáveis com nossa vantagem de dois
gols. Sentamos em nossos calcanhares, assistimos os Eagles voltarem
para amarrá-lo.
Os Eagles. Os malditos Eagles.
Isso era para ser um estouro. Uma chance de preencher nossas
estatísticas. E agora estamos prestes a ir para a prorrogação com um
time que venceu apenas seis jogos na temporada passada.
O treinador pede um tempo com menos de um minuto para o fim, e
nos reunimos ao redor do banco apenas para sermos criticados.
— Não seremos um time que joga no nível de nossos adversários —
grita ele, apontando para baixo para enfatizar. — Vamos jogar o nosso
jogo, não importa quem estamos enfrentando.
Cauler quebra um frasco de sais aromáticos antes de entrarmos no
gelo novamente, e pela primeira vez ele não parece atraente, fazendo
uma careta com o cheiro dele. Ele pisca a queimadura de seus olhos e
segura o frasco para mim.
— Aqui. Acorde antes que você faça nós dois parecermos uma merda.
Ele diz isso sem calor real, mas ainda queima sob minha pele. Eu
tenho sido um não-fator neste jogo. Eu tenho feito minha parte no
empate quando sou chamado, mas não tenho um ponto ou uma rebatida
no meu nome, apenas dois passes ao gol. Eu preciso fazer alguma coisa.
Eu me inclino para inalar os sais que Cauler segura no meu nariz. Ele
poderia muito bem ter enfiado agulhas com amônia diretamente nos
meus seios nasais. Meu rosto se contorce e eu balanço minha cabeça
algumas vezes até que a queimação desapareça. É o mais acordado que
me senti o dia todo.
Nossa linha é enviada com trinta e três segundos restantes no
relógio. Colocamos a pressão logo no empate, porque não vamos para a
prorrogação com os Eagles. Mas Ralph Lu não está cedendo. Ele se joga
de um lado para o outro sem se preocupar com sua própria segurança,
pegando com parte de seu corpo todos os tiros com que o atiramos.
Eu nunca quis tanto brigar contra um goleiro como agora. Ele pode
apenas. Deixar. Eu. Pontuar?
Os Eagles congelam o disco apenas para ter uma pausa, e com apenas
seis segundos restantes, o treinador nos deixa lá fora.
A multidão está de pé em antecipação, mas minha pulsação está
batendo tão alto em meus ouvidos que seus gritos são um zumbido
abafado. A jogada é para eu bater o disco nas pernas do cara na minha
frente no confronto direto. Dobre o ombro, saia em volta dele, faça um
passe rápido para Cauler no slot.
Praticamos dezenas de vezes para momentos exatamente como este.
Quando estamos no limite e precisamos de algo. Quando funciona, é
rápido, bonito e perfeito.
O jogo recomeça. Eu pego o taco, bato no disco. Dou uma volta pelo
centro Eagle. E o disco está de volta ao meu taco. Cauler está aberto no
slot, a defesa desmoronando ao meu redor, Lu se endireitou pronto para
barrar o tiro.
Se eu jogar para Cauler, vamos ganhar este jogo. Ainda seremos
destroçados pelo treinador por nos colocarmos nesta posição, mas pelo
menos não seremos o time que perdeu para os Eagles. Cauler vai deixar
este jogo infernal com dois gols. Dois belos gols. Um vencedor do jogo.
Ele vai ser tudo o que os analistas falam.
Se eu der esse tiro, neste ângulo, as chances de ele entrar no gol são
quase zero. Mas se isso acontecer, serei o vencedor do jogo. Eu serei o
único em bobinas de destaque. Os olheiros nas arquibancadas darão
acenos de cabeça impressionados enquanto anotam notas sobre minha
ousadia e confiança. Eu vou até dar a eles o celly mais apaixonado que
eles já viram de mim.
Cauler está aberto no slot. Eu mantenho meus olhos em Lu.
Em algum lugar atrás de mim, Zero grita:
— Não! — como se ele soubesse o que vou fazer antes mesmo de eu
decidir.
Eu faço o tiro. Aponto para o lado curto, onde há essa pequena lacuna
no canto superior.
Lu pega ele com a luva. Claro que sim.
A arena inteira esvazia quando a buzina soa no regulamento. Não há
nenhuma emoção da multidão que geralmente vem com horas extras.
Eles sabem que estragamos este jogo.
Eles sabem que eu estraguei esse jogo.
Deixo meu impulso me levar para trás nas boards e fico ali olhando
fixamente para o gelo enquanto os Eagles comemoram nos
acompanhando. Parece que eles acabaram de ganhar um campeonato.
Alguém na multidão bate no vidro perto da minha cabeça. Eu ainda não
me movo.
Até Cauler patinar na minha frente. Eu empurro as boards antes que
ele possa dizer qualquer coisa. Ele fica comigo, agarrando minha camisa
para me atrasar.
— Esqueceu como se joga, Sua Graça? — ele pergunta. Há malícia
completa em sua voz novamente.
Eu não digo nada. Não sinto nada. Eu me solto de seu aperto e patino
até o banco com os olhos para a frente.
Jaysen Caulfield e outras 271 pessoas curtiram um tweet de Paul Duggan • 41 min
Paul Duggan @duggerfest
Caulfield - babaca carismático
James - idiota socialmente inepto
Cícero - idiota sem noção
A linha superior dos Royals é apenas uma linha de idiotas.
DEZESSEIS
Um tiro ruim nos faz perder o jogo aos dois minutos da prorrogação. Não
ouço nada que o treinador diz no vestiário. Tudo o que sei é que envolve
muitos gritos.
Os meninos estão quietos. A julgar pelos olhares rápidos que eles
continuam me lançando, muitos deles me culpam por isso. Mas
estávamos todos fora do nosso jogo. Eles que se fodam.
Eu não tomo banho no vestiário do rinque. Eu vou ouvir reclamações
deles eventualmente. Não precisa ser quando estamos todos nus.
Eu puxo meu capuz para cima e curvo meus ombros, mantendo
minha cabeça baixa quando saio do vestiário. Eu só quero sair dessa
arena sem ninguém falando comigo, olhando para mim, respirando na
minha direção geral. Tomar um banho e convencer minhas irmãs a
ficarem bêbadas na casa dos laxs em vez da festa de hóquei.
— Mickey!
Oh Deus, me mate agora. Já não fui torturado o suficiente hoje?
Paro no meio do Salão dos Campeões e respiro fundo antes de me
virar para encarar meu pai. Ele fecha a porta de vidro do escritório do
treinador e se dirige para mim, passando o mural dele e seu nome nas
paredes sob todas as honras.
— Ei, cara — ele diz suavemente uma vez que ele me alcança. Ele
passa um braço sobre meus ombros e nós saímos. — Como vai você?
— Bem. — Não consigo vê-lo com o capuz levantado, mas tenho
certeza de que ele está me dando aquele olhar falso de preocupação,
aquele que ele usa para mascarar sua decepção.
— Tem certeza? Foi um jogo difícil.
— É um jogo. Não é o fim da nossa temporada. — Não importa que
eu tenha me envergonhado na frente dos olheiros do Sabres. ESPNU.
Minha família. Nova. Não importa que os Eagles estejam provavelmente
em seu vestiário agora gritando sobre como venceram as principais
perspectivas da NHL. Não importa que Cauler me odeie de novo, se ele
realmente parou.
Eu continuo vendo meu tiro ir direto para aquela luva do goleiro.
Eles provavelmente repetiram vinte vezes no relatório pós-jogo.
— Você diz isso — papai diz enquanto passamos por uma saída
lateral. — Mas parece que está incomodando.
Eu zombo. Ele está falando sério agora?
— Como você seria capaz de saber, pai? É apenas a minha cara.
Seu braço afrouxa em meus ombros e eu escorrego de seu alcance,
acelerando meus passos. Suas pernas mais longas me acompanham
facilmente.
— Mickey. Ei. Me diz o que tá acontecendo.
Eu continuo andando.
— Mickey — papai diz novamente, desta vez com mais firmeza. Sua
mão se fecha ao redor do meu pulso, me fazendo parar. Eu puxo meu
braço para longe dele. Estou tão cansado de ser puxado por aí assim. Viro
as costas para ele e enfio as mãos no cabelo, ainda molhado e sujo de
suor.
Eu não deveria estar tão cansado, tão suado, tão dolorido. Eu não fiz
merda nesse jogo. Dei a Ralph Lu uma defesa que ele vai se lembrar pelo
resto da vida.
Oh Deus. O que devo fazer comigo mesmo se todos decidirem que
sou péssimo no hóquei?
Uma mão pousa no meu ombro e empurra. Deixo que me guie sem
pensar muito em quem é ou para onde estão me levando. Sou empurrado
para um banco do lado de fora da arena, na colina com vista para o
campus e o lago.
As árvores estão quase sem folhas. Os sinos começam a tocar a alma
mater do topo do Edifício Principal, anunciando o início das horas de
jantar. Um grupo de garotas desce a colina com os braços entrelaçados,
vestidas de roxo e preto do Royals, cantando uma de suas músicas de
classe. As cores do pôr do sol refletem no lago.
Meus olhos ardem. O ar parece tão pesado de repente.
— Fale comigo — papai diz. — O que está acontecendo?
— Por favor, pare de fingir que você se importa. — É uma luta para
manter minha voz uniforme. Eu aperto minhas mãos juntas para impedi-
las de tremer e coloco meu queixo no meu peito, me escondendo mais
fundo no meu capuz para que ele não possa ver meus olhos brilharem.
— O que você está falando? Claro que me importo.
— Você só se importa porque está afetando meu jogo. — Minha
respiração falha. — Apenas me diga o quanto eu estraguei tudo hoje e
acabe com isso. Por favor. Eu não posso lidar com o que diabos você está
fazendo agora.
— Você está bem, amigo. Todo time tem jogos ruins. Todo jogador
faz jogadas ruins.
— Na frente dos olheiros do Sabres. Na frente de você e da mamãe.
— Mickey. Olhe para mim. — Eu não olho. Ele me pega pelo ombro
novamente e me força a virar para ele. Eu me esforço para enxugar as
lágrimas do meu rosto antes que ele as veja. — Foi um tiro entre anos de
um bom hóquei. Você não precisa ficar tão preocupado com isso.
Eu finalmente olho para ele. E talvez eu veja indícios de mim mesmo
nele. Em sua incapacidade de mostrar como ele realmente se sente. Ele
está queimando de decepção e vergonha por dentro. Eu sei isso. Mas ele
está olhando para mim como se quisesse dizer cada palavra.
Minha próxima respiração vem neste estremecimento incontrolável,
e de repente estou soluçando violentamente em um banco ao ar livre ao
lado de meu pai. Eu deixo cair meu rosto em minhas mãos e prendo
minha respiração, tentando fazer parar, mas isso só torna o próximo
soluço mais alto e mais agressivo. Papai senta ao meu lado
pacientemente e em silêncio enquanto eu tenho um colapso completo, e
acho que nunca me senti tão deprimido em minha vida. No momento em
que consigo controlar minha respiração e as lágrimas diminuem, o sol
está quase se pondo e minha cabeça dói.
— Bailey e eu temos falado sobre você — papai diz enquanto eu
limpo o nariz nas mangas e puxo meus pés para cima do banco para me
tornar o menor possível. — Ela está preocupada. Lembra do remédio que
sua mãe costumava tomar?
Eu dou de ombros. Eu tenho essa vaga lembrança de parar em uma
farmácia com mamãe quando criança, ela discutindo sobre o preço de um
pequeno frasco de comprimidos laranja. Mas já se passaram sete anos
desde que morei com eles, então não me lembro de muita coisa.
— Eram antidepressivos — papai continua. — Você sabia que a
depressão pode ser genética?
— Eu não estou depressivo — eu digo por instinto. Minha voz está
baixa e sem vida novamente.
— Você está mostrando muitos dos sinais que sua mãe mostrou.
Eu não digo nada. Não tenho energia para discutir. Observo algumas
folhas secas arranhando o cimento em frente ao banco, a brisa
empurrando-as e me fazendo estremecer.
— Você tem alguns dias de folga para o Dia de Ação de Graças —
papai diz. — Por que você não volta para casa? Podemos levá-lo a um
médico e...
Pelo menos eu tenho energia para rir dessa piada hilária.
— O quê? — Papai pergunta.
— Casa. — eu zombo. — Você quer dizer com os Vinters? Ou minha
família de tarugos em Michigan.
— Quero dizer comigo e sua mãe e Madison.
— Quando essa foi a minha casa?
— Mickey…
— Eu nem tenho um quarto na sua casa, pai.
Ele respira com força. Sai meia sílaba antes de parar. Ele comprou
uma casa de quatro quartos quando foi negociado com Carolina. Um
quarto para ele e mamãe. Um para as gêmeas. Um para Bailey e Delilah. E
um para Mikayla como a mais velha. Eu tinha dez anos. Mas eu não
precisaria de um quarto se nunca passasse mais do que alguns dias lá.
— Você ainda tem um lugar lá, Mickey — papai diz depois de um
tenso momento de silêncio.
Eu me levanto e começo a andar.
— Preciso tomar banho.
Ele não me segue.
LEVO MEU telefone para o chuveiro e abro o bate-papo em grupo.
Mickey: : Não esqueça o uísque
Talvez um pouco de vodka também
Na verdade, toda a loja de bebidas seria ótima
Delilah: Alguém precisa de uma bebida
Mickey: Bebidas.
Plural.
Muitas delas.
Mikayla: Nós cobrimos você garoto
Mickey: Legal
Certeza que você não quer beber na casa lax em vez disso
Bailey: Eles não vão festejar esta noite
Os caras tem fall ball das 6 da manhã
Mickey: Me mata
Bailey: Podemos beber no meu quarto?
Mickey: Omg sim pfv
Estou vestindo um jeans preto quando Dorian e Barbie entram.
— Terzo, perfeito! — Dorian diz, todo animado como se eu não
tivesse perdido um jogo de hóquei há uma hora. — Precisamos de sua
permissão para algo.
Eu fico tenso, virado para o armário. Meus olhos estão inchados de
tanto chorar e eu não preciso que eles me vejam assim.
— Ok?
— Lembra daquele projeto de filme que eu te mostrei? — Dorian se
senta na beira da cama e passa a mão pelo cabelo, quase nervoso. —
Precisamos de sua autorização para usar qualquer coisa em que você
apareça.
— Para quê? — Eu coloco uma gola em V preta e me olho no espelho.
Meu armário não é exatamente colorido, mas não costumo usar preto
assim. Na verdade eu meio que gosto. Cauler e Dorian ainda se saem
melhor do que eu.
— Queremos postar online — diz Dorian. — Barbie foi escolhido na
quinta rodada pelo Flames. Esta é a única maneira de torná-lo famoso.
Vejo Barbie dar uma olhada em Dorian pelo espelho enquanto corro
meus dedos pelo meu cabelo molhado. Ele murmura algo em espanhol
que faz Dorian sorrir. Para mim, ele diz:
— Parte disso é uma compilação de você dizendo me mate.
— O quê? — Eu me viro para enfrentá-los.
— Você fala muito, cara — Dorian diz. Então ele dá uma boa olhada
em mim e seu rosto cai. — Você está bem, cara?
Merda. Viro o rosto para o chão e procuro minha carteira.
— Estou bem.
— Não, mas você tem tipo, emoções em seu rosto.
— As consequências das emoções — Barbie o corrige.
Fecho os olhos e respiro fundo. Não posso ficar bravo com eles
quando faço questão de parecer sem emoção. Dorian é provavelmente a
pessoa mais legal comigo neste campus. Ele já sabe tanto. E Barbie está
muito ligado a ele. Se vou me abrir com qualquer um nesta equipe, pode
ser com eles.
— Foi um dia difícil — murmuro. Meu telefone vibra na minha
cômoda. Uma mensagem de Madison.
— Problemas familiares? — Dorian pergunta. Eu levanto meus olhos
para olhar para ele sem levantar meu rosto. Ele me dá esse olhar
conhecedor. — Toda vez que você recebe uma mensagem do seu pai,
parece que quer quebrar seu telefone. E agora ele está aqui, então acho
que você gostaria de esmagar o rosto dele.
Eu balanço minha cabeça e suspiro.
— Não é tão ruim.
— Tem certeza? Porque se é isso que você quer, eu te ajudo, cara.
Não importa se eu costumava ter um pôster dele na minha parede, eu
vou acabar com ele.
Madison enviou uma foto de Nicolette e Bailey, segurando uma
garrafa de uísque entre elas, sorrindo largamente. Apresse-se antes que
elas bebam seu álcool. Eu desligo e deslizo meu telefone no meu bolso.
Dorian e Barbie me observam, esperando.
Eu esfrego a parte de trás do meu pescoço.
— Está tudo bem.
— Ok — Dorian diz, mas ele não parece convencido. — Não tenha
medo de chorar perto de nós, sabe. Não vamos julgar.
— Dori chorou quando fomos para diferentes equipes da USHL — diz
Barbie.
Dorian coloca a mão sobre a boca de Barbie e empurra sua cabeça
para longe.
— E Barbie chorou quando eu fui para o Kings e ele ficou preso com
o Flames.
— Eu estava chorando por eles. Desperdiçou uma escolha de
segunda rodada com você.
Dorian tenta cobrir a boca novamente, e desta vez Barbie se afasta de
seu alcance antes de envolver um braço em volta da cintura para jogá-lo
na cama.
Eles deitam um ao lado do outro, falando em espanhol e olhando
para seus telefones enquanto eu termino de me arrumar. Eu continuo
olhando para eles. Eles estão em um nível de conforto que só pode vir de
uma vida inteira de amizade, do jeito que eles passam todo o tempo
juntos e se cobrem um do outro e não dão a mínima para o que alguém
tem a dizer sobre isso. Eles provavelmente vão dormir no mesmo quarto
no próximo ano, já que eles realmente poderão ter uma escolha de
colegas de quarto no segundo ano.
Eu tenho que limpar o nó ciumento da minha garganta antes que eu
possa dizer:
— Vocês vão para a casa de hóquei?
Ambos olham para mim.
— Você não vai? — Dorian pergunta.
— Vou ficar com minhas irmãs no quarto de Bailey.
Barbie se senta ereto, um olhar frenético em seu rosto.
— Espere, Nova vai estar lá?
— Quero dizer, sim? — Eu digo.
Eles compartilham um olhar, Barbie com ambas as sobrancelhas
levantadas e Dorian com esse sorrisinho presunçoso.
— Uh, você quer vir? — Eu pergunto.
Barbie pensa por um segundo, então suspira e balança a cabeça.
— Eu não quero me intrometer no seu tempo com a família.
— Cara, tudo bem.
Dorian se levanta da cama e estica os braços acima da cabeça.
— Devemos pelo menos fazer uma aparição na casa de hóquei
primeiro. Dê uma hora, e então podemos sair com sua namorada.
Barbie dá um tapa no braço de Dorian, mas o sorriso bobo em seu
rosto mostra como ele realmente se sente.
Eles transferem as garrafas do frigobar de Dorian para um mochila e
saímos. Eu mando uma mensagem para Bailey para que ela saiba que
estou a caminho, então quando descemos a colina até o prédio dela, ela
está esperando na porta da frente.
Bailey mora no prédio que pertenceu ao fundador da Hartland, agora
convertido em dormitório para mulheres juniores e seniores. Eu nunca
estive dentro.
— Olá, cavalheiros — diz Bailey, presa entre a porta e o batente para
mantê-la aberta. Ela parece feliz com uma cerveja na mão. — Vocês vão
se juntar a nós esta noite?
— Talvez mais tarde, se estiver tudo bem? — diz Dorian.
— Isso aí. Nossa RA está fora da cidade neste fim de semana, e temos
muito espaço e muito para beber. — Ela abre mais a porta e me conduz
para dentro enquanto Dorian e Barbie continuam descendo a colina.
Estamos em uma entrada com teto alto e piso quadriculado em preto
e branco. Mais à frente há uma escada que se curva ao longo da parede e
leva ao relógio da viúva que faz parte de uma das muitas histórias de
fantasmas de Hartland. Dizem que se você estiver atravessando a ponte
sobre o riacho do lado de fora e a luz da torre se apagar, não olhe para
trás ou você ficará cara a cara com um espírito assassino.
Definitivamente, parece do jeito que eu esperaria que uma casa mal-
assombrada parecesse – um pouco fria e muito ecoante. Velhas fotos em
preto e branco emolduradas do que imagino ser a família Hart se
alinham nas paredes, e passamos por algumas salas de estar com janelas
altas com vista para o lago a caminho da escada.
Bailey tem um quarto solo no último andar, e assim que entro,
Nicolette passa um braço em volta dos meus ombros e dá um beijo
bêbado e desleixado na minha bochecha. Ela empurra uma garrafa de
vidro pesada na minha mão.
— Mikayla comprou isso, mas não queria dar para você porque ela é
uma profissional e você é uma criança — ela diz, muito alto no silêncio
relativo do prédio. Eu torço a tampa e engulo um gole de uísque em
chamas.
O quarto parece algo que eu esperaria de um prédio de apartamentos
antigo e chique. Nada como o meu dormitório de calouros com seu piso
frio e duro e móveis pressionados em uma linha contra a parede. Bailey
tem um piso de sequoia rangente, janelas do chão ao teto, uma lareira
que foi emparedada com tijolos e até uma pequena varanda de frente
para o lago. A porta está aberta, Nova e Madison encostadas no parapeito
da varanda enquanto conversam.
— Estou arriscando meu trabalho apenas por estar aqui — diz
Mikayla de seu lugar na cama de Bailey. Ela tem uma garrafa de água em
suas mãos, mas ela observa Nicolette tomar um gole de sua bebida com
um olhar ciumento em seus olhos. — Podemos ser presas por isso, Cole.
— Cara, relaxe — diz Nicolette. — Ninguém vai prender uma mulher
grávida.
— Você está brincando? Eu teria mais problemas do que qualquer
um! Bailey está no último ano e estava no ensino médio enquanto eu me
formava na faculdade.
— Jesus — eu digo. — Você é velha.
— E você ainda vai ao pediatra!
É difícil beber quando você está rindo. Delilah tira a garrafa de mim
enquanto estou distraído e derrama alguns dedos em um copo de
plástico.
— Vá com calma, meu caro — diz ela. — O uísque é feito para ser
saboreado.
Estreito meus olhos enquanto ela demora para entregar o copo,
segurando a garrafa fora do meu alcance. Há um olhar duro em seu rosto,
seus lábios apertados e sobrancelhas juntas. Eu pego o copo dela e olho
para a pequena gota de álcool que ela me deu.
A alguns quilômetros de distância, minha equipe provavelmente está
falando todo tipo de merda sobre mim. Compadecendo-se de uma perda
embaraçosa e colocando toda culpa em mim. Algumas doses de uísque
não serão suficientes para afrouxar o nó de ansiedade no meu peito.
Eu tomo o gole de uísque e seguro o copo de volta para Delilah. Ela
me dá o que eu acho que deveria ser um olhar significativo antes de me
servir novamente. Repetimos o mesmo processo até meus nervos
começarem a dar lugar a um formigamento na ponta dos dedos,
dormência na língua e uma névoa na cabeça. Delilah deve ver isso no
meu rosto, porque ela enrosca a tampa de volta na garrafa e diz:
— Devagar. — Ela leva a garrafa com ela quando vai se sentar no
chão ao lado de Jade.
Há algum reality show passando na TV na cômoda de Bailey, mas
ninguém está prestando atenção nele. Mikayla e Bailey estão na cama
conversando, Nicolette está com as pernas cruzadas na velha poltrona de
madeira no canto, inclinando-se para se colocar na conversa de Delilah e
Jade. Nova e Madison chegam do frio e fecham a porta da sacada,
esfregando os braços para se aquecer. Nova está com o rosto todo
vermelho, ainda parecendo pronta para a sessão de fotos em calças de
moletom largas e uma das minhas velhas camisetas da Seleção Nacional
cortada em um top curto sob um cardigã.
Eu fico no meio da sala por um segundo e apenas me absorvo na
presença delas. É um pouco estranho, tê-las todas aqui em um lugar que
comecei a associar ao meu lar. Família e lar não andam juntos para mim
há muito tempo.
Elas não vão embora até amanhã, mas eu já sinto falta delas.
DEZESSETE
Dorian e Barbie aparecendo é distração suficiente para que eu consiga
pegar a garrafa de uísque de volta antes que Delilah perceba. Não me
lembro muito da noite depois disso, além de cair de cara na cama.
Agora, Barbie está no chão com toda a parte superior do corpo
debaixo da minha cama. Com a luz do sol entrando pelas persianas e a
dor de cabeça do uísque, estou a cerca de cinco segundos de me juntar a
ele quando o pânico me atinge tão forte e repentino que tira o fôlego do
meu peito.
Pego meu telefone em meus lençóis e quase o deixo cair, minhas
mãos estão tremendo tanto.
Sem mensagens.
Sou eu quem deveria estar pedindo desculpas a Cauler, fazendo o
primeiro contato, então não sei por que a tela vazia dói tanto. Mas sim.
Como um soco no estômago.
Estou prestes a mandar uma mensagem para Nova pedindo ajuda
quando seis corpos passam pela porta fazendo tanto barulho quanto
humanamente possível.
Barbie bate a cabeça na parte de baixo da minha cama enquanto
Dorian acorda gritando, segurando o cobertor no peito e colocando as
costas contra a parede. Seu horror se dissolve em mortificação direta
quando ele vê que são minhas irmãs e Nova. Ele puxa o cobertor sobre a
cabeça e diz:
— Terzo, agora é sua vez de me matar.
— Acho que estou com uma concussão — diz Barbie do chão.
Delilah e Nicolette passam por cima dele para pular na minha cama.
— Levante-se, levante-se! — Delilah diz enquanto Nicolette geme: —
Estou com fome, cara, vamos.
— Como vocês não estão de ressaca agora? — Eu murmuro. Eu me
empurro para cima, forçando-as sobre a borda do colchão. Nicolette
quase bate na cabeça da Barbie.
— Somos adultas e sabemos nos controlar — diz ela, manobrando
em torno de Barbie enquanto ele se enrola em uma bola para se proteger.
Ele mal abre os olhos quando Nova se agacha na frente dele. — Nós não
bebemos garrafas inteiras de uísque no segundo em que colocamos as
mãos nelas.
— Eu não bebi aquela garrafa inteira. — Meu cérebro bate contra o
interior do meu crânio como se discordasse.
— Só porque Madison arrancou de suas mãos quando você começou
a deslizar pela parede.
— Não, acho que foi depois que ele sentou Nova e Barbie um ao lado
do outro e disse agora beija — diz Delilah. Ela está com os braços
cruzados e uma carranca de desaprovação no rosto.
— Isso foi depois que ele pegou a garrafa de volta — diz Madison. —
Tivemos que tirar isso dele várias vezes.
— Eu obviamente estava me divertindo. — Eu engasgo no fim de um
bocejo e tenho que prender a respiração por um segundo. — Por que
você matou minha diversão?
— Intoxicação por álcool, é por isso.
Eu quase caio assim que me levanto, como se meu corpo tivesse que
levar o ponto ainda mais longe. Eu coloco o moletom mais próximo que
posso encontrar, que definitivamente não é meu com a forma como as
mangas engolem minhas mãos, e o mesmo jeans da noite passada. Eu
cubro minha cabeça com um boné snapback e o capuz para uma boa
medida.
— Eu tenho tempo para escovar meus dentes pelo menos? Parece
que algo morreu na minha boca.
Bailey me entrega um chiclete do bolso do suéter, capuz puxado para
baixo sobre o rosto e maquiagem preta borrada sob os olhos. Pelo menos
não serei o único a parecer um desastre no café da manhã.
— Você pode ficar na minha cama, se quiser, Barbie — eu digo por
cima do ombro na porta. Barbie faz algum barulho de gratidão, mas ele
não se move, exceto para ver Nova sair.
Ela caminha comigo na parte de trás da mochila, parecendo um
pouco áspera. Ela gira o telefone em seus dedos com uma sugestão de um
sorriso no rosto.
— Barbie me manteve acordado a noite toda com suas mensagens de
texto — digo a ela.
Seu rosto cora e ela olha para o chão.
— Foi bom conhecê-lo pessoalmente. Eu gosto dele.
Eu dou de ombros.
— Ele não é ruim.
Ela suspira, batendo o telefone contra a palma da mão.
— De qualquer forma, duvido que vá a algum lugar. Eu tive que
subornar alguém para conseguir este fim de semana de folga.
— Por que você não para de modelar e atuar e fica em casa?
Ela levanta uma sobrancelha e franze os lábios.
— Eu vou fazer isso quando você parar com o hóquei, querido.
Eu chuto uma pedrinha na calçada.
— Okay, certo. Talvez depois de ontem à noite.
— Vamos, Mickey. Foi um jogo. Tenho certeza de que todo mundo já
superou isso.
— Não Cauler.
— Oh garoto. Fale comigo.
Eu levanto meus ombros até minhas orelhas, as mãos nos bolsos do
meu jeans.
— O que há para dizer? Ele está chateado e não quer falar comigo.
Ela estala a língua e coloca o braço no meu, me puxando para mais
perto.
— Ah, querido. Vai passar. Se ele realmente te cortasse por causa de
uma única jogada de hóquei, ele não valeria a pena de qualquer maneira.
Eu dou um suspiro. Quer dizer, eu provavelmente faria isso se ele me
ferrasse de propósito no rinque, mas talvez ele seja uma pessoa melhor
do que eu.
— Eu acho que sim.
Chegamos ao pequeno café fora do campus e nos sentamos em uma
mesa com vista para o lago. Minha ansiedade começa assim que me
sento.
Se alguma vez houve um momento para dizer a elas, é agora.
Depois de fazer o pedido, ergo a cabeça apoiando com os punhos e
olho para a água enquanto Mikayla fala sobre casamento e bebê. Eu só
encontrei meu futuro cunhado algumas vezes, mas ainda estou de pé
como um de seus padrinhos. Não entendo por que não posso estar com
minhas irmãs, mas não vou discutir com a noiva sobre isso.
E o bebê. Eu os verei com um bebê, mas depois disso ele
provavelmente estará falando quando eu puder vê-lo novamente.
Provavelmente nem vai me reconhecer.
Nova está segurando seu telefone para Mikayla para aprovação em
seu vestido de dama de honra quando o garçom volta com nossa comida.
Eu molho minhas batatas fritas caseiras na calda e enfio uma garfada,
instantaneamente sentindo metade da ressaca assim que atinge meu
estômago.
— Se seu bebê for menino, você vai chamá-lo de Mickey para manter
a tendência? — Delilah pergunta. Uma mecha de seu cabelo azul gruda
em uma mancha de xarope no queixo.
— Claro que não — diz Mikayla, torcendo o rosto em desgosto. —
Isso seria muito estranho. Eu quero gênero neutro. Algo como Jordan ou
Riley. E ele não vai jogar hóquei, a menos que peça explicitamente.
— Caramba. Papai vai te odiar.
— Ele não é tão controlador assim — Bailey argumenta, colocando
açúcar em sua xícara de chá.
Delilah esfaqueia sua torrada francesa.
— Só porque somos todos atletas. Você pode imaginar se um de nós
tivesse feito teatro?
— Ele diz que hóquei em campo não é hóquei de verdade — Madison
acrescenta calmamente.
Nicolette faz uma pausa de cortar suas panquecas para apontar o
garfo ao redor da mesa e dizer:
— Como passamos de casamento feliz e conversa de bebê para
conversa deprimente de papai?
— É uma coisa que todos nós temos em comum — eu digo. Bailey
enrola o lábio como se quisesse discutir um pouco mais, mas em vez
disso ela apenas balança a cabeça e toma um gole de chá.
À medida que nos aproximamos de terminar o café da manhã, mais
perto de quando quatro delas têm que sair, posso sentir isso no meu
peito. Essa sensação pesada de perda e sofrimento iminentes. A gaiola
estática apertando meu coração enquanto as palavras se acumulam atrás
dos meus dentes. Esta é a primeira vez que estamos todos juntos em uma
eternidade, e a próxima vez não será até o dia do draft e o casamento de
Mikayla alguns meses depois. Depois disso, quem sabe? Eu não quero
fazer isso no bate-papo em grupo.
Se eu não fizer isso agora, vai ficar na ponta da minha língua – ou na
ponta dos meus dedos, eu acho – até eu vê-las novamente.
Minha respiração acelera, coração disparado só de pensar nas
palavras saindo da minha boca. E eu sei que elas vão aceitar. Quero dizer,
Delilah é lésbica e Bailey está namorando dois caras bi, pelo amor de
Deus. Mas não torna mais fácil respirar e dizer:
— Posso dizer uma coisa a vocês?
Concentro-me em empurrar batatas fritas encharcadas no meu prato
para não ter que olhar para elas.
— Duh — diz Nicolette.
Acho que vou ficar doente.
— Eu sou… — O joelho de Nova pressiona contra o meu debaixo da
mesa. Eu olho para ela com o canto do meu olho. Ela está sorrindo
enquanto toma seu café. — Bissexual — eu deixo escapar. — Eu sou
bissexual. Ou talvez pan. Não sei. Pan se encaixa melhor, eu acho, mas bi
soa melhor para mim. Isso é ruim? É apenas mais fácil. Não sei. Mas sim.
Não em linha reta. Então sim…
A mão de Madison se fecha em cima da minha e eu cortei minha
divagação. Eu tomo algumas respirações antes de olhar para elas. Bailey
está apoiando o queixo na mão com um toque presunçoso nos lábios.
Mikayla e as gêmeas têm esses pequenos sorrisos quase orgulhosos em
seus rostos.
Mas Delilah está boquiaberta para mim, torrada francesa pendurada
no garfo que ela segura sobre seu prato. Ela fecha a boca e a coloca para
baixo lentamente.
— Como eu não sabia disso? Mickey! Por que você não me contou?
Eu dou de ombros.
— A mesma razão que você não fez até que você trouxe sua primeira
namorada para casa.
— Não é como se não fosse óbvio.
— Mas você ainda não contou.
Seus olhos suavizam com a compreensão. Ela assente um pouco e
volta a comer.
Bailey limpa a garganta antes de dizer:
— Sid e Karim estariam totalmente dispostos se você quiser
conversar mais depois disso.
Dou-lhe um pequeno aceno de cabeça e um sorriso ainda menor.
Minha respiração se acalmou e meu coração não está mais batendo. Eu
me sinto mais leve de alguma forma.
— Você sabia? — Delilah exige. Bailey arqueia uma sobrancelha,
mantendo contato visual enquanto toma um longo gole de chá.
— Alguém mais quer se assumir hoje? — diz Nicolette. — Agora é a
hora de fazer isso. Nova?
Nova estala a língua e pousa sua caneca de café.
— Infelizmente, ainda me sinto exclusivamente atraída por caras.
Nicolette empurra o queixo para mim.
— Surpreendida que este aqui não os arruinou para você.
Todos nós rimos, e eu nunca estive tão grato por ter Delilah e Bailey
na mesma universidade que eu enquanto assistia o resto delas irem
embora. Se eu não as tivesse ao meu lado enquanto todas as outras
entravam no carro com mamãe e papai para ir ao aeroporto, eu poderia
ter desistido ali mesmo e ido com elas.
Paul Duggan @duggerfest • 1d
Caulfield - babaca carismático
James - idiota socialmente inepto
Cícero - idiota sem noção
A linha superior dos Royals é apenas uma linha de idiotas.
Mickey James III @mjames17 • 6m
Respondendo a @duggerfest
Se chamar alguém de merdinha e puxá-lo pelo gelo pela camisa torna alguém
carismático, não é de admirar que eu seja o socialmente inepto.
Jaysen Caulfield @jaycaul21 • 6m
Respondendo a @duggerfest @mjames17
Parabéns, você aprendeu a usar as mídias sociais. Você agora está um pouco menos
inepto, mas ainda é tão merdinha quanto antes
Mickey James III @mjames17 • 5m
Se você pode me ensinar a ser carismático, talvez eu te ensine a levantar um disco por
cima de uma proteção de goleiro
Jaysen Caulfield @jaycaul21 • 5m
Essa pode ser a coisa mais engraçada que você já disse terzo. @Duggerfest você pode
querer alterar seus rótulos. James é tanto o socialmente inepto quanto o sem noção
Mickey James III @mjames17 • 3m
Eu literalmente fiquei aberto no posto na prática umas 12 vezes só para você jogar o
disco direto no equipamento de proteção de colie. Use os pulsos e siga através de
cauler. Lift. O disco.
Jaysen Caulfield @jaycaul21 • 2m
Eu pego de volta. Essa foi a coisa mais engraçada que você já disse. Você realmente vai
falar sobre estar aberto no posto depois do jogo de ontem à noite? Isso é ousado,
Terzo.
Mickey James III @mjames17 • 1m
Se eu tivesse alguma fé em sua precisão, eu teria passado para você sem problemas
Jaysen Caulfield @jaycaul21 • 36s
Você está falando sério agora? Isso é uma piada, certo. Este é você tentando melhorar
suas habilidades sociais contando piadas terríveis. Caso contrário, nada do que você
acabou de dizer fez algum sentido
Paul Duggan @duggerfest • 21s
Isso está realmente acontecendo agora no meu @
DEZOITO
Zero agarra o ombro do meu moletom e puxa. Ou sou sufocado ou o sigo,
então eu empurro minha cadeira para trás e cambaleio atrás dele. Meu
telefone cai no chão com um baque pesado. Ele não me dá tempo para
pegá-lo, apenas continua me arrastando atrás dele. Alguns dos caras se
inclinam para trás em suas cadeiras e espiam por cima das paredes de
seus gabinetes de estudo para assistir.
Estamos indo direto para Cauler.
Me mata.
Tudo o que vejo são suas costas daqui, fones de ouvido, mas tenho
certeza de que ele está curvado sobre o telefone esperando minha
resposta meio digitada. Zero o agarra da mesma forma que ele me
agarrou, mas não é tão fácil manuseá-lo. Cauler tira os fones de ouvido e
os coloca no pescoço.
— Vamos — Zero late. — Deixe seu telefone.
Cauler o coloca virado para baixo em sua mesa e se levanta
lentamente. Ele me dá um olhar frio, mas mantenho meu rosto o mais
neutro possível enquanto Zero nos arrasta para a saída.
— Vocês dois vão ficar no frio até parar de agir como adolescentes —
diz ele.
— Mas somos adolescentes — diz Cauler. Eu reviro os olhos.
— Vergonha para esta equipe é o que você é — Zero estala. —
Brigando no Twitter? Seriamente? Os analistas já estão nas suas bundas
e agora vocês fazem essa merda? — Ele segura a porta aberta e nos
empurra para o caminho pro lado de fora da biblioteca. — Caia na real
com sua merda antes de arruinar minha temporada de campeonato.
Vocês tem até o fim da sala de estudos.
Ele fecha a porta atrás de si e nos deixa. Está quieto. Todo mundo
está nos dormitórios do outro lado do campus se recuperando da noite
passada, e somos apenas nós atletas superando aqui. A madeira preta da
ponte está coberta por folhas dos galhos arqueados sobre ela, e estou
totalmente focado nisso só para não ter que reconhecer essa tensão
estranha enquanto Cauler e eu ficamos de frente um para o outro em
silêncio.
Eu puxo meu capuz e enfio minhas mãos no bolso, curvando meus
ombros contra o vento. Espero ficar doente só para poder espirrar no
Zero como vingança pelo que quer que seja.
Não vou falar primeiro. Claro, isso provavelmente é minha culpa.
Definitivamente minha culpa. Mas de jeito nenhum eu vou admitir isso.
Cauler resiste pelo que parece ser um sólido dois minutos antes de
dizer:
— Eles provavelmente estão lá fazendo apostas sobre se vamos dar
uns amassos ou não.
Eu começo a me afastar antes que ele me pegue corando. Eu só dou
alguns passos antes que as folhas comecem a amassar atrás de mim.
Parte de mim está emocionada que ele está me seguindo depois de dizer
algo assim, mas o resto de mim me odeia por isso. Isso não é como se
estivéssemos realmente começando a dar uns amassos agora só porque
os garotos querem.
Ótimo, agora é tudo que consigo pensar. Como vamos cair na real
com nossa merda se estou muito ocupado fantasiando para falar com
ele?
Cauler me alcança quando desço da ponte, e ele parece saber
exatamente para onde estou indo, virando em direção ao lago sem
esperar por mim. Passamos por Main, o cais à vista antes que ele falasse
novamente.
— Se você realmente não confia na minha precisão, podemos ir para
a pista agora e esclarecer isso. Mas acho que você já sabe disso.
Eu suspiro e murmuro:
— Você provavelmente está certo.
— Então o que foi aquilo?
Há mais pessoas do lado de fora agora que estamos em um dos
dormitórios e no refeitório. Há algumas garotas sentadas sob o sicômoro
gigante na frente do Main, usando suéteres, leggings e cachecóis,
bebendo em copos de café de papel e olhando para nós por um tempo
demais enquanto passamos. Um cara está atravessando a ponte sobre o
riacho vindo dos outros dormitórios, grampeando em seu telefone,
olhando para cima para observar seus passos. Seus olhos nos seguem
quando ele nos vê.
Eu abaixo minha cabeça.
— Aqui não. — Digo como se fosse realmente me explicar quando
não estivermos sendo observados.
A doca está vazia, e não sei dizer se estou aliviado ou desapontado
por não ter uma desculpa para ficar quieto. Eu vou para o meu lugar
habitual no final e sento, chutando minhas pernas sobre a água. Cauler
fica muito perto. Para alguém que não me suporta, ele não tem nenhum
problema em estar no meu espaço.
Uma rajada de vento vem do lago, me fazendo estremecer. Eu puxo
meus pés para cima do cais e envolvo meus braços ao redor meus
joelhos. Meu capuz o bloqueia da minha visão periférica, o que é bom
para mim. Não posso olhar para a boca dele dessa maneira.
Eu espero que ele diga alguma coisa. Que me ataque por causa do
jogo, me chame de egoísta. Diga-me que o que quer que tenhamos está
oficialmente acabado.
Mas eu quero consertar isso. Quero voltar ao flerte, ao beijo, se
pudermos. Pelo menos então estávamos nos divertindo um com o outro.
— Desculpe por ser um merdinha — murmuro.
— Você é sempre um merdinha — diz Cauler. — Você terá que ser
mais específico.
Olho para o lago e suspiro.
— No jogo de ontem. E agora no Twitter.
Cauler cantarola. Eu olho quando ele traz um joelho para apoiar sob
o queixo.
— Aquele jogo foi uma piada. Eu superei. Estou principalmente
surpreso que você saiba como enviar um tweet, honestamente.
Eu não digo nada. Eu tenho o mesmo sentimento pesado no meu
peito que eu tinha antes de sair do armário para minhas irmãs mais cedo.
Palavras tentando forçar seu caminho através dos meus dentes antes que
eu tivesse tempo de pensar nelas. É apenas…
— É difícil, jogar na frente do meu pai — eu deixo escapar.
Cauler ri um pouco.
— Posso dizer com certeza que foi difícil para alguns dos meninos
também. Achei que você já estaria acostumado com isso agora.
Eu dou de ombros.
— Ele se aposentou há alguns anos. Não é como se ele tivesse tempo
para vir aos meus jogos. Raleigh fica muito longe de Michigan. É só que…
— Eu me paro. Ele não quer ouvir minha história triste. Eu deveria ser
grato por ter entrado no NTDP. Não teria acontecido se não fosse por
papai me empurrando e me deixando em Buffalo.
— É só que? — Prensa Cauler.
Eu solto um suspiro e puxo as cordas do meu moletom para manter
minhas mãos ocupadas.
— Ele espera muito. Tipo muito. Ou pelo menos eu suponho que ele
faz? Não sei. Eu meio que entrei em pânico no final desse jogo. Eu não
tinha feito merda nenhuma e ele estava assistindo e... eu não sei.
— Você percebe que se você tivesse passado para mim, você teria
uma assistência, certo?
— Sim. Mas então você teria dois gols.
— E você me prepararia para um jogo vencedor em uma bela jogada
com segundos no relógio, e todos ficariam obcecados com nossa química
no gelo em vez de nos colocar um contra o outro como sempre.
Eu pressiono minha testa contra meus joelhos.
— Eu sei.
— Você parecerá muito melhor para os olheiros se se concentrar no
time e vencer em vez de acumular gols.
— Eu sei. — Há um tom desesperado na minha voz que me faz fechar
os olhos. Não vou chorar na frente dele.
Ele ouve totalmente, também. Ele está perto o suficiente para que eu
possa senti-lo puxar a outra perna para cima, seu cotovelo pressionando
meu braço enquanto ele se ajusta.
— Se você quer uma figura parental que tenha um orgulho
repugnante de tudo o que você faz, eu darei seu número para mamãe.
Faça um turno sem fazer gol contra ou cair de bunda e ela vai explodir
seu telefone sobre o quão bem você está indo.
Eu dou uma risada pelo nariz e viro a cabeça, descansando o lado do
meu rosto em meus joelhos para que eu possa olhar para ele. Ele inclina
a cabeça para trás, olhando para as cores do pôr do sol que espreitam
através das nuvens cinzentas. Meus olhos seguem a longo extensão de
sua garganta, até o colar de prata descansando na base de seu pescoço.
— Ela não sabia nada sobre hóquei quando comecei — ele continua.
— Ela chorou quando me viu de patins sem cair. Basicamente chamou o
Sr. Cícero de milagreiro, ela ficou impressionada. Nunca superei isso
também. Ela está maravilhada com tudo.
— Como você começou a jogar se ela não sabia nada sobre isso? —
Eu pergunto.
— Kyle Kane é do mesmo bairro que eu. Estávamos a caminho do
meu primeiro treino de futebol, na verdade. Um garoto negro diz que
quer praticar esportes, os professores mandam panfletos de futebol e
basquete para casa, sabe. Mas mamãe e eu encontramos Kyle Kane
jogando hóquei de rua com algumas crianças a alguns quarteirões de
casa. Homem negro praticando um esporte que não é futebol ou
basquete com um bando de crianças negras? — Ele sorri. Balança a
cabeça um pouco. — Fiquei instantaneamente obcecado. Papai começou
a fazer muitas horas extras e mamãe começou a tomar conta de um
monte de crianças antes do trabalho à noite para que pudessem pagar
para eu brincar. — Ele vira a cabeça para olhar para mim. — Não sei se
você sabia disso, mas o hóquei é caro.
— Eu sei — eu digo suavemente.
Ele se inclina para trás, segurando-se com as mãos no cimento frio do
cais.
— Sabe o que mais é caro? Contas hospitalares. — Não consigo ver
seu rosto com ele sentado assim, mas ouço a mudança amarga em seu
tom.
Eu ainda posso ver aquele golpe que ele levou na minha mente. Ouço
o som de seu capacete tocando no poste. Imagino-o de bruços no gelo por
cinco minutos imóvel antes de ser levado em uma maca, os locutores tão
apavorados que nem sequer especularam sobre o quão ruim poderia ser
o ferimento.
Não consigo imaginar experimentar isso em primeira mão.
— Estou surpreso que seus pais deixaram você continuar jogando —
eu digo.
— O mesmo, honestamente. — Ele não está surpreso que eu
soubesse do que ele estava falando. Foi tudo o que a mídia de hóquei
falou por meses. — Foi o pior. Não conseguia pensar direito, vomitava o
tempo todo, mal conseguia andar. Parecia que eu estava fazendo uma
ressonância magnética todos os dias. Mas tudo o que me importava era
voltar para o gelo. Desde aquele dia, jogando hóquei de rua com Kyle
Kane, construí minha vida inteira em torno desse esporte. Eu não tinha
mais nada. Soa familiar?
— Eu não construí esta vida. — Eu me encolho com minhas próprias
palavras assim que elas saem.
— Dramático — diz Cauler, mas ele não parece irritado com isso pela
primeira vez.
Nós dois estamos quietos. O sol está se pondo rapidamente, e está
ficando mais frio a cada segundo. Não sinto vontade de me mexer.
Quando Cauler está deitado de costas com os joelhos dobrados e as mãos
cruzadas sobre o estômago, parece uma boa ideia. Até eu me deitar com
ele e nossos braços estarem pressionados um contra o outro.
Ele não se afasta. Nem vacila. O calor dele é suficiente para espantar
um pouco do frio de novembro.
— Você deveria se tornar profissional no próximo ano — eu digo. É
quase um sussurro.
— Eu deveria — ele concorda.
— Então por que você não vai?
— Porque. Nunca mais quero sentir que o hóquei é tudo o que tenho.
Meus pais estão bem com dinheiro por enquanto, mas com minha dívida
médica, eles não seriam capazes de me enviar para a faculdade sem esta
bolsa. Estou aproveitando.
— Qual é o seu backup, então?
— Meu irmão está na faculdade de direito. Muitas bolsas de estudo e
concessões. Ele vai abrir a sua própria firma para lidar com as violações
dos direitos civis. Eu quero ajudar.
— Você realmente vai para a faculdade de direito? — Levanto minha
cabeça do cais para dar uma olhada nele. — Você diz isso às pessoas, não
há como você ser escolhido primeiro.
Ele fecha o rosto para mim.
— Eu não vou para a faculdade de direito, seu merdinha. Você não
precisa de um diploma de direito para ser um paralegal. E você?
— E quanto a mim?
— Você descobriu um plano de backup?
— Não.
— O que aconteceu com a ciência marinha?
Minhas bochechas aquecem e meu coração pula. Ele se lembrava
disso desde nossa primeira aula de álgebra? Cara.
— Entrei em pânico quando todo mundo estava dizendo suas
especialidades.
— Se esse foi o seu objetivo, você deve gostar pelo menos. Você
passa muito tempo aqui embaixo.
Eu dou de ombros. Ficamos quietos novamente. Como se tivéssemos
atingido nosso limite de trabalho para o dia. Fecho os olhos, sentindo-me
mais relaxado agora do que há dias. Fora estar bêbado, pelo menos.
— Terzo — diz Cauler, e eu acordo assustado. Eu nem percebi que
estava adormecendo. — Se eu for o primeiro, seu pai vai deserdá-lo?
Eu pisco o sono dos meus olhos. Se ele tivesse me feito essa mesma
pergunta ontem eu provavelmente teria dito que sim. Poderia até
acreditar também. Mas hoje, eu digo:
— Huh? Não. Ele é um fanático, mas não é um idiota total.
— Eh, não tenho tanta certeza sobre isso. Mas bom saber. Agora não
vou me sentir tão culpado por isso.
Eu rio. Uma risada real e cheia de gargalhadas.
— Você está delirando, Cauler.
— Segure essa sensação de segurança, Sua Graça. Isso tornará o dia
do draft ainda mais satisfatório.
O sol está quase se pondo e eu estou congelando, mas eu quero
continuar neste momento, comigo e Cauler nos dando bem e deitados um
ao lado do outro em um silêncio que não é tenso e constrangedor para
variar.
Cauler bate os dedos no peito, e eu tremo por todo o meu corpo
quando as estrelas começam a espreitar através de nuvens escuras. Ele
sopra ar pelos dentes que congela acima de seu rosto.
Eu poderia beijá-lo agora. Aqui, no cais. Meu lugar favorito no
campus. Seria francamente poético, terminar uma briga com um beijo.
Mas somos os principais prospectos da NHL e há tanta atenção em
nós que em um lugar semi-público como este, não há como ficar em
segredo por muito tempo. E quando eu me assumir para o mundo, quero
que seja nos meus termos.
Então, em vez disso, eu digo:
— Zero nos deu até o fim da sala de estudos. Que horas são?
— Vou me adiantar e dizer que a sala de estudos acabou agora.
— Acha que resolvemos o suficiente para eles?
— Você obviamente não tem prestado atenção. Para eles, resolver
significa colocar nossas bocas um no outro.
Eu gaguejo quando meu coração aperta minha garganta, mas Cauler
apenas ri e se senta, esticando os braços acima da cabeça.
— Calma, Terzo. Eu sei que demonstração de afeto pública é
perigoso. — Ele se levanta e estende a mão para me ajudar a levantar, e
eu quero gritar. Eu meio que olho fixamente para ele por um segundo
antes de me firmar.
Ele me olha nos olhos. Um contato visual profundo e intenso
enquanto ele me puxa para os meus pés. Ele me puxa para mais perto do
que precisa, segura por um segundo mais do que o necessário, e por um
segundo eu juro que ele vai fazer isso. Malditos olhos curiosos. Eu mordo
meu lábio e olho para sua boca e espero por isso.
Ele se vira quando estou prestes a me inclinar, e eu o sigo de volta
para a biblioteca com o coração no estômago.
DEZENOVE
Cauler e eu fazemos sexo novamente mais algumas vezes antes do
feriado de Ação de Graças, e graças a Deus não temos nenhum jogo nos
próximos dias, porque ele me deixa com esse chupão gigante para me
lembrar dele pela última vez.
Os garotos que ficaram na casa de hóquei passaram o jantar de Ação
de Graças inteiro tentando descobrir quem fez. O consenso geral é que
Nova voou ontem à noite para um sexo casual. O nome de Cauler nem
aparece, e tenho certeza que é intencional.
Estou meio dormindo no sofá depois do jantar quando meu telefone
toca, me acordando assustado com uma mensagem de Cauler.
Jaysen: Como zero está cozinhando
Olho ao redor da sala de estar. Há um jogo de futebol na TV, e Colie
está desmaiado na poltrona do outro lado da sala, de boca aberta e
roncando. Todo mundo parece ter migrado para o álcool na cozinha.
Mickey: Nada mal, na verdade
O Peru está um pouco seco, mas eu apenas afoguei no molho
Como está em casa?
Jaysen: Legal
Se você notar algum vergões em mim quando eu voltar, não se assuste
Meu primo rashida leva muito a sério o pingue-pongue bárbaro
Ok, eu nunca ouvi falar de uma versão de pingue-pongue que
resultasse em vergões, mas não posso dizer que não estou intrigado.
Antes que eu possa perguntar sobre isso, porém, Cauler envia outra
mensagem.
Jaysen: Jogando cartas com a família agora e shae está chutando minha bunda
Parece que eu não posso ganhar
Ele está jogando cartas com sua família e aproveitou o tempo para
me enviar uma mensagem. Não é isso que amigos com benefícios fazem,
certo? Isso deve significar algo mais.
Mickey: Quem é Shae
Jaysen: Meu irmão
Ele perguntou sobre você
Eu olho para cima novamente, me certifico de que ninguém entrou
no quarto e Colie ainda está dormindo.
Mickey: Ah?
Jaysen: Sim
Eu posso ter falado muita merda sobre você no começo
E minha família está acompanhando as projeções do draft
Você é o vilão nesta casa
Mickey: Meu pai pensa o mesmo sobre você
Ele te chamou de distração
Jaysen: Ele está certo
Minhas palmas estão suando. Eu tiro uma selfie com meu pescoço à
vista e envio para ele.
Mickey: Você me diz
Ele manda um monte de emojis rindo e então:
Jaysen: Fica bem em você
Mickey: Você pensaria assim.
Eu olho para a cozinha novamente. A única pessoa que posso ver é
Zero, sentado no balcão com uma garrafa de cerveja na mão, rindo de
algo fora de vista. Não prestando atenção em mim.
Mickey: Fale-me sobre Shae
Jaysen: Cara, ele é tipo
Uma das minhas pessoas favoritas
Somos bem diferentes, como se ele não gostasse de esportes
em tudo e ele odeia minha música, mas ele é tão inteligente
Eu admiro muito ele, mas não estamos em lugar nenhum
próximo tão próximos quanto você e suas irmãs
Meio ciumento na verdade
— Para quem você está mandando mensagem?
Juro que quase engasgo com meu próprio coração quando Delilah
coloca a cabeça sobre o encosto do sofá e coloca o queixo no meu ombro.
Eu bato meu telefone no meu peito para esconder a tela e olho para ela.
Ela sorri.
— Acho que posso adivinhar.
Meu telefone zumbe contra minha caixa torácica, fazendo meu
coração pular.
— Aposto que você estaria errada.
Delilah revira os olhos.
— Negue tudo o que quiser, Mickey. Mas eu sei das coisas.
— Como o quê?
Ela levanta a mão direita.
— Eu jurei sigilo.
— Delilah.
— Mickey.
— Eu sou seu irmão.
Ela ri um pouco e dá a volta no sofá para se sentar ao meu lado. Ela
enfia uma de suas pernas sob ela e se vira para mim, embalando um
refrigerador de vinho. Ela jantou com sua própria equipe, então ela
perdeu toda a conversa do chupão. Quando ela me vê agora, seu nariz
franze em desgosto.
— Ah, de novo? Você é tão adolescente.
Eu levanto meus ombros como se fosse esconder.
— Cale-se.
— Então, qual é o problema com vocês dois? — Ela mexe as
sobrancelhas. — Por favor, me diga que vocês são namorados.
— Meu Deus. — Olho em volta em pânico, mas Colie ainda está
roncando e posso ouvir o quicar de uma bola de pong em um copo antes
que os meninos comecem a gritar na cozinha. — Não. Nós não estamos...
namorando.
— Eca. Homens.
— Com o que você se importa?
Ela dá de ombros e toma um gole pequeno de sua bebida.
— Eu só acho que seria bom para você. Você parece melhor desde
que isso começou.
Eu franzo a testa para ela.
— Melhor?
— Sim, tipo… — Ela aponta um dedo para sua própria cabeça.
Meu estômago cai. Fiquei tanto tempo sem que ninguém percebesse,
e agora é como se todos pudessem ver através de mim. Uma coisa é dizer
às pessoas eu mesmo, mas ser confrontado com isso, primeiro por papai,
agora por Delilah?
Raiva lampeja repentina e quente na parte de trás do meu crânio. Eu
tento eliminá-la antes que ela tome conta, mas ela se instala e sai da
minha boca de qualquer maneira.
— Melhor — eu disparo. — Não há nada de errado comigo.
Ela parece tão cansada quando olha para mim novamente, apertando
os lábios e me dando esses olhos tristes.
— Mickey, eu não estava tentando...
— Não há nada de errado comigo — repito. Eu me levanto e vou para
a cozinha.
Eu preciso de uma bebida.

O ÚLTIMO TEXTO que recebi da mamãe é do verão, quando eu estava


treinando naquele acampamento relaxado com Bailey. Meus polegares
pairam sobre o teclado por dez minutos inteiros antes de eu ter coragem
de digitar.
Mickey: Oi mamãe
Ela responde imediatamente, o que me faz sentir mal.
Mom: Topolino! Feliz Dia de Ação de Graças!
Mickey: Feliz Ação de Graças
Mom: Mi manchi
Mickey: Também sinto sua falta
Desculpe não poder ir
Muito dever de casa
Mom: Tudo bem. Natal talvez?
Mickey: Talvez
Esfrego os olhos com as palmas das mãos. Posso ouvir o barulho dos
meninos conversando pelo chão do banheiro, onde estou sentado no
vaso sanitário fechado. Eu nem bebi tanto assim, mas me sinto doente.
Cansado. Como se eu pudesse rastejar para a cama e ficar lá por três
anos.
Tudo porque Delilah disse algo sobre eu melhorar. Como se ela
apontando que eu tenho um problema o fez voltar, eu não sei.
Minhas mãos tremem quando pego meu telefone de volta e começo a
digitar novamente.
Mickey: Então
Papai disse algo sobre depressão
Tipo você tem, eu acho
Eu não me lembro muito de quando eu morava com vocês então eu não sabia
Mom: Sim. Isso acontece na minha família. Por quê? Você está bem?
Mickey: Não
Na verdade
Mom: Deixe-me ir para um lugar tranquilo e eu te ligo.
Mickey: tudo bem
Mom: Ti voglio bene Mickey.
Mickey: Também te amo

EU LEIO o folheto da medicação três vezes antes mesmo de tocar o


frasco de comprimidos. É o mesmo antidepressivo que mamãe toma, na
dosagem mais baixa para começar. A lista de efeitos colaterais é tão
longa que minha boca fica seca ao lê-los. Mas mamãe disse que ela
acabou de ganhar algum peso. A única vez que ela teve um problema foi
quando ela pulou algumas doses e começou a passar por abstinências.
Eu agito o pote lentamente, ouvindo as pílulas chocalharem
enquanto olho para o teto.
Antidepressivos.
Eu. Tomando antidepressivos.
Eu, Mickey James III, com um futuro tão brilhante e financeiramente
próspero pela frente. Tanta gente mataria para trocar de lugar comigo. E
aqui estou eu. Com um frasco de antidepressivos na mão.
Eu não tenho o direito de estar deprimido, eu disse a mamãe. Minha
vida não é horrível. Nada realmente ruim nunca aconteceu comigo.
A depressão não se importa com quem você é ou com o que você
passou, disse ela. É uma doença que pode acontecer com qualquer um.
Ela disse isso, a internet disse isso, o conselheiro de Hartland disse
isso quando fui perguntar sobre tratamento. O médico que realmente
prescreveu o remédio disse isso. Inferno, eu até disse isso para Dorian.
Mas por mais que eu saiba logicamente que é verdade, que está tudo
na minha genética, meu cérebro não para de me dizer que estou sendo
ingrato. Papai não me abandonou quando criança, ele me preparou para
o sucesso. Eu não tive essa vida empurrada em mim, é apenas o que eu
sou bom. Eu não odeio hóquei, só não tenho energia para gostar.
Porque estou deprimido.
Fecho os olhos e respiro lenta e profundamente, batendo a garrafa na
testa.
Droga.
VINTE
Assim que Dorian volta ao campus depois do Dia de Ação de Graças, ele
aponta para o meu pescoço e diz:
— Espero que você tenha uma história para isso.
Jesus. Está quase sumindo agora, como ele percebeu? Já é ruim o
suficiente eu ainda estar recebendo mensagens no chat em grupo como:
Delilah: Ei chupão14
quero dizer mickey
Assim que o lago congelar
vamos jogar um chupão na lagoa
quero dizer hóquei
Você vai?
Eu literalmente odeio minha vida.
— Os meninos já decidiram que foi Nova — digo.
— Certo. Porque você realmente faria isso com o Barbie. Feliz por
você, no entanto. E honestamente impressionado. Eu noto a escolha
extremamente cuidadosa de Cauler.
Eu realmente gaguejo para ele.
Dorian apenas ri.
— Agora esse é um caso clássico de opostos se atraem, hein? Só tome
cuidado, cara. Se a Liga descobre que seus principais prospectos estão se
pegando, a merda vai acontecer.
Meu rosto está em chamas.
— Meu Deus. Dorian. Que diabos.
— Quais são as chances? Eles cairiam em cima disso.
— Comecei a tomar antidepressivos — digo só para mudar de
assunto, e passamos o resto da manhã limpando nosso quarto e
conversando sobre medicamentos, efeitos colaterais e benefícios.
Honestamente, nós nos envolvemos tanto que é como se estivéssemos
nos unindo para falar sobre garotas ou algo assim.
Eu puxo a gola do meu moletom sobre minha boca quando entro na
sala de fita naquela tarde. Não preciso que o resto dos meninos que
foram para casa no Dia de Ação de Graças percebam. Meu estômago dá
uma reviravolta estranha quando vejo Cauler. Ele geralmente senta na
frente com Zero. Hoje, ele está nos fundos, onde sempre me sento com
Dorian e Barbie.
Assim que me sento ao lado dele, ele me entrega um chiclete. Eu pego
dele e olho para vê-lo empurrar o seu próprio em sua boca. Ele ergue
uma sobrancelha para mim.
Esse idiota.
Assim que o chiclete toca minha língua, é como se eu o estivesse
beijando novamente. Eu olho para ele. Ele fez isso de propósito.
Cauler apenas ri enquanto eu afundo no meu assento e mastigo
furiosamente.
Barbie está sentado do meu outro lado, a perna balançando contra a
minha. Ele está mandando mensagem para Nova. Não que eu esteja
sendo intrometido ou algo assim. Ele mastiga a unha do polegar
enquanto lê as mensagens dela e leva seu tempo digitando as suas
próprias. As coisas devem estar ficando sérias. Sua perna continua
balançando mesmo quando ele coloca o telefone no bolso. Eu quero
empurrar seu joelho para baixo para detê-lo, mas Dorian pressiona sua
perna contra ele do outro lado e isso parece ajudar um pouco.
Meu estômago se revira quando o treinador começa a fita e vejo as
camisas azuis e douradas dos Canisius Golden Griffins na tela. A
ansiedade sai do meu peito até a ponta dos dedos. Eu afundo na minha
cadeira e mastigo as cordas do meu moletom, me apertando bem no
meio. Perdemos este jogo, e sei que cometi meu quinhão de erros. Nada
como o jogo dos Eagles, mas o suficiente para eu ficar mal-humorado o
resto da noite. Eu odeio assistir qualquer tipo de fita, mesmo de jogos
que ganhamos. Meu pai gravou tudo quando eu era criança, de jogos a
treinos e arremessos em uma rede na nossa garagem. Mostrou-me a fita
para me guiar por todos os erros que cometi até que fosse tudo em que
eu pudesse me concentrar. Eu poderia fazer cinco pontos em um jogo e
ainda me lembrar apenas de uma virada, do confronto perdido na zona
defensiva.
Não é como se ele quisesse que fosse assim. Certo? Ele estava apenas
tentando me ensinar.
Mas eu ainda não gosto de assistir fita.
Sempre que minha linha aparece no gelo, tento me concentrar em
Cauler e Zero, os blueliners, Colie, qualquer um além de mim para
manter as críticas de papai fora da minha cabeça. Estar no gelo com
Cauler é uma coisa. Estar no momento, tudo acontecendo tão rápido,
pensar nos meus próximos passos. Isso realmente não me dá a chance de
apreciar totalmente a habilidade de Cauler. Ver isso acontecer em uma
tela honestamente me assusta. Até com o disco no gelo, ele está sempre
em movimento, sempre se colocando na melhor posição possível, sempre
trabalhando. Ele é um jogador completo de sessenta metros. Faz um
centro muito melhor do que eu jamais poderia. E quando o disco está em
seu taco, bem... é óbvio porque ele é uma ameaça para o meu posto no
draft.
Eu me inclino para frente e prendo a respiração quando um disco
limpo passa de Barbie nas marcas de hash externas em nossa zona atinge
meu taco logo fora da linha azul. Eu o redireciono para Cauler na linha
azul oposta com um movimento rápido do meu pulso, e Cauler o leva
para o ponto de confronto antes de colocá-lo no canto superior com um
snapper duro para empatar o jogo. A peça é rápida e emocionante o
suficiente para deixar os garotos empolgados, embora todos saibamos
que isso não importa. Colie sacode Cauler de onde ele está sentado do
outro lado, gritando:
— Top cheddar! Ai que lindo!
— Eu não sei por que vocês estão tão animados quando sabem como
isso termina — o treinador retruca, silenciando a alegria de todos. —
Podemos fazer todas as jogadas bonitas que quisermos, mas se não
pudermos acompanhá-las com vitórias, qual é o objetivo?
A energia na sala diminui o suficiente para que ninguém reaja
quando eu arrisco com o temporizador no topo do círculo esquerdo. Eu
posso ver meu erro com clareza surpreendente desta vez. No gelo, pensei
que não tinha tempo. Meu defensor estava entrando, o goleiro deslizando
pelo vinco, outro cara se aproximando por trás. Minha pista estava
fechando, e pensei que tirar um tempo para alinhar o tiro seria uma
oportunidade perdida. Mas vendo assim, vejo o zagueiro tropeçando
rasteiro, pegando nas proteções do goleiro, amarrando os dois. Eu
poderia ter esperado, deked no último segundo a sair da dobrada, deu
um tiro melhor. Eu tive muito tempo.
A pior parte é que eu superei isso mais rápido do que eu já superei
um erro antes. Eu sei que sou péssimo em tiros rápidos. Eu cheguei a um
acordo com isso.
E agora está sendo empurrado na minha cara.
Eu afundo mais no meu assento.
— Este é um problema que tivemos durante toda a temporada — diz
o treinador, pausando a fita. — Jogamos muito rápido. Há momentos em
que funciona, com certeza. Como aquela jogada com Barboza, James e
Caulfield. Mas as vezes que isso não acontece são catastróficas.
Precisamos desacelerar, pensar. Atingimos a linha azul como uma
parede, tudo de uma vez. Espalhe, tome seu tempo. Temos apenas alguns
meses para acertar nosso jogo. Nosso recorde está do nosso lado por
enquanto, mas se continuarmos cometendo erros como esse, não vai
durar. Precisamos jogar com mais inteligência.
— James — o treinador me chama. Eu estalo meus olhos para ele. —
Você é melhor que isso. Vocês…
Eu desligo o resto de suas palavras e mantenho meu queixo enfiado
no vestiário enquanto nos arrumamos. Não ouço mais nada até me
levantar para seguir minha equipe até o gelo e o treinador me chamar de
lado. Cauler estreita os olhos para nós quando passa. Quase parece
preocupação.
— Eu quero você trabalhando em seus tiros rápidos com o treinador
Stempniak — o treinador diz.
Meu corpo inteiro fica tenso quando olho para eles.
— Eu nunca dou tiros rápidos, treinador — eu digo depois de um
momento de silêncio. — Isso foi um acaso.
— É uma habilidade que você deveria ter.
Eu pisco para ele. O tom de sua voz soa menos como um habilidade
que você deve ter e mais como uma habilidade vergonhosa para não se ter
como Mickey James III. Nós nos encaramos, mas eu tenho muito mais
prática em manter meu rosto frio e inquietante, e o Treinador acaba
cedendo. Ele desvia o olhar e diz:
— Vá em frente, continue com isso.
Levo mais alguns segundos antes de desviar os olhos e levar o
treinador Stempniak para o gelo. Assumimos uma das zonas e montamos
de forma idêntica como Cauler e eu fizemos. Mas ele não é Cauler e não
estamos sozinhos e onde cada tiro fracassado me trouxe esse tipo
estranho de alegria antes, agora eles me trazem nada além de raiva. Sinto
olhos nas minhas costas. Eu sei que os meninos estão ocupados
praticando atrás de mim, mas tudo o que ouço é o sangue correndo em
meus ouvidos, e eu posso jurar que eles estão todos lá atrás me
observando errar cada tiro.
Eu me pergunto o que papai diria se pudesse me ver agora.
Provavelmente algo sobre meu nome e meu sangue e seu legado. Ele não
tinha esses problemas. Ele é alto. Forte. Pode dar um tiro de qualquer
lugar, atingir o disco com tanta força que quebra o vidro. Eu nunca vou
fazer jus ao nome dele.
Às vezes me pergunto se ele se arrepende de ter se casado com a
mamãe. Se ele a culpa por me fazer tão baixinho.
Leva meia hora de falha contínua e o treinador Stempniak fazendo o
trabalho mais difícil de sua carreira tentando me consertar antes que eu
finalmente me conecte com solidez e precisão, do jeito que um
verdadeiro jogador de hóquei deveria.
E então eu sou Mickey James III. Uma máquina de hóquei impecável
que pode acertar uma tacada tão boa quanto qualquer um.
VINTE E UM
DEZEMBRO

Só porque estamos fazendo sexo regularmente agora não significa que


vou deixar o caminho fácil para Cauler. Fiz três gols e duas assistências
em nossos dois jogos naquele fim de semana, enquanto ele saiu com um
gol e duas assistências, e estou oficialmente onze pontos à frente dele.
O Twitter adora. Especialmente quando Cauler twitta:
Jaysen Caulfield @jaycaul21
Imagine se @mjames17 pudesse adicionar esses onze pontos à sua altura. Talvez
então eu ficaria nervoso.
Estou sentado ao lado dele na cama, dividindo um saco de batatas
fritas com sal e vinagre, quando respondo.
Mickey James III @mjames17
Respondendo a @jaycaul21
Deve realmente ferir seu ego para alguém tão pequeno quanto eu para ser muito
melhor do que você.
Cauler bufa quando lê.
— Isso é o melhor que você pode fazer?
Eu dou de ombros.
— Não que eu possa ser vulgar nas redes sociais.
Ele me empurra para o meu colchão enquanto o Twitter explode
sobre nossa rivalidade e o quanto nos desprezamos.
Acordo na segunda-feira com alma mater tocando na torre do sino,
saudando a primeira forte nevasca do ano. Meu jeans está ensopado até
os joelhos quando chego à aula, apenas para encontrar uma placa colada
na porta dizendo que está cancelada.
Meus dedos dos pés estão congelados sem motivo. Eu verifico meu e-
mail antes que eu possa cometer o mesmo erro novamente e encontro
mensagens de meus professores cancelando minhas aulas posteriores
também. Aparentemente, cancelar todas as aulas era o motivo do sinal, e
eu sou muito calouro para saber disso. Eu quase tinha esquecido como
era bom um dia de neve. Eu só queria não ter vindo até aqui para nada.
Paro no refeitório para tomar um café e um bagel, e estou voltando
para o meu quarto quando Zero manda uma mensagem para o grupo de
bate-papo da equipe.
Luca Cicero: Equipe Lax indo para o fall ball em vinte minutos
Está nevando
Vocês todos sabem o que isso significa
Eu literalmente não tenho ideia do que isso significa. Eu vejo as
respostas chegarem enquanto eu tiro minhas meias molhadas e jeans e
depois de alguns minutos, Barbie é o único a falar.
David Barboza: Alguém quer explicar o que está acontecendo para nós noobs?
Maverick Kovachis: Leve suas bundas para a casa de hóquei e prepare-se para a
batalha.
Aparentemente, a batalha significa atirar bolas de neve no time
masculino de lacrosse quando eles saem da casa. É uma guerra completa
em segundos, e eles têm a vantagem de bastões de lacrosse para lançar
suas bolas de neve mais longe e com mais força.
— Cometemos um erro terrível! — Kovy grita com esse terrível
sotaque britânico. — Recuar!
Todos nós lutamos para recuar, mas meu pé fica preso em um monte
de neve. Eu caio de cara, afundando tão baixo na neve, parece que estou
em areia movediça. Vejo meus companheiros me deixarem para trás,
cuspindo neve da minha boca e tentando ficar de joelhos. Dorian está
alguns passos à frente antes que ele perceba e volte para agarrar meu
pulso e me levantar, gritando e me puxando atrás dele. Sid e Karim estão
em cima de nós um segundo depois, nos empurrando de volta para a
neve.
— Deveria ter se salvado, Hidalgo — Sid diz, prendendo Dorian no
chão.
— Só porque vocês laxers são desleais não significa que nós somos
— diz Dorian. Ele recebe um punhado de neve em seu rosto em resposta.
Quando voltamos para a casa de hóquei, estamos ensopados até os
ossos e tremendo de frio, mas os meninos estão se amontoando nos
carros, não nos dando tempo de nos recuperar. Cauler está ao lado do
SUV de Zero com a porta traseira aberta.
— Não se preocupe, Cauler, eu voltei para salvá-lo — diz Dorian,
apontando o polegar para mim. Ele não vê o olhar de raiva que Cauler lhe
lança enquanto entra no carro.
Eu estou na frente de Cauler, tremendo tanto que meus dentes estão
batendo. Meu cabelo está congelado contra minha testa, e eu sinto cada
mudança no vento enquanto ele me golpeia.
— Você me deixou para morrer — eu digo.
Cauler zomba.
— Você realmente espera que eu resgate o meu inimigo mortal?
— Isso é o que eu sou para você?
— Você é um merdinha, é isso que você é. — Ele sorri enquanto me
agarra pelo ombro e me empurra para dentro do carro.
Não sei o que estamos fazendo até chegarmos à pista e ver a equipe
feminina no gelo. Eu praticamente corro para o vestiário para pegar
meus patins e taco. O hóquei no lago com minhas irmãs foi um ponto alto
da minha infância. Tínhamos um lago nos fundos, alimentado pelas
inundações do riacho que serpenteava pela floresta atrás de nossa casa e
se curvava em nosso quintal. Tinha alguns metros de profundidade,
menor que um rinque padrão, mas bom o suficiente para nós. No verão
estava cheio de sapos e tartarugas e mosquitos suficientes para que não
pudéssemos nadar muito nele. Mas no auge do inverno, congelava sólido
e claro, cercado por montes de neve e um plano de fundo branco por
causa dos pinheiros com neve. Uma foto tão perfeita que acabou em
cartões postais em mercearias locais e em um ou dois calendários do
oeste de Nova York.
Naquela época, eu acordava antes do sol só para sair de patins com
minhas irmãs. Parecem as memórias de uma pessoa completamente
diferente.
O lago aqui é grande demais para congelar e não estou com todas as
minhas irmãs aqui e as coisas não estão perfeitas. Mas eu não consigo ir
para o gelo com Delilah com frequência, então eu aceito.
Delilah, Barbie e eu somos escolhidos pela capitã da equipe feminina,
mas Cauler e Dorian acabam com Zero. Eu meio que gostaria de poder
jogar contra Delilah para que pudéssemos lutar por pontos como fizemos
durante toda a temporada, mas estou feliz em dominar o gelo com ela.
Jogamos juntos com frequência suficiente para saber exatamente onde
colocar o disco para que o outro apareça em seu caminho, não importa
quanto tempo tenha passado ou o quanto mudamos como jogadores.
Agora nós patinamos em círculos em torno de nossos companheiros
de equipe e fazemos passes impossíveis um para o outro, marcando gols
que fazem todos gritarem de frustração e espanto.
— Ok, quem diabos achou que era uma boa ideia colocar os James em
uma equipe? — uma das garotas do time de Zero pergunta depois de um
conjunto de passes sujos e um gol de Delilah.
Eu faço um gol pegando o disco na lâmina do meu taco e jogando-o
como um tiro lateral de lacrosse, e Delilah me levanta do gelo enquanto
Kovy grita:
— Oh merda, ele tem o dangles15!
Delilah está gritando na minha cara e me girando em círculos. Eu
reviro os olhos.
— Me coloca no chão? — Eu digo, e ela faz apenas para me pegar
pelas mãos e continuar girando.
— Dangles? — Cauler sibila enquanto desliza ao lado de Kovy. Ele me
dá esse olhar mordaz com o brilho mais fraco em seus olhos que faz meu
sangue bombear. — Mais como traição. Poderia muito bem despejá-lo na
casa lax onde ele pertence.
Eu cavo meus patins para parar o giro de Delilah e inclino meu
queixo para ele.
— Você realmente espera ir ao Frozen Four sem mim? — Eu
mantenho minha voz baixa e uniforme, lutando contra um sorriso.
Cauler se aproxima, até que estamos quase peito a peito, me
forçando a olhar para ele.
— Você é muito pequeno para ter um ego tão grande.
Eu arqueio uma sobrancelha para ele, e Delilah me solta.
— Ok, posso me afastar pelo menos três metros antes que vocês dois
façam... o que quer que estejam fazendo?
— Isso se chama tática de intimidação, Delilah — argumenta Cauler.
— Tire sua mente da sarjeta; é do seu irmão que estamos falando.
Eu rio. Alto e incomum, o suficiente para fazer um monte de garotos
se virarem e olharem para mim.
— O que você está fazendo com ele, Caulfield? — Zero patina com
preocupação fingida em sua voz e coloca a mão no meu ombro. — Esse
menino está machucando você, minha pobre criança rabugenta?
— Sim, acho que rompi alguma coisa. — Agarro minha barriga, e
Cauler está me observando com esse tipo de olhar suave em seu rosto. O
tipo de olhar que eu vi Delilah e Jade dar uma à outra, ou Bailey e Sid e
Karim.
Eu engasgo com minha próxima risada e deixo Zero me levar pelo
cotovelo antes que eu possa tirar mais conclusões ridículas.
Não avançamos muito antes de Cauler gritar:
— Ei, Terzo. Devemos praticar nossas poses para o dia do draft. —
Ele ergue o dedo indicador, da forma que uma escolha número um
sempre posa em fotos com os três primeiros. Assim como ele espera que
eu vá em frente e levante dois.
Eu inclino minha cabeça para o lado.
— Você quer tentar isso de novo?
Ele estica os braços, puxando-os sobre o peito e sacudindo os pulsos
como se tivesse que se esticar para isso. Ele ergue o punho e levanta
lentamente um dedo. Eu avanço e agarro sua mão, tentando forçá-la para
baixo. Todo o jogo se transformou em truques e jogadores de hóquei
fingindo ser patinadores artísticos neste momento. Zero nem tenta
acabar com a nossa luta de empurra-empurra. Ele observa até que Cauler
me dá uma chave de braço e sai patinando dizendo:
— Crianças, todos vocês.
Eu deveria estar envergonhado, com meus braços batendo
inutilmente ao lado de Cauler, curvados e presos na dobra de seu
cotovelo. Mas ele está rindo, e eu estou rindo, e honestamente, ambas as
equipes podem desaparecer do gelo agora, deixando apenas nós dois, e
eu nem perceberia.
NICOLETTE ENVIA UM link no chat em grupo no meio da minha aula de
italiano. Não costumo usar meu telefone na aula, mas é apenas uma
revisão final, e o italiano provavelmente vai me impedir de ser reprovado
na próxima semana, então não é como se eu realmente tivesse que
prestar atenção.
O link me leva a um vídeo que preciso silenciar em pânico antes que
me coloque em apuros. É Hugh e Alyssa na frente de outro gráfico meu e
de Cauler, desta vez de pé um ao lado do outro em nossos equipamentos
Royals durante uma pausa no jogo. Ele está dizendo algo com a cabeça
inclinada para mim e apontando para o gelo, mas estou olhando para ele.
Eu tenho esse tipo de olhar malcriado no meu rosto que faz parecer
que eu quero que ele cale a boca, mas provavelmente era apenas suor
nos meus olhos.
Funciona perfeitamente no banner Royals Rivalry Heats Up que eles
têm na parte inferior da tela.
Eu olho para cima para ter certeza de que a Professora Iacovella não
está me encarando, mas desde que ela percebeu que eu sou quase fluente
e faço esta aula pelo A fácil, ela praticamente começou a me ignorar. Eu
tenho sorte que ela não me expulsou e me enviou alguns níveis.
Eu afundo no meu assento e escondo meu telefone debaixo da mesa
de qualquer maneira.
— Agora, você sempre foi uma das maiores críticas de Mickey James
III, então tenho certeza que você tem muito a dizer sobre sua reviravolta
nesta temporada — disse Hugh nas legendas.
— Eu tenho — diz Alyssa com um aceno profundo. — Nós realmente
o vimos sair de sua concha nos últimos meses. Você pode dizer que ele
está ligado a esta equipe de uma maneira que ele nunca esteve antes.
— Sem mencionar o quanto ele cresceu como jogador também —
acrescenta Hugh. — Indo para esta temporada, eu diria que era
impossível para Mickey James ficar melhor do que já era sem dar o passo
para a NHL, mas… — Ele balança a cabeça, sorrindo. — Ele se tornou um
verdadeiro jogador de sessenta metros. Ele sempre foi uma ameaça na
zona ofensiva, com suas habilidades de armação, aquele infame tiro de
pulso, seu excelente QI de hóquei. Mas vimos ele melhorar
exponencialmente no backcheck nesta temporada. Ele é pequeno, mas
sabe usar seu corpo para criar ataque na zona defensiva. Não importa
onde ele esteja no gelo, ele é perigoso. Eu me sinto mal por qualquer cara
forçado a ir contra ele.
Alyssa muda seu peso de um pé para o outro enquanto Hugh fala,
obviamente esperando para dizer mais, e quando Hugh finalmente
termina, ela aproveita a chance de dizer:
— Vou em frente e credito uma boa parte desse crescimento a Jaysen
Caulfield.
Claro que ela diria isso. Ela provavelmente está certa também.
— James tem sido apontado como o melhor jogador em todos os
times em que já esteve — ela continua. — Ele não teve que se esforçar
tanto para subir acima do resto. Agora que ele compartilha uma equipe
com seu maior concorrente de draft, ele foi forçado a melhorar a si
mesmo.
— Você acha que o mesmo poderia ser dito de Caulfield?
— É claro. Ambos estão buscando o mesmo lugar no topo de sua
classe, então eles têm que dar o seu melhor para o gelo todos os dias ou
então deixar o outro avançar. Eles empurram um ao outro para fazer
melhor, querendo ou não.
— Eles têm uma das rivalidades mais acaloradas do esporte no
momento, mas são surpreendentemente bons em manter o que sentem
um pelo outro fora do gelo. Eles são jovens, mas quando se trata de
hóquei, são profissionais.
— Bem, não podemos esquecer o comportamento deles nas mídias
sociais.
— Como eu disse. — Hugh se vira para a câmera com um sorriso
cheio de mídia. — Eles são jovens.
O clipe termina e eu volto para o bate-papo em grupo.
Nicolette: Imagine a fanfic que essa rivalidade vai gerar.
Mickey: As pessoas não escrevem fanfics sobre jogadores de hóquei
Nicolette: Hummmmm, estou contando mais de 12k nesta categoria de rpf de hóquei,
então
Você está errado
Eu poderia ter passado a vida inteira sem saber que poderia ser o
assunto da fanfic de alguém. Eu li meu quinhão de fanfics, e eu sei o que
isso tende a envolver. Eu também devo realmente gostar de sofrer,
porque mal consigo sair da aula antes de procurar.
E oh. Meu Deus. Nicolette não estava mentindo. Há AUs e slice of life,
dor/conforto e fluff, e quase todos eles envolvem algum ship ou outro.
Jesus.
Isso vai se tornar algo agora. Vou ter que verificar isso todos os dias.
Talvez duas vezes por dia. Só para garantir que eu não apareça, é claro.
VINTE E DOIS
Há dois barris na casa de hóquei para comemorar o final do semestre e
uma pausa nos jogos e treinos. Mas estou aqui lendo uma AU de fantasia
onde sou uma espécie de elfo ladino enviado para assassinar Cauler, um
príncipe humano, e em vez disso acabo me apaixonando por ele.
Eu juro que é uma leitura de ódio. Eu não posso parar porque eu não
posso acreditar que alguém realmente escreveu isso. Eu não estou
investido em tudo.
Mas oh meu Deus, eu tenho que mostrar Cauler.
Delilah está arrumando um barril na cozinha quando eu finalmente
vou tomar uma bebida, alguns garotos a segurando. A cozinha está lotada
de jogadores de ambos os times esperando por sua vez e torcendo por
ela, então tiro algumas fotos rápidas com Zero e volto para a sala com
uma cerveja em cada mão.
Espero até que meus dedos estejam formigando e minha língua
esteja pesada antes de enviar uma mensagem para Cauler sentado do
outro lado da sala, uma garrafa de água nas mãos. Não o vi beber a noite
toda.
Mickey: eu tenho que te mostrar uma coisa cara
É horrível
Estou relaxado na curva da seção entre Dorian e Barbie com uma das
companheiras de equipe de Delilah, Sierra Browne, sentada no chão na
minha frente, encostada nos meus joelhos. Ela esteve por perto a noite
toda. Eu não acho que ela está me seguindo, necessariamente. Ela
realmente quer falar sobre hóquei. E o fato de que sempre que a câmera
faz uma panorâmica sobre a arena no jogo Bruins-Sabres que passa na
TV, o nome do meu pai é visível pendurado nas vigas.
Eu mastigo a borda do meu copo de plástico vazio. Fui criado como
torcedor do Sabres. Brinquei com os filhos dos ex-companheiros do
papai, morava com um de seus ex-companheiros, o Sr. Vinter. Fui a todos
os jogos em casa, sonhei em levantar a Taça de azul e dourada, ter meu
número aposentado ao lado do de papai.
Mas Cauler é um garoto de Boston, um fã ferrenho dos Bruins, e
observar a maneira como ele se senta na beirada do sofá, inclinando-se
para a frente, pronto para pular da cadeira a qualquer momento e gritar
de raiva ou excitação é quase o suficiente para fazer de mim um fã dos
Bruins. E isso é uma blasfêmia absoluta vinda de um Buffaloniano. Eu
assisto Cauler mais do que o jogo, mantendo meu rosto para frente
enquanto meus olhos vagam para o espetáculo que é Jaysen Caulfield
irritado no hóquei.
Eu só queria que ele parasse por um segundo e verificasse seu
maldito telefone. Ele está praticamente levitando com a adrenalina,
sacudindo Colie pelo ombro e gritando:
— Bata no disco, puta merda, você tinha uma pista aberta!
— Isso não vai acontecer, Cauler — Colie diz seriamente. — O PK dos
Sabres está imundo este ano, e o powerplay dos Bruins está faltando.
— É um cinco em três, sua mãe - AH! — Cauler empurra Colie antes
de colocar as duas mãos em cima de sua cabeça. — Você está brincando
comigo? Como ele perdeu isso! Deus, eu o trocaria por uma porra de um
camelo agora.
Dorian bufa e Barbie diz:
— Sério, Cauler? Um camelo?
— Não comece comigo, Barboza. — Cauler aponta um dedo em nossa
direção sem olhar.
— Sonhe mais alto, Cauler — diz Sierra. — Eles poderiam pelo
menos conseguir uma escolha de quinta rodada para ele.
— Hum, desculpe-me? — Barbie parece genuinamente ofendido. —
Você está dizendo que eu não valho mais do que isso?
Sierra joga a cabeça para trás rindo, batendo em meus joelhos. Ela se
inclina para frente e esfrega a nuca, ainda rindo.
— Desculpe, cara. Esqueci que você era um jogador da quinta rodada.
— Eu posso ser um jogador da quinta rodada, mas ainda assim não
teria perdido aquele arremesso. Sério, ele tinha o topo, tipo, oitenta por
cento da rede.
— Tenho certeza que você perdeu um arremesso em uma rede
completamente vazia antes, Barbs — Dorian o lembra. — Tipo, o goleiro
foi puxado e tudo.
— No mínimo! Esse cara deveria ser um profissional!
Eles continuam discutindo sobre a minha cabeça, mas eu me desligo
quando Cauler se recosta no sofá com um suspiro, finalmente checando
seu telefone. Ele não olha para mim quando lê a mensagem, mas suas
sobrancelhas se juntam e ele franze a testa enquanto digita alguma coisa.
Um momento depois, meu telefone vibra em minhas mãos. Eu afundo e
puxo para perto do meu rosto para que Dorian e Barbie não possam ler
por cima do meu ombro.
Jaysen: Isso soa ameaçador
Mickey: Ok, não horrível como seriamente horrível
Apenas horrível de uma maneira meio assustadora
Sótão?
Eu tenho que lutar para sair do sofá entre o álcool e os corpos
pressionados ao meu redor, mas eles estão muito ocupados discutindo
para dizer qualquer coisa sobre eu ir embora. Eu paro na cozinha para
tirar outra foto pelas costas de Delilah antes de subir as escadas. Cauler
leva seu tempo, tornando nosso desaparecimento mútuo um pouco
menos suspeito. Ele desliza para o sótão em silêncio, os óculos
escorregando pelo nariz e o boné torto. Não posso deixar de pensar
naquele jogo de insultos que jogamos aqui. Faz apenas alguns meses, mas
eu não conseguia nem imaginar dizer coisas assim para ele agora.
Cauler sorri enquanto me pressiona no sofá com um beijo forte e
mãos ásperas sob minha camisa. O mesmo sofá em que acordamos juntos
depois daquela festa.
Temos que aproveitar esses momentos quando podemos tê-los. É
uma tortura direta quanto tempo passamos juntos incapazes de nos
tocar. Estamos juntos por horas a cada dia, mas nunca sozinhos assim.
Seria fácil se deixar levar, mas Cauler me empurra depois de alguns
minutos, sentado de pernas cruzadas no sofá ao meu lado.
— Vamos ver esse material assustador.
Eu me sento, enfio uma perna embaixo de mim e ajeito meu chapéu
enquanto uma onda de tontura surge na minha cabeça. Eu esfrego meus
olhos e pisco algumas vezes antes de passar, então pego meu celular e
abro a fic.
Cauler traça um dedo ao redor do meu joelho enquanto carrega.
Talvez eu não devesse mostrar a ele. E se isso o assustar? Apenas o
pensamento de pessoas nos shippando para seu próprio entretenimento
parece um pouco perigoso quando chega tão perto da verdade. Como se
todas as nossas interações públicas fossem examinadas ao ponto de
alguém nos descobrir.
Mas quem estou enganando? O que estamos fazendo não contribui
para uma história de amor de fantasia épica. Não há nada perto da
verdade sobre isso.
Eu entrego meu telefone para Cauler e descanso minha cabeça no
encosto do sofá para observar seu rosto enquanto ele lê. Assim que ele vê
o site, suas sobrancelhas se erguem.
— Você encontrou as fics de Dragon Age de Kovy?
Ele volta a ler antes que eu possa responder, seu rosto passando por
fases de confusão, compreensão e então... Absoluto. Prazer. Ele me dá o
sorriso mais ridículo que eu já vi nele, com o nariz franzido e os olhos
semicerrados. Meu coração parece que está tentando se comprimir na
inexistência.
— Eles fizeram de você um elfo — diz ele, rindo. — Perfeito.
Eu olho para ele.
Ele ri um pouco mais.
— Ah, esse é bom. Meio quente. Muito mais quente do que o olhar de
cadáver que você costuma ter.
Eu estreito meus olhos, mas ele não para de sorrir, mesmo quando
ele estende a mão e roça o polegar sobre meu lábio, me puxando para um
beijo. Ele ri contra a minha boca.
— Você sabe que fez sucesso quando as pessoas escrevem fanfics
sobre você — diz ele.
Eu suspiro.
— Ainda nem fomos convocados.
— Melhor ainda. Só podemos subir daqui.
— Você não acha que é assustador? Tipo tudo isso?
— É hilário, você está brincando? Eu não posso acreditar que eles me
fizeram o príncipe e você o assassino. Incrível.
Meu Deus. Ele está falando sério agora? Ele mantém a mão no meu
queixo e volta a ler, e estou cheio de arrependimento. Eu gemo.
— Mostrar para você foi um erro, não foi?
— De jeito nenhum. Vou marcar isso.
Eu avanço e pego meu telefone dele, deixo cair no chão, e rastejo em
seu colo.
— Você deveria ficar horrorizado junto comigo.
Ele me dá um sorriso torto e passa a mão pelo meu cabelo,
derrubando meu chapéu da minha cabeça.
— Vamos ver como vai ser quando eu realmente ler.
Nós nos beijamos assim por alguns minutos, eu no colo dele, a mão
dele no meu cabelo, até que há um alvoroço no andar de baixo que nos
faz olhar para a porta.
— Bruins provavelmente marcou — diz Cauler todo presunçoso.
Reviro os olhos e me levanto. Já estamos aqui há muito tempo. Ajeito
minhas roupas, conserto a bagunça que ele fez no meu cabelo e coloco
meu boné de volta. Faço-me parecer como se eu não tivesse apenas a
língua de outra pessoa na minha boca.
Cauler me dá esse último beijo suave e quase amoroso antes de
descer as escadas, e eu me sinto tão... triste de repente. O tipo de tristeza
que senti ao ver meu pai passar pela segurança do aeroporto sem mim
quando eu tinha dez anos. Minha mãe e minhas irmãs me deixando para
trás enquanto dirigiam à frente do caminhão de mudança.
Cauler e eu nunca seremos mais do que isso. E o pior parte é que eu
sei que ele quer mais. E eu acho que eu também. Mas a perspectiva do
que acontece quando estragarmos tudo é demais para lidar.
Eu passo as costas da minha mão na minha boca como se fosse
apagar a memória dos lábios de Cauler nos meus e vou para a cozinha
para outra bebida.
CINCO MINUTOS DEPOIS, estou no barril mais longo da minha vida.
Barbie e Kovy seguram minhas pernas enquanto Delilah relutantemente
aciona a válvula, Dorian e Zero gritando bem na minha cara. Não estou
nisso para quebrar o recorde da casa de Colie. Estou nisso para parar de
sentir.
Os dois provavelmente andam de mãos dadas.
No momento em que estou de pé novamente, mal me mantendo em
pé, meu nome substituiu o de Colie no quadro branco pendurado sobre a
mesa de pingue-pongue. Poderia também substituir mais nomes.
— Lilah? — Eu digo, apontando para a mesa de pong onde Dorian e
Barbie já tomaram um lado.
Ela franze a testa enquanto me olha de cima a baixo, observando
meus olhos provavelmente vidrados, do jeito que eu não consigo manter
minha cabeça erguida.
— Vamos — eu imploro. — É o fim do semestre.
Ela solta um suspiro suave.
— Tudo bem. — Ela coloca um sorriso arrogante no rosto e me leva
até a mesa.
— Parceiros! — diz Dorian. — De jeito nenhum, vocês dois não
podem ser um time!
Delilah solta uma risada absolutamente maníaca enquanto puxa as
mangas do vestido para trás. Ela rola a bola entre as mãos e afunda um
copo logo de cara.
— Ugh, aqui vamos nós — Barbie geme.
No momento em que vencemos Dorian e Barbie, e Zero e Sierra
tomam seus lugares, estou no ponto em que normalmente estaria seminu
e dançando em uma mesa ou alegando ser o segundo - ou quarto ou
talvez sétimo agora – vinda de Jesus Cristo. Mas Cauler está na sala
jogando Smash Bros e não está pensando em mim, e mamãe e papai estão
na Carolina do Norte em sua casa enorme que não tem um único toque
meu nela, e eu não estou com vontade de dançar ou fazer milagres.
Uma hora atrás, eu estava sendo beijado sem sentido. Agora tudo o
que quero fazer é beber até perder os sentidos.
Delilah e eu acertamos copo após copo, mesmo quando eu começo a
balançar em meus pés quando eu jogo e me apoio em Delilah quando eu
assisto, a ponto de ela tirar minha bebida de mim e me fazer mudar para
água. Sierra continua se curvando toda vez que me levanto, tentando me
distrair com uma linha de visão clara por baixo de sua camisa. Só
funciona quando eu deixo.
Cauler literalmente me odeia quando não está me tocando. Eu não
devo nada a ele.
— Pare com isso, Brownie! — Delilah se encaixa eventualmente. —
Aquele é o meu irmão!
— É a natureza do jogo, Jamie — Sierra atira de volta, sorrindo.
Zero se vira e abaixa as calças para dar a Delilah uma visão completa
de sua bunda nua na vez dela, e agora sou eu quem suspira e diz:
— Luca Cicero, essa é minha irmã!
— Ei, quando você festeja com seus irmãos, a merda vai ficar
estranha — Zero grita. Ele pega a bola do arremesso perdido de Delilah e
abotoa as calças. — Onde está Jade esta noite de qualquer maneira? Eu
poderia encontrar uma maneira de as coisas ficarem realmente
estranhas para Terzo se ela estivesse aqui.
— Trabalhando em seu portfólio final — diz Delilah. — Pensei que os
estudantes de arte tivessem uma vida fácil, mas juro que ela tem mais
trabalho do que qualquer outra pessoa que conheço.
Eu não aguento muito mais na mesa. Não consigo ver direito quando
jogo a bola. Os copos se multiplicam e se movem sozinhos, e se eu
continuar olhando para eles posso vomitar. Eu cambaleio para o
corredor antes que o jogo esteja oficialmente terminado e me inclino
contra a parede, inclinando minha cabeça para trás.
O chão está literalmente rolando sob meus pés.
— Aquele barril está tentando você?
Eu abro um olho quando Sierra se inclina contra a parede ao meu
lado, perto o suficiente para que nossos braços se toquem. Ela tem longos
cabelos loiros e olhos azuis, e ela está com essa camisa branca apertada
sem ombros, enfiada em jeans que vão até o umbigo. Não é meu tipo, mas
ela é fofa.
— Nah — eu murmuro. — Me sinto bem. — Ela tem uma boa risada.
— Você toca D, hein?
Ela se vira para mim, o rosto se iluminando porque ela tem tentado
falar de hóquei comigo a noite toda e eu a estou dispensando
completamente como um idiota. Ela está jogando hóquei há tanto tempo
quanto eu, com um jogo final do Team USA, NWHL. Eu a vi jogar. Ela vai
conseguir. Não terá tanto sucesso quanto Delilah, obviamente, mas elas
jogam em posições diferentes de qualquer maneira, então acho que não
importa muito.
Eu posso dizer que ela está flertando. E eu estou flertando de volta.
Eu me sinto sujo com isso e mal consigo manter meus olhos abertos.
Mamãe e papai gostariam dela, no entanto. Se eles não podem ter Nova
como nora, eles sempre disseram que eu deveria pelo menos procurar
uma fã de hóquei. Alguém que conhece o jogo e o estilo de vida e me
ajudará a tornar outro Mickey James uma lenda. Um jogador de hóquei
de verdade seria ainda melhor.
Mas Cauler é um verdadeiro jogador de hóquei também. Papai não é
homofóbico, obviamente, mas ainda posso imaginar o sermão que ele me
daria. Por que está tudo bem para Delilah ser gay, mas não eu. Porque os
fãs de hóquei feminino a aceitariam, mas os fãs da NHL fariam da minha
vida um inferno. Como eu literalmente nunca o veria durante a
temporada.
Não sei o que Sierra acabou de me dizer. Eu tento abrir meus olhos
para olhar para ela, mas eles parecem grudados. Eu mal consigo abri-los
quando ouço Cauler dizer:
— Onde está Terzo? — Há riso em sua voz, e quando ele entra no
corredor, ele está sorrindo. — Ei. Eu quero chutar sua bunda em Smash
Bros.
Eu não quero jogar. Quero uma das garrafas de licor escondidas no
sótão. Quero engolir até esquecer meu próprio nome. Eu quero tocar em
alguém. Eu quero tocar Cauler.
— Hum… — Sierra começa, olhando para trás e para frente entre
nós. — Vou pegar uma bebida. — Ela facilita seu caminho para fora do
corredor como se soubesse exatamente o que está acontecendo aqui.
Cauler e eu nos encaramos. Ou talvez seja só eu e ele está tentando
descobrir se deve voltar antes que eu vomite nele ou algo assim.
— Vamos? — Cauler pergunta, apontando para a sala de estar.
Aquele suporte de barril realmente está me tentando. Deixo-me
deslizar pela parede até me sentar.
— Nós provavelmente não deveríamos fazer merdas assim — eu
tento dizer. Não sei até que ponto é coerente.
Cauler suspira. Ele se senta de pernas cruzadas na minha frente,
pegando os calos em suas mãos. Mordendo seu piercing no lábio. Eu
tento fechar meus olhos para bloqueá-lo, mas o chão está balançando
novamente e eu tenho que abri-los.
— Por que não? — Cauler diz rispidamente.
— Por que. Muito perto de ser algo, então. — Não sei se estou
falando palavras reais. Eu não quero fechar meus olhos com a forma
como tudo gira quando eu faço, mas eles são muito pesados para mantê-
los abertos.
Ele não responde de imediato. Meu estômago está dando
cambalhotas. Eu tenho que sair daqui.
— Você não acha que já passamos desse ponto? — Sua voz é suave,
calma. Quase meio triste.
Eu empurro para baixo os sentimentos tentando dragar seu caminho
para o meu peito.
— Não. Se estivermos, então... temos que parar.
Ele está tão quieto, por um segundo eu não tenho certeza se ele está
mais aqui. Abro meus olhos o suficiente para ver seus sapatos antes de
deixá-los cair fechados novamente.
— Por que temos que parar? — ele pergunta eventualmente.
Eu rio, um som delirante e bêbado pelo qual me sinto culpado
instantaneamente.
— Porque. É tão perigoso…
Meu estômago dá uma guinada e eu coloco uma mão sobre minha
boca. Cauler se afasta, então volta para me ajudar a ficar de pé.
— Banheiro? — ele pergunta. Eu respondo com outro suspiro seco.
Cauler me levanta do chão. Eu deixo minha cabeça cair em seu ombro
enquanto ele me carrega pelo corredor.
Seriamente. Alguém me mata.
Eu ouço a voz de Delilah, mas não consigo entender o que ela está
dizendo. A voz de Cauler vibra em seu peito quando ele diz:
— Eu o peguei.
Tudo fica quieto depois disso.
VINTE E TRÊS
Acordo me odiando.
Não é uma coisa desconhecida, mas também não é bem-vinda.
O mesmo vale para a dor de cabeça pulsante e o gosto amargo de
vômito no fundo da minha garganta. Eu saio da cama e cambaleio para
fora do quarto, para o banheiro para vomitar.
A noite passada foi um show de merda total. Por que eu sou assim?
Cauler me carregou para o banheiro e ficou comigo enquanto eu
vomitava. Então ele me levou para o carro de alguém. Me levou de volta
ao campus, me carregou para o meu quarto e me ajudou a vestir as calças
de moletom. Me fez beber água e deitou e ficou comigo até Dorian voltar.
Nós não conversamos.
Deitei de lado, de frente para a parede, ouvindo sua respiração
constante e segurando as lágrimas.
Que embaraçoso.
Eu gostaria de poder apenas desmontar minha cabeça e esculpir cada
parte que me faz assim, realmente. É exaustivo estar dentro da minha
própria cabeça.
Dorian está acordado quando eu volto para o quarto. Eu cambaleio
até minha cama e me deito, pressionando as palmas das mãos nos olhos.
— Como se sente? — Dorian pergunta. Eu grunhi em resposta e ele
força uma risada e eu realmente apreciaria a morte agora. — Você está a
fim de tomar café da manhã? Zero está nos servindo com torradas da
pousada.
Eu grunhi novamente. O pensamento de comida faz meu estômago
revirar, mas se eu vou conseguir manter alguma coisa no estômago,
torrada francesa é isso.
— Vou tomar isso como um sim — Dorian diz. O som dele digitando
em seu telefone é muito mais alto do que tem o direito de ser.
E se Cauler me mandou uma mensagem? Eu procuro no emaranhado
de meus cobertores, torcendo meus braços por todo o lugar tentando
encontrar meu telefone. Eu praticamente desloco os dois ombros apenas
para encontrá-lo em cima da minha cabeceira.
Nenhum texto de Cauler. Apenas Delilah me pedindo para deixá-la
saber que estou vivo. Eu envio a ela alguns emojis de vômito e tiro uma
selfie de ressaca para Nova. Está tudo horrível, mas posso fingir.
— Ei, sim… — diz Dorian. Eu viro minha cabeça para olhar para ele,
metade do meu rosto ainda enterrado no travesseiro. — Eu
provavelmente deveria ter avisado sobre bebida e remédios.
Eu pisco para ele.
— Só porque, tipo — ele diz rapidamente. — Quero dizer, nós
realmente não tivemos uma grande noite de bebedeira desde que você
começou a tomá-los, e você estava mal na noite passada, cara. Há uma
razão que eles dizem para não misturar medicamentos prescritos e
álcool. Especialmente quando é novo.
Eu fecho meus olhos. Pressiono a mão na minha testa. Eu nem pensei
nisso. Eu li os avisos tantas vezes que provavelmente poderia tê-los
recitado de cor, mas me acostumei tanto a usar álcool no lugar da
medicação que é como se tivesse esquecido que estava tomando.
— Você está bem? — ele pergunta.
Fecho os olhos e dou uma risada.
— Quando eu já estive bem?
Dorian ri pelo nariz.
— Relacionável.
Zero entrega nosso café da manhã direto no nosso quarto. Ele diz que
é porque ele quer que nos lembremos dele como o melhor capitão que já
tivemos, mas acho que é porque ele queria me checar.
Eu me sinto mil vezes melhor depois de comer e tomar banho. Pelo
menos fisicamente. Mas ainda verifico meu telefone a cada poucos
minutos enquanto Dorian e eu jogamos Borderlands juntos. Recebo
algumas mensagens dos meninos. O bate-papo em grupo com minhas
irmãs é bastante estável o dia todo. E Nova e eu mandamos snaps como
de costume.
Mas nenhuma palavra de Cauler.
Deus, eu me sinto tão patético. Eu poderia facilmente enviar uma
mensagem para ele. Dizer algo como, ei, desculpe pelo colapso nuclear
total ontem, surpresa, estou meio deprimido! Ou eu geralmente sou muito
melhor na coisa de amigos com benefícios, meu erro.
Talvez apenas…
Mickey: Oi.
Me desculpe pela noite passada.
Obrigado por cuidar de mim.
Eu jogo meu telefone fora do alcance do braço e me acomodo para
uma longa e ansiosa noite.
Jaysen: Oi
Você pode vir ao meu quarto?
Dodge 211
eu vou abrir a porta
Eu estava me sentindo melhor. Agora eu meio que sinto que posso
estar doente de novo.
Dorian está todo acomodado na cama com seu laptop, assistindo
Netflix enquanto adormece. Estou meio tentado a perguntar a ele o que
devo fazer, mas preciso descobrir isso por mim mesmo.
OK. Enfrente isso. Qual é a pior coisa que pode acontecer se eu for até
lá? Cauler me disser que não estamos mais namorando? Que eu o
assustei com aquela bagunça ontem à noite? Estou indo embora depois
do próximo semestre de qualquer maneira. Com alguma sorte, seremos
convocados para diferentes conferências e nos veremos apenas duas
vezes por temporada. Quando ele se formar e entrar na liga, talvez ele
esqueça qualquer coisa que aconteceu entre nós.
Respiro fundo, fecho os olhos e solto o ar rapidamente.
— Vou dar uma volta — digo quando saio da cama e coloco meus
tênis.
Dorian puxa um de seus fones de ouvido e me dá um olhar aguçado.
— Não pense em mim desta vez. Isso seria rude com Cauler. — Ele
levanta uma sobrancelha e minhas bochechas coram. Aparentemente, o
estado em que voltei da última vez que anunciei que estava saindo era
uma revelação do que eu estava fazendo.
— Eu não sei — eu digo enquanto puxo minha jaqueta. — Talvez ele
gostasse disso.
— Hum. Não seria alguma coisa? — Ele coloca o fone de ouvido de
volta e volta para o Netflix. — Bem, divirta-se e fique seguro.
Eu reviro os olhos.
— OK, mãe.
Eu levo meu tempo caminhando até o prédio de Cauler. Não é uma
longa caminhada, mas eu a arrasto tanto que meus músculos doem de me
proteger contra o frio no momento em que chego à porta. Ele a abriu com
um de seus sapatos. Eu suspiro quando me inclino para pegá-lo e estico
meus músculos um pouco quando me levanto.
Ainda. Parando.
Entre, Mickey.
Outra respiração profunda, e eu subo as escadas de dois em dois.
Este edifício é constituído por suites. Como quatro quartos
compartilhando um corredor curto e um banheiro. Como se, a qualquer
momento, uma dessas três portas pudesse abrir e eu estaria cara a cara
com um dos colegas de quarto de Cauler enquanto bato em sua porta. À
meia-noite.
Eu abaixo minha cabeça enquanto espero que ele responda. As molas
da cama rangem atrás da porta, o som de pés descalços no linóleo.
Prendo a respiração quando a maçaneta da porta gira. Minhas mãos
estão úmidas.
Cauler cheira como se tivesse acabado de sair do banho. Ele está de
óculos. Uma camiseta de manga comprida. Ele parece bem. Muito bem.
Minha voz fica meio tensa quando digo
— Ei.
Ele não diz nada. Apenas sai do caminho para me deixar entrar. A
primeira coisa que noto é o pôster gigante de Ashley Graham em um
biquíni com uma boa quantidade da parte inferior dos seios à mostra.
Além disso…
Quase engasgo com minha própria saliva.
Há um pôster de Nova na parede. É menor que o de Ashley Graham,
mas maior que os outros de cantores, rappers e jogadores de beisebol.
Ela está em um vestido vermelho até o chão com uma fenda até a coxa,
inclinada para frente em uma cadeira com os lábios entreabertos em um
beicinho estranho.
— Oh meu Deus — eu digo. Eu pego meu telefone para enviar um
snap para Nova.
— Está do lado do meu colega de quarto — diz Cauler. Afirmando o
óbvio.
— Você nunca me disse que ele era um fanboy de Nova!
Ele dá de ombros, os olhos vagando pela parede de seu colega de
quarto.
— Eu não fico muito aqui.
O lado da sala de Cauler está bem vazio. Há uma tapeçaria Bruins
acima de sua cama. Nosso cronograma de treinos e jogos para o próximo
semestre preso em seu quadro de cortiça. Algo que se parece com um set
list autografado ao lado disso. Nenhum outro toque de sua personalidade
para ser visto.
Fica um pouco mais fácil, estar no quarto dele. Sozinho com ele.
Já estivemos sozinhos muitas vezes. Mas sempre foi meu quarto,
minha terra natal. Isto é diferente, e não só porque tenho medo do que
ele vai dizer.
Cauler se senta na beira da cama e coloca os antebraços nos joelhos.
Mãos entrelaçadas. Olhando para o chão. A pose de uma pessoa que
acaba de receber a notícia mais angustiante de sua vida.
— Então — ele diz. — Noite passada.
Eu suspiro pesadamente. Afaste-se dele, empurrando as duas mãos
no meu cabelo.
Aqui vamos nós.
Eu sento na cadeira da mesa de seu colega de quarto.
— Sinto muito — eu digo. Não me dou a chance de construir muros.
— Estou tomando esse novo remédio. Não deveria estar bebendo.
Obrigado por… — Eu engulo contra o aperto na minha garganta. —
Obrigado por me levar de volta ao meu quarto.
Ele olha para mim, esfregando lentamente as mãos agora. Eu posso
ouvir o leve clique de sua língua perfurando seus dentes por alguns
segundos antes que ele diga:
— Lembra das coisas que você estava dizendo?
— Infelizmente.
— Quer falar sobre isso?
Suspiro novamente, inclinando a cadeira para trás em duas pernas e
olhando para um ponto acima da cabeça de Cauler. Eu não quero falar
sobre isso. Falar traz emoções, e as emoções nesta situação seriam muito,
muito ruins. Mas ele obviamente quer falar sobre isso.
— O que você quer que eu diga? — Eu pergunto. É uma resposta total
de foda-se, mas é tudo o que posso controlar.
— Eu quero que você me diga o que você quer — diz ele sem
hesitação. Seu rosto é o mais vazio que eu já vi. Eu não gosto disso. Ele
geralmente é tão expressivo. Eu odeio que é minha culpa que ele se
parece dessa forma. — Eu sei que você estava flertando com Sierra
ontem à noite, e tanto faz. Mas se é assim que vai ser, preciso que você
me diga agora para que eu possa decidir o que fazer com isso.
Eu engulo em seco, movendo meus olhos para o chão. A pequena lata
de lixo ao lado da mesa de seu colega de quarto está cheia de papéis
amassados. Seu edredom está pendurado na metade da cama, uma pilha
de roupa suja na ponta do colchão. Enquanto isso, o lado de Cauler está
impecável. Isso me faz pensar em como seria o quarto dele em casa. Se
está tão limpo porque ele morou em Green Bay nos últimos dois anos. Se
ele fez uma bagunça neste verão.
— O que eu quero não importa — eu digo. Minha voz está
embargada. Eu pressiono um punho em meus lábios e respiro fundo. —
Até o que estamos fazendo agora é perigoso. As pessoas tiram fotos
nossas e colocam online, e se alguém nos vir… — Eu me interrompo e
limpo a emoção da minha garganta.
— Então você quer parar? — Ele parou de se mexer, sentado
completamente imóvel enquanto seus olhos queimam através de mim,
sem piscar. Eu me mexo desconfortavelmente, a cadeira rangendo
embaixo de mim.
Parar seria o melhor. Não teria mais chupões para explicar, por
exemplo. Não teria chance de alguém tirar uma foto mal cronometrada
de nós sendo descuidados no campus.
Esfrego a nuca, desvio o olhar para o armário aberto de Cauler e sua
fileira de camisas principalmente pretas.
— Eu quero dizer… não.
Cauler não diz nada. Posso vê-lo olhando para mim com o canto do
olho, mas não consigo olhar para ele. Cruzo os braços e me afundo no
banco. Estalo minha língua contra o céu da minha boca apenas para
preencher um pouco do silêncio constrangedor.
Isso dura alguns bons... longos... segundos, antes de Cauler soltar esse
tipo de risada incrédula e balançar a cabeça. Ele esfrega os olhos e parece
tão cansado quando diz:
— Jesus, Terzo.
Meu pulso dispara. Eu me sento direito.
— O quê? O que agora?
Ele balança a cabeça.
— Você é tão... merdinha. — Ele diz isso como um gemido. Como se
eu estivesse lhe causando dor física.
— Por que é tudo sobre mim, afinal? — Eu pergunto. — Você disse
que sabe o que quer, então por que não me diz?
Ele arrasta as mãos pelo rosto e se senta, plantando os pés no chão.
Ele me encara e diz:
— Eu não quero ser apenas uma opção para você. Eu não estou
pedindo algum compromisso estrito ou namorados ou qualquer coisa.
Apenas, se você vai começar a sair com outra pessoa, eu não vou ficar no
meio disso.
Eu finalmente encontro seus olhos, mastigando o interior da minha
bochecha. É um pedido simples e fácil de aceitar. Mas parte de mim está
um pouco desapontado por ele não ter pedido um compromisso estrito.
Quer dizer, eu provavelmente diria não. É muito arriscado, muito
provável que termine dolorosamente para nós dois. Mas eu posso
sonhar, certo?
— Tudo bem — eu digo.
Ele me estuda por um segundo, seu rosto ilegível. Ele respira fundo e
diz:
— Quer ficar esta noite?
— E quanto ao seu colega de quarto? — Eu pergunto.
Cauler revira os olhos.
— Ele tentou trazer uma porra de um tabuleiro Ouija aqui com um
monte de amigos dele, então eu o expulsei. Disse a ele para não voltar até
ter certeza de que não estava possuído.
— Seriamente?
— Sim. Eu acho que ele pensou que já que eu ouço screamo e visto
roupas pretas, eu ficaria tranquilo com isso? Não sei.
— Então você está planejando um quarto solo no próximo ano,
então?
— Não. Vou para um triplo com Barbie e Cara de boneca.
— Oh. — Eu juro que meu coração afunda até os dedos dos pés. Os
três dividindo um quarto. Sem mim. Enquanto estou morando com um
dos meus companheiros veteranos em uma cidade que será
determinada. Eu me levanto antes que eu possa cair naquela espiral e
tiro minha jaqueta. — Sim, eu vou ficar.
Ele puxa as pernas para cima da cama e abre espaço para mim. Eu
tiro meus sapatos no meio da sala e me acomodo ao lado dele.
Isso terá que ser suficiente.

EU ACORDO NA cama de Cauler.


Eu não sei onde estou no começo, atingido por um breve momento
de pânico meio adormecido antes de tudo da noite passada se juntar.
Cauler ainda está dormindo, suas costas pressionadas contra a
parede e um de seus braços sobre minha cintura. Minhas calças de
moletom se amontoam em volta da minha panturrilha, onde minha perna
está presa entre as dele. Seus lábios se abrem um pouco em seu sono, e
ele parece tão macio que eu poderia morrer.
E não estou procurando nada. Eu realmente não estou. Mas eu não
estou pronto para isso acabar.
Fecho os olhos e me acomodo no travesseiro para dormir mais, mas
um segundo depois, Cauler está dizendo:
— Ei.
Sua voz é áspera pela manhã. É assustador o quão gostoso ele é.
— Ei — eu digo.
Ele se estica ao meu redor, fazendo aquele barulho suave de esforço
que as pessoas fazem quando fazem seu alongamento matinal. É
adorável. Quando ele relaxa novamente, seu rosto se aproxima do meu.
— Eu te beijaria — diz ele —, mas seu hálito está com um cheiro
horrível.
— Quero dizer, você não me ofereceu uma escova de dentes ontem à
noite.
— Essas são tipo dez dólares cada na livraria, cara, eu não tenho
estoque.
— Acho que vou tentar não respirar, então.
Ele sorri, os olhos fechados.
— Isso pode ser o melhor.
O que seria melhor seria voltar para o meu próprio quarto. Tomar
banho e escovar os dentes. Enviar e-mail para o escritório de
aconselhamento e marcar outra consulta.
Ajeitar minha vida.
— Cheira a meias sujas aqui — eu digo.
— Como eu disse. Sua respiração é terrível.
— Foda-se, isso não cheira a pés.
Ele ri. É o tipo de som que vai se repetir na minha cabeça até me
deixar louco.
— Meu colega de quarto lava a roupa, tipo, uma vez por mês — diz
ele.
Eu lanço um olhar em pânico para o lado de seu colega de quarto
com a menção dele, mas a cama está vazia.
— Eu mandei uma mensagem para ele — diz Cauler. — Ele não vai
voltar até depois do brunch. Eu juro, se ele trouxer um fantasma de volta
com ele…
Deixo escapar um suspiro de alívio e rolo de costas, esticando meus
braços acima da minha cabeça até minhas costas arquearem para fora da
cama. Cauler passa as pontas dos dedos sobre minhas costelas levemente
o suficiente para me dar calafrios.
— Sabe — ele começa, parando para bocejar. — Interação
medicamentosa ou não, é bom ver você ficar um pouco emocional às
vezes.
Eu viro minha cabeça para o lado para dar-lhe um olhar.
— Eu me sinto levemente ofendido? De qualquer forma, isso é tudo
que você vai conseguir. Eu tenho um limite definido de uma emoção por
semana.
— Vou marcar na minha agenda. — Sua mão está quente na minha
pele nua.
Isso não é nada. Isso não significa nada. Ele nem gosta de mim, muito
menos gosta de mim. Isso só está acontecendo porque eu era o cara mais
próximo disponível, moderadamente atraente, que emitia algumas
vibrações gays bastante transparentes.
Isso não é nada.
Seus dedos flexionam contra meu quadril. Sua respiração parece
instável. Seus olhos estão fechados.
— Uma pergunta. Não pense muito nisso.
Oh Deus, aqui vamos nós.
— Quais são seus planos para as férias? — ele pergunta.
Minha língua gruda no céu da boca quando abro, porque, meu Deus?
Isso está indo para onde eu acho que está indo?
— Eu costumo ir para a casa de Nova — eu digo lentamente. — Mas
ela está em Milão ou algo assim.
— Raleigh, então?
Eu rio amargamente.
— Não me lembro da última vez que passei o Natal com minha
família.
Eu não digo isso pelo olhar triste que ele me dá, mas felizmente ele
não insiste nisso.
— Entãããão... por que você não vem para Boston?
Eu empurro meu cotovelo para olhar para ele.
— Boston? Tipo com você?
— Sim, quero dizer. — Ele encolhe os ombros e evita me olhar nos
olhos. — Minha família é muito hospitaleira. Não tenho cinco irmãs como
você, mas tenho muitas primas. Ambos os lados se amontoam na casa
dos meus pais, e há caos e muita comida e álcool e jogos de cartas. Ouvi
dizer que meu ex-tio estará lá, então será interessante.
— Por que seu ex-tio está vindo?
— Ele ainda não é oficialmente um ex e seus filhos estarão lá, então
ele acha que é seu direito ir junto. Minha tia pediu o divórcio, mas ainda
não foi finalizado. Shae entra nisso com ele. Divertido como o inferno.
— Parece cansativo.
— A maioria das coisas é cansativa para você.
Falar sobre estar cansado desencadeia um bocejo enorme que Cauler
cobre com a mão para bloquear meu hálito matinal. Nós dois rimos
sonolentos.
— O que sua família vai dizer sobre você se associar com o inimigo?
— Eu pergunto.
— Ehh, eles vão ver o quão pequeno você é na vida real e perceber
que você não é uma ameaça.
— Você não é Zdeno Chara.
— Quinze centímetros fazem uma grande diferença, Terzo. Aposto
que você não sabia que tem esse topete esquisito aqui em cima. — Ele
enrola um pouco do cabelo no topo da minha cabeça em torno de seu
dedo e meu coração enche meu peito inteiro. — Eu tenho uma visão
perfeita.
— Cale-se.
Ele ri. Me puxa para mais perto, fechando os olhos, parecendo que
vai voltar a dormir. Eu tenho essa consciência aguda de cada ponto de
contato entre nós.
— Então? — ele pergunta.
Eu respiro lentamente até meus pulmões não conseguirem segurar
mais ar. Eu o seguro por alguns longos segundos e fecho meus olhos ao
expirar.
— Ah, eu não sei. Dormir no cais por alguns dias no auge do inverno
parece atraente. O refeitório estará fechado, então vou praticar minha
pesca no gelo. Eu não fui escoteiro nem aprendi a acender fogo, então
vou ter que foder... Sméagol essa merda. E... — Abro os olhos para
encontrar Cauler sorrindo para mim. — Você não está me parando.
— É bom ouvir você falar quando você não está sendo um idiota
total.
Não pense muito nisso.
— Você chama isso de não ser um idiota? — Eu pergunto.
— Não, isso foi você sendo um merdinha.
Reviro os olhos, gemendo.
— Vou me arrepender disso.
Ele aperta meu quadril.
— Isso significa que você virá?
— Eu acho.
Ele estava reclamando do meu hálito alguns minutos atrás, mas isso
não o impede de me beijar agora.
VINTE E QUATRO
As finais acabaram, e não há nada que eu possa fazer agora a não ser
atualizar obsessivamente até que minhas notas sejam publicadas. Eu me
sinto muito bem com biologia, e sei que tirei uma nota perfeita no meu
exame de italiano, mas álgebra é um tiro no escuro. Meu trabalho final
para redação da faculdade foi uma bagunça. Acho que vou ser bom se
ficar acima de 2.0, mas quero fazer melhor que isso.
Quero atingir os níveis de sucesso acadêmico de Dorian e Cauler. Não
vai acontecer no espaço de dois semestres, mas pelo menos é algo pelo
qual lutar.
Ver Dorian e Barbie carregarem suas malas no Lyft é quase de partir
a alma. Esta vai ser uma pausa reduzida. Nem todo o mês que a maioria
do corpo discente recebe. Mas parece que estou vendo eles pela última
vez.
Jesus.
Como será deixá-los em maio?
Eu nem quero pensar nisso.
Dorian me abraça forte, dizendo:
— Nós sobrevivemos ao nosso primeiro semestre, cara! Só podemos
subir daqui.
Barbie me dá um tapinha nas costas, depois pensa melhor e me puxa
para um abraço. Ele é tão alto, eu me sinto como uma criança em seus
braços.
Assim que eles se vão, Cauler e eu colocamos nossas próprias malas
no carro de Zero. Zero tem mais um exame antes de nos levar para
Boston mais tarde esta noite, então nós dois passamos o tempo no meu
quarto.
Ele está tirando meu jeans quando meu telefone vibra. Eu o jogo para
fora da cama e o ignoro.
Ele está puxando a camisa sobre a cabeça, os joelhos de cada lado dos
meus quadris, quando ela sai de novo, e empurrando minhas mãos nos
travesseiros pela terceira vez.
— Algo está errado — ele murmura. — Você não é tão popular.
— Foda-se. Provavelmente é Dorian me atualizando. Pedi a ele para
fazer o check-in quando chegar ao aeroporto.
— Como você é doméstico.
Temos mais um minuto ou dois para nós mesmos antes que uma
chamada de vídeo chegue no meu laptop, alta e animada e intrusiva e
implacável. Nós o ignoramos por um minuto inteiro antes de Cauler
desistir, gemer e rolar de cima de mim.
— Vá ver quem é — diz ele, enterrando o rosto em meus
travesseiros.
— Eu não quero — eu lamento. Mas o toque não para.
— Vai. — Cauler me empurra para a beirada da cama e eu me
levanto, resmungando enquanto coloco a calça de moletom mais próxima
no chão. Claro que são de Cauler, tempo suficiente para quase tropeçar
neles a caminho da mesa.
Eu corro meus dedos pelo meu cabelo e tento tornar menos óbvio o
que eu estava fazendo enquanto me jogo na minha cadeira.
— Merda — eu murmuro ao ver a foto de Madison na tela do meu
computador. Ela nunca inicia o contato. Eu aceito a chamada e leva um
momento de atraso antes que o vídeo se conecte.
E não é Madison olhando para mim.
É papai.
O vídeo está congelado em seu olhar de desespero por um segundo,
como se ele tivesse tanta certeza que eu não ia responder.
— Ei, camarada! — ele grita, e a imagem salta e se estende algumas
vezes antes de seu rosto alcançar suas palavras.
Eu posso sentir como meus olhos estão arregalados. Com que força
meu maxilar aperta mesmo enquanto eu tento tanto evitar que o pânico
apareça. Não falo com ele desde aquele jogo em novembro. Ele ligou e
mandou uma mensagem e eu ignorei e ignorei e agora é tão estranho que
eu meio que quero vomitar.
Olho para Cauler, quase nu na minha cama, deitado de bruços com o
travesseiro sob o queixo. Há preocupação em seu rosto que eu não
mereço. Não com tantas pessoas por aí que têm pais muito piores do que
eu.
— Mickey? Você me escuta? — Papai pergunta.
Volto minha atenção para ele e tento falar, mas minha voz fica presa
na garganta. Eu limpo e tento novamente.
— Sim. Oi.
— Estou feliz que você atendeu. Faz algum tempo.
— Sim.
Papai abre a boca, mas não diz nada a princípio, parecendo se sentir
tão desconfortável quanto eu. Ele respira fundo e, quando olha para
baixo e esfrega a nuca, quase consigo me ver nele. Não sou tão bom em
mascarar meu desconforto como costumava ser.
— Então… — Ele ainda não olha para mim, mantendo os olhos para
baixo ou para o lado, em qualquer lugar, menos no meu rosto. — Havia
muito que eu queria falar com você sobre. Mas acho melhor fazer
pessoalmente. Suas irmãs estão voando pela manhã. Como você se
sentiria em se juntar a elas?
Sinto repulsa, é assim que me sinto.
— Um pouco tarde para comprar uma passagem — eu digo.
— Já cuidei disso. Por que você acha que eu liguei tanto?
Minha cama range quando Cauler se senta, e eu olho para vê-lo se
acomodar com as costas contra a parede, a cabeça inclinada para trás,
olhando para o lado de Dorian do quarto. Não consigo ler o rosto dele.
Isso é decepção ou impaciência? Talvez ele esteja apenas com fome.
Eu não o conheço de jeito nenhum. Mas aqui eu estava planejando ir
conhecer sua família.
Eu engulo, mordo o interior da minha bochecha.
Vou ver minhas irmãs. Todas elas. Esse é o único ponto positivo aqui.
— Quanto tempo? — Eu pergunto.
— Eu quero você aqui enquanto você puder estar.
Eu coloco meu rosto em minhas mãos e suspiro pesadamente. Meu
peito dói. Eu mal posso processar o que está acontecendo. Mais de sete
anos sendo meu maldito treinador de hóquei de longa distância e agora
ele está tentando ser pai?
Mas eu quero isso. Eu quero a chance de ter uma família novamente.
Eu esfrego minhas mãos no meu rosto. Passo-as pelo meu cabelo.
Minha voz rouca quando eu digo:
— Ok.
Papai sorri, seus ombros cedendo em alívio. Como se eu ainda tivesse
escolha quando ele já foi e comprou uma passagem pelas minhas costas.
— Ótimo — diz ele sem fôlego. — Bailey tem as informações do voo.
É cedo. Durma um pouco.
Ele desliga tão rápido que é como se ele tivesse o dedo pairando
sobre o botão o tempo todo. Eu olho para a tela por dez segundos antes
de Cauler dizer:
— Você está bem?
Eu me empurro para os meus pés.
— Sim. Desculpe.
— Não se desculpe. É a sua família.
Ele me observa enquanto eu troco suas calças pelas minhas e
termino de me vestir. Não tenta interferir, o que é bom porque não
consigo lidar com merda nenhuma agora.
— Vou tirar minhas malas do carro de Zero — eu digo.
— Quer ajuda?
— Não. — Fecho o zíper da jaqueta até o queixo. Escondo-me no meu
capuz. Deixo-o para trás. Pego meu telefone e imediatamente mando uma
mensagem para Bailey.
Mickey: A culpa é sua.
Bailey: Sim.
Mickey: Vai se foder, bailey.
Bailey: Supere, mickey.
Você tem ignorado ele por semanas.
Eu estava no telefone com ele por mais de um hora
na noite passada com ele em pânico
sobre como se ele não conseguiu falar com você
em breve ele provavelmente nunca teria a chance de consertar as coisas
Como se algo precisasse ser consertado.
Mickey: Muito mais do que você pensa
Bailey: Bem, parabéns agora você tem a chance de expor
todas as suas queixas infantis mesquinhas
Mickey: eu te odeio
Bailey: Eu sei o quanto você gosta de fingir que teve uma vida horrível cheia de
sofrimento sem fim, mas é hora de crescer mickey.
Mamãe e papai te amam.
Isso é muito mais do que outras pessoas recebem.
Mickey: Muito fácil para você dizer.
Nossos pais realmente criaram você.
VINTE E CINCO
A Carolina do Norte está mais fria do que eu esperava, e tudo o que
trouxe foi um blusão Royals. Cruzo os braços e levanto os ombros até as
orelhas, mas não ajuda muito. Bailey está vestindo shorts de ginástica, e
espero que ela fique congelada nos joelhos. Ela morava em Raleigh. Ela
deveria saber melhor.
Madison nos pega no aeroporto e, por mais feliz que eu esteja em vê-
la novamente, não consigo suportar o quão animadas as três ficam
quando tudo que eu quero fazer é colocar minha cabeça contra a janela e
adormecer. Madison nem precisa de GPS. Ela está prestando mais
atenção em Delilah em seu espelho retrovisor e Bailey no banco do
passageiro do que na estrada, mas ela sabe exatamente quando virar,
exatamente quando diminuir a velocidade antes de uma armadilha de
velocidade. Ela mora aqui há tanto tempo que provavelmente considera
esta casa mais do que Buffalo.
Não reconheço nada que passamos. Eu poderia ter me sentido
entorpecido antes do remédio. Agora, a tristeza que toma conta de mim é
tão intensa que me sinto mal do estômago.
É melhor, de certa forma.
A casa da mamãe e do papai fica a quarenta e cinco minutos de carro
do aeroporto em um condomínio fechado de verdade. Quero dizer, houve
algumas vezes em Buffalo em que um ou dois fãs ficavam do lado de fora
de nossa casa esperando por autógrafos, mas eu não achava que o hóquei
fosse grande o suficiente na Carolina do Norte para que eles precisassem
de tanta segurança. Provavelmente é apenas o pai sendo rico, branco e
cheio de si.
A casa em si é enorme, toda de pedra branca, janelas grandes e uma
porta da frente que parece pertencer a um palácio. Só o paisagismo deve
ter custado dezenas de milhares de dólares, sem mencionar as luzes de
Natal que provavelmente são visíveis do espaço.
É um exagero, se você me perguntar.
Há uma campainha quando entramos pela porta da frente, uma voz
automática ecoando pela casa anunciando que a porta da frente está
aberta. Os tetos abobadados e pisos de madeira e espaços abertos me
fazem sentir frio e pequeno e o ambientador de maçã e canela me lembra
Cauler e Deus, eu não quero estar aqui. Aperto as alças da mochila e tento
respirar.
— Mamãe e papai estão fazendo compras de última hora — diz
Madison, pendurando as chaves em um gancho na porta.
— E por compras de supermercado você quer dizer compras de
bebidas, certo? — Bailey pergunta.
Madison zomba.
— Temos isso sob controle.
— Hora de ficar bêbado antes que eles voltem? — Eu me arrependo
imediatamente, antes mesmo de Bailey revirar os olhos e se dirigir para a
escada curva do outro lado da entrada.
— Qual é o problema dela? — Madison pergunta. Ela nos leva a
cozinha com todo o aço inoxidável impecável e bancadas em granito
escuro.
— Ela está assim a manhã toda — Delilah diz. Ela joga as malas no
chão perto da copa e vai direto para o armário de bebidas. Tenho certeza
de que foi projetada para ser uma despensa completa. Pego uma garrafa
de Delilah e um copo de Madison e vou até a sala da família. Toda a
parede dos fundos da casa é forrada com enormes janelas com vista para
uma piscina que foi fechada para o inverno. Eu nunca enfiei um dedo do
pé naquela piscina. Nada sobre esta casa parece caseiro ou familiar. Eu
poderia entrar na porta da frente dos Vinter agora, tirar meus sapatos e
abrir a geladeira como se fosse o dono do lugar, mas aqui, sinto que
tenho que pedir permissão para pegar um copo de água. Como as
primeiras semanas na casa da minha família em Michigan, antes de me
sentir confortável.
Eu me acomodo no sofá, tomando cuidado para não esmagar
nenhuma das almofadas, e torço a tampa da garrafa. Não me incomodo
com o vidro. Madison e Delilah me seguem depois de alguns minutos,
juntando-se a mim no sofá com seus calcanhares enterrados e almofadas
abraçadas em seus peitos, confortáveis e pertencendo enquanto se
acomodam para beber e assistir a algum reality show. Eu engulo tanto
álcool quanto posso estômago de uma só vez.
— Vai com calma, Mickey — Delilah diz suavemente. — Lembra…
— Sim — eu estalo. — Eu lembro. — Ainda assim, dou a garrafa a ela
quando ela estende a mão, e ela me serve um pequeno copo e o coloca
em um porta-copos na mesa de centro na minha frente. Estabelecendo
meus limites.
Bailey desce as escadas um pouco depois, sentada do outro lado da
sala com seu laptop e fones de ouvido, assistindo a vídeos de lacrosse. Ela
é a primeira a levantar quando o sinos de porta soam. Minhas palmas
começam a suar. O murmúrio suave da voz de papai percorre o corredor,
junto com outro homem que mal reconheço até que Mikayla ri. Isso é o
suficiente para me pressionar. Sigo minhas irmãs de volta ao saguão.
Spencer está preso carregando sua própria mala em cima da de
Mikayla e um saco gigante de presentes embrulhados, se esforçando com
o peso de tudo em vez de colocá-la no chão. Ele ainda consegue parecer
mais à vontade aqui do que eu. Mikayla distribui abraços em torno de sua
barriga crescente. Nicolette abre a porta com o pé ao lado, um monte de
sacolas plásticas penduradas em seus braços.
— Tem mais no carro! — ela diz quando me pega olhando.
Se isso significa evitar papai, vou carregar mantimentos o dia todo.
Mamãe me dá um beijo na bochecha quando passo por ela no caminho
para a garagem. Seu Benz está estacionado do lado de fora da garagem, o
porta-malas aberto e ainda cheio de sacolas de compras.
A porta da garagem está aberta, exibindo uma fileira de carros
esportivos, provavelmente valendo o suficiente para nós seis
terminarmos a faculdade sem nossas bolsas. Mesmo o aluguel em que
Spencer, Mikayla e Nicolette apareceram provavelmente está custando
cem dólares por dia.
Uma das primeiras coisas que Cauler me disse é que estou ocupando
espaço em Hartland. Usando uma bolsa universitária completa que eu
não preciso, por um ano isso nem importa.
Vou ter que começar minha própria bolsa de estudos ou algo assim
para compensar essa culpa.
Papai não está na cozinha quando volto com as compras, então ajudo
mamãe a preparar algumas pizzas para o jantar. Ela começa me
perguntando sobre as finais e o hóquei, depois, eventualmente, passa
para minha saúde mental e medicação.
— Demora um pouco para se ajustar — ela diz quando eu conto a ela
sobre o colapso bêbado. — Se não funcionar para você, você sempre
pode mudar para outra coisa. Há muitas opções. Adicionar terapia
ajudaria.
— Eu sei — eu digo.
— E beber muito é uma das piores coisas que você pode fazer
quando tem depressão.
— Eu sei.
Ela me dá um sorriso suave, estendendo a mão para tirar o cabelo da
minha testa. Eu quase me inclino para o gesto. Não me lembro de uma
vez em que me senti tão perto dela.
Spencer mantém papai ocupado durante o jantar, falando sobre a
temporada até agora e trocando rumores de que ele espera realmente
colocar os Coyotes em uma posição melhor para a primavera. Eu quase
me intrometo para dizer que ele deveria esperar por seu próprio negócio,
mas então eu sou arrastado. Os olhares desajeitados de papai são mais
do que suficientes para mim. Assim que o jantar termina, as cartas saem
e o armário de bebidas é arrombado de verdade desta vez.
Bebo uma garrafa de refrigerante a noite toda.
Adormeço no sofá assim que eles colocam um filme e tenho toda a
intenção de dormir lá pelo resto do filme até que uma mão no meu
ombro me acorde. A casa está quase toda escura, exceto pelo verde e
vermelho vindo das luzes de Natal ao redor das janelas e o brilho fraco
da tela preta da TV que não está realmente desligada. Todo mundo se foi.
Exceto pelo papai acima de mim.
— Eu tenho um quarto preparado para você — diz ele suavemente.
Eu sinto que ele poderia ter dito a mesma frase em espanhol e eu teria
entendido melhor. Não há um quarto não utilizado nesta casa, e mesmo
que ele forçasse Mikayla a ficar com outra pessoa quando Spencer
voltasse para o Arizona, ainda não seria meu espaço.
Ainda assim, essa estranha sensação de culpa se instala no meu
estômago. Eu mencionei a situação do quarto em novembro para
machucá-lo, e aparentemente funcionou.
Bailey ficaria tão satisfeita agora, me vendo perceber que estou
errado sobre ele.
É uma luta ficar de pé, e me sinto sobrecarregado enquanto sigo meu
pai por um corredor escuro, estremecendo e levantando a mão para
bloquear o brilho repentino quando ele acende o interruptor de luz
dentro da terceira porta à esquerda. É para ser um escritório. Eu posso
dizer antes mesmo de meus olhos se ajustarem, com as estantes
embutidas do chão ao teto e uma parede de janelas voltadas para o pátio
dos fundos, nada além de cortinas transparentes para privacidade. A
cama de casal empurrada para o canto onde as duas paredes sólidas se
encontram parece completamente fora do lugar. As prateleiras estão
cheias de todos os troféus e medalhas que ganhei ao longo dos anos, e
algumas das minhas camisetas antigas estão emolduradas nas paredes.
Eu sei que tudo estava guardado em caixas até agora.
— Não é o ideal — papai diz enquanto eu silenciosamente absorvo
tudo. — Mas eu queria que você tivesse um lugar só seu.
— Por quê? — eu murmuro. Eu precisava disso anos atrás, não
agora.
— Quero que saiba que sempre terá um lugar aqui.
Minha garganta fecha e eu mordo meu lábio, dobrando meu queixo e
mantendo meus olhos no chão para que ele não possa ver o quanto isso
está me afetando. Minha bolsa já está no chão ao lado da cama. Jesus.
Papai suporta meu silêncio por um minuto antes de colocar a mão no
meu ombro e apertar.
— Durma um pouco. Eu farei o café da manhã.
Dou-lhe um aceno de cabeça e espero a porta se fechar atrás dele
antes de vestir um short de ginástica e desligar o luzes. Eu dormi em
muitas camas desconhecidas no meu tempo. Inúmeros hotéis e casas
temporárias. Mas mesmo no quarto feito para mim na casa dos meus
pais, sinto-me um hóspede.
Como teria sido crescer aqui? Conhecer a cidade assim como
Madison. Ter verões na piscina com minhas irmãs. Tê-los sempre ao meu
alcance.
Como seria crescer com uma família?
Depois de uma hora acordado, olhando para o teto, pego meu
telefone ao lado dos travesseiros e mando uma mensagem para Bailey.
Mickey: Desculpe por ser um pirralho
Eu não espero uma resposta até de manhã, mas ela responde apenas
alguns minutos depois.
Bailey: O mesmo
É só que
eu falo muito com o pai
E eu sei que ele está tentando
Então é difícil para mim ver você ignorá-lo assim
Eu entendo qual o seu ponto
Apenas dê a ele uma chance de consertar
Mickey: tudo bem
Bailey: Te amo irmão
Mickey: Também

CAULER ME ENVIA MENSAGENS de manhã enquanto estou comendo


bacon encharcado de xarope de bordo, me abençoando com algo para me
concentrar em vez da minha família extremamente barulhenta de
pessoas matinais.
Jaysen: Meu corpo dói
Mickey: Não olhe para mim
Jaysen: Merda
Joguei mais pingue-pongue bárbaro com meus primos ontem à noite
Mickey: ok o que caralhos é pingue-pongue bárbaro
Jaysen: Eu vou te mostrar de volta ao campus
Começar um novo jogo de festa com os meninos
Trocamos mensagens de texto o dia todo, apenas pequenas coisas
aleatórias sobre o que está acontecendo, as travessuras de nossa família,
memórias de férias de infância.
Isso me faz sentir falta dele.
Isso é perigoso.
Papai e eu conseguimos contornar um ao outro por alguns dias, até
Spencer voar para sua família e papai não ter sua masculinidade para se
apoiar em uma casa cheia de mulheres. Não importa que todas as
mulheres nesta casa possam chutar meu traseiro.
Ele adere à conversa fiada no início. Classificação da NHL, seus
pensamentos sobre alguns dos maiores nomes da temporada. Então
minhas notas chegam, e quero dizer, elas são decentes, mas, como meus
pais, acho que eles são obrigados a me dizer que eu poderia fazer melhor.
É a manhã da véspera de Natal quando as coisas finalmente ficam
pesadas.
Estou sentado no sofá com uma caneca de chocolate quente,
observando minhas irmãs decorarem a árvore. Eu tentei ajudar, mas há
muitas delas se amontoando uma ao redor da outra e todos os enfeites
que eu coloquei foram movidos assim que eu me abaixei para pegar
outro de qualquer maneira, então eu estou bem deixá-las lidar com isso.
Finalmente fiquei confortável o suficiente para sentar com os pés
apoiados no sofá, o que é bom porque não trouxe meias grossas o
suficiente e esse piso de madeira está frio. Eu puxo as mangas do meu
moletom sobre minhas mãos e seguro a caneca perto do meu rosto,
sorrindo enquanto Nicolette envolve Madison em enfeites e começa a
tirar fotos. Mamãe e papai ficam de lado com os braços em volta um do
outro e canecas nas mãos, sorrindo enquanto observam.
Quase me sinto como se tivesse dez anos de novo.
Uma vez que a árvore está decorada ao seu gosto, todos nós nos
reunimos em frente a ela para uma foto tirada em um timer com a
câmera de Nicolette, os braços de Mikayla em volta do meu pescoço e
provavelmente o maior sorriso que eu tive no meu rosto em anos. Eu tiro
algumas selfies com minhas irmãs e as envio para Nova, e ela responde
com um monte de emojis de choro e olhos de coração.
Depois, começamos a ir para a cozinha para começar o café da
manhã, mas papai segura a manga do meu moletom para me manter de
volta.
— Podemos conversar?
Eu literalmente sinto o sangue sumir do meu rosto. Ele parece tão
nervoso que é como se ele fosse o adolescente nessa situação e não a
lenda aposentada da NHL de 52 anos.
Eu corro a mão pelo meu cabelo e jogo a outra para cima como pode
ser. Não é como se eu tivesse escolha. Eu me afundo de volta no sofá e
pego meu chocolate novamente, escondendo minha boca atrás da caneca
enorme. Papai está sentado na outra ponta do sofá, cotovelos nos joelhos,
ligeiramente virado para mim. Tomo um gole e espero que ele encontre
suas palavras.
Talvez Bailey estivesse certa. Talvez todos os meus problemas sejam
realmente mesquinhos e infantis. Não sou o único jogador de hóquei que
deixou seus pais jovens para jogar em times de elite. Pelo menos eu
sempre tive um teto sobre minha cabeça.
Papai coça o queixo e não me olha nos olhos.
— Você cresceu muito desde agosto — diz ele. — Todo mundo notou.
Eu bato uma unha contra a caneca, focando no ping suave e sem
dizer nada.
— Não em termos de tamanho — ele acrescenta rapidamente.
Estranhamente. — Como jogador.
— Eu entendo — eu resmungo.
Ele finalmente encontra meus olhos.
— E como pessoa.
Eu desvio o olhar, segurando a borda da caneca contra meu lábio
inferior.
— Eu não vou fingir que realmente te conheço. — Sua voz soa quase
sufocada de emoção, o suficiente para fazer meus olhos arderem. — Sei
que falhei nesse aspecto e quero fazer melhor. Mas eu vi a maneira como
você mudou através de entrevistas, coisas que suas irmãs dizem. Como
você se comporta. E eu estou orgulhoso.
Minhas mãos estão tremendo. Por que minhas mãos estão tremendo?
— Eu poderia falar sobre como você mudou no gelo também, mas…
— Ele aperta os dedos. Rola os polegares um ao redor do outro. Suspira.
— Mas isso só importa se isso é algo que você quer continuar fazendo.
Eu pisco para ele. Não há nenhuma chance de ele dizer o que eu acho
que ele está dizendo.
— O que você quer dizer? — Eu pergunto lentamente.
— Você quer jogar hóquei, Mickey?
Deus, eu realmente gostaria de ter adicionado mais cacau. Essas são
palavras que eu nunca pensei que ouviria sair da boca do papai. Nunca
foi uma pergunta. Ele me carregou para o gelo quando criança. Patins
amarrados aos meus pés assim que eu conseguia andar em terra firme.
Me colocou no nosso lago quando eu tinha três anos. Antes mesmo de
meus pais se conhecerem, foi decidido que eu jogaria hóquei. Esta é a
única coisa que eu queria que ele me perguntasse desde o início, e agora
não tenho ideia do que devo dizer.
— Uh… — Eu giro o que sobrou do meu chocolate, observando-o
subir pelas laterais da caneca. — Eu não sei, quero dizer...
— Isso é importante, cara. — Papai se aproxima, e eu olho para cima
por um segundo para vê-lo me dando esse olhar triste e sério. — Isso não
é algo que você pode entrar com incerteza. Há contratos e milhões de
dólares envolvidos, você não tem escolha de onde vai parar e, às vezes,
nem recebe um aviso antes de ser negociado em todo o continente. Não é
algo que você deve seguir, a menos que esteja totalmente envolvido.
Meu peito parece que está desmoronando, meu coração apertado.
— Então tem isso — papai acrescenta, quieto e cauteloso enquanto
ele estende a mão para puxar a manga do meu moletom. Mas não é meu
moletom. É grande o suficiente para engolir minhas mãos e cair até a
metade das minhas coxas. Porque é do Cauler.
Merda.
Tem o nome e o número dele atrás. Ele deixou no meu quarto e eu
gosto de suéteres grandes e nem pensei nisso.
Merda merda merda.
Papai não parece notar como meus olhos se arregalaram, como eu
parei de mexer com a caneca. Ele continua falando, dizendo:
— Depois do Royals, vocês provavelmente nunca mais jogarão no
mesmo time. A menos que vocês tenham muita sorte, vocês estarão a
centenas de quilômetros de distância um do outro.
Ok. Sim. Está acontecendo. Coloquei minha caneca na mesa de centro
e coloquei meu rosto em minhas mãos. Esfreguo meus olhos, empurro
meus dedos no meu cabelo. Tento não surtar.
— Você vai ter que pensar sobre isso para qualquer um com quem
você ficar. Você vai viajar muito. Se você for negociado, não é apenas sua
vida que é interrompida. Então tem…
— Pai. — Eu não posso mais ouvir isso. O que está acontecendo
agora? Eu mantenho meus cotovelos nos joelhos e minhas mãos no meu
cabelo e olho para o chão. — Parece que você está tentando me
convencer a desistir agora.
— Não, não, claro que não — diz ele rapidamente. — Há muitas
coisas boas em se tornar profissional também. Eu não trocaria minha
experiência na NHL por nada. Mas. Mickey, seu coração nunca esteve
nisso. Eu pensei que se eu continuasse pressionando você, você acabaria
aprendendo a gostar mais, mas em vez disso é o contrário, e eu sinto
muito. Desculpe, Mickey. Eu só quero que você seja feliz.
— Mas essa é a coisa — eu digo. Minha voz treme. — Nada me deixa
feliz. Na verdade. Não é que eu não goste de hóquei, é só que... eu não
gosto de nada. Não o suficiente para importar. Tudo o que eu sempre
quis com o hóquei foi uma escolha. Eu queria ir com você quando você se
mudasse. Eu não me importava com as melhores oportunidades. Eu tinha
dez. Eu queria minha família. Você poderia ter se aposentado em Buffalo,
mas escolheu vir para cá e continuar jogando. Você escolheu me deixar. E
quando você finalmente se aposentou, em vez de voltar, você ficou aqui.
Papai olha para as mãos, os olhos avermelhados.
— Sinto muito — diz ele.
As palavras são suaves, genuínas e caramba. Eu engasgo com um
soluço e coloco meu rosto de volta em minhas mãos. Meu corpo inteiro
treme. Eu não consigo respirar. Papai coloca a mão no meu ombro e me
puxa até minha cabeça encostar em seu peito.
— Independentemente do que pretende fazer — diz ele, seu queixo
no topo da minha cabeça e uma mão esfregando minhas costas. O sofá
afunda do meu outro lado. Sinto o perfume da mamãe um segundo antes
de outro conjunto de braços me envolver. — Vamos apoiá-lo.
— Mas eu não sei o que eu quero — eu digo. Ouço vidros tilintando
na cozinha. O som crepitante de algo cozinhando. Se eu posso ouvir lá,
minhas irmãs podem ouvir aqui. Não tenho energia para ficar
envergonhado.
— Você tem tempo — mamãe diz. — Você pode ficar na escola.
Obtenha um diploma. Ou jogue na NHL e faça aulas online. Ou não faça
nenhuma dessas coisas e venha morar aqui até descobrir. Não há pressa,
topolino.
— Mas e se eu demorar muito e perder o momento? E se eu nunca
descobrir?
— Você vai — papai insiste. — O mais importante é cuidar de você.
— Nós vamos fazer você passar por isso — mamãe acrescenta. Ela
me beija no ombro e pressiona seu rosto contra minhas costas, ambos
me segurando juntos enquanto eu desmorono.
Não apaga os anos de ausência. Mas neste momento, não o trocaria
por nada.
VINTE E SEIS
JANEIRO

O campus está tranquilo.


As aulas só começam em três semanas, e com a neve cobrindo tudo,
parece que sou o único aqui.
Está frio, mas sinto falta do cais. Embrulhado em camadas suficientes
para tornar o movimento inconveniente, eu me sento na beirada com
minhas pernas para cima e meu telefone no meu colo.
Meu histórico de pesquisa é uma bagunça.
+nhl rankings de perspectiva
+jaysen caulfield
+atletas profissionais lgbt
+ryan getzlaf xingamento de playoff
+homofobia na nhl
+ciências marinhas da universidade de hartland
+nhl jogadores com depressão
+nhl rankings de perspectiva
+empregos em ciências marinhas
+licenciatura em ciências marinhas
+mickey james III
+mickey james
+jaysen caulfield
+jogadores de hóquei gays
+licenciatura em ciências marinhas online
+diploma on-line da universidade de hartland
+nhl jogadores com diploma universitário
+grau ou nhl
+nhl draft perspectiva
Mamãe e papai disseram que eu tenho tempo, mas na verdade tudo o
que tenho é até o Draft Combine em junho. Seis meses para descobrir o
resto da minha vida.
Sem pressão.
E depois há Cauler.
Estou surpreso que papai não tenha feito disso um grande negócio.
Não confirmei, mas também não neguei. Claro, ele apoiou minhas irmãs
desde o início, mas eu pensei que seria diferente para mim, estando sob
um escrutínio mais pesado ou algo assim.
A maioria dos rankings ainda me coloca em primeiro lugar, mas
todos com certeza apontam que é por pouco e a única coisa que me
coloca acima de Cauler é minha disponibilidade na próxima temporada.
Os que me colocam em segundo lugar, ou até mais abaixo às vezes, não
conseguem deixar passar o meu tamanho.
Nada disso é útil.
Eu fecho meu histórico e ligo para Nova. Ela está ocupada e tem sua
vida organizada e provavelmente não vai responder, mas…
— Ei! — Nova soa tão brilhante e alegre, por um segundo eu esqueço
por que eu estava ligando para ela.
— Ei, Nova. — Minha voz está áspera de todo o choro que tenho feito
ultimamente. Meus olhos eternamente inchados. — Você pode fazer algo
para mim? — Nós brigamos com frequência suficiente para que eu não
me sinta mal por pular as gentilezas.
— Precisa de mim para chutar a bunda de alguém?
Eu reviro os olhos.
— Não, idiota.
Ela ri um pouco. Ouço carros passando ao fundo. Pessoas
conversando. Ela respira pesado como se estivesse andando rápido.
— E aí? O que você precisa?
— Estou prestes a ter essa conversa séria com Cauler e preciso, tipo,
fotos de pinguins fofos em espera se der errado. Preciso mudar meus
hábitos de enfrentamento.
— Tudo bem — diz ela hesitante. — Estou almoçando sozinha agora,
então vou trabalhar nisso. Você vai me dar os detalhes mais tarde, certo?
— Claro, Nova. Te amo.
— Amo você também amor. Boa sorte.
Sento-me em silêncio por mais alguns minutos, a cabeça inclinada
para trás, respirando o ar fresco e frio. Limpando minha cabeça.
Deixando isso me acordar.
Temos prática em algumas horas. Dois jogos esta semana. Mais
quatro antes das aulas recomeçarem.
Seis meses para deixar de lado as expectativas de todos e descobrir
quem eu vou ser. Como o terceiro no final do meu nome me faz estar à
altura dos que estão diante de mim.
Eu tomo uma última respiração profunda, tão fria que dói dentro do
meu nariz, e deixo sair em um suspiro lento antes de me levantar.
Cauler está descendo o cais em minha direção. Eu paro depois de um
passo gaguejante, mãos cerradas em punhos nos bolsos. Mandei uma
mensagem para ele dizendo que deveríamos conversar, mas não
esperava que ele viesse me procurar.
Ele diminui quando fazemos contato visual, levando um par de meios
passos antes de parar a alguns metros de distância. Nós nos encaramos,
sua respiração saindo em baforadas visíveis como se ele corresse para
cá.
— Ei — diz ele sem fôlego.
— Ei.
— Você está bem?
— Sim, eu só… — Eu me paro. Não vou mentir agora. Chamei ele para
conversar por uma razão. — Hum… — Eu suspiro, me mexendo
desconfortavelmente. Acabe com isso. Rasgue o Band-Aid. — Olha,
Cauler. Eu não sei se você percebeu, mas eu estou… — Eu rio
amargamente. — Estou profundamente deprimido. Agora estou tomando
medicação e ainda estou tentando me acostumar a sentir as coisas e,
honestamente, na maior parte do tempo, eu realmente me odeio.
Eu mantenho minha voz surpreendentemente firme. Não vou chorar
aqui. Este é o mais forte sentimento que já senti, sendo honesto com
minha própria saúde mental.
Cauler apenas olha para mim por um longo momento antes de dizer:
— O que posso fazer?
Oh. Isso... não era o que eu esperava. Eu nem sei como responder
isso. Não há nada que ele possa fazer. É a minha doença para lidar.
Eu levanto meus ombros e olho para o lago.
— Nada. Mas…
Uma nuvem de sua respiração é levada pela brisa.
— Mickey.
Eu respiro fundo.
— Estar com você ajuda. Mas estou com medo. Tudo mudará em seis
meses. Quem sabe onde estaremos. Nem perto um do outro. Quero você.
Eu quero isso. Mas como fazemos isso quando somos quem somos?
Estou tremendo quando olho para ele. Há pressão crescendo atrás
dos meus olhos e um peso na minha garganta. Está tão frio que mal
aguento mais, mas não sei o que devo fazer fazer aqui. Dorian queria que
nós quatro almoçássemos juntos para comemorar nosso segundo
semestre. Deve estar perto dessa hora agora. Como resolvo isso antes
que tenhamos que sair?
— Ei. — Cauler levanta a mão para o meu rosto, deixando-a pairar
perto do meu queixo, sem tocar. Ele espera que eu o olhe nos olhos. — Eu
posso?
Eu engulo em seco.
— Sim.
Ele traça seus dedos frios ao longo do meu queixo, empurra-os para
o cabelo na minha nuca e me puxa contra seu peito. Eu me derreto nele,
envolvo meus braços ao redor de sua cintura e o aperto com força.
— Eu não quero ser apenas mais um de seus ex-companheiros de
equipe — diz ele no meu cabelo. — Eu quero poder ligar para você
depois de seus jogos e tirar sarro das caras que você fez no banco ou
surtar sobre uma jogada doentia que você fez, e eu quero que você ligue
e pergunte sobre o meu e eu quero acordar com mensagens de texto
suas. Eu quero ser aquele para quem você liga quando está passando por
um momento difícil.
— Você vai ter que fazer isso com Nova — murmuro em seu peito.
— Não sou contra chats de vídeo em grupo.
Eu solto uma risada. Cauler afrouxa seu aperto em mim e se afasta o
suficiente para nos olharmos novamente. Ele mantém as mãos em meus
ombros.
— Eu também quero isso — diz ele. — E eu sei que vai ser difícil,
talvez até impossível, mas quero ver onde podemos chegar. Há, tipo, oito
times a cinco horas de carro daqui, talvez tenhamos sorte e você seja
convocado por um deles. Poderíamos nos ver algumas vezes, pelo menos.
O que você acha?
Ele fica quieto, esperando que eu diga alguma coisa.
Deus, isso parece quase exatamente como papai me perguntando se
eu quero jogar hóquei. Há muito o que pensar antes que eu possa decidir
sobre algo assim.
Cauler está certo. Vai ser quase impossível, ter qualquer tipo de
relacionamento com ele daqui para frente. Especialmente quando
estamos ambos na NHL. Mas será completamente impossível se não
tentarmos.
Mesmo que só dure até junho, pelo menos é alguma coisa.
— Ok — eu digo. Limpo o nariz com as costas da mão e ele nem se
mexe. — Sim. Vamos tentar.
Ele sorri, tão suave e bonito que faz meu coração parar por um
segundo ou dois. Acho que ninguém nunca me olhou assim antes. Se ele
continuar fazendo isso, isso pode ser mais fácil do que eu pensava.
— Então vamos fazer isso direito — diz ele. Ele recua o suficiente
para segurar minhas mãos entre nós. Ele levanta um para roçar os lábios
contra meus dedos. Meus joelhos parecem fracos. — Mickey Liam James
III. Você quer ser meu namorado?
Estou tremendo, e duvido que seja só de frio.
— Sim — eu digo, puxando-o de volta para mim, ficando na ponta
dos pés para beijá-lo. O campus está vazio. Estou com minha pessoa
favorita, no meu lugar favorito em Hartland, beijando enquanto a neve
começa a cair ao nosso redor.
Isso nunca foi como eu pensei que a faculdade seria para mim. Mas
eu não ousaria reclamar.
Cauler interrompe nosso beijo para me abraçar novamente, me
abraçando forte até eu dizer:
— Tudo bem, podemos entrar antes que minhas bolas congelem?
Cauler ri. Eu sorrio.
Caminhamos de volta ao campus para encontrar Dorian e Barbie com
as nossas mão juntas. É tão bom que mal noto como nossos dedos estão
frios.
EPÍLOGO
JUNHO

Eu giro meu anel de campeão da NCAA no meu dedo e fico na ponta dos
pés para ver através da multidão. Não há esperança. Estou cercado por
jogadores de hóquei gigantes e suas famílias quase igualmente gigantes,
e não consigo ver nada.
— Tem certeza que ele está aqui? — Nicolette pergunta.
— Ele me mandou uma mensagem cinco minutos atrás dizendo que
seu ônibus estava chegando — eu digo.
Mamãe puxa minha gravata, ajeitando o nó pela centésima vez na
meia hora que estou com ela.
— Relaxe, topolino. Esta não é a última vez que você verá Jaysen.
Com certeza parece.
— Ele provavelmente recebeu um pedido de entrevista — papai diz,
sorrindo quando um homem se aproxima para lhe dar um aperto de mão
e depois eu. Já apertei a mão de tanta gente que não conheço hoje e o
draft ainda nem começou.
— Mikayla está no telefone — diz Madison. — Ela diz que Jordan
teve soluços por meia hora e ela não sabe o que fazer.
— Fazer ela arrotar — mamãe sugere enquanto ela arruma meu
cabelo que parece bem como está. — Ou fazê-la rir. Não a deixe comer
tão rápido.
Delilah procura na multidão como eu, mas ela tem a vantagem de
altura.
— Onde está esse tal de Alex Nakamoto? Quero algumas palavras
com ele.
— Deixe o pobre garoto em paz — diz Bailey. — Não é culpa dele que
ele teve um aumento de popularidade.
— Hum, sim, é?
Eu preciso sentar.
— Com licença, Sr. James? — Todos olhamos quando um homem
com um cordão de acesso total se aproxima de nós, os olhos em mim. —
A NHL Network quer falar com você.
— Certo. — Eu o sigo para o lado, onde outro cara está sendo
entrevistado pela TSN a poucos metros de Hugh e Alyssa. Estou meio
preparado para eles, pelo menos. Durante o Combine, Cauler e eu
tentamos fazer um monte de perguntas que imaginamos que eles nos
fariam e planejamos nossas respostas.
Eu fico com eles na frente de um pano de fundo com o logotipo da
NHL Network ampliado no centro e compartilho algumas risadas sobre
as críticas que eles fizeram para mim ao longo da temporada antes de
Alyssa dizer:
— Houve muita conversa sobre sua melhora com o Royals,
principalmente de onde veio. No verão passado, a maior parte da
conversa era que você atingiu seu pico amador e a única maneira de
melhorar seria jogar em um nível mais alto. De onde você acha que veio?
Eu disse a mim mesmo que seria completamente honesto se eles me
perguntassem algo assim. Eu tenho praticado minha resposta na minha
cabeça por semanas. Mas agora que finalmente chegou a hora de dizer
isso, preciso de todo o meu poder para evitar que minha voz trema.
— Bem, muito disso tem a ver com os caras com quem eu
compartilhei gelo — eu começo. — É difícil estar em linha com Luca
Cicero e Jaysen Caulfield e ficar estagnado como jogador. Eles nunca
deixariam isso acontecer, eles são todos sobre melhoria contínua. E
então apenas os Royals como um todo, eles são um grupo incrível de
caras. Eu me dei muito bem com eles fora do gelo, o que torna muito
mais fácil se encaixar bem no gelo. — Eu engulo contra o nó nervoso na
minha garganta. Minha voz está um pouco tensa quando acrescento: —
Mas acho que o maior fator foi eu controlar minha própria saúde mental.
Fui diagnosticado com depressão clínica e, uma vez que tomei a
medicação e comecei a ver um terapeuta, pude colocar muito mais
energia e paixão no hóquei. Eu fui capaz de começar a gostar de novo,
não apenas ver isso como algo que eu tinha que fazer.
Por cima do ombro do cinegrafista, vejo papai sorrindo torto. Mamãe
com as mãos cruzadas na frente da boca, mas seu sorriso ainda presente
em seus olhos. Minhas irmãs, menos Mikayla, assistindo com orgulho.
Para seu crédito, Hugh e Alyssa apenas parecem levemente
surpresos.
— O que você diria para outros jogadores passando por
circunstâncias semelhantes? — Hugh pergunta.
— Honestamente, não tenha vergonha. Muito mais pessoas lidam
com isso do que você pensa, e a melhor maneira de lidar com isso é
reconhecê-lo e pedir ajuda. Não sofra sozinho.
Eles passam para mais questões de hóquei, meu desempenho no
Combine e, em seguida, outro grande problema.
— Este é provavelmente um dos drafts mais imprevisíveis que
tivemos na memória recente — diz Alyssa. — A maioria dos analistas
tem certeza de que a ordem dos três primeiros vai depender do que você
pretende fazer na próxima temporada. Depois que você ganhou um
campeonato da NCAA com os Royals, houve muita especulação sobre se
você escolheria continuar na faculdade por mais alguns anos. Qual é o
plano?
— Se me oferecerem um contrato, eu aceito — digo. Sem hesitação.
— Sou privilegiado o suficiente, não preciso dessa bolsa completa, então
vou fazer aulas on-line e fazer meu trabalho de campo no verão e abrir
uma vaga na bolsa de estudos para outro jogador que precise. Vou sentir
falta dos caras, vou sentir falta de Hartland, mas quero que o maior
número possível de outras pessoas tenha a oportunidade de
experimentar esse lugar e esse time.
Alyssa está com os olhos arregalados, como se ela tivesse que mudar
tudo o que ela sempre pensou sobre mim depois de uma única
entrevista. No momento em que termina, minha família e eu temos que
praticamente correr para nossos lugares, e eu não tive a chance de ver
Cauler primeiro.
Não é difícil identificar os Royals, uma massa roxa ao longo da
amurada no nível trezentos. Dorian e Zero e Kovy estão de pé, dançando
junto com a música de clube e luzes de laser como se estivessem em uma
rave. Nova e Barbie estão um ao lado do outro tirando uma selfie que
aparece no meu celular um minuto depois, eles fazendo carinhas de beijo
cercados por emojis de coração. Jade, Sid e Karim estão sentados atrás
deles.
Examino a multidão de prospectos e suas famílias, procurando por
Cauler, mas não o vejo.
Mickey: Cadê vocêêêê
Jaysen: 105 quinta fila para cima
Desculpe, fui puxado para muitas entrevistas
Eu o encontro um segundo depois, sentado com sua mãe, seu pai e
Shae. Ele acena para mim do outro lado da sala lotada de gerentes de
todas as trinta e duas equipes e eu aceno de volta, talvez um pouco
entusiasmado demais.
Mickey: Você parece bem
Jaysen: Você mal pode me ver
Mickey: Mas eu ainda sei que você parece bem
Ele envia emojis de revirar os olhos e depois um monte com a língua
de fora, e eu realmente espero que não haja nenhuma câmera em mim
agora porque estou corando.
Jaysen: Meus pais querem fazer um grande café da manhã com sua família amanhã
Mickey: Você quer dizer que eu tenho que conhecer seus pais com toda a minha
família comigo???
Você conheceu minhas irmãs direito.
Jaysen: Sim
O que significa que é justo
Mickey: Eu acho que posso fazer isso
Isso está demorando uma eternidade. Meu joelho começa a balançar
e mamãe pressiona seu ombro contra mim e mesmo que eu tenha me
preparado para esta noite toda a minha vida, eu nunca estive tão
nervoso.
Mickey: Eu posso vomitar
Jaysen: Segure isso para Gary Bettman
Mickey: Omgggg não
Pior pesadelo
Jaysen: Eu vou tropeçar nas escadas provavelmente então
Eu vou compartilhar a humilhação
Mickey: Há uma grande diferença entre
tropeçar em algumas escadas
e vomitar no comissário gd
Jaysen: Eu aposto que você receberia muitos aplausos por isso
É quando Gary Bettman escolhe subir ao palco para seu coro de vaias
padrão. Ele leva com calma, acostumado com isso agora, sorrindo
enquanto fala. A enorme tela atrás dele, que mostrava os destaques dos
dez principais prospectos, agora mudou para nada além do logotipo do
draft. Quanto mais ele fala, mais minha ansiedade aumenta.
Tivemos sorte. As duas primeiras equipes são os Senators e os
Panthers. Ambos na divisão Atlântica. Vamos jogar uns contra os outros e
nossos times de cidade natal pelo menos quatro vezes por temporada.
Um de nós fica com a capital do Canadá e o outro fica com os Everglades.
A menos que algo ultrajante aconteça e um de nós caia para o
terceiro lugar e seja enviado para Los Angeles.
Pelo menos eles têm Dorian.
Jaysen: O perdedor paga pelo nosso próximo encontro
Mickey: Espero que você esteja economizando
Estou desejando bife e lagosta
— Vamos começar — Gary Bettman finalmente diz. Meu coração
despenca. Esperei dezoito anos por isso e aqui está. O momento que eu
tenho trabalhado por toda a minha vida. Mamãe pega minha mão suada e
papai dá um tapinha no meu joelho. — A primeira seleção do Draft da
NHL deste ano pertence aos Senators de Ottawa.
Eles têm três minutos para fazer sua escolha. Três minutos de agonia
direta, tentando ficar parado enquanto as câmeras se movem sobre mim,
tentando não parecer tão doente quanto me sinto. Eu olho para Cauler a
cada poucos segundos para encontrá-lo mexendo em sua gravata,
olhando para a tela onde eles estão de volta para clipes de nós dois,
mastigando o lábio. Seus pais se revezam esfregando os braços para
acalmá-lo.
Quando Ottawa sobe ao palco, estou à beira de uma parada cardíaca.
O proprietário agradece aos fãs por seu apoio e a Denver por sua
hospitalidade durante a semana do draft e eu quero gritar.
Eles podem apenas? Continuar com isso?
Finalmente. Finalmente.
Após dezoito anos de antecipação, o GM de Ottawa se aproxima do
microfone.
— Os Senators de Ottawa — diz ele —, estão orgulhosos de
selecionar, da Hartland University Royals…
Eu olho para Cauler.
Ele está olhando para mim.
E isso importa muito mais do que o nome chamado primeiro.
O FIM
Notas
[←1]
Identificação de um jogador de defesa do time. A gíria D-Man (Defense Man) também
é usada nessas horas.
[←2]
Penalty Kill. Refere-se basicamente à formação do jogador, estratégias e métodos de
jogo por uma equipe penalizada que está com falta de jogadores.
[←3]
Lax é abreviação para lacrosse
[←4]
Abreviação de “irmãos lacrosse”. Um membro da irmandade do lacrosse. Alguém que
abraça totalmente a cultura do lacrosse.
[←5]
A organização You Can Play trabalha para garantir a segurança e a inclusão de todos
que praticam esportes, incluindo atletas, treinadores e fãs LGBTQ+.
[←6]
A parede de madeira ao redor da pista que mantém o disco em jogo.
[←7]
Um passe ou chute que é feito com a parte de trás da lâmina do taco.
[←8]
Verificação de retorno. Correr de volta para a zona defensiva em resposta ao ataque
de uma equipe adversária.
[←9]
Um arremesso rápido e preciso feito ao bater os pulsos quando o disco atinge a
lâmina do taco.
[←10]
Usar o contato corporal para evitar que um jogador adversário ganhe uma posição
vantajosa no gelo
[←11]
“Celly” é a abreviação de “celebrar”, como para comemorar um gol ou uma vitória
entre companheiros de equipe.
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Penalização que consiste em diminuir o número de jogadores no gelo.
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Hatty é uma gíria para hat-trick, quando um jogador marca três gols em um jogo,
resultando em torcedores jogando seus chapéus no gelo
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Chupão em inglês é hickey fazendo trocadilho com mickey e hockey em inglês
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No hóquei e no lacrosse, dangles são uma série de truques complexos que consistem
em enganar o adversário para derrotá-lo.

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