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CULTURA CLERICAL E TRADIÇõES FOLCLóRICAS

NA CIVILIZAÇÃO MEROVíNGIA

«Todos os historiadores do cristianismo medieval conhecem o fenó-


meno da pressão das representações populares sobre a refigiãó -dos
eruditos.:Assuas -primeiras -inanifestações- remontavam, verosimilmente, a
muito tempo atrás. Será admissível pôr o problema da «decadência»',
da civilização intelectual antiga sem perguntarmos a nós próprios se-essa
«c-ultura;;- nasCidã-nas sociedades muito específicas de algumas cidade-
zinhas helénicas, adoptada em seguida e adaptada pela oligarquia romana,
n~~nt5:cip_ªQªQl~_n!e. condenada a estranhas <!~.<?E!l~_e_s, a partir
do momento em que, embora ainda limitada a uma elite, mas a uma
elite doravante ~~lhada pelo vasto_ n1undo, ela ficou, de boa ou má
vontade, em contacto com as multidões impregnadas de todas as outras
€~~içõ~s_IIlentai~?» (Marc Bloch, Annales d'Histoire sociale, 1939, p. 186).

O desejo de relacionar os grupos ou os meios sociais com os níveis


de cultura no momento da passagem da Antiguidade para a Idaife-Mêdia-.
devemÓs
nOõeidente,_ nw-é" novo. Sem.·-voTfãr. ímilto .. atrás;. lembrár o I
célebre artigo de Ferdinand Lot <<Em que altura se deixou de falar
latim?»(') - citado também, mais tarde, por. ~~_9_f_bC?rg ('). Sin-
to-me incapaz de seguir estes dois autores eruditos no campo filológico
em que se colocaram. Mas, se é verdade que admiro muito as observações
pertinentes que enchem os seus artigos, se lhes estou reconhecido por
haverem baseado o seu estudo linguístico na análise mais ampla das
condições socia~ creio que o essencial, para o nosso debate, não está aí.
Sem dúvida que a utensilagem linguística faz parte, a nível funda-
mentái, dal:rteiiSilagem mental e intelectual e encontra-se pois mclulda
no contexto social, que marca profundamente a segunda. Mas, do ponto de

(') Cfr. Bibliografia, n. 2 25.


(') Cfr. Bibliografia, n. 2 33.

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vista central da comunicação cultural, pelo menos em relação aos sé-
\culos V e VI, Dag Norberg parece~ ter razão ~~tr~erdinand Lot: «Do
l,ponto de vista social não havia na época duas línguas, mas sim diversas
1
\formas dã mesma língua, de acordo corri os diferentes meios- da sódé-
·- ·- ·-·--·- -. . . - - .-•·

1tlade. » (') ·-
_A nível linguístico, pois, o poy_9_~_ª__aristocracia e11tendem~se- com
o
esta importante reserva: onde falarem latim: -ora se clero fala, por todo
o lado, o latim, os laicos continuam~-m:iiitas vezes, a falar as línguas
«bárbaras»- quer se trate das línguas vulgares de populações que há
muito entraram na área política e cultural romana ou das línguas
dos Bárbaros propriamente ditos, imigrantes ou invasores recentemente
instalados nos limites do Império Romano. _~-º-l?LliJ!_eiro _çaso, tratava-se
sobretudo de camponeses que haviam _conservado as suas línguas tra-
.Qicjonais - copta, ~i~íaco, - trácio~- celta; berbere -=-; como Ieml'írou
A. H M~Jones-num notável estudo('). Para nos limitarmos ao Ocidente,.
_a__pel'.S.i!lt.~P.cia_d,a!>linguagens célticas é atestada por diversas fontes, nomea-
!illm~p.te por S. JeróÍlimo (') e por Sulpício Severo (6 ). No quere-spelta
aos recêm-vindos, a permanência da utilização dos dialectos germ~nicos
encontra-se_!ml toda a soill.dade. Há nitidamente uma certa romanizaçªo
dosBárb~~os, e~ora seja ~~ú'O limífadii ('). .
1) Assistimos assim à afirmação de _dois fenóme~os_es~e_ll~i_ais: a emer-
igência da massa camponesa como grupo de pressão cultural (') e -~ iiidi-
-rere,~ci~~ão t'c~ltural cresc:~te r~ com ai~~~-~, er~cepç~es iliâ!~~~~~Ji~ ~ou
(') Loc. cit., p. 350.
(') «The social background of the struggle between paganism and
christianity» em Momigliano (Cfr. Bibliographie, n.~ 47).
(') Comm. in Ep. Gal, II.
( 6) Dialogi, I, 27.
C) «Os condes, os saiones enviados em missão junto dos funcionários
romanos, conheciam necessariamente algumas frases latinas, aquilo que
com certeza sabe qualquer oficial ou até qualquer soldado, num país
IOC!Jpado» (P. ~iché, BibliograpJ:lie, n.• 37, p. 101). ~<É verdade que ~lguns
.anstocratas barbaros se romamzaram bastante rapidamente. Mas e bem
\evidente que só pode tratar-se de uma minoria, tendo a massa dos Bár-
baros conservado os seus costumes próprios» (ibid., p. 102).
(') Trata-se de um fenómeno diferente daquele que se produziu nos
inícios da cultura romana. Ali, o fundo rural impregnou para sempre
uma cultura que se urbanizava e dilatava continuamente (cfr. por exemplo
W. E. Heitland, Agrícola, Cambridge, 1921; e as notas de J. Marouzeau
sobre o latim como língua de camponeses», em Lexique de terminologie
linguistique, 2.! ed., 1943). Aqui, o camponês, evacuado e mantido afas-
tado do universo cultural (cfr. J. Le Goff, «Les paysans et le monde
rural dans la littérature du haut Moyen Age (V•-vr siecle)», em Agricol-
tura e mondo rurale in Occidente nell'alto medioevo. Settimane di studio
dei Centro italiano di studi sull'alto medioevo, XIII. Espoleto, 1965 [1966],
pp. 723-741) faz pesar sobre esta cultura uma ameaça que obriga os clérigos
a promoverem um movimento inverso, de cima para baixo, lançado do
leste.

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locais- dé~; cama·das sociais~ face ao.~)que monopoliza
todas as formas evoluídas, e nomeadamente escritas, de cultura. O peso
da massa camponesa e o monopólio clerical são as duas formas essenciais
que agem sobre as relações entre os meios sociais e os níveis de cultura
na Alta Idade Média. O melhor terreno para estudar estas relações não
arece ser o da lín sim- ~ais amplo e mais profundo- o
~ensil~ em intelectual e mental. ~'":::
Para melhor se compreender o papel dos suportes sociais da cultura
na Alta Idade Média, devemos recordar a evolução das infra-estruturas
que, no século IV; leya bruscamente o q:istiani~ITIR ao primei~Q_ P1'!!1.9
da cena histórica~ A. H. M. Jones (") mostrou que a difusão do cristia-
-iúsmolloliiündo romano d~ século IV não era um facto meramente
político ou espiritual- consequência da conversão de Constantino e do
zelo missionário dos cristãos, a partir de então mantidos pelos poderes pú-
blicos. Em princípios do século IV, o cristianismo estava sobretudo difun-
dido nas classes urbanas médias e inferiores, enquanto quase não atingia-as,
massas camponesas iê. a -aiisiocraêia. àra .a
contracção económica . e·-êJ
desenvolvimento da ht:iroérà-aã-éõlidUzemà promoção destas middle and
wwer urban classes, onde-o.- cristianismo era já forte. Essa promoção
leva à expansão cristã_,_ Mas quando o triunfo do cristianismo se torna
evidente, as classes gue o guiaram estão em franco recuo. O cristia-
nismo escapa ao desmoronar das superstruturas frágeis do Baixo Império,
separando-se das classes que lhe garantiram o êxito e que a evo-
lução histórica fez desaparecer. A transformação social da aristocracia,
d~~is da~S!~.C:~<?~_é!s, implanta _9 cristianismo, mas à custa
de muitas distorsões~ particularmente sensíveis no domínio da cultura.
Entreum clero cada vez mais coloniZado pÓr ..umaãrístocracut fonnâda
pela paideia greco-romana C6) e lJ!ll. laiç_ado._du.tedomo. ruraL qué
·o recuo do paganismo- -ofiC!if torna mais vulnerável às pressões de
uma cultura primitiva renascente, a religião cristã, introduzida por
categorias sociais urbanas moribundas, conseguirá definir-se numa cultura
<:OíilUnl;- atrãVês--ae um -1oio-·-SübHC cte ·-aC:Uíiü;~Ções · internas7. ('1 ) · -~
-----~---~- ------_..._·~-' "-~ -- --~ ~ . --~----.....,:...--~-

(") Loc. cit., n. 2 6.


C') Cfr. a obra clássica de H. I. Marrou, Bibliografia, n.• 30;
e para os fundamentos gregos da cultura greco-romana: W. Jaeger, l'aideia.
The Ideais of Great culture, I-III, Oxford, 1936-1945.
( 11) Sobre a problemática da aculturação, o relatório de referência é o
de A. Dupront, «De l'acculturation», em Comité international des sciences
historiques, xn• Congrês international des sciences historiques (Viena,
1965). Partes da obra: I. Grandes temas (1965), pp. 7-36. Traduzido para
italiano com adições em: L'accu/turazione. Per un nuovo rapporto tra
ricerca storica e scienze umane (Turim, 1966). Os problemjls de acultu-
ração interna nascidos da coexistência de níveis e de conjuntos culturais
distintos dentro de uma mesma área étnica constituem um domínio parti-
cular e particularmente importante da aculturação.

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I - .é\_s_características fundamentais da história da cultura ocidental,
desde .o séc~l-; -y-~~~!{)--VII_(pQ'de-~-definir=-s-e· assínl: -- ---- -----
a) A laminagem das classes médias encontra-se no 4omínio da cultura
onde o fosso se alarga entre a _!!lassa inc~lta e uma _eli~- cultivada;
b) Mas a clivagem cultural não coincide com a estr~,ttificação social,
pQ.r:que.__a__Eu1tura inteh!ctual se torna o monopólio da Igreja. Mesmo
que haja úãndes--dife~ei.~Ças-de grau de cultura entre os Clérigos, a
pa~ureza da sua cul!_\!!.~ __!__~!l!e~@l!- e a linha essencial de separação é
a que separa os clérigos dos laicos;
c) _A cultura eclesiástica, quaisquer que sejam as respos~as individuais
ou colectivas dos clérigos ao problema da atitude a adoptar para com o
conteúdo da cultura profana pagã, utiliza a utensilagem intelectual
desenvolvida, do século III ao século v-: por autores didá_ctico~ que siste-
JJlatizaffi._a.!J.ível ~wiflflcacioemedÍÕcie;--a:-iieránçà metodolÓgica -e-cien-
tífica da culiura greco-roníána· (12):--nesta ufénsifagem intelectual, o
. essenclálé~ provaveiffierite, o quadro das «artes liberaiS)) e Marciano
'"-Capella, o autor mais impÔrtante (De nuptiis Philologiae et Mercurii,
primeira metade do século V) (''). S~ria importante possuir um perfeito
conhecimento global desta primeira camada de «fundadores da Idade
Média)), por vezes ainda pagãos, como é o caso de Macróbio ('•);
d) Os chefes eclesiásticos recebem tanto mais facilmente esta for-
mação intelectual quanto, sobret~dO no século V e no século Vl~a gráffile
maiofla-peitence às aristocracias indígeno-romanas. Mas os prelãdos bár-
bar~ bispos eosabadesdeõrigeriioaroãfá que fizeram carreira, adop-
tam muito bem este tipo de cultura, porquanto a sua aquisição é,_ precisa-
mente, um dos melhores meios de assimilação e de ascensão sociais.- O
tipo hagiográfico do santo bispo comporta, em geral, uma origem «ilustre»
e, quase sempre antes ou depois da «conversãm), a formação das artes
liberais (o que aconteceu com Paulino de Milão na Vita Ambrosii, em 422;
com Constâncio de Lyon na Vita Germani, por volta de 470-480, e
com outros);
e) A despeito da tendência para a regionalização, esta cultura
eclesiástica tem, mais ou menos por todo o lado, a mesma estrutura e .o
mesmo nível (cfr. dois exemplos, entre os mais opostos: Isidoro de Sevilha
e a cultura visigótica no princípio do século VII, a cultura monástica

(u) Por exemplo, o essencial dos conhecimentos etnográficos que a


cultura greco-latina legará ao Ocidente medieval virá das Colletanea
rerum memorabilium, medíocre compilação de Solinus, no século III
(ed. Mommsen, 2.' ed., Berlim, 1895).
('') Cfr. W. H. Stahl, «To a better understanding of Martianus
Capella)), em Speculum, XL, 1965.
(") Foi a Macróbio que os clérigos da Idade Média tardiamente
foram buscar, por exemplo, a tipologia dos sonhos- tão importante numa
civilização em que o untverso onírico tem um lugar tão vasto: cfr. L. Deu-
bner, De Incubatione, Giessen, 1899.

210
irlandesa de Ynis Pyr na época de Iltud, na primeira metade do
século VI, segundo a Vita Samsonis) (");
erante esta cultura eclesiástica, a cultura laica manifesta uma
regressão muito mais acentuada, iniciada desde o século II, reforçada pela
desôrganJzaEo·-watêr.fare·-rn.entãf"(iÜese-tornou catastrófica com as
i.nv~c;§.~ __fusão <,l.Qu!emen.t.o..§~árb~!9~ _~<2!IL-ª-§.22fieda~~ indígenô:.
-romanas. Esta regressão cultural manifestou-se, sobretudo, com-ressur:
gênci~de técnicas, de mentalidades, de crenças «tradicionais». oQiie
a cultura eclesiástica encontrou na sua frentê·Iõi~-mãTs queüiiia cultura
pagã do mesmo nível e do mestno tipo de organização, depressa vencida, a
despeito das últimas convulsões do princípio do século V, uma cultura
«primitiva» de cariz mais guerreiro nos Bárbaros (em especial na camada
superior: cfr. o mobiliário funerário)('"), de carácter sobretudo camponês
no ~êQ~jijº'to-:Ja,LÇ~;n~aii:.bliidoi~s.-:ruralÍia~ãs.

II - Pondo, pois, de lado o testemunho dos documentos arqueológicos,


podemos tentar definir as relações entre estes dois níveis de cultura
através das relações entre cultura clerical e folclore.
··u-raciõ-ãeSle esboço sê- funaãr-em documentos pertencentes à'
cultul:i eclesiástica escrita (em especial vidas de santos e obras pastorais,
·tais como os Sermões de Cesário d' Arles, o De correctione rusticorum
de Martinho de Braga, os Dialogi de Gregório, o Grande, os textos dos
sínodos e concílios e os penitenciais irlandeses), arrisca-se a falsear, se não
a objectividade, pelo menos as perspectivas. Mas não se procura, aqui,
estuoãr a resistência da cultura folclórica e as diversas formas que ela
pôde tomar (resistência passiva~ contanliOãǪº· _da __ç.JJlt_l).rn eçl~!@"éa,
ligação com moVimentÔs--pÔIÍticós, sóclaise religiosos, revoltas campo-
nesas~ ariãnisino (*), priscilianismó (*'*), petãgianisiriol***5:-etc.):·· ·confeii~
-----------~ ·---..........--~---

(") A Vita Samsonis foi submetida à rígida crítica do seu editor


R. Fawtier (Paris, 1912). Mas, mesmo que as adições e os acrescenta-
mentos -posteriores tenham sido importantes no texto que nos chegou,
os historiadores do monaquismo irlandês tendem a considerar a cultura
«liberal» dos abades irlandeses (Santo Iltud ou S. Cadoc pertencem
<to mesmo grupo de Samson) como uma realidade e não como uma ficção
carolíngia (cfr. P. Riché, op. cit., p. 357); e O. Loyer, Bibliografia, n.• 26,
pp. 49-51).
('•) Se bem que a arqueologia nos revele uma cultura guerreira
(cfr. E. Salin, Bibliografia, n.• 45), a aristocracia militar da Alta Idade
Média permanece afastada da cultura escrita à espera do impulso da época
carolíngia e pré-carolíngia (cfr. n. 25, p. 216), onde mergulha de resto
na cultura clerical, antes de irromper na época românica com as canções
de gesta (cfr. J. P. Bodmer, Bibliografia, n." 6).
(*) Doutrina de Arius, que negava a unidade e. a consubstancialidade das
três pessoas da Santíssima Trindade e, portanto, da divindade de Jesus Cristo. O aria-
nismo foi condenado pelo Concílio de Niceia (325) e pelo de Constantinopla (381).
- (N. da T.)
(..) Prisciliano concebia o ascetismo como autêntica forma da vida cristã.
Prisciliano, heresiarca espanhol, falecido em 385. - (N. da T.)

211
temo-nos com tentar definir a atitude da cultura eclesiástica perante a
Çi!ltug_lolclóriÇli?~~ -
Há, sem dúvida, um certo )lCOlhimento deste _folçlore na cultura
clericat:
a) É favorecido por certas estruturas mentais comuns às duas
culturas, em especial _a_ confusão entre o terrestre e o soj:lrenatural, o
material e o espiritual (por exemplo, atitude perante os milagres, o culiõ
dãs relíquias, uso dã"s filacteras (*), etc.);
b) Tornou-se obrigatório, pela táctica e pela prática evangelizadoras;
l!_eva_~lJzªç!_<!_ ~edama um es_fo~ço de adaptação cultural do clero: língu-a

(• ..) Heresia criada por Pelágio, que negava a eficácia da Graça e do pecado
original. - (N. da T.)
( 17 ) Eo.r___cultura folclórica entendo sobretudo a camada profunda da
cultura (ou daClvillzaÇãõ) !rádll:wgat (no se~1do d~)\_. __Y~I"<lgJ:J.ac, Blblm--
~n." 48) siili.!ac_e.nt~ -~IU- lo _a a soc1e acre- li1stonca e, parece-me,
afloran o ou %restes .a..aJlqra_:r:_na. <l_eso~_amzação'querelriou-etrtre- a Anu-
gmdade e a 1 ade Média. O que torna a identificação e a ariâtíse desta
camaaa culturar-partkularmente delicadas, é ela ser recheada de contribui-
ções históricas discordantes pela idade e pela natureza. Aqui, só podemos
tentar distinguir o extracto profundo da camada de cultura «superior»
greco-romana que a marcou com o seu cunho. São. se se ~uiser, os dois
~aganismos da ~-Q~d~:ren~as tr~giçi()nais de muito onga duraçao
e o da religiãõ Qficial greco-romaria,·- mais evolutiva:- Os autores cristãos
da Baixa Antiguidade e dá -Alta -Idade Média distinguem-nos mal e pare-
cem, de resto (uma análise, por exemplo, do De correctione rusticorum de
Martinho de Braga, Bibliografia, n." 13 e 27, e do texto ap. C. W. Barlow,
«Martin de Braga», Opera omnia, 1950), o demonstra, mais preocupados
em combater o paganismo oficial do que as velhas superstições, que mal
distinguem. Em certa medida, a sua atitude favorece a emergência destas
crenças ancestrais mais ou menos purgadas da sua roupagem romana e
não ainda cristianizadas. Mesmo um santo Agostinho, contudo ainda
atento em distinguir a urbanitas da rusticitas nos aspectos sociais das
mentalidades, das crenças e dos comportamentos (cfr. por exemplo a sua
atitude discriminatória perante as práticas funerárias no De cura pro
mortuis gerenda, PL-CSEL 41 -Biblioteca augustiniana, 2; e mais geral-
mente o De catechizandis Rudibus PL, XL, Biblioteca augustiniana,
1,1) nem sempre consegue a distinção. Assim, a célebre passagem do De
Civitate Dei, XV, 23, acerca dos Silvanos et Faunos quos vulgo incubos
vocant, acto de nascimento dos demónios íncubos da Idade Média, como
muito bem analisou Ernest Jones no seu ensaio pioneiro obre a psicanálise
das obsessões colectivas medievais, em On the Nightmare (2.! ed., Londres,
1949), p. 83.
Na prática, considero como elementos folclóricos os temas da lite-
ratura merovíngia que nos levam a um motivo de Stith Thompson, Motif-
-Index of Folk-literature (6 vol., Copenhaga, 1955-1958).
Sobre a historicidade do folclore, temos o artigo luminoso de alcance
geral apesar do título, de G. Cocchiara, «Paganitas. Sopravivenze Folklo-
riche dei Paganesimo siciliano», A tti dei I! congresso internazionale di
studi sulla Sicilia antica. Studi pubblicati dall'Istituto di storia antica
dell'Università di Palermo (X-XI, 1964-1965, pp.. 401-416).
(•) Pergaminho contendo urna passagem da Bíblia e que os Judeus usam
corno talismã. - (N. da T.)

212
(sermo rusticus), recurso às formas orais (sermões, cantos) e a certos tipos
de cerimónias (cultura litúrgica, procissões: o caso das Ladainhas('") e
das procissões instituídas por Gregório, o Grande C"), satisfação das
petições da «clientela» (milagres «a pedido»).
A cqltura eclesiástica deve, mudas vezes, inserir-se nos quadros da
cultura folclórica: localiZação das igrejas e dos oratórios, funções pagãs
trimsm1hdas aos santos, etc. ·
Porém, a iniciativa é ( 9 e s t a cultura fol~lóric-!1 pela cultura
eclesiástica:
a) Por destruição
As inúmeras dest de tem los e de ídolos tiveram por simetria,
na literatura, a proscrição dos temas prQI?riamente o c óncos, cu]ãrêC@iià,
mesmo na literatura hagiográfica a p_riori privilegiada neste aspecto;ê
fraca. A recolha é aindãmalSescassâ, sê
eliminarmos os temas folclóncos
tirados da Bíblia (neste aspecto seria importante distinguir a tradição
do Antigo Testamento, rica em motivos folclóricos, e a tradição do Novo
Testamento, onde estes temas são raros). Por outro lado, devemos distin-
guir cuidadosamente, nos relatos hagiográficos, as diferentes camadas
cronológicas de elementos folclóricos devidos às sucessivas correcções.

('') Sabe-se que as Ladainhas datam dos séculos V e VI. Foram


instituídas, segundo a tradição, por S. Mamert, bispo de Viena (falecido
em 474), num contexto de calamidades e rapidamente se estenderam a
toda a Cristandade, conforme testemunha Santo Avit (fal. em 518),
Homilia de Rogationibus (PL, LIX, 289-294). Não é certo que tenham
sido o substituto directo das Ambarvalia antigas: ver o artigo «Rogations»
em Dictionnaire d'archéologie chrétienne et de /iturgie (XIV-2, 1948, col.
2459-2461, H. Leclercq). Pelo contrário, é certo que acolheram elementos
folclóricos. Mas· é difícil saber se estes elementos deram imediatamente,
desde a época que analisamos, o seu colorido à liturgia das Ladainhas, ou
se não foram nelas introduzidas ou, pelo menos, desenvolvidas mais tarde.
Os nossos testemunhos que, por exemplo, dizem respeito aos dragões das
procissões só datam dos séculos XII e XIII para os textos teóricos (os
liturgistas Jean Beleth e Guillaume Durant) e dos séculos XIV e XV para
as menções individuais concretas. Estudei o problema dos dragões proces-
sionais desde a época merovíngia num ensaio, «Culture cléricale et
folklore au Moyen Age: saint Marcel de Paris et le dragon», Mélanges
Barbagallo II, 51-90 e aqui intra pp. 221-260. Sobre as características
folclóricas das Ladainhas, temos as belas páginas de A. van Gennep, com
o. título significativo: «Fêtes liturgiques folk:lorisées», em Manuel de Fol-
klore trançais contemporain (I/4-2, 1949, pp. 1637 e ss.).
C") A sua origem é urbana, a sua natureza propriamente litúrgica,
como o demonstra o alvará de instituição dirigido pelo papa aos Romanos,
após ser elevado ao pontificado por altura da epidemia de peste negra de
590- alvará que Gregório de Tours inseriu na Historia Francorum pois
um diácono de Tours, então em Roma, para aí adquirir relíquias, lha
havia entregado (HF, X, 1). Mas a sua inserção no calendário litúrgico
como /iturgiae majores ao lado das /iturgiae minores das Ladainhas
expô-las também, sem dúvida, a uma degradação popular.

213
Certos autores (por exemplo, P. Saintyves, À Margem da Lenda Dourada,
ou H. Günther, Psicologia da Lenda) não fizeram uma suficiente distinção
entre tais extractos e tiveram por isso tendência para fazer recuar, atê à
Alta Idade Média, elementos folclóricos introduzidos na época carolíngia e,
sobretudo, na altura da grande vaga folclórica dos séculos XII e XIII
que vem rebentar na Le-niúi Dourada de -Jacques- de -Voraglne.-
"b)-P;r obliter~çao-- -·.
A sobreposição dos temas, das práticas, dos monumentos e das per:-:o-
nagens cristãs a antecessores pagãos não é uma «sucessaõ»; mas-uma
abolição. -A:-cultur!l clerical encobre, oculta, elimina a culüirarottlõrica.
-- c) Por déSrui:tu~ação
É provavelmente o mais importante processo de luta contra a
cultura folclõrTEa:-os__.feinàs folclóricos mudam radicalmente--de- sfgnifi-
caOoliosseus-sul)stit~tos cristãos (exemplo do dragão n~ Vita Mar~~lli
-de ·Fortunato('"); exemplo dos fantasmas na Vita Germani de Constâncio
de Lyon, em comparação com o modelo greco-romano de Plínio o Moço
e o tema folclórico dos mortos sem sepultura) (21 ) e até de natureza (por
exemplo os santos não ~am de taumaturgo$ aux~_:- só_D.eu:;_.@~_os

--------
, milagres) ('').
\·"

('") O dragão folclórico- símbolo das forças naturais ambivalentes


que podem reverter a nosso favor ou em nosso prejuízo (E. Salin,
op. cit., IV, pp. 207-208)- continua a existir durante toda a Idade
Média, ao lado do dragão cristão identificado com o diabo e reduzido ao
seu mau significado. Na época (fim do século VI) em que Fortunato
escreve a Vita Marcel/i (cfr. Bruno Krusch, MGH, Scriptores Rerum Me-
rovingiarum, IV-2, 49-54), o tema do santo vencedor do dragão fica a meio
caminho destas duas concepções, na linha de interpretação antiga que,
atribuindo aos heróis a vitória sobre o dragão, hesitava entre a domesti-
cação e a morte do monstro. Sobre os aspectos folclóricos deste tema,
cfr. Stith Thompson, op. cit. Motif A 531: Culture hera (demigod)
overcomes monsters. Tentei apresentar este problema no artigo citado
na nota 8, p. 208. «L'ambivalence des animaux rêvés» foi sublinhada por
Jean Gyõry, Cahiers de Civilisation médiévale (1964, p. 200). Para uma
interpretação psicanalítica deste ambivalência, cfr. E. Jones, On the
nightmare, p. 85.
( 21 ) Constâncio de Lyon, Vie de saint Germain d'Auxerre, ed. R. Bo-
rius (Paris, 1965, pp. 138-143): Plínio o Moço, Lettres, VII, 27.
(") Há que distinguir. A tese de P. Saintyves, que se exprime no
título sugestivo do seu livro, marcado com a indicação «modernista)):
Les Saints successeurs des dieux (Bibliografia, n.g 43), aparecido em 1907,
é falsa, na medida em que os antepassados afastados e eventuais dos santos
são não os deuses, mas os semideuses, os heróis, e em que a Igreja quis fa-
zer dos santos, não os sucessores, mas os substitutos dos heróis e situâ-los
num outro sistema de valores. Em contrapartida, a tese de G. Cocchiara,
loc. cit., afirma o triunfo da Igreja nesta matéria, mas não tem em conta
o facto de a grande maioria dos cristãos, na Idade Média, e mais tarde,
terem tido para com os santos o mesmo comportamento que os seus
antepassados tiveram para com os heróis, com os semideuses e até com
os deuses. Em especial, contrariamente ao que pensa G. Cocchiara, a

214
O fosso cultural reside, aqui, sobretudo, na oposição entre o carácter
fundamentalmente ambíguo, equívoco, da cultura folclórica (crença nas
forças szmultaneamente boas e más e Utihzaçao · de uma utensilagem
cultural com dois gumes) e o «racionalismo» da ciillura eclesiáshca,
herdeirá ãà·curturá-arTs'tociática gieCõ-romana (''): ~a separação do"oem
e do mal, do verdadeiro e do falso, da magia negra e da magia branca,
sendo o maniqueísmo propriamente ·dito evitado apenas pela omnipotência
de Deus.
Temos pois de considerar duas culturas diversamente eficazes, níveis
diferentes. A. barragem que a cultura çlerical opõe à çultura folcló-
rica provê~. nao -·somente de uma hostilidade consciente e deliberada,
mas também da incompreensão. O fosso que separa a elite eclesiástica,
cuja formação inteléctual; origem social, implantação geográfica (qua-
dro urbano, isolamento monástico). a tornam permeável à· cultura fol-
clórica, da massa rural, é, sobretudo lÍÍ:n fosso de ignorancfi!jcfr. a incom-
preensão admirada de Constâncio de Lyon perante o milagre dos galos
mudos realizado por S. Germano a pedido_g~_c_a!.DJ!Oneses) (24 ). ····-
·-.
-------~--<J~_....-.' ·-· ·······-
~"····---·~--- -·-~~·-·-

atitude, tão frequente nas colectividades medievais, de maltratar um santo


(ou uma~de não haver atendido às orações dos seus
~alta beffide uma· mentalidade «pnmittva» persistente, e não
·crcqmrl!IY«Jfiud=m;.i-ªtç_çuva.::da. .me!lª[e, O que fica ê q~:a IDsfmçãÕ
~nue=õ papel:aé: s e o Pí112el dos santos ··-=][mos interme Iários- nos
milagres....ofer~c-e--à..psico1ogia_indivi.9.ll~L~-cole.ctfY-ª_!!l!!a vaJ.Viiiaâe escape
que _salv.a.IDJax:.da. em__certa m~.9ida.q a_ ciexQç.ª-Q_.Mra. __com Deus. ·--- ,
(") Trata-se sem dúvida de simplificar o papef intelectu-are mental
do cristianismo, ao insistir nos progressos da racionalização que trouxe a
estes domínios. No meio termo da história das mentalidades colectivas ele
parece mais provir de uma reacção mística, «oriental», perante um certo
«racionalismo» greco-romano a que de resto não poderíamos reduzir a
sensibilidade crítica: muitos aspectos da sensibilidade helenística serviram
de base ao judeo-cristianismo, e os cristãos da Idade Média percebiam uma
certa continuidade ao atrair Virgílio e Séneca para o cristianismo. Acontece
que, no domínio das estruturas mentais e intelectuais, o cristianismo
parece-me ter marcado sobretudo uma nova etapa do pensamento racional,
conforme P. Duhem o havia defendido no campo da ciência, onde, se-
gundo ele, o cristianismo permitira ao pensamento científico progressos
decisivos ao dessacralizar a natureza. Neste aspecto, a oposição folclórica
ao cristianismo (mais fundamental, parece-me~ que os amálgamas e as
·simblose-s) representa-a-resistência do irracional, ou melhor, de um outro
sistema mental, uma outra lógica, a lógica do «pensamento selvagem».
(") Constâncio de Lyon, Vie de saint Germain d'Auxerre, ed. cit.,
pp. 142-143. Germano, albergado pelos aldeões, cede às suas súplicas e
restitui a voz aos galos que se haviam tornado mudos, dando-lhes a comer
trigo bento. O biógrafo mostra não compreender a importância e o
significado deste milagre, que evita mencionar. lta virtus diuina etiam
in rebus minimus maxima praeeminebat. Estas res minimae, de que falam
· ió rafos d Alta d Média ,.._ recisamente mila res
de tipo folclórico - entrados pe a «horta o cavalo» na literatura c enca .
No caso aqm citado liã-umã- com maçao de diversos temas fotcloncos-
englobados neste milagre de feiticeiro de aldeia que põe em marcha a
ordem mágica da natureza. Cfr. Stith Thompson, Motif-lndex op. cit.,

215
A~isili!!s>s assim, no Ocidente da Alta Idade Média_,_ mais a um
bloqu~amentodacultura.lnferiÕrpela cultura superior, a uma estrati-
ficação relativamente estaHque dos níveis de cultura, do que a uma hierar-
quização, dotada de órgãos de transmissão, que garantam influências unira=
-t~_x:a_is_Qy bilaterais, entre os níveis culturais. Porém, esta estratificação
cultural, se é verdade que- culminã..nã formação di uma cultura aristns:rá-
tica clerical ("), não se confunde por J~~~-~ ~stratificação s~E!~·l, A
partir da época carolíngia, a «reaCçãO folclórica» ~ã-"ãCÇãõãe todas as
camadas laicas. Irromperá na cultura ocidental a partir do século XI,
paralelamente aos grandes movimentos heréticos (").

--------- ,)'-
r~
j. I ~ .

- j'c
A 2426: Nature and meaning oÍ animal cries (nomeadamente A 2426.2.18:
origin and meaning of cock's cry); A 2489: Animal periodic habits (nomea-
damente A 2489.1: Why cock wakes man in morning; A 2489.1.1: Why
cock crows to greet sunrise); D 1793: Magic results from eating or drin-
king; D 2146: Magic contra! o/ day and night; J. 2272.1: Chanticleer
believes that his crowing makes the sun rise.
(") Esta _cultum_aristocrática clerical desenvolveu-se na época caro-
Iíngia, numa _.llellhg_ra -redprog_da I_gn:ja~!mLo~_valQrª-J.!licos e da
ia~_s_toc~acia laica s~bt:t! _<>S. _valor~s- !"e!igi§sos._~. no nosso temeo, nos
seçulos Y-VI, -ª-aJJstQcrªcm -co!Q_niZ~ill!®bieJLJ.&r.eJa,_ela so o fãZ
abanaonaruro-a sua cultiifa!iüca. não como utensilagem tecmca, mas
comõSiSt~ma::.cie: valores. Entre- oiifros;·-êsignificativo o. eiemplo de
Cesár1õ-d'Ades (Vita Caesarii; I, 8-9, ed. G. Morin, S. Caesarii opera omnia,
t. II, 1937). Cesário, enfraquecido pelas suas práticas ascéticas em Lérins,
é mandado para Arles para uma família aristocrática que o confia a
quidam Pomerius nomine, scientia rhetor, Afer genere, quem ibi singu-
larem et clarum grammaticae artis doctrina reddebat... ut saecularis
scientiae disciplinis monasterialis in eo simplicitas poliretur. Pomério, autor
do De vita contemplativa, com grande voga na Idade Média, é, de resto,
um cristão sem nada de «racionalista». Mas, uma vez adquirida a técnica
intelectual, Cesário desvia-se desta ciência profana, como lhe sugere um
sonho em que vê um dragão devorar-lhe o ombro pousado em cima do
livro sobre que adormecera. No outro extremo do período que analisamos
(século VII-VIII), vemos o ideal aristocrático (não nos metemos agora em
discussões sobre a existência de uma nobreza desta época) invadir a
literatura hagiográfica a ponto de lhe impor um tipo aristocrático de
santo; F. Graus, Bibliografia, n. 2 22; e F. Prinz, Bibliografia, n. 2 36,
nomeadamente as pp. 489, 501-507: Die Selbstheiligung des frankischen
Adels in der Hagiographie, 8. Heiligenvita-Adel-Eigenkloster, 9. Ein neues
hagiographisches Leitbild; e os trabalhos citados ibid. pp. 493-494, n. 2 126
e 127, aos quais devemos juntar K. Bosl», Der «Adelsheilige», Idealtypus
und Wirklichkeit, Gesellschaft und Kultur im Merowingerzeite. Bayern
des 7. und 8 Jh.» em Speculum historia/e, Geschichte im Spiegel von
Gedichtsschreibung und Gedichtsdeutung (ed. Cl. Bauer, 1965, pp. 167-187).
( 20 ) A exemplo de Erich Kohler, interpreto o renascimento da lite-
ratura profana dos séculos XI e XII como o produto do desejo da
pequena e média aristocracia dos milites de criar para si uma cultura
Je@tivam.e...nJ~ _ÍI).dependente_da__cultu@_~leric"ãr, a que se- unham ~oelí'i
acomoaâdo os prócere.nalcos carolíngios (cff~. Kõhler, Trobadorlyrik
und hofischer Roman, Berlim, 1962. Id., «Observations historiques et
sociologiques sur la poesie des troubadours», Cahiers de civilisation

216
SELEOÇÃO BIBLIOGRÁFICA

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médiévale, 1964, pp. 27-51). Acho também como D. D. R. Ower, «The


secular inspiration of the "Chanson de Roland"» (Speculum, XXXVII,
1962), ue a mentalidade e a moral do Roland primitivo são inteiramente
laicas, ·« eu ais». nso qu a cu ura eu a a1ca
iiiTiuenc10u a cultura folcloríéã-süó]acente, porque esta era a única cu ura
dé reserva·----ueõS""sen · , se nao o e trnSimpor, ao
lado a cu tura c enca . e res o, are oc avta pressenti o a Impõf:-
fãncia desta natureza fõlclórica profunda das canções de gesta («A intriga
do Roland vem mais do folclore do que da história: ódio entre enteado e
padrasto, inve-ja, traição». La Société f.éodale, L, p. 148. Cfr. ibid., p. 133~
CertamentC2_ a cultura clerical chegará de ressa e facilmen um com-
prOiillsSQ,-a -urna · çao a cu.JYrª--~~ on __llikª---!l.LÜ!illi.Q
fõlClõricO.l~iitre-aé"'ôffi'õy"de- Mõiliiíoilth; por exemplo, e Robert de Boron
temos âpenas o tempo de lobrigar um Merlin selvagem, profeta nã
cristão, louco estranho à razão católica, homem selvagem fugindo do
mundo cristão, saído de um Myrdclin onde a cultura semiaristocrática
dos bardos celtas havia deixado supor um feiticeiro de aldeia. Mas, ao
contrário da época merovíngia, o período românico-gótico não conseguiu
afastar completamente esta cultura folclórica. Teve de contemporizar com
ela e permitir-lhe que se implantasse antes do novo impulso dos séculos XV
e XVI. O tema, eminentemente folclórico e portador de aspirações vindas
do mais secreto colectivo, da região de Cocagne, apareceu na literatura do
século XIII antes de surgir definitivamep.te no século XVI (cfr. Cocchiara,
II paese di Cuccagna, 1954). A este respeito, os séculos XII e XIII são
~ a primeira etapa do Rena~ento~--

217
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