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A revista que valoriza o fotógrafo e a fotografia

www.fotografemelhor.com.br | n0 278 | Ano 24

A magia e os desafios da

paisagem
noturna
Dicas de quatro especialistas

Retratos ousados de
Gabriel Wickbold
Nu artístico em P&B
Os riscos de fotografar a
Amazônia em chamas
A fé de Severino Silva

Grandes fotógrafos da edição: Cristiano Xavier David Eisenberg Gabriel Wickbold Gabriela Biló Gjon Mili Marcelo Portella
Marco Antonio Perna Paulo Behar Ricardo Takamura Severino Silva Ueslei Marcelino Valda Nogueira Victor Lima Victor Moriyama
22

Marco Antonio Perna


Ano 24
Edição 278
Novembro/2019

Foto de capa:
Victor Lima

6 Grande Angular
Notícias e novidades

12 Revele-se
Fotos dos leitores em destaque

28
Gabriel Wickbold

16 Câmeras Clássicas
A SLR pioneira Kine Exakta

20 O mestre Gjon Mili

22
E o incrível light painting com Picasso

Nu artístico low key


O P&B de Marco Antonio Perna
36
28 Retratos ousados
As duas faces de Gabriel Wickbold

36 PAISAGEM NOTURNA
Ricardo Takamura

Os desafios da longa exposição

60 Amazônia em chamas
A cobertura de três fotojornalistas

60
Gabriela Biló

70 A fé de Severino Silva
Do hard news ao documentário

76 Vida de fotógrafo
O estilo divertido de David Eisenberg

86 Equipamento
Lançamentos de Canon, Nikon e Sony

Fotografe Melhor no 278 3


Fundador
Aydano Roriz
Diretores
Luiz Siqueira
Tânia Roriz

Diretor Executivo: Luiz Siqueira


Diretor Editorial e Jornalista Responsável:
Roberto Araújo – MTb.10.766 – araujo@europanet.com.br

REDAÇÃO
Diretor de Redação: Sérgio Branco (branco@europanet.com.br)
Editora de arte e capa: Izabel Donaire
Editor convidado: Érico Elias
CARTA AO LEITOR

J
Colaboradores especiais: Diego Meneghetti e Livia Capeli

á fiz algumas imagens noturnas de longa exposição com a câmera


Colaboraram nesta edição: André Teixeira e José de Almeida
Revisão de texto: Denise Camargo
PUBLICIDADE no tripé, mas sempre em ambientes urbanos – produzi uma série,
publicidade@europanet.com.br
certa vez, ainda na era do filme, na madrugada em Diamantina,
São Paulo
Equipe de Publicidade: Angela Taddeo, Alessandro Donadio, para mim a mais bela das cidades históricas mineiras. Não ficou
Elisangela Xavier, Ligia Caetano, Renato Perón e Roberta Barricelli lá essas coisas, mas deu para salvar umas quatro fotos de 36 poses,
Outras Regiões
Head de Publicidade Regional: Mauricio Dias (11) 98536 -1555
ISO 400. Por isso, acredito que fotografar paisagens naturais à noite é
Bahia e Sergipe: Aura Bahia – (71) 3345-5600/9965-8133
um tremendo desafio. Além de dominar a técnica, o fotógrafo precisa
Brasília: New Business – (61) 3326-0205 planejar muito bem a saída a campo e ter bastante paciência para ficar
Rio Grande do Sul: Semente Associados – (51) 8146-1010
Santa Catarina: MC Representações – (48) 9983-2515 horas na captura de uma boa imagem – virtude que, confesso, me falta
Outros estados: Mauricio Dias – (11) 3038-5093
Publicidade – EUA e Canadá: Global Media, +1 (650) 306-0880
em muitas ocasiões, e essa é uma delas.
ASSINATURAS E ATENDIMENTO AO LEITOR Ser paciente e metódico, aliás, é uma característica comum a quem
Gerente: Fabiana Lopes (fabiana@europanet.com.br) fotografa a natureza nos seus variados segmentos. E, sempre que penso
Coordenadora: Tamar Biffi (tamar@europanet.com.br)
Equipe: Josi Montanari, Camila Brogio, Regiane Rocha, nisso, me vem à cabeça lembranças do saudoso Luiz Claudio Marigo
Gabriela Silva e Bia Moreira
(1950-2014) e suas histórias não de horas, mas de dias e semanas (às vezes
meses) em busca de uma imagem no lugar e momento certos. Diante
ATENDIMENTO LIVRARIAS E BANCAS – (11) 3038-5100
Equipe: Paula Hanne (paula@europanet.com.br)
EUROPA DIGITAL (www.europanet.com.br) desse exemplo, esperar horas não parece tão complicado assim, mas,
Gerente: Marco Clivati (marco.clivati@europanet.com.br)
Equipe: Anderson Ribeiro, Anderson Cleiton, Adriano Severo,
definitivamente, não é para o meu bico – ou o meu foco.
Fábio Molliet e Karine Ferreira Por isso, admiro fotógrafos como o mineiro Cristiano Xavier, o
PRODUÇÃO, EVENTOS E MARKETING carioca Marcelo Portella, o paulista Ricardo Takamura e o baiano Victor
Gerente: Aida Lima (aida@europanet.com.br)
Arte: Jeff Silva Lima. São esses especialistas que falam, na matéria de capa desta edição,
Equipe: Beth Macedo (produção) e Laura Araújo (arte)
sobre os detalhes que envolvem a fotografia de paisagem noturna
DISTRIBUIÇÃO E LOGÍSTICA no Brasil e fora dele, pois todos também viajam para o exterior para
Coordenação: Henrique Guerche
(henrique.moreira@europanet.com.br) produzir esse tipo de imagem. As que mostram constelações da Via
Equipe: Gabriel Silva e Edvaldo Santos
Láctea (hoje, bastante em voga) e as que desenham o rastro das estrelas
(um clássico) sempre chamam muito a atenção, mas há outros tipos
ADMINISTRAÇÃO
Gerente: Renata Kurosaki
Equipe: Paula Orlandini e Gabriel Tadeu de imagem que também encantam e fazem da fotografia de paisagem
DESENVOLVIMENTO DE PESSOAL
Tânia Roriz e Elisangela Harumi
noturna um misto de magia e desafio. Boa leitura.
Rua Alvarenga, 1.416 – São Paulo/SP, CEP: 05509-003
Telefone: 0800-8888-508 (ligação gratuita) e
(11) 3038-5050 (cidade de São Paulo)
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4 Fotografe Melhor no 278 fotografe@europanet.com.br fotografemelhor.com.br • Bookplay
GRANDE ANGULAR

Fotos: Fernando Lemos

Duas obras produzidas por Lemos entre 1949 e 1952 que estão na exposição: Eu Poeta (autorretrato) e Luz Teimosa

IMS adquire obras do acervo de


Fernando Lemos e Albert Frisch
O Instituto Moreira Salles adquiriu
um conjunto de cerca de 2 mil
obras do artista português
Fernando Lemos, entre fotografias, gravuras,
desenhos e peças de design, e ainda um
Nascido em Lisboa, Portugal, em
1926, Lemos foi uma figura de proa no
movimento surrealista português no
início da década de 1950. Suas primeiras
fotografias são retratos de personalidades
Jacaré na Amazônia
registrado entre 1867 conjunto de 98 imagens do fotógrafo da cena artística portuguesa e trucagens
e 1868 na expedição de alemão Albert Frisch (1840-1918), realizadas que criam ambientes fantásticos, com claro
Albert Frisch pela região entre 1867 e 1868 na Amazônia brasileira. viés político. Descontente com a ditadura
salazarista, ele se mudou para o Brasil em
1953. Aqui, logo ganhou proeminência,
Albert Frisch/Acervo IMS

ao expor suas fotos, no mesmo ano, nos


museus de arte moderna das cidades de
São Paulo e do Rio de Janeiro.
A trajetória artística multifacetada de
Fernando Lemos pode ser conferida na
exposição Fernando Lemos – mais a mais ou
menos, aberta no Sesc Bom Retiro, em São
Paulo (SP), até o dia 26 de janeiro de 2020.
Com curadoria de Rosely Nakagawa, reúne
86 obras em suportes variados.
Já as obras de Albert Frisch foram
compradas em um leilão realizado pela
Sotheby’s em Nova York, EUA, pelo valor
de US$ 81.250 – trata-se de um recorde
obtido por trabalhos de Frisch, segundo a
casa de leilões. As imagens de Frisch, que

6
Uma das fotos de indígena
e paisagem em que Frisch
usou fusão de duas cópias

se somam a outras 40 do
mesmo autor que o IMS já
tinha, foram feitas em uma
expedição comissionada pela
Casa Leuzinger, do Rio de
Janeiro. Frisch percorreu o
Rio Amazonas de Tabatinga
até Manaus, em viagem
que durou cinco meses.
Muitas das imagens finais
são resultantes da fusão de
duas cópias fotográficas
em papel, visto que Frisch
Albert Frisch/Acervo IMS
registrou indígenas diante de
um fundo neutro e depois qualidade técnica do trabalho,
realizou a montagem com a paisagem realizado em uma época em que
amazônica ao fundo. São fotografias era necessário emulsionar e revelar
que ficaram conhecidas não apenas as chapas em campo, munido de
pelo ineditismo, como também pela um laboratório portátil.

Ganhadores da bolsa ZUM/IMS


A revista ZUM e o Instituto temas polêmicos e atuais. Seu
Moreira Salles anunciaram projeto propõe um processo
os projetos ganhadores da imersivo em motéis da Avenida
sétima edição da Bolsa ZUM/ Brasil, no Rio de Janeiro (RJ).
IMS: Avenida Brasil 24h, Já Neves planeja a criação de
de Aleta Valente, e Retrato imagens de seu avô, a quem ele
Falado, de Eustáquio Neves. não conheceu e de quem não há
A carioca Aleta Valente tem fotos nos álbuns de família.
um trabalho centrado no Cada artista foi contemplado
uso da autorrepresentação e com o valor de R$ 65 mil, e tem
das redes sociais, enquanto oito meses para desenvolver
o mineiro Eustáquio Neves, seu projeto com essa verba. O
que é químico de formação resultado final será incorporado
e fotógrafo autodidata, tem ao acervo do IMS.
um trabalho marcado pela
manipulação analógica e o uso
de sobreposição de negativos.
Aleta usa a fotografia em
plataformas digitais para discutir
Aleta Valente

Eustáquio Neves

Autorretratos dos fotógrafos Aleta Valente e Eustáquio Neves

Fotografe Melhor no 277 7


GRANDE ANGULAR

Três imagens do documentário que Valda Nogueira produzia


no norte de Minas Gerais com quilombolas e ribeirinhos
Fotos: Valda Nogueira

JOVEM FOTÓGRAFA VALDA


NOGUEIRA MORRE NO RIO
A fotógrafa Valda Nogueira
morreu no dia 3 de outubro de
2019 no Rio de Janeiro (RJ), aos
34 anos, vítima de atropelamento.
Ela se formou na Escola de
Fotógrafos Populares, no Complexo
da Maré, em 2012, e tinha no de populações tradicionais, com parte da exposição Através do Olhar,
fotógrafo e professor João Roberto destaque para uma série produzida realizada no Sesc Madureira, no Rio,
Ripper sua principal fonte de no norte de Minas Gerais, tratando com curadoria de Thais Rocha. A
inspiração. Com um trabalho da relação de quilombolas e mostra reuniu o trabalho de quatro
promissor, Valda registrava a vida ribeirinhos com o Rio São Francisco. fotógrafas negras moradoras de
Ela era aluna do bairros periféricos, contando também
curso de Artes Visuais com imagens de Aparecida Silva,
na Universidade Fernanda Dias e Thaís Alvarenga.
Estadual do Rio de “Valda foi o mais bonito meteoro
Janeiro (UERJ). Integrava que conheci”, diz João Roberto
ainda o coletivo Farpa Ripper. “Fotógrafa de um brilho
e as plataformas de impressionante, colocava suas
mulheres fotojornalistas fotos em defesa das populações
Women Photograph, tradicionais, dos moradores de favelas
Diversify.Photo e MFON e, de um modo geral, das populações
Women. Valda fez menos favorecidas e esquecidas ou
perseguidas pelos poderes oficiais.
Valda, que morreu Era ativista do feminismo negro. Ela
precocemente, mostra continua encantada e encantando.
foto para moça que Hoje seu assistente de iluminação é o
havia fotografado astro rei”, completa Ripper.
João Roberto Ripper

8 Fotografe Melhor no 277


Chinês vence concurso com marmota assustada
Uma foto engraçada
e assustadora foi a
vencedora do Wildlife
Photographer of the Year
2019, principal premiação
mundial de fotografia de
natureza e vida selvagem.
Feita por Yongqing Bao,
nas montanhas Qilian, na
China, mostra uma
marmota levando um
susto diante de uma
raposa prestes a atacá-la.
O concurso Wildlife
Yongqing Bao
Photographer of the Year
é realizado pelo Museu cerca de 48 mil inscrições premiadas no concurso
de História Natural de de cerca de cem países. no site da revista:
Londres. Recebeu em 2019 Confira outras imagens fotografemelhor.com.br.

Fotografe Melhor no 277 9


GRANDE ANGULAR
FOTO DO MÊS

A MUSA DO DESCANSO
DOS GUERREIROS
Nada escapa a um publicação, Tiago Queiroz foi
fotojornalista observador. escalado para uma matéria
Tiago Queiroz, da Agência de cotidiano na região da
Estado, é a prova de que uma Avenida Faria Lima. Foi ali
boa foto pode surgir do nada, que se deparou com a cena.
basta estar atento aos sinais. No meio de uma tarde
Ao circular pelas ruas de São de sexta-feira, em pleno
Paulo (SP), ele percebeu a Monumento às Musas, dois
existência de uma nova classe bike boys descansavam com
de trabalhadores, chamados a cabeça dentro de suas
de bike boys, entregadores bolsas de entrega.
solicitados via aplicativo, a A imagem, capturada
maioria deles homens e jovens. com uma Canon EOS 1
O tema acabou virando DX com lente fixa de 40
pauta para duas reportagens mm, viralizou. Apenas na
publicadas em O Estado de conta do fotógrafo no
S. Paulo, a mais recente feita Facebook teve cerca de 800
em parceria com o repórter compartilhamentos. “Sou
Renato Jakitas. Logo após a grato pela discussão que
ela gerou sobre os rumos
que o trabalho informal está
Entregadores tiram
Tiago Queiroz

um cochilo no meio tomando nos dias atuais numa


da tarde em praça de grande metrópole como São
São Paulo (SP) Paulo”, conta Queiroz.

A VENCEDORA DO

Tathiana Gimenez
CONCURSO DA ABFRN
A fotógrafa paulista Thatiana
Gimenez, dona do estúdio Doce Click
Fotografia, foi a grande vencedora
do concurso da Associação Brasileira
dos Fotógrafos de Recém-Nascidos
(ABFRN). Como prêmio, ela teve a foto
na capa do recém-lançado Manual
Prático de Newborn, publicação inédita
no Brasil e fruto da parceria entre
Fotografe e ABFRN.
Na foto, feita há cinco meses,
aparece a bebê Gabriela, então com
10 dias, e a irmã Clara, de 2 anos,
filhas do casal Luana e Vinicius
Destefani. A interação entre as irmãs
na imagem foi o que mais chamou a Paulo. A vitória no concurso da ABFRN, Acima, a
atenção dos jurados para a escolha da segundo ela, repercutiu bastante entre imagem
foto vencedora, pois foge das poses os colegas de profissão. “Já tinha sido vencedora do
clássicas do segmento de newborn. finalista em outros concursos, mas concurso e, ao
lado, Thatiana
Thatiana Gimenez, 40 anos, é nunca havia vencido”, diz ela. Gimenez,
profissional há sete e mantém seu Para mais informações de como profissional
estúdio na região da Freguesia do adquirir o Manual Prático de Newborn, do segmento
Ó, zona Noroeste da cidade de São acesse www.europanet.com.br. há sete anos
Camila Diniz

10 Fotografe Melhor no 277


REVELE-SE

No peito e na raça
A
natação, ensina Jonne Roriz, fotógrafo especialista
nessa modalidade, é um dos esportes mais difíceis de
se registrar justamente por causa da água, que pode
impedir que o nadador fique no foco. Não foi o que ocorreu √ Autor: Laura Lopes
com a foto feita por Laura Lopes durante uma prova de nado √ Cidade: Ilhéus (BA)
de peito do Campeonato Baiano de Natação. Ela congelou √ Câmera: Nikon D5300
com perfeição o movimento do nadador no auge da braçada, √ Objetiva: Nikkor 55-200 mm
com o splash de água reforçando a sensação de movimento. √ Exposição: f/5.6, 1/2.000s e ISO 250

12 Fotografe Melhor no 278


Arbitragem pirata
A moeda para o sorteio de escolha de lado de campo no
jogo entre Vasco e Bahia pelo Brasileirão de 2019, no
estádio de São Januário, Rio de Janeiro (RJ), foi jogada
pelo juiz e o fotógrafo Delmiro Júnior prendeu o dedo no disparo √ Autor: Delmiro Júnior
contínuo da câmera. Ao conferir, viu que em uma das imagens a √ Cidade: Rio de Janeiro (RJ)
moeda ficou justamente na altura do olho do árbitro Caio Max √ Câmera: Nikon D750
Vieira, lembrando o tapa-olho de um pirata. Ele buscava algo √ Objetiva: Nikkor 70-200 mm
assim ao disparar, mas ficou melhor do que esperava... √ Exposição: f/2.8, 1/4.000s e ISO 200

Fotografe Melhor no 278 13


REVELE-SE

Papo amarelo e verde


O
Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste da cidade
do Rio de Janeiro (RJ), é conhecido como reduto
de jacarés-do-papo-amarelo, espécie ameaçada de
extinção – há locais onde é comum vê-los, como o Canal das √ Autor: Alexsandro Calixto
Tachas. Alexsandro Calixto, passeando pela região, avistou o √ Cidade: São Paulo (SP)
réptil de repente, quando observava a vegetação aquática de √ Câmera: Nikon D80
cima de uma ponte. Câmera na mão, foi só enquadrar o bicho, √ Objetiva: Nikkor 70-300 mm
que parecia estar de olho nele, cercada pelo verde cintilante. √ Exposição: f/5.6, 1/40s e ISO 100

14 Fotografe Melhor no 278


Colheita de néctar
B
orboletas não são tão fundamentais na polinização
como as abelhas, mas dão sua contribuição para o
transporte dos minúsculos grãos de pólen quando vão
sugar o néctar das flores. Na imagem captada por Luiz Carlos √ Autor: Luiz Carlos Cau
Cau, com uma composição bem equilibrada, uma borboleta √ Cidade: Pedreira (SP)
da espécie rabo-de-andorinha (Papilio machaon) parece que √ Câmera: Canon EOS 30D
terá muita diversão e comida em um canteiro de margaridas- √ Objetiva: Canon 100-400 mm
mexicanas (Tithonia rotundifolia). √ Exposição: f/8, 1/1.600s e ISO 1.000

Mande fotos e ganhe uma caneca da Coleção Câmeras Clássicas


Os autores das fotos selecionadas Especifique no e-mail: nome, endereço,
para publicação na revista receberão telefone, ficha da foto (equipamento,
pelo correio uma caneca da Coleção dados técnicos...) e um breve relato
Câmeras Clássicas. Para participar (local, data...) sobre as imagens que você
da seção “Revele-se”, envie até três enviar. Os arquivos devem ter, no mínimo,
fotos, no máximo, em arquivo digital tamanho de 13 x 18 cm (ou aproximado)
(formato JPEG), para o e-mail com resolução de 200 a 300 ppi. Evite
fotografe@europanet.com.br. arquivos muito pesados.

Fotografe Melhor no 278 15


CLÁSSICAS

Exakta
A primeira

Fotos: Mário Bock


SLR de 35 mm

A avançada e
inovadora
câmera fabricada
em Dresden,
Alemanha, foi
uma das vítimas
do nazismo na Visão lateral da Exakta,
Segunda Guerra. reflex pioneira para
Saiba mais o formato 35 mm

A Exakta contava
com uma ampla
T erminada a feira de fotografia
de 1936 em Leipzig, Alemanha,
a fotografia nunca mais seria a
mesma. Naquela ocasião foi apresentada
a primeira câmera reflex de 35 mm do
tela de focalização e mundo, a Kine Exakta. Criada pela Jhagee
visor tipo capuchão Kamerawerk, empresa de Dresden,
Alemanha, tinha dispositivos inéditos
para a época, entre os quais visor e tela
de focalização intercambiáveis, alavanca
para o avanço do filme, obturador
mecânico de cortina de 12s a 1/1.000s e
baioneta de encaixe rápido da objetiva.
A Exakta também foi pioneira em
aplicações médicas e científicas: contava com
sistema para instalação em microscópios,
telescópios, endoscópios e aparelhos de
topografia, além de chassi para 250 chapas.
Para macrofotografia, tinha uma espécie
de ring flash e até fotômetro TTL, mas
apenas para uso com fole de extensão. No
entanto, a ascensão do nazismo e o advento
da Segunda Guerra acabaram com todos

16 Fotografe Melhor no 278


os planos do empresário holandês disso, podia receber de potentes Schneider Kreuznach, e também de
Johan Steenberg (veja box), dono da teleobjetivas a lentes e acessórios outros países, como a americana
fábrica alemã, que sonhava em ver sua para macrofotografia e reproduções Kodak, a francesa Angenieux e as
inédita reflex dominar o mercado de – serviço complicado em câmeras de japonesas Soligor, Tokina, Nikon
fotografia profissional. fole e de visor direto. (objetiva 135 m) e Olympus
Em 1939, a Jhagee já havia Ela pesava quase 1 kg (com a (40 mm) – em 1936, ela foi
patenteado o fotômetro TTL, objetiva) graças ao sólido corpo lançada com a superluminosa
cuja fabricação foi interrompida em liga de alumínio, peças e Zeiss Biotar 50 mm f/1.4.
pelo início da guerra. Perdeu ali a mecanismos muito robustos, feitos
oportunidade de se tornar a primeira para durar uma eternidade. O visor
reflex com leitura de luz através da usava um grande espelho e a tela
Vítima da guerra
objetiva, primazia que a japonesa de focalização, feita com um bloco
Topcon alcançou somente em 1962. maciço de vidro, era eficiente na A Jhagee, empresa do
distribuição da luz e na projeção holandês Johan Steenberg,
AVANÇADA E ROBUSTA de uma imagem clara, sem bordas produzia câmeras de fole de
Ao ser lançada, a Exakta dividiu escurecidas e de excelente nitidez. vários tipos e tamanhos desde
opiniões: de um lado, fotógrafos Outra grande novidade era o 1912, em Dresden, Alemanha.
Em 1936, o projetista alemão
adeptos de câmeras de fole de encaixe da lente, simples e eficiente.
Karl Nüchterlein criou a Kine
grande formato, como Linhof e Bastava dar uma volta de 30o para a Exakta. Em 1940, a fábrica foi
Speed Graphic, indispensáveis para objetiva chegar à posição de serviço confiscada pelos nazistas e
produzir ampliações de qualidade; e ficar travada por uma chave depois, em 1945, arrasada
do outro, defensores das rangefinder rústica, mas muito prática. Contudo, por bombardeios aliados.
Leica e Contax, de filme 35 mm, se a Jhagge era avançada na parte Após a Segunda Guerra,
práticas e precisas. Contudo, a reflex mecânica, nunca se interessou pela foi reerguida pela Alemanha
de 35 mm da Jhagee logo ganharia parte óptica. Assim, a Exakta tinha comunista e, em 1960,
espaço na fotografia profissional: o à disposição as melhores lentes encampada pela Pentacon, que
foco e o enquadramento através da alemãs, como Carl Zeiss Jena e produziu modelos Exakta até
1969 – a fábrica em Dresden
objetiva, rápido, preciso
fechou em 1973. Dez anos
e isento de paralaxe, era antes, os herdeiros de Steenberg
um ponto forte. Além passaram a fabricar em Berlim
a Exakta Real, moderna e com
design da projetistas da Ferrari.
A baioneta para encaixe
da lente na Exakta Contudo, ela durou somente
funcionava de forma um ano, vencida pelas câmeras
simples e eficiente japonesas, mais avançadas e mais
baratas. Os modelos seguintes
foram as câmeras japonesas
Petri e Cosina com a
marca Exakta. A
estratégia não
deu certo e a
fábrica em Berlim
fechou em 1976.

Fotografe Melhor no 278 17


CLÁSSICAS

reflex
A vantagem
do sistema SLR é
a possibilidade de
focar e enquadrar
através da
objetiva
Fotos: Mário Bock

PARA CANHOTOS? Na Exakta,


Uma das maiores curiosidades os principais
controles
da Kine Exakta era a posição dos
ficavam ao
controles. Ela parecia mesmo alcance da
destinada a fotógrafos canhotos, já mão esquerda
que os mais importantes – ajuste da
velocidade, alavanca de transporte,
contador de exposição e disparador –
eram acionados pela mão esquerda. uma pequena janela de vidro,
A mão direita servia para ajustar a circular ou retangular.
objetiva (diafragma e foco). Mas A tampa traseira se abria por
tudo era permitido para uma câmera completo e facilitava a troca do filme
inovadora, projetada sem referências ou a remoção de parte dele, cortado
técnicas anteriores. por uma faquinha embutida (um
A Exakta vinha com visor tipo requinte). Já a alavanca de transporte
capuchão (semelhante ao da do filme substituía o arcaico botão
Roleiflex) para enquadramentos ao de girar: em um único movimento, Conheça a coleção
nível da cintura, ao nível do solo colocava o espelho em posição,
ou em ângulos elevados. Para as armava o obturador e avançava o Até o final de 2019, a cada
tomadas rápidas e de assuntos em contador de exposições – o máximo edição de Fotografe, uma
movimento, o visor dispunha de de modernidade para a época. câmera que marcou época na
fotografia será destacada nesta
seção com um breve histórico.
Ao mesmo tempo será lançada
a caneca da Coleção Câmeras
Clássicas com o modelo do
mês. Para adquirir esse produto
exclusivo, acesse: www.colecao
camerasclassicas.com.br.

O modelo
trazia uma
faquinha
embutida para
cortar o filme

18 Fotografe Melhor no 278


MESTRES DA FOTOGRAFIA

Duas das imagens em que Pablo Picasso pinta com luz diante da câmera do mestre albanês Gjon Mili na França

Light painting
com Picasso
Gjon Mili, fotógrafo albanês radicado nos EUA, foi pioneiro na técnica
e um dos grandes nomes mundiais entre os anos de 1940 e 1960
POR SÉRGIO BRANCO

C aso o nome Gjon Mili lhe pareça estranho


e pouco familiar, saiba que você não está
sozinho. Esse mestre da fotografia já foi
listado entre os melhores do mundo, mas poucos o
conhecem. Para se ter uma ideia de quem é ele, em
1923 e, como fotógrafo da poderosa revista Life, rodou
o mundo registrando os mais variados temas. Seu
trabalho mais conhecido foi realizado há 70 anos: em
1949, ele viajou até Vallauris, França, para retratar o
pintor espanhol Pablo Picasso. Desse encontro nasceu
maio de 1958 a revista americana Popular Photography uma fantástica série de imagens em que Mili usou a
divulgou o resultado de uma pesquisa para escolher os técnica do light painting.
dez principais fotógrafos em atividade na época. A lista Mas, se o light painting virou arte com a dupla Mili-
foi publicada em ordem alfabética (pelo sobrenome) Picasso, antes disso o albanês fez várias experiências no
para não caracterizar um ranking. Era a seguinte: Ansel Instituto de Tecnologia de Massachusetts, em parceria
Adams, Richard Avedon, Henri Cartier-Bresson, Alfred com Harold Edgerton, para desenvolver a técnica do
Eisenstaedt, Ernst Haas, Philippe Halsman, Yousuf Karsh, flash estroboscópico com o objetivo de captar várias
Gjon Mili, Irving Penn e W. Eugene Smith. imagens em um único fotograma (até então, o recurso
Nascido na Albânia em 1904, Gjon (pronuncia-- era usado apenas para fins científicos). Para muitos, esse
se “gion”) Mili mudou-se para os Estados Unidos em é o grande legado de Mili para a fotografia moderna.

20 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Gjon Mili/acervo Getty Images
e a fotografou com longa exposição O resultado do trabalho
Primeiro light painting combinada com um ou mais disparos de inédito feito para a Life
que se tem notícia foi flash. As fotos impressionaram Picasso e o só foi visto por Picasso
de Mili: luzes na bota da quando as fotos saíram
inspiraram a fazer desenhos de luz no ar
patinadora Carol Lynne na revista americana
para que Mili os registrasse.
Dessa parceria genial nasceu Desenhos
de Luz de Picasso, série feita para a revista
Life durante cinco sessões de trabalho
no estúdio do pintor com o ambiente às
escuras. Uma pequena lâmpada ligada a
um fio elétrico se transformou em pincel Gjon Mili em ação: em
1958, ele foi considerado
virtual para o artista malaguenho, que um dos dez melhores
literalmente pintou com luz diante da fotógrafos do mundo,
câmera de Mili. Em alguns momentos, o ao lado de nomes como
fotógrafo disparava o flash e congelava a Cartier-Bresson, Ansel
imagem de Picasso produzindo uma obra Adams, Richard Avedon,
que ele não enxergava. Irving Penn, entre outros
O gênio espanhol só foi conferir o
Arquivo Life

resultado do que havia desenhado com


luz quando as fotos foram publicadas
na Life. Na época, o trabalho de Mili
foi considerado mais comercial do
que artístico, com as imagens sendo
exibidas em outras revistas e jornais de
forma bastante repetitiva. Anos depois,
ampliadas como obras de arte, circularam
pelo mundo em exposições e passaram
a ser vendidas por alguns milhares de
Mili foi ao encontro de Picasso já dólares em galerias. Hoje pertencem à
com a ideia na cabeça. Lá chegando, coleção da Getty Images.
compartilhou com o pintor as primeiras Gjon Mili começou na Life de 1939
experiências com light painting: um e só a deixou em fevereiro de 1984, aos
ensaio no qual colocou luzes na bota 79 anos, quando morreu em Stanford,
da patinadora americana Carol Lynne Connecticut, vitimado por uma pneumonia.

Fotografe Melhor no 278 21


NU ARTÍSTICO Fotos: Marco Antonio Perna

O carioca Marco
Antonio Perna
aposta no Esculturas
em low key
clássico P&B
contrastado para
produzir ensaios
de nu artístico
POR JOSÉ DE ALMEIDA

M arco Antonio Perna é o


que se pode chamar de
“pé de valsa”. Apaixonado
por dança de salão, esse carioca da gema,
nascido em Copacabana, zona sul do Rio
em que modelos iniciantes fazem permuta
de portfólio com fotógrafos. “O método de
convencimento nesses grupos é mostrar
o portfólio. Elas avaliam e as que gostam
respondem à chamada para posar”, explica.
de Janeiro (RJ), há 54 anos, aprendeu a Para quem quer começar no segmento,
fotografar justamente para registrar os ele diz que é normal não ter portfólio de
bailes dos quais participava. Tornou-se um nu. O caminho que ele encontrou foi fazer
craque na área e dediciu se arriscar em imagens na praia com mulheres de biquíni.
outro segmento: passou a fazer ensaios “A partir das fotos de praia montei meu
sensuais com mulheres. Depois de três portfólio de sensualidade. Foi o primeiro
anos, montou um portfólio transformado passo para a fotografia de nu artístico”,
em livro, Female Sculptures, em que aposta ensina. O que o fotógrafo percebe é
Alternando entre no estilo low key em P&B para mostrar que atualmente várias modelos buscam
modelos experientes
e iniciantes, Marco suas imagens de nu artístico. a fotografia sensual como forma de
Antonio Perna levou O fotógrafo conta que o primeiro ensaio empoderamento feminino, ou seja,
dois anos e meio para foi com uma dançarina de dança do ventre e, tomam a decisão de mostrar o corpo nu
concluir o trabalho a partir daí, entrou em grupos de redes sociais sem pedir licença a ninguém.

22 Fotografe Melhor no 278


O fotógrafo
conseguiu
em grupos de
redes sociais
várias modelos
leveza para posar
A experiência
do fotógrafo com
dança influenciou
a direção das
modelos nas
poses

Fotografe Melhor no 278 23


NU ARTÍSTICO
Fotos: Marco Antonio Perna

UMA FONTE DE
LUZ DE CADA LADO
As imagens do trabalho Female
Sculptures foram feitas em diversos locais
com esquema de estúdio, explica Marco
Antonio Perna. Inicialmente, diz que era
apenas um aprendizado numa temática
“de que todo fotógrafo gosta”. À medida
que o conhecimento crescia, percebeu
que estava montando um portfólio
respeitável sobre o tema e, em dado
momento, o trabalho poderia ser editado
em formato de livro.
O fotógrafo conta que o esquema
de iluminação foi um processo lento
de escolha de direcionamento de luz.
“Basicamente, a luz da maioria das fotos
é uma fonte de cada lado da modelo,
em ângulos e alturas diversas. Cerca
da metade delas foram com flash sem

A maioria das imagens


de Female Sculptures foi
realizada com uma fonte
de luz em cada lado da
modelo para conseguir
um alto contraste

24
Algumas modelos (acima e no Marco Antonio Perna
alto, à esq.) parecem ginastas, mas é fã do trabalho do
o fotógrafo garante que eram
mulheres com elasticidade nata fotógrafo russo Anton
Belovodchenko e não
modificador de luz. Posteriormente,
descobri que podia obter o mesmo
esconde que usou o
efeito com lâmpadas LED, embora trabalho dele como
a imagem não fique praticamente referência para seus
pronta na câmera como a feita
com flash. Mas a facilidade do LED
ensaios, mas não o
compensa muito”, afirma. copiou simplesmente
Apesar de gostar do efeito
que uma fonte de luz dá no estilo
low key (em que predomina o tom sua principal referência. “As
escuro e o alto contraste), ele usou poses dos ensaios que ele faz
duas fontes, o que foi um desafio. remetiam ao meu subconsciente
“Do início dos primeiros testes até a de dança. Resolvi fazer fotos
finalização do livro foram cerca de daquele jeito. Logo percebi que
dois anos e meio”, informa Perna, fã não tinha ginastas russas nem
confesso do trabalho do fotógrafo estúdio grande nem verba para
russo Anton Belovodchenko, grandes esquemas”, brinca.

Fotografe Melhor no 278 25


NU ARTÍSTICO
Fotos: Marco Antonio Perna

Todas as imagens dos ensaios foram aprovadas em comum acordo: fotógrafo e modelo tinham que gostar da foto

POSES INTROSPECTIVAS
Marco Antonio Perna comenta que cada “Algumas vinham para a sessão como se
mulher é um caso particular nos ensaios estivessem numa praia de nudismo, em
Cada e que os corpos são diferentes em todos outras dava para notar que havia alguma
mulher e cada os sentidos. “Algumas se adaptam melhor tensão. O que facilitou muito foi que várias
corpo são um em algumas poses, outras em outras. posavam com frequência para ensaios de
caso particular. Uma das modelos tinha uma elasticidade nu artístico, mas em outro estilo”, conta.
nata. Várias delas eram frequentadoras Ele faz questão de frisar que todas as
O fotógrafo assíduas de academia de ginástica, mas não fotos foram aprovadas em comum acordo.
precisa prestar eram ginastas”, garante. O estilo de pose “Envio a imagem para a modelo aprovar.
atenção a isso. escolhido, mais introspectivo na maioria, foi Tenho que gostar e ela também. Apenas
algo natural, contudo, depois ele percebeu duas preferiram não divulgar as fotos”,
Algumas são bem que sua experiência com dança influenciou diz Marco Antonio Perna, que continua
soltas, e outras, bastante na direção de cena. trabalhando como analista de sistemas (é
mais tensas Algo que ele aprendeu durante as funcionário público) e fazendo suas fotos
sessões de fotos é que o comportamento de dança, “em bailes ou shows à noite ou
Marco Antonio Perna das modelos também é muito diferente. no fim de semana, menos balé”, informa.

26 Fotografe Melhor no 278


RETRATO Fotos: Gabriel Wickbold

A arte de
empreender
As duas faces de Gabriel Wickbold, jovem fotógrafo e galerista paulistano
que vem chamando a atenção com trabalhos de grande impacto visual
POR ÉRICO ELIAS

C om 35 anos recém-completados,
Gabriel Wickbold é um dos
maiores fenômenos da
fotografia brasileira na atualidade. Em 2019,
ele já expôs em Portugal, Reino Unido e
no Brasil, Art Basel Miami, nos Estados
Unidos, e ESTe Art, no Uruguai.
Mas Wickbold, herdeiro da tradicional
fábrica de pães que leva o nome da família,
conta que se sente realizado mesmo é no
Emirados Árabes – onde foi escolhido como momento da criação. No trabalho que faz
um dos quatro homenageados no festival em estúdio, o corpo humano se transforma
Acima, imagem da Xposure. Fora isso, é dono de uma galeria em anteparo para experimentações
série Sexual Colors,
primeiro trabalho de (confira o box), na qual comercializa o seu e reflexões. Suas séries têm um forte
Wickbold realizado trabalho e o de fotógrafos estrangeiros. Essa impacto visual e, ao mesmo tempo, estão
em estúdio com segunda atividade o leva a ser presença estruturadas em torno de propostas
o uso de tintas constante em feiras de arte, como SP-Foto, conceituais – nada é gratuito, arte pela arte.

28 Fotografe Melhor no 278


Imagem da série
I Am Light, na qual
o rosto humano
se expande em
rastros de luz

estúdio
A marca de
Wickbold é a
criação de retratos
impactantes em
estúdio

Fotografe Melhor no 278 29


RETRATO

tintas
A utilização
de pigmentos e
outros materiais
transforma
as feições
humanas

Imagem da série Sexual


Colors, em que o rosto sofre
mutações inesperadas

30 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Gabriel Wickbold

Retrato realizado durante


viagem pelo Rio São
Francisco, que despertou
em Wickbold o sentimento
de realização como artista

DA POESIA À FOTOGRAFIA
Antes de descobrir na fotografia e descobriu um Brasil formado por
a realização plena, Gabriel Wickbold gente generosa e acolhedora, capaz
passou pela poesia e pela música. A de sorrir e bem receber mesmo em
poesia o despertou para a observação situações muito precárias. “Retornei
do mundo, enquanto a música trouxe dessa aventura transformado, triste de
a experiência da direção, já que ver as condições em que grande parte
ele atuou como produtor musical, dos brasileiros se encontrava, mas
conduzindo os músicos para a com uma fé na humanidade por sua
sonoridade desejada em cada caso. empatia”, recorda.
A grande transformação se deu O impacto da viagem fez com que
em 2006, quando ele partiu em uma Wickbold se reinventasse. O primeiro
viagem para percorrer o Rio São passo foi criar um estúdio de fotografia
Francisco da nascente à foz. Nesse no mesmo espaço em que mantinha
percurso, a fotografia deixou de ser o estúdio de música. Ali começaram as
hobby e passou ao primeiro plano. experiências, sempre como autodidata. Uma das fotos mais conhecidas da
“Me senti pela primeira vez realizado “Nunca fui assistente de fotógrafo. série Sexual Colors de Wickbold
como artista e entendi que ali poderia Simplesmente comecei. Foi na cara
mudar ou conduzir a forma com que e na coragem que fotografei moda, trabalho: a utilização de pigmentos para
as pessoas encaram a vida, me senti publicidade, retratos, e minha forma de a produção de retratos em estúdio. A
puro e verdadeiro, sem ter que fazer trabalhar os arquivos era diferente, as ideia de fazer um trabalho com tintas
o mínimo de esforço para aquilo fotos tinham uma textura minha, o que surgiu de um amigo. Logo na primeira
acontecer”, lembra. logo ficou como a minha assinatura sessão de fotos ele sentiu que se abria
A revelação se deu pela em estúdio”, comenta. ali um longo caminho para pesquisas
descoberta da fotografia como Depois de um ano aprendendo e experimentações, que culminou, em
ferramenta expressiva e, ao mesmo na prática e fazendo um pouco de 2009, com a série Sexual Colors, na qual
tempo, comunicativa. Wickbold entrou tudo, Wickbold se deparou com o que o rosto humano é usado como tela e
na casa das pessoas para fazer retratos seria uma das grandes marcas do seu sofre mutações inesperadas.

Fotografe Melhor no 278 31


RETRATO

Fotos: Gabriel Wickbold

Imagens da série
Sans Tache, na qual a
impressão fotográfica
HOMEM E NATUREZA
é violada pela ação
O trabalho de Gabriel Wickbold parece Para a série Naïve, de 2010, ele pintou
de grilos e pelo fogo
de um maçarico se desenvolver de maneira orgânica. Uma o rosto dos modelos com tinta branca e
série conduz a outra. Quando fotografava esperou secar para obter a textura desejada,
para a série Sexual Colors, reparou que para então sobrepor elementos colhidos na
a tinta guache secava e trincava, criando natureza, com um colorido peculiar. “Quis
superfícies áridas no corpo dos modelos. chamar o homem de Naïve, ou ingênuo,
Daí nasceu a ideia para uma série que trata por se achar superior à natureza. Coloquei-o
da relação do homem com a natureza. seco e sereno, cada cabeça buscando

32 Fotografe Melhor no 278


As pesquisas estéticas de
Gabriel Wickbold envolvem a
dimensão da performance, tanto
dos modelos com de outros
elementos que entram na obra

equilibrar-se com o elemento. A


natureza sempre acima do homem.
Aí entendi como construir uma
instalação humana”, constata.
As pesquisas estéticas de
Wickbold costumam envolver a
dimensão da performance. Em alguns
casos, não são somente os modelos
que participam da elaboração
material das obras. Como na série
Sans Tache, que em francês significa
“sem marcas”. A proposta inicial era
a de retratar o corpo humano em
sua beleza imaculada. Para tanto,
ele fotografou os modelos de corpo
inteiro sobre fundo negro. Imagens da série
Após imprimir as imagens em Naïve, contraponto
tamanho real, resolveu interferir entre o rosto humano
e elementos naturais
diretamente nas impressões e
passou a pesquisar técnicas de
envelhecimento de papel. Foi
então que descobriu a prática
da “grilagem”, que consiste
em envelhecer artificialmente
documentos forjados para
conseguir posse de uma
determinada área de terra.
Esse “envelhecimento” é
feito por meio da ação de grilos,
que estão na origem do termo
“grilagem”. Ao colocar papéis em
uma caixa fechada com grilos, os
insetos se alimentam do papel
e suas fezes e urina contêm um
elemento ácido que amarela e
corrói a superfície, dando uma
aparência de envelhecido.
Wickbold transpôs essa
prática para as obras da série Sans
Tache e incorporou ainda outro
procedimento, a queima do papel
com maçarico. E assim os corpos
imaculados emergem ao final
cheios de marcas e cicatrizes, que
simbolizam a ação do tempo.

Fotografe Melhor no 278 33


RETRATO

Quis fazer
uma crítica ao
vício de ficar
conectado o
tempo todo.
É como se a
pessoa estivesse
enrolada num
emaranhado
de linhas
Gabriel Wickbold

Imagem da série I Am
Online, uma crítica ao
vício em internet das
novas gerações digitais

SUFOCAMENTO E EXPLOSÃO
As séries mais recentes, I Am de inquietações acerca do vício com esse conceito de vida perfeita.
Online, de 2016, e I Am Light, de em tecnologia, redes sociais e Quis fazer uma crítica a tudo isso
2018, parecem se sustentar em informação. “A geração de nativos e me colocar na primeira pessoa.
princípios opostos. Na primeira há digitais tem muita dificuldade em se Digital, conectado e enrolado nesse
uma sensação de sufocamento, desconectar. Vivemos um paradoxo, emaranhado de linhas e conexões
causada por fios que envolvem os pois mentimos e somos enganados que nos sufoca”, explica.
rostos. Na segunda, há uma explosão constantemente nas redes sociais, Depois de viver intensamente
de luzes e os rostos parecem se nessa luta incessante por comer bem, essa série, Gabriel Wickbold
expandir e se desintegrar. viajar, ser bem-sucedido, bom pai e reservou um tempo para meditar
I Am Online nasceu a partir por aí vai. Começamos a sofrer muito e foi para um retiro espiritual.

34 Fotografe Melhor no 278


Fotógrafo e
empreendedor
A partir de 2015, o estúdio
de Gabriel Wickbold em São
Paulo (SP) se tornou também
galeria. Ele queria ter um espaço
para que colecionadores de
arte se encontrassem com os
artistas para dialogar. De lá para
cá, já acrescentou ao portfólio
a representação de quinze
fotógrafos estrangeiros de
renome no mercado internacional,
dentre eles David Yarrow, do Reino
Unido; Russell James, da Austrália;
Christy Lee Rogers; dos EUA;
Marius Sperlich, da Alemanha;
Sebastian Copeland, da França;
Marcel Van Luit, da Holanda;
Donald Boyd, da Islândia; e David
Ballam, da África do Sul.
Apesar do talento como
empreendedor, Wickbold
prefere os momentos de criação.
“Atualmente, o artista tem a
oportunidade de ser completo,
no Instagram ele faz a curadoria
das imagens, compõe os textos
que quer, fala com o público final
e pode facilmente realizar vendas.
Ficou muito mais fácil começar,
mas, pelo volume de imagens que
vemos todos os dias, também
ficou mais fácil se perder e difícil de
se destacar”, argumenta.
Ele conta que, sempre que
conversa com jovens fotógrafos,
tenta mostrar que é preciso ter
um corpo de trabalho coeso e
tempo para evoluir dentro da
temática escolhida. “Isso só vai
acontecer com o exercício diário
da fotografia, que é um trabalho
que só evolui com repetição. E,
para as imagens transcenderem,
elas precisam de um tema
por trás, uma pesquisa. Para
Fotos: Gabriel Wickbold

Imagem da série ser original, basta pensar que


I Am Light, na qual somos seres únicos e cada um
os modelos são tem sua forma de se conectar
tratados como criativamente. Pegar o caminho
“seres de luz” mais fácil e imitar o trabalho de
alguém só enaltece o original.
Não pegue esse caminho”, ensina.
“Como em um clarão, algumas fichas ele pintou os corpos de negro e os cobriu
caíram para mim. Entendi que nada de glitter. Por meio da combinação de
disso importa, nós somos um universo flash com luz contínua, conseguiu obter
de possibilidades, somos seres de luz. uma textura impressionante, que dissolve
E nossa missão como seres humanos é a luz refletida em diversos rastros ao
nos conectar profundamente com essa mesmo tempo que conserva as feições
energia, nosso propósito”, filosofa. humanas. “Considero que o resultado
Daí nasceram novas experimentações serviu também como uma forma de fechar
que desembocaram em I Am Light, série esse ciclo de 12 anos de trabalho. Entendi
na qual os retratados são representados que fotografar é mesmo pintar com a luz”,
como seres de luz. Para obter o resultado, define Gabriel Wickbold.

Fotografe Melhor no 278 35


MATÉRIA DE CAPA

Imagem captada
em Santo Antônio
do Pinhal (SP): o
uso da câmera no
modo manual é
imprescindível para
fazer fotos noturnas
Ricardo Takamura

36 Fotografe Melhor no 278


A magia de capturar
paisagens noturnas
Aprenda com quatro feras no assunto os segredos para
criar imagens incríveis em longa exposição e veja como
funciona o processo criativo de cada um deles
POR LIVIA CAPELI

A fotografia de paisagem noturna


pode oferecer resultados incríveis,
desde que se siga algumas regras
básicas. A primeira e mais importante de todas
consiste em ajustar uma baixa velocidade no
um assunto complexo e deve ser averiguado
com cuidado e paciência, pegando algumas
dicas de quem entende. Um tripé robusto com
cabeça rotativa, que dê bastante mobilidade,
é fundamental para a especialidade. E, fora
obturador da câmera (15s, 30s, 45s...) para o tripé, um disparador remoto, com ou sem
trabalhar com tempos de exposição mais longos fio, é outro quesito bastante recomendado
(algumas capturas chegam a uma ou mais horas por especialistas, pois colabora para efetuar o
de duração). Portanto, usar o modo manual é disparo sem mexer na câmera – pois qualquer
imprescindível. O passo seguinte é ter habilidade movimento produz vibrações que podem
para acertar o foco na escuridão e fazer uma prejudicar a nitidez da imagem.
boa composição da cena. Essa é a lição inicial de Quem não dispõe de um disparador, pode
quatro especialistas: o mineiro Cristiano Xavier, resolver parcialmente a situação usando o
o carioca Marcelo Portella, o paulista Ricardo temporizador da própria câmera. Mas esse
Takamura e o baiano-capixaba Victor Lima. recurso não permitirá exposições com mais
Na estrutura desses pilares básicos, um de 30 segundos (possível somente no modo
acessório é indispensável: o tripé. Cabe a ele B, de bulb). Vale lembrar ainda que é muito
garantir estabilidade para evitar a tremedeira importante desligar o estabilizador de imagem
durante os extensos tempos de exposição. Vale da objetiva enquanto estiver fotografando com
lembrar que não é qualquer tripé comprado a câmera montada no tripé. Isso evita que o
em lojinha popular que vai servir. Se você motor da estabilização provoque uma vibração
quer levar a sério a fotografia noturna, tripé é indesejada e atrapalhe a captura da cena.

Fotografe Melhor no 278 37


Cristiano Xavier
A ESSENCIAL
GRANDE ANGULAR
Com toda a tecnologia aplicada em angular de 14 mm a 16 mm com abertura
sistemas digitais, atualmente é possível máxima de f/2.8. Porém, aberturas mais
fotografar paisagem noturna com a maioria estreitas, como f/8, f/11, f/16, são muito
dos smartphones e câmeras compactas. Alguns utilizadas por quem é da área devido à maior
equipamentos, é claro, oferecem mais restrições profundidade de campo oferecida, que é
e podem apresentar mais ruídos na imagem do sinônimo de maior nitidez na imagem.
que outros. Entretanto, os especialistas defendem Em fotografia noturna, o foco automático
Acima, uma cena que é possível aproveitar sabiamente os recursos costuma não funcionar na maioria dos casos,
noturna que dá a de câmeras mirrorless e DSLRs mais simples pois simplesmente não existe iluminação
impressão de ter disponíveis no mercado, inclusive tirando proveito suficiente para o sistema encontrar um
sido realizada de
dia; abaixo, a luz das lentes que compõem os kits, como a zoom ponto de foco, ou seja, é um tiro no escuro.
artificial da kombi 18-55 mm, que tem boa cobertura angular. Mas existem alguns truques para driblar
inserida em cena Para ir além ao fotografar paisagens à esse problema. Um deles consiste em usar a
com vagalumes noite, a objetiva mais recomendada é a grande metragem do foco manual da lente, criando
uma estimativa da distância entre a câmera
e o local a ser focado no primeiro plano e
Ricardo Takamura

marcar essa distância no próprio anel de foco


da objetiva. Outro truque é iluminar o primeiro
plano com uma lanterna potente e aproveitar
essa iluminação para fazer o foco.
Pontos que não devem ser esquecidos:
fotografar sempre usando o formato RAW para
ter mais espaço de manobra nas altas e baixas
luzes ao ajustar o arquivo na pós-produção e
escolher o balanço de branco considerando a
presença de iluminação artificial na cena e o
estágio da Lua, que muda conforme passa a
noite (ao nascer, por exemplo, o astro emite
uma luz muito mais quente). Normalmente, um
valor assertivo está entre 3.500 e 5.000 Kelvin.

38 Fotografe Melhor no 278


tripé
A escolha
do modelo
deve ser sempre
por um modelo
profissional

Marcelo Portella
forte e leve

Aurora boreal registrada na


Islândia: a longa exposição
conferiu movimento às
nuvens e gerou efeito
cremoso nas cachoeiras

Fotografe Melhor no 278 39


MATÉRIA DE CAPA

Cena em que o
elemento humano e a
luz artificial integram a
paisagem noturna de
maneira harmônica

luzes
Flash, lanterna
e iluminador
LED podem ser
complementos
criativos à luz
Victor Lima

ambiente

40 Fotografe Melhor no 278


Marcelo Portella
O elemento humano
dá a dimensão
de escala para a
paisagem noturna

é estudar o ambiente
com calma e ter em
mente que elementos
em primeiro plano
tendem a aumentar a
ideia de profundidade.
Primeiro, pensar no
que deseja destacar
no primeiro plano,
depois compor com os
elementos do segundo
plano (caso haja) e, por
fim, harmonizar tudo
com o fundo, onde está
o horizonte.
Há muitas
possibilidades criativas
para fotografar
paisagens noturnas,
como poderá ser
O ELEMENTO observado nos
trabalhos de Cristiano

HUMANO NA CENA Xavier, Marcelo Portella, Ricardo


Takamura e Victor Lima, profissionais
especializados no assunto que
Algo que valoriza uma imagem de “pinta” a cena com luz. seguem diferentes linhas de trabalho.
paisagem noturna é a presença de um No enquadramento, é crucial Porém, com o mesmo propósito:
elemento humano. Isso ajuda a criar ficar atento aos elementos no fotografar belos cenários noturnos,
uma identificação com o espectador cenário para ter uma composição em que o céu e as estrelas merecem
e ainda cria a noção de espacialidade. harmoniosa. A dica dos especialistas especial atenção.
Por outro lado, o modelo deve ficar
imóvel durante toda a exposição, do
Cristiano Xavier

contrário não haverá nitidez.


Outro recurso usado por
quem é do segmento é levar flash,
lanterna potente ou iluminador de
LED para produzir efeitos criativos.
Mas é preciso cautela para não
exagerar. Sutileza acima de tudo para
harmonizar a luz desses acessórios
com a luz natural do ambiente. O uso
de lanterna, por exemplo, para fazer
light painting no primeiro plano, pode
gerar resultados muito interessantes.
Mas é preciso saber combinar
intensidade, movimento e duração
de exposição da luz da lanterna para
atingir o objetivo. Em casos assim, a
ajuda de um assistente é bem-vinda, Uso criativo do primeiro plano
pois permite que o fotógrafo controle e da mistura de luzes em foto
a câmera enquanto o assistente feita nos Lençóis Maranhenses

Fotografe Melhor no 278 41


MATÉRIA DE CAPA

Cabana de nativo
no Deserto de Gobi,
na Mongólia, como
primeiro plano para
a cena de céu estrelado

Fotos: Cristiano Xavier

42 Fotografe Melhor no 278


Imagem captada numa
fortificação no Irã: exemplo
de integração de luz
ambiente com luz artificial

O fotógrafo de
Minas Gerais
PINTURA COM LUZ: recomenda a
CRISTIANO XAVIER utilização de
flash e lanterna
Para o fotógrafo mineiro Cristiano fundo tem as estrelas no céu escuro. Dê a para “pintar” a
Xavier, o tópico mais interessante da sua contribuição criativa por meio da luz cena noturna,
fotografia noturna é aprender a fazer light artificial. Ao pintar a cena, o resultado será
painting na cena para obter um resultado mais rico e diferenciado”, ensina. misturando de
que vai além do simples registro em longa Atualmente, uma tendência na forma criativa
exposição. Xavier diz que quem deseja se fotografia de paisagem noturna, e que luz ambiente e
destacar no segmento precisa aprender a impressiona o observador, é incluir uma
trabalhar com as diversas possibilidades parte do cinturão de estrelas da Via luz artificial
da fotografia noturna usando a iluminação Láctea, a galáxia da qual o sistema solar
artificial. Ele, por exemplo, escolheu usar faz parte. Para isso, Xavier costuma usar
flashes para criar efeitos nas imagens que uma Canon EOS 5Ds com a objetiva
faz. Mas, para quem está começando, 14 mm f/2.8 (luminosa e com pouca
recomenda o uso de uma lanterna distorção). Ajusta ISO 3.200 ou 4.000, que
potente para realizar essas interferências. considera o suficiente, e alerta que acima
“A fotografia noturna é como uma tela em disso o nível de ruído é muito alto e pode
branco que podemos pintar com luz. O deteriorar a imagem, principalmente em

Fotografe Melhor no 278 43


MATÉRIA DE CAPA

astros
Para fotografar
o céu estrelado é
necessário saber ao
menos o básico
de astronomia

Fotos: Cristiano Xavier


Combinação de paisagem
noturna e light painting para
realçar a estranha vegetação
de deserto na Namíbia

Quem é ele câmeras mais simples. deve conhecer, no mínimo, as fases


Explica que o foco à noite é a parte mais da Lua, a posição das estrelas e da Via
Cristiano Xavier, 45 anos, crítica e dominar a técnica exige bastante Láctea. Aliás, é importante lembrar que a
é um veterano no segmento. prática. Se usar o autofoco é complexo, o Via Láctea tem uma grande diferença de
Fotógrafo desde 1997, está à foco manual também não é menos difícil, posição entre os dois hemisférios, o
frente da OneLapse Expedições visto que o fotógrafo está na escuridão, em norte e o sul.
ensinando alunos sobre técnicas lugares geralmente ermos, bem distantes Fora isso, o especialista diz que é
de fotografia noturna e light de cidades, com a melhor luminosidade preciso ter conhecimento avançado
painting em cenários como natural do céu possível. Portanto, o em aplicativos que são essenciais para
Mongólia, Noruega e Patagônia. primeiro desafio é encontrar algo no mostrar a posição da Via Láctea, assim
Premiado no Brasil e no exterior primeiro plano, como uma rocha ou uma como a hora que o Sol e a Lua nascem
em diversos concursos de árvore, para iluminar com uma lanterna e se põem. Por fim, soma-se ainda um
fotografia, é autor do livro Magna, forte e então fazer o foco automático. bom planejamento para ir até o ponto
publicado pela Vento Leste Assim que o sistema focar, desliga-se o escolhido e fazer as fotos.
Editora. Para saber mais, acesse: autofoco para realizar a captura. Xavier ensina que há ainda um ponto
www.cristianoxavier.com. Outro truque muito comum usado de partida de ajuste de câmera para ter
por ele é acionar o liveview da câmera resultados diferentes: se a ideia é um
e manualmente dar um zoom na tela, registro estático das estrelas, sugere um
tentando girar o anel de foco até ver o ISO de 3.200 ou um pouco mais com
pontinho da estrela bem focado, ou seja, uma lente luminosa (f/2.8). Já no caso
quanto menor o ponto (estrela), mais de buscar por imagens de estrelas em
focado, e quanto maior, mais desfocado. movimento (rastros), em que a exposição
pode ser de 1 hora ou mais, é importante
ENTENDER DE ASTRONOMIA usar um ISO abaixo de 3.200 para
Conhecer um pouco de astronomia é ter mais tempo de exposição e evitar
o pulo do gato para quem quer investir imagens superexpostas.
no assunto. Xavier indica que o fotógrafo Mas de nada adianta uma lista

44 Fotografe Melhor no 278


Acima, fotos feitas no
Deserto do Atacama, no
Chile; ao lado, imagem
realizada no Lago Mono, na
Califórnia, Estados Unidos

de técnicas se o fotógrafo
economizar justamente na base
da câmera, ou seja, no tripé.
Um acessório profissional, de
qualidade, pode ser fundamental
para gerar uma imagem nítida,
mantendo a câmera firme
durante a exposição. “Procure
investir em um feito com fibra de
carbono, que seja leve, fácil de
transportar e firme para suportar
qualquer vento, pois um pequeno
movimento em longa exposição
pode levar tudo por água abaixo.
Se tiver que escolher, fique com
o tripé pesado, mas que seja
firme”, explica.

45
MATÉRIA DE CAPA

estrelas
O registro do
rastro das estrelas
é um clássico
em paisagem
noturna

EXPERIMENTAÇÕES:
MARCELO PORTELLA
Marcelo Portella, profissional há 16
anos, leva a paixão pela fotografia noturna
tão a sério que modificou a própria Nikon
D800E para capturas de espectro completo.
Ou seja, mandou retirar um filtro interno
da câmera e tem feito experimentos com
astrofotografia e infravermelho para
ter efeitos de modificação de cores em
algumas imagens.
Gosta de produzir algumas imagens de
paisagem noturna fora do convencional,
como ter a luz da Lua como fonte de
Acima, rastros de iluminação de primeiro plano ou mesmo
luz deixados pelo usar um drone com duas lanternas de LED
deslocamento para ter o mesmo efeito. Ele conta que
das estrelas; ao aproveita as expedições fotográficas que
lado, uso de
light painting organiza para estimular principalmente a
para iluminar criatividade dos alunos.
as pedras no Além do equipamento personalizado,
primeiro plano Portella usa ainda duas outras Nikon, a D850

Fotografe Melhor no 278


Fotos: Marcelo Portella

Luz de lanterna foi


utilizada para destacar
a locomotiva em ruínas
no Salar de Uyuni, Bolívia

Fotografe Melhor no 278 47


Quem é ele
No comando da escola
Visual Arts Escola de Fotografia
e da Dreamscapes Expedições,
o fotógrafo e professor Marcelo
Portella, 54 anos, começou
na fotografia em 1998. Ele
cresceu em um ambiente
artístico, rodeado de telas
de pintura e livros de arte, e
desenvolveu um olhar apurado
para a fotografia. Fez cursos de
Artes Plásticas no MAM e no
Parque Lage, no Rio de Janeiro.
Portella viaja constantemente
para destinos exóticos mundo
afora para dar workshops ou
comandar expedições. Para
saber mais sobre ele, acesse:
www.dreamscapes.com.br.

e a D810 Nikon, com as lentes 14-24 mm a área de cobertura do celular e levar um


f/2.8 e 24-70 mm f/2.8. Porém, não é só no kit de emergência (pilhas e baterias extras
equipamento fotográfico que está a técnica. para lanterna e celular, comida, água,
Para ele, a fotografia de paisagem noturna remédios e proteção contra o frio). Manter
está diretamente relacionada em fazer um um plano “B” também é importante. “No
bom planejamento seguindo o que ele começo, pesquise imagens de outros
chama de “algumas etapas de ouro”. fotógrafos não para copiá-los, e sim para
Primeiramente, pesquisar o local a ser servir como fonte de informação, pesquisa
fotografado, estudando as maneiras de e inspiração”, ensina.
acesso e visitando o lugar durante o dia, o
que é primordial na visão dele. O uso de RECEITA SIMPLES
aplicativos como TPE, PhotoPill e Planit Pro Defensor da ideia de que é possível
são essenciais para visualizar o trajeto da fotografar a Via Láctea com qualquer
No começo, Via Láctea, do Sol e da Lua, assim como os equipamento, desde que se tenha um bom
horários que eles estarão visíveis. conhecimento sobre a técnica, entendendo
pesquise imagens Vale sempre consultar a previsão do os recursos e limites da câmera, Portella
de outros fotógrafos tempo para saber se é possível realizar a explica que registrar paisagens noturnas não
não para copiá-los, e foto planejada e que tipo de vestimenta é nada de outro mundo, basta seguir um
sim para servir como usar, pois em lugares de frio extremo é passo a passo simples.
necessário estar bem protegido. Outro Primeiro, montar a câmera em um bom
fonte de informação, passo é montar um checklist fotográfico tripé sobre uma área estável. Depois, ajustar
pesquisa e para não esquecer itens importantes. o modo manual e, em seguida, desligar
inspiração Outra dica de Portella é avisar sempre o sistema de estabilização da lente (se
alguém quando for sozinho fotografar em houver). Escolher o arquivo RAW para ter
Marcelo Portella algum lugar distante – além de verificar uma edição de melhor qualidade e usar uma

48 Fotografe Melhor no 278


Combinação criativa
do rastro das estrelas
com o rastro dos
faróis de automóveis

grande angular com o menor comprimento


focal (como uma 14 mm).
O tempo de exposição deve ser entre
Fotos: Marcelo Portella

15s e 30s, dependendo da luminosidade


da lente, e o ajuste deve ser mantido na
maior abertura possível (como f/2.8). O white
balance deve estar ajustado entre 3.500 e
4.500 Kelvin, diz ele. Para evitar que a câmera
trema no momento da captura, recomenda
disparar a câmera via cabo ou controle iluminada e depois passar para o manual Exemplo de rastro
remoto. Deve-se fazer um teste, conferindo para travar o foco antes do disparo”, explica. das estrelas em
que o primeiro
a composição da cena e o histograma da Outro método usado por Portella é fazer plano foi iluminado
imagem para evitar imagens subexpostas. o foco por meio da distância hiperfocal. De com a técnica
Como fazer foco na escuridão é uma uma forma bem simplificada, a distância de light paiting,
dúvida muito recorrente, o especialista hiperfocal é a distância de foco que oferece feito com lanterna
conta que, se houver um assunto em a melhor profundidade de campo, ou seja, a superpotente
primeiro plano, o foco deve ser feito nele, distância em que a maior parte da imagem
porém, quando o tema for apenas o céu, o estará nítida. Segundo ele, é possível
foco é feito no infinito (verifique a posição encontrar a distância hiperfocal necessária
correta na lente, pois isso varia de acordo usando uma Tabela DoF (Depth of Field) ou
com o modelo). “Uma maneira bem simples com algum aplicativo, como o PhotoPills,
de fazer o foco em ambientes muito muito mais prático e muito bem ilustrado.
escuros é iluminar o assunto em primeiro Isso permite que se trabalhe de forma mais
plano ou posicionar uma lanterna contra a precisa e prática, obtendo uma imagem
câmera, usar o sistema de autofoco na área nítida do primeiro plano até o fundo.

Fotografe Melhor no 278 49


MATÉRIA DE CAPA

A luminosidade
das grandes
EQUILÍBRIO DA LUZ:
aglomerações RICARDO TAKAMURA
urbanas causa Aprender a enxergar a tênue iluminação mais enxergar o céu estrelado como ele
um tipo de nas paisagens durante a noite e entender realmente é. Somos uma das últimas
poluição visual o que a câmera vai fazer com essa luz: gerações que têm a oportunidade de ver a
para Ricardo Takamura, esse é o principal Via Láctea. Acredito que em pouco tempo
que dificulta a segredo. Segundo ele, é necessário treinar ela será visível somente em áreas de vazio
observação do bastante os olhos para fotografar no escuro humano, como desertos, regiões gélidas
céu estrelado (o olho humano costuma levar cerca de 15 e no oceano”, explica ele, defendendo a
minutos para se adaptar à total escuridão). ideia de que a fotografia noturna é uma
tal como ele O exercício começa em desligar todo e maneira de documentar algo que está
realmente é qualquer tipo de luz, inclusive a da tela desaparecendo rapidamente.
do celular. Takamura lembra também que Para produzir imagens de paisagem
é bastante difícil fazer a composição em noturna com céu estrelado e driblar a
fotografia noturna – para ele, é literalmente poluição luminosa, é necessário ir cada
disparar no escuro. Portanto, planejar com vez mais longe das grandes, médias e até
antecedência, visitando as locações durante mesmo pequenas cidades. Além disso, o
o dia, é um ponto-chave nesse tipo de tema. brilho da Lua também costuma atrapalhar
A cada ano que passa, o céu fica bastante esse tipo de fotografia. Portanto,
Acima, a dinâmica mais oculto atrás de um manto de um dos segredos é fotografar em noites
do rastro das luminosidade. Isso é resultado da de Lua nova, ensina Takamura.
estrelas contrasta
com a solidez da poluição luminosa das grandes cidades, A receita fica ainda mais completa se
formação rochosa explica Takamura. “Atualmente já se juntar a isso uma noite sem nuvens, sem
de Analândia (SP) pode considerar o fato de que um terço poluição e com pouca umidade do ar.
em primeiro plano da população mundial não consegue Nem sempre é possível conseguir um céu

50 Fotografe Melhor no 278


Acima, antiga mina de lítio abandonada no Deserto do Atacama, no Chile; abaixo, uma paisagem rural em que a luz do
carro passando pela estrada permitiu criar rastros luminosos que conduzem o olhar em perspectiva e profundidade
Fotos: Ricardo Takamura

51
MATÉRIA DE CAPA

Quem é ele sem nuvens em uma noite de Lua nova,


porém, o especialista aconselha a jamais
Ricardo Takamura, 42 desistir: a dica é usar as nuvens para
anos, morador de São José dos compor as imagens.
Campos (SP), fotografa paisagens
noturnas desde 2012 – algo que SEM RECEITA PRONTA
chamava a atenção dele desde Para produzir imagens noturnas
criança, quando morava em de paisagens com estrelas, Ricardo
um condomínio rural, afastado Takamura informa que um bom ponto
da cidade, e podia observar de partida é começar com ISO 1.600,
as estrelas do quintal de casa. trabalhar com objetivas com a mais
Também desde cedo relaciona-se ampla abertura possível e usar o tempo
com a arte, pois ainda bem jovem de exposição próximo de 30 segundos. A
começou a pintar e a esculpir em partir daí, deve-se reconfigurar a câmera
madeira. Foi com uma câmera de acordo com a situação.
compacta com superzoom que Segundo ele, não existe uma receita
descobriu a longa exposição. pronta para todas as câmeras, cada
Para saber mais, acesse: equipamento tem um limite de ISO
www.ricardotakamura.com.br. diferente. O tempo de exposição também
varia conforme a objetiva. A dica então
é usar a regra dos 500: divida 500 pela
distância focal da lente que estiver usando.
O resultado vai ser o maior tempo de
exposição que poderá usar sem que as
estrelas risquem o céu. Com uma lente 50
mm, faça a conta: 500 dividido por 50 igual
a 10, ou seja, 10 segundos de exposição,
este é o tempo máximo para fotografar sem
que as estrelas saiam tremidas (riscadas), a é fazer o foco durante o dia e depois
não ser que seja essa a ideia, ensina ele. prender o anel de foco da lente com
Para o desafio de fazer foco perfeito, uma fita e aguardar pela noite. Há os que
Ricardo Takamura tem seus truques: costumam usar o marcador de infinito
Iban Mulero

“Costumo fazer o foco no modo manual da lente, mas, na minha opinião, isso
e usar algum ponto de luz distante, como nem sempre é confiável para fotografia
uma estrela mais brilhante. Outro truque noturna”, avalia Takamura.
Para produzir seus trabalhos, ele usa
uma Nikon D810 com a objetiva Nikkor
14-24 mm f/2.8 e uma Fuji XT3 com uma
Rokinon 12 mm f/2. Entretanto, explica
que com os avanços tecnológicos é
possível fotografar estrelas até mesmo
com alguns modelos de smartphone e
de câmera compacta.
Fazendo coro com os demais
especialistas, ele indica que um bom tripé
também é fundamental. Takamura sugere
os modelos robustos, pois quanto mais
pesados, mais estáveis. Por outro lado,
inviabilizam saídas que requerem longas
caminhadas. Na dúvida, o ideal é ter dois
de perfil profissional, um mais leve e outro
mais pesado – o fotógrafo usa
dois da Manfrotto, um do modelo
055xpro3 (pesa cerca de 2,5 kg) e um do
A escala de Bortle mede a luminosidade do céu noturno e permite modelo 190cx (1,3 kg), quando precisa
quantificar o nível de observação astronômica e de poluição luminosa fazer longas caminhadas.

52 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Ricardo Takamura
Acima, contraluz da Lua confere um efeito de dia; abaixo, exemplo de interação das luzes do céu com as da cidade

foco
Focalizar
bem a cena é
um dos grandes
dasafios de quem
fotografa
à noite

Fotografe Melhor no 278 53


MATÉRIA DE CAPA
lua
Ao refletir
a luz do Sol, a
Lua se transforma
na principal fonte
natural de luz
à noite

Contraluz da Lua
combinado com
longa exposição para
registrar as famosas
Torres del Paine, na
Patagônia chilena

54 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Victor Lima
DOCUMENTO E
ARTE: VICTOR LIMA
A fusão de imagens em fotografia de “Também faço fusões de fotografias com
paisagem noturna é um tema polêmico. a finalidade de decoração de ambientes,
Victor Lima diz que alguns puristas por exemplo, com a venda de impressões
descartam o aspecto artístico e não fine art. Normalmente, uso imagens feitas Acima, cena
admitem imagens que não sejam feitas em em horários anteriores ao anoitecer, em sob luz da Lua
apenas um clique. Mas, para ele, a fotografia que posso trabalhar com o ISO mais baixo no Deserto do
como expressão de arte não deve se e com isso obter menos ruído. Depois faço Atacama; abaixo,
Via Láctea captada
prender ao simples ato de documentação. O a mesclagem com imagens capturadas
em Mangue Seco,
correto é que o fotógrafo informe sempre o durante a noite, no mesmo lugar ou não, na Bahia, apesar
espectador sobre o que ele está vendo, ou via Photoshop”, diz ele, que também de certa poluição
seja, fotografia documental ou arte digital. explica que existem três tipos principais luminosa no local

55
MATÉRIA DE CAPA

Imagem noturna das


Lagunas Escondidas
de Baltinache, no
Deserto do Atacama

Fotos: Victor Lima


Quem é ele de técnicas de pós-produção de imagens “Considerando essa movimentação, cada
noturnas utilizando mais de uma imagem: lugar deve ser estudado para verificar em
Morador de Salvador (Bahia) stacking (empilhamento), blending que época do ano será viável a composição
e natural do Espírito Santo, Victor (combinação) e composite (composição). desejada”, explica.
Lima tem 44 anos e fotografa há No stacking se faz uma série de
quatro anos. Engenheiro civil de imagens da mesma cena, em sequência e BUSCAR CONHECIMENTO
formação, o fotógrafo autoditada no mesmo horário, sem alterar o frame, e Para iniciantes que querem se dedicar
comprou a primeira câmera depois há o empilhamento dessas imagens ao segmento, Victor Lima tem duas dicas
para registrar uma viagem e para a redução de ruído ou para simular principais: estudar conceitos básicos de
se apaixonou por fotografia de exposições mais longas. Já o blending é a fotografia e saber usar aplicativos para o
paisagens. Em 2015 inscreveu partir de duas imagens da mesma cena em planejamento das saídas para produzir
algumas imagens em um horários diferentes ou então no mesmo imagens. Ele defende a ideia de que,
concurso da National Geographic, horário, porém com exposições diferentes. independentemente do equipamento, o
que acabou escolhendo uma Em seguida, faz-se a combinação das duas fotógrafo que tem uma base sólida nos
foto dele para compor a capa da para ter uma imagem mais homogênea dois itens citados por ele conseguirá bons
edição especial de fim de ano da em relação à exposição do terreno e do resultados em registros noturnos.
NatGeo Traveler. Para conhecer céu. No composite não há regras: pode-se A quantidade de ruído em uma
mais sobre o trabalho dele, usar uma imagem feita na Itália durante o imagem capturada com pouca luz está
acesse: @victorlimaphoto. dia e combinar com uma imagem do céu diretamente relacionada com o ISO
noturno da Namíbia. ajustado, ou seja, quanto maior o ISO,
Ensina que sempre vale chegar durante maior a quantidade de ruído, diz Lima.
o dia para pensar no enquadramento e na Portanto, deve-se procurar sempre usar um
composição da cena. No início do ano, o maior tempo de exposição e um diafragma
núcleo da Via Láctea começa a aparecer mais aberto para ter um ISO mais baixo.
na linha do horizonte na direção sudeste, Imagens em que o fotógrafo usa luz
no céu noturno perto do amanhecer. artificial para iluminar o primeiro plano
À medida que o ano avança, ele vai ou em dias de Lua cheia, sem a intenção
começando a surgir mais cedo e percorre de capturar as estrelas, podem ser feitas
o céu girando em direção ao sudoeste. com ISO 800 ou ISO 1.600. Já imagens em
No final do ano, começa a aparecer situações sem iluminação artificial podem
junto ao horizonte na direção sudoeste. ser capturadas com ISO a partir de 3.200,
ruído
Quanto maior
a sensibilidade
ISO usada, maior
o risco de marcas
digitais na
imagem

indica ele. “Existe um modo de redução equipamento, usa uma Canon EOS 6D Deserto do Atacama e
Mangue Seco (abaixo):
de ruído de longa exposição que, quando com objetiva Canon 16-35 mm f/2.8, tripé
quanto mais isolado o
ativado, ajuda no controle de grãos. Manfrotto modelo 055XProb e lanternas lugar, menos poluição
Porém, ele duplica o tempo de captura, de mão e de cabeça. luminosa para atrapalhar
já que faz uma foto com o obturador
aberto e outra de mesma duração com o
obturador fechado”, explica o especialista.
Lima ressalta ainda que tais
recomendações levam em conta exposições
de no máximo 30 segundos em modo
manual. No caso de exposições maiores,
em modo B (bulb), o ideal é reduzir o ISO
na mesma proporção de f-stops (pontos de
exposição) em que se aumenta o tempo de
captura. Sobre o foco, ele recomenda usar o
modo manual, desligando o estabilizador de
imagem com a câmera no tripé para evitar
que o motor de estabilização provoque
vibração indesejada e atrapalhe a captura.
Victor Lima informa que seus locais
preferidos para fotografar ficam em
Mangue Seco (BA), Ilha Grande (RJ),
Fotos: Victor Lima

Monteiro Lobato (SP), Cambará do


Sul (RS), Chapada dos Veadeiros (GO),
Deserto do Atacama, no Chile, e nas
Patagônias argentina e chilena. Como

Fotografe Melhor no 278 57


FOTOJORNALISMO

Perto do fogo
Confira as dificuldades enfrentadas por fotógrafos na cobertura
das queimadas na Amazônia, que envolveu longas distâncias,
riscos, perigos, conexão precária e incursões em mata fechada
POR ÉRICO ELIAS

A cobertura de situações como a das


queimadas na Amazônia exige uma
logística fora do comum. Longas
distâncias, zonas de incêndio, locais em que o
poder público quase não chega, infraestrutura
O ponto de vista dos fotojornalistas se
complementa com o relato de Paulo Behar,
fotógrafo de natureza que realizou uma
expedição à região em parceria com Victor
Chahin (veja box). Todos os relatos coincidem
de estradas e internet deploráveis, dificuldades ao realçar duas sensações: tristeza e exaustão
das mais variadas fazem com que aqueles diante dos fatos que ocorreram entre os meses
que se planejam melhor consigam obter uma de agosto e setembro de 2019, levando o Brasil
vantagem competitiva. Três fotojornalistas que a ganhar páginas da imprensa internacional
se destacaram nessa cobertura contam como por um lamentável motivo: incêndios
foi o desafio: Gabriela Biló, da Agência Estado, que se alastravam em diversos pontos da
Ueslei Marcelino, da Agência Reuters, e Victor Amazônia, sobretudo no chamado “arco de
Moryiama, freelancer que cobriu a história para a desmatamento”, zona de expansão agrícola que
ONG Greenpeace e o jornal The New York Times. se estende desde o Acre até o Maranhão.

60 Fotografe Melhor no 278


perigos
Na cobertura
de queimadas
é preciso estar
muito atento às
mudanças do
vento

Victor Moriyama

Foto aérea de Victor


Moriyama dá uma
ideia da amplitude das
queimadas na Amazônia

Fotografe Melhor no 278 61


FOTOJORNALISMO

Longas
distâncias
a percorrer,
muitos focos LOGÍSTICA E
de incêndio,
estradas bem DESLOCAMENTO
precárias e “Em situações de crise ou risco, atingidas por focos de incêndio.
internet ruim: a logística tem que ser sua principal Marcelino passou 35 dias na região
preocupação. Se você não pensar e da Amazônia acompanhado do colega de
problemas que colocar um pé à frente das possíveis vídeo da Reuters, Leonardo Benassatto.
os fotógrafos situações, vai ter problemas maiores”, No primeiro período, eles fizeram idas
enfrentaram ensina Ueslei Marcelino. O planejamento e vindas com veículo 4 x 4 alugado em
se dá em grande medida antes da partida, Porto Velho. Rodaram pelo norte de
por meio de uma pesquisa prévia e da Rondônia, o sul do Amazonas, e foram
consulta a fontes que estão no local até o Acre para acompanhar um ritual
ou que conhecem em profundidade o indígena em defesa da floresta. Depois,
tema abordado. Todos os fotógrafos voaram até o Maranhão e foram para
entrevistados partiram de Porto Velho, a Terra Indígena Arariboia, próximo ao
capital de Rondônia, um dos locais de município de Amarante do Maranhão.
melhor infraestrutura entre as regiões mais Gabriela Biló viajou acompanhada

62 Fotografe Melhor no 278


Gabriela Biló/Agência Estado
Acima e à
esquerda, troncos
de árvores
consumidos
pelo fogo em
um cenário
de apocalipse,
segundo os
fotógrafos
Fotos: Ueslei Marcelino/Agência Reuters

do repórter de texto André Borges,


que conhece bem a Amazônia.
Foi ele quem programou o trajeto
percorrido. Os dois partiram
de Porto Velho e seguiram pela
Transamazônica, BR-230, passando
por Humaitá, Lábrea, Manicoré,
Santo Antônio do Matupi, Apuí
e Reserva Indígena Tenharim/ Em campo: acima,
Gabriela Biló/Agência Estado

Ueslei Marcelino
Marmelos, todas no sul do Amazonas. e Leonardo
O percurso foi feito em veículo Benassatto, da
comum, passando por estradas de Reuters; ao lado,
terra. “Infelizmente não tínhamos um Gabriela Biló e
carro 4 x 4, o que dificultou muito. André Borges, da
Nosso carro era alto, o que nos Agência Estado
salvou. Chegamos a atravessar um
rio com ele devido à precariedade
de uma ponte que, se passássemos
por ela, tínhamos a impressão de que

63
FOTOJORNALISMO

Ueslei Marcelino/Agência Reuters


Acima, vista aérea não suportaria o peso”, conta Biló. Acompanhado do guia, passou por
de madeireira Victor Moriyama fez os deslocamentos municípios no interior do Amazonas e de
próxima à BR-319, a partir de Porto Velho também em Rondônia, como Jaru, na terra indígena
no município de
Realidade (AM) veículo 4 x 4 alugado na cidade. Ele Uru-eu-wau-wau, e Guajará-Mirim, na
contratou um guia e um motorista local, fronteira com a Bolívia. Ele chegou no dia
fundamental para o sucesso da cobertura. 22 de agosto, quando a pauta começava
Gabriela Biló/Agência Estado
Victor Moriyama

Acima, o fotógrafo
Victor Moriyama; ao
lado, homem da brigada
contra incêndios na mata

64 Fotografe Melhor no 278


O olhar de fotógrafos
de natureza
Imagem aérea de
Victor Moriyama: Os fotógrafos de natureza
dificuldade de e vida selvagem Paulo Behar e
acesso aos focos de Victor Chahin também estiveram
incêndio demandou na Amazônia para registrar o
uso de avião impacto das queimadas. A partir
de Porto Velho, fizeram incursões
pelo interior de Rondônia, ao
longo da BR-364, e na Vila
Samuel, próxima à Floresta
Nacional do Jacundá.
Behar conta que as paisagens
da floresta em chamas ou em
cinzas são constantes na região.
Os madeireiros retiram primeiro
as árvores nobres e deixam
espaço aberto à ação dos
grileiros, que se apropriam da
terra, colocam fogo na floresta
ou passam o “correntão”, grossas
correntes presas a tratores para
deixar o terreno limpo e pronto
para virar pasto. A terra “limpa”
vale dez vezes mais do que a
terra coberta pela floresta.
“Durante nosso retorno
da Vila Samuel, passamos por

Victor Moriyama
quilômetros de pastos sem fim e
quantidades enormes de terras
improdutivas. São terrenos que
seguem na recuperação da
pastagem, para receber o gado
quando o pasto atingir a altura
a chamar a atenção da imprensa grande agência internacional, Marcelino já
adequada. Se a terra não for
internacional, e relata que em poucos dias passou por diversos cursos de segurança usada para boi, certamente será
a cidade foi “invadida” por jornalistas de para situações de risco. “Nós recebemos usada para a soja, alimentação
diversos veículos e agências. Da cidade treinamentos para cobrir ambientes básica do gado. Num país em
era possível ver no horizonte os focos de hostis quase todos os anos pela Reuters que o rebanho bovino chega
incêndio. Havia muita fumaça no ar. e aprendemos algumas coisas simples, a 215 milhões de cabeças,
Dadas as dificuldades de acesso por porém muito importantes, como manteremos o status de maior
terra e as grandes distâncias a percorrer, manter os pés secos, as botas limpas, se exportador mundial de carne ao
uma boa parte da cobertura foi feita hidratar com mais custo das florestas”, prevê Behar.
do ar, em sobrevoos realizados em regularidade, dormir
pequenos aviões Cessna. Moriyama conta assim que puder e
que o aeroclube de Porto Velho contava evitar o risco. Acabei
com uma empresa que serviu bem a toda fazendo isso quase
demanda, cobrando um valor de R$ 800 que de maneira
por hora de voo. militar, o que me
Já as aproximações dos focos de ajudou muito. O
incêndio, tanto por ar como por terra, desgaste físico das
exigiram muita atenção e prudência. caminhadas dentro
“O risco é real. O fogo vira rápido com da mata não foi
o vento e, se você não estiver bem brincadeira”, recorda.
posicionado, fica desorientado e preso
no incêndio”, explica Gabriela Biló, cuja
cobertura foi toda feita por terra. “Nas
aproximações por aeronave em áreas
de queimada ou garimpo, sempre pedia Caminhão carrega
para baixar um pouco mais e o piloto toras de madeira
próximo a Porto
me alertava até onde poderíamos ir em
Velho (RO), em
segurança, para não ter problemas”, foto captada por
relata Ueslei Marcelino. Paulo Behar durante
Por conta de trabalhar em uma expedição à região
Paulo Behar

Fotografe Melhor no 278 65


FOTOJORNALISMO

sujeira
Faz parte da
logística pensar
na limpeza do
equipamento
em situações
hostis

Cobra atravessa trecho


de mata completamente
destruído pelo fogo, próximo
a Porto Velho (RO)

EQUIPAMENTO E CONEXÃO
Marcelino levou equipamento equipamento”, lembra Marcelino.
fotográfico, notebook, um telefone Como fotógrafa da Agência Estado,
satelital, um terminal BGAN para transmitir Gabriela Biló não tinha os mesmos
fotos e textos de lugares remotos, e um recursos tecnológicos de transmissão
aparelho GPS, além de diversas baterias disponibilizados pela Reuters. “Um dos
extras, que serviam para recarregar o maiores desafios era a conexão. Do que
computador e os aparelhos, e um inversor adianta termos o material se não pudermos
de voltagem, que garantiu uma “tomada contar para o mundo o que está ocorrendo?
Em elétrica” no carro. Nas viagens por terra O computador não conectava nem com
situações de crise com 4 x 4 era necessário poupar ao reza, todo o material, texto, foto e vídeo,
ou risco, a máximo o veículo para evitar quebra. era enviado via WhatsApp em pequenas
logística tem que “Ao imaginar que poderíamos ter um cidades que encontrávamos, com bastante
problema com o carro, nos perder ou ter compressão e pouca resolução, tendo que
ser a principal que ficar mais tempo para registar alguma ser interpolada pelos profissionais do jornal
preocupação. É cena ou esperar uma luz mais bonita, para publicação”, relata Biló.
preciso se fizemos uma pequena dispensa com Como estava fazendo uma cobertura
alimentos básicos que nos ajudou nas mais “fria”, voltada principalmente para
programar para andanças. Também levamos combustível uma grande reportagem que o jornal The
evitar problemas extra. Algo que achei impressionante foi New York Times planejava publicar em
maiores a quantidade de sujeira que as lentes e novembro de 2019, Victor Moriyama podia
câmeras pegavam. Temos de estar ligados retornar à base em Porto Velho para, de lá,
Ueslei Marcelino também nesse aspecto, a limpeza do enviar o material. Moriyama conta que a

66 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Ueslei Marcelino/Agência Reuters

Gabriela Biló/Agência Estado

situação em campo era de fato catastrófica. os índios querem sobreviver da floresta e No alto, árvore cortada
“As imagens me lembram o Apocalipse, me o que ela oferece, a caça, os frutos, a água. em trecho destruído
lembram um pouco daquele filme Platoon, Por outro lado, há pessoas que não têm pela ação do fogo;
acima, um incêndio
com árvores pegando fogo em um cenário muitas oportunidades e acabam sendo consome a floresta na
de guerra. De fato, o que está acontecendo empregadas na derrubada da floresta para região sul do Amazonas
é uma guerra pela floresta. Por um lado, abrir novas fronteiras agrícolas”, analisa.

Fotografe Melhor no 278 67


FOTOJORNALISMO

Madeireiros ilegais
interceptados pelos índios
Guajajara, na Amazônia
maranhense: a cobertura
mais tensa já vivida por
Ueslei Marcelino

Os três
fotógrafos
entrevistados GUARDIÕES DA FLORESTA
estiveram em A cobertura dos três fotógrafos guiados por Antonio Teharim, integrante
áreas de reserva envolveu o contato com povos da tribo que estava desolado com as
indígenas, na busca de reportar o drama queimadas dentro da reserva. “Até onde
indígena para vivido por eles. Moriyama se embrenhou se via eram cinzas. Levamos quase duas
acompanhar pelas terras dos Uru-ue-wau-wau, em horas para chegar ao local de difícil
a luta pela Rondônia. Para chegar até a aldeia, teve acesso, cheio de areais, pontes quebradas
de caminhar por oito horas em mata e lamaçais. Uma vez lá, tive minutos para
preservação da fechada e chegou a ter um início de fazer a foto e retornar a algum local com
floresta em meio desidratação, que causou alucinações conexão para transmitir a tempo do
às queimadas leves. Dormiu por lá e acompanhou um fechamento do jornal impresso”, lembra.
grupo na abordagem de madeireiros Como havia ficado tarde, Antonio
ilegais. “Eles estavam armados de arco convidou-os a dormir na aldeia. “No dia
e flecha, preparados para o embate. seguinte, entendemos como era grande
Havia uma tensão no ar. Encontramos o impacto naquele povo, tanto que os
o local onde os madeireiros atuavam, próprios Tenharim se voluntariavam
mas não tinha ninguém. Eles queimaram para lutar contra o fogo na brigada do
os barracos, como de praxe, mas não Prev Fogo, do Ibama. Me marcou muito
houve conflito”, relata. o desespero, a tristeza e a vontade de
Gabriela Biló esteve na reserva ajudar desse povo”, recorda Biló.
Teharim/Marmelos, no Amazonas. Ela A história mais tensa foi vivida
e seu companheiro de cobertura foram por Ueslei Marcelino. Ele e Leonardo

68 Fotografe Melhor no 278


Fotos: Ueslei Marcelino/Agência Reuters

Acima, indígenas colocam fogo


em caminhão interceptado;
ao lado, Ronildo Alves,
funcionário de uma carvoaria
clandestina; abaixo, o líder
indígena Antonio Tenharin

Benassatto passaram sete dias


na Amazônia maranhense, para
registrar a ação dos Guajajara, na
reserva Arariboia. Eles criaram uma
brigada para proteger a floresta e

Victor Moriyama
fazem incursões pela mata na busca
de desbaratar a ação de invasores.
Assim, ao acompanhar uma ronda,
Marcelino viveu uma situação de
confronto, quando os indígenas
interceptaram três caminhões
Gabriela Biló/Agência Estado

com madeira explorada de forma


ilegal em suas terras. “Houve
troca de tiros na abordagem. Os
motoristas do caminhão fugiram
e um madeireiro foi capturado.
Depois, o madeireiro foi liberado e
os Guajajara voltaram para as aldeias
com mais uma missão realizada,
visivelmente cansados e aliviados por
estarem vivos. Nunca tinha vivido
algo tão intenso numa cobertura. Foi
realmente difícil”, recorda.

69
FOTOGRAFIA DOCUMENTAL

A luz que O veterano fotojornalista


Severino Silva, craque do hard

leva à fé
news, deixa a vida de redação
para se dedicar a um projeto
pessoal sobre a fé do brasileiro
POR ANDRÉ TEIXEIRA

R epórter fotográfico clássico, formado na escola do hard


news (muitas vezes, mais heavy do que hard), Severino
Silva surpreendeu o fotojornalismo carioca ao pedir as
contas no jornal O Dia, depois de quase 40 anos de uma carreira
consagrada. Aos amigos, espantados com a súbita decisão, se disse
insatisfeito com as condições de trabalho e, principalmente, com
vontade de se dedicar a projetos pessoais, mais elaborados. Alguns
dias depois, arrumou as malas – mais equipamento do que roupa – e
partiu para o Nordeste. Trocaria a rotina de retratar o duro cotidiano
da cidade do Rio de Janeiro pelo desafio de aprofundar Fé, Luz e
Sombras, trabalho documental sobre as manifestações religiosas
brasileiras, que há anos despertavam seu interesse.
Uma mudança dupla: da estabilidade de um emprego formal aos
altos e baixos da vida de freelancer e (talvez ainda mais difícil) uma
guinada na própria abordagem fotográfica, trocando o imediatismo
do trabalho diário pela paciente elaboração do documentarismo. Do
reflexo à reflexão, numa análise simplista mas não necessariamente
falsa. “A situação do jornal já não estava tão boa, com salários
atrasados, ameaça de mais cortes na equipe. Minha aposentadoria
tinha saído, resolvi que era hora de abrir espaço para os mais jovens
e desenvolver um projeto pessoal”, explica. Ele já vinha trabalhando
nesse tema em férias e folgas, mas precisava se dedicar mais.

70 Fotografe Melhor no 278


Pomba observa um
ritual de candomblé
no Parque dos
Orixás, na cidade do
Rio de Janeiro

Severino Silva

Fotografe Melhor no 278 71


FOTOGRAFIA DOCUMENTAL
Charretes que levam
fiéis ao Santuário de
Bom Jesus da Lapa,
na Bahia, levantam
poeira na estrada

Do setor de
limpeza do
jornal O Globo
para uma vaga
na equipe do
EXPERIÊNCIA A
diário O Dia,
Severino Silva
FAVOR DO OLHAR
Encarar riscos não é novidade para de O Dia, em 1992, e ali conseguiu um
dedicou-se esse paraibano de Pirpirituba, no agreste espaço que talvez não tivesse num veículo
muito para do Estado. Órfão de pai aos oito anos, de perfil menos popular.
aprender os chegou ao Rio de Janeiro com 11, com O jornal apostava alto na cobertura
a mãe, a avó e a irmã. Depois de rodar da violência carioca, uma realidade à
segredos da pela Baixada Fluminense, a família se qual ele, até hoje morando na mesma
profissão estabeleceu na Tavares Bastos, favela Tavares Bastos, já estava mais do que
encravada no bairro do Catete. Ainda acostumado e soube retratar como
adolescente, trabalhou em obras e no poucos. “Conheço os caminhos, as
comércio, enquanto alimentava o sonho regras de aproximação. Um ‘bom-dia’,
de ser fotógrafo – que começou a se ‘por favor’ e ‘obrigado’ ajudam muito”,
materializar quando conseguiu uma vaga ensina. A obstinação – “enquanto não
no setor de limpeza de O Globo. consigo a foto, não sossego”, garante – e
Insistente e disposto a aprender, em a capacidade de observação fazem parte
pouco tempo fazia os primeiros frilas para do pacote. “Com o tempo, você aprende
o próprio jornal, nas folgas do trabalho a antever situações”, avalia. Os prêmios
como fotógrafo industrial. Depois de obtidos na carreira (Tim Lopes, Vladimir
passagens por outros jornais, já como Herzog, Nikon e Líbero Badaró, entre
repórter fotográfico, entrou para a equipe outros) e a divulgação de suas fotos em

72 Fotografe Melhor no 278


Acima, romeiros rezam por uma graça de Padre Cícero em Juazeiro do Norte (CE) e, abaixo, fiel solitária faz oração em
Santa Brígida, Bahia, local de romaria para pedir a bênção do Beato Pedro Batista e de sua assistente Madrinha Dodô

Imagem de Padre
Cícero cultuada em
Juazeiro do Norte
Fotos: Severino Silva

livros e exposições provam que a Sergipe e Pará. “Antes de viajar,


receita funciona. busco contatos, pesquiso os locais
Com esses ingredientes à mão, e os deslocamentos. Procuro
Severino se lançou no desafio de, chegar alguns dias antes para ir
mais do que documentar a fé e a me habituando com a cidade,
religiosidade do brasileiro, retratar as pessoas, vendo os melhores
o cotidiano, os hábitos, os rostos e locais para as fotos, e também
as expressões. A primeira imersão para documentar a preparação
foi por Bahia, Pernambuco, Ceará, da festa, o envolvimento dos fiéis

Fotografe Melhor no 278 73


FOTOGRAFIA DOCUMENTAL

Procissão do Fogaréu, em
Pirenópolis (GO), e, mais
abaixo, a procissão de Corpus
Christi em São Cristovão (SE)

e seu cotidiano”, conta. Banca as


despesas do próprio bolso, num
investimento de retorno financeiro
no mínimo incerto. “Espero, pelo
menos, patrocínio para um livro ou
exposição”, comenta.
A Pirpirituba natal, para onde
nunca mais voltou, está nos planos
de viagem, mas não nos próximos
meses. “Perdi minha mãe há pouco
tempo, a presença dela ainda é
muito forte. Se for para lá agora,
planos não vou conseguir me concentrar
A ideia de no trabalho”, diz. Da pequena
Severino é ter cidade, guarda na memória uma
material para uma cena que despertou nele a vontade
de eternizar imagens. “Lembro
exposição e um
da minha avó varrendo a casa,
livro em breve que tinha piso de terra batida. A
luz do sol atravessava a poeira
que ela levantava. Achava lindo,
tentava desenhar, mas não ficava
muito bom. Acho que ali, mesmo
sem saber nada sobre fotografia,
comecei a virar fotógrafo”, imagina.
O tema, ele sabe, já foi muito
explorado. “Conheço e admiro
o trabalho do Tiago Santana, do
Fotos: Severino Silva

José Bassit, do João Machado e de


outros fotógrafos. A ideia é tentar
algo diferente, buscar detalhes,
uma aproximação maior com os
personagens, fazer experiências
com a luz”, explica. Para ele, a
experiência de repórter fotográfico
é valiosa, mesmo num trabalho de
longo prazo. “A gente mistura a
rapidez à capacidade de aguardar o
momento certo. Sabe se posicionar,
se relacionar com as pessoas, sente
quando a foto vai surgir. Acho que
uma abordagem fotojornalística
num projeto documental, num
assunto rico e variado como a
fé, pode ter um resultado muito
interessante”, avalia.

Imagem de Nossa Senhora


Aparecida presente na
Missa dos Vaqueiros, em
Serrita, Pernambuco

74 Fotografe Melhor no 278


VIDA DE FOTÓGRAFO

Eisenberg tem um
projeto dedicado a
fotos de bailarinas em
ambientes urbanos
Fotos: David Eisenberg

Olhar experiente,
alma de garoto
POR LIVIA CAPELI

Conheça
o trabalho
do divertido
D avid Eisenberg tem 66 anos e
não está nem aí para a idade.
O descolado senhor de cabelos
grisalhos parece se divertir muito na hora de
transmitir o que aprendeu ao longo de 46
da música e importantes políticos mexicanos
menos tensa e mais divertida. “Crie um
momento agradável para mostrar quem seu
fotografado é realmente por dentro”, ensina.
Ao longo da admirável carreira,
fotógrafo David anos de carreira. Tem uma alma jovem que Eisenberg marcou seu nome na moda
invade o estúdio e que o faz pular e fazer ao fotografar para marcas como Armani,
Eisenberg, graça para descontrair qualquer modelo Valentino e Hugo Boss. Também assinou
canadense travado que esteja diante de suas lentes.
Nascido em Toronto, Canadá, ele esteve
editoriais em publicações como Rolling
Stone, Poder, Día Siete, Tentaciones, Fox Sports
radicado no em São Paulo (SP) como uma das principais USA, Vogue, Líderes Mexicanos, Open e com
México que atrações do evento Zoom In Project, grande destaque para a revista Playboy,
promovido pela Canon do Brasil – do qual é versão latino-americana. Entre suas “vítimas”
esteve no Brasil embaixador da marca no México, país onde (como ele gosta de chamar seus modelos)
para evento passou a viver em 1972. estão Ringo Starr, Fidel Castro, Bill Gates,
É assim, com uma vibrante energia, que David Byrne, além de diversas celebridades
realizado pela David torna uma sessão fotográfica com mexicanas e vários nomes de peso da
Canon presidentes de grandes corporações, astros política e do mundo do espetáculo.

76 Fotografe Melhor no 278


versátil
A modelo mexicana Julia Dono de um
Orayen em ensaio feito estilo versátil, ele
para a revista Playboy, faz de retratos a
versão latino-americana ensaio de nu
e dança

Fotografe Melhor no 278 77


VIDA DE FOTÓGRAFO

Fotografar dança é uma


das paixões de Eisenberg,
que registra bailarinas CLIQUES E PROVOCAÇÕES
tanto fora como dentro
do seu estúdio (acima) A versatilidade do simpático 1996, a venezuelana Alicia Machado,
canadense-mexicano não se restringe a passou pelas lentes dele para um ensaio
fotografar apenas gente do alto escalão provocador, que, segundo Eisenberg, tinha
governamental, intelectual e artístico. Ele a intenção de cutucar o atual presidente
também é perito em fotografar dança, dos Estados Unidos, Donald Trump.
uma de suas grandes paixões, que faz A foto, que foi publicada na edição de
praias e cenários urbanos se tornarem outubro de 2007 da Playboy americana
palco para performances de bailarinos. e feita nas praias mexicanas de Huatulco,
Também é um especialista em clicar Oaxaca, mostra o corpo escultural da ex-
mulheres e não é à toa: fez ensaios de -miss e atualmente atriz de telenovelas
nu e sensualidade durante 12 anos para no México. Mas não foi bem assim que
a Playboy latino-americana. Foi em uma Trump enxergou Alicia em 1996, quando
dessas sessões que a Miss Universo de foi jurado do concurso realizado em Las
Vegas, EUA. Quando Alicia começou a
ganhar peso anos depois, desagradou
Retrato do músico David
Byrne, uma das celebridades ao atual presidente americano, que a
internacionais registradas chamou de Miss Piggy (miss porquinha)
por David Eisenberg e Miss Housekeeping (miss empregada

78 Fotografe Melhor no 278


Fotos: David Eisenberg

Acima, Alicia Machado


posa para ensaio sensual
publicado na Playboy; ao
lado, o “beatle” Ringo Starr

doméstica, por ser latina).


No estúdio dele na
Cidade do México, há sempre
muita música e diversão. Um
dos segredos de Eisenberg
está em chamar os modelos
para dançar, ou bailar, como
se diz em espanhol. Ele
afirma que dançar ajuda a
desinibir e deixa as pessoas
menos nervosas e mais livres
de si mesmas – é o que ele
busca fotografar: a essência
de cada um usando um
pouco de loucura e ousadia.

Fotografe Melhor no 278 79


Fotos: David Eisenberg
David Eisenberg
começou Don Juan Corono, pescador retratado por Eisenberg no estado de Nayarit, no México

fotografando
bebês e ATIVIDADE ATÉ EM
casamentos
até conseguir PROGRAMA DE TV
trabalhos nas Nos últimos anos, David Eisenberg Outro é um programa de TV chamado
áreas comercial se envolveu em três grandes projetos Shooting Hot com David Eisenberg,
e editorial, áreas autorais. Em Manos en el Tabaco, o fotógrafo transmitido pela emissora mexicana Total
documentou, durante quatro anos, a história Play e SHE Entertainment. E há ainda um
com as quais e os personagens da indústria do tabaco programa independente, disponível nos
se identificou de Cuba, o que lhe rendeu 25 exposições sites www.shootinglikearockstar.com e
no México e em diversos outros países. www.shootingwiththepros.com, em
que ele compartilha segredos e
experiências fotográficas.
A atriz mexicana Martha Ele começou o namoro com
Higareda em pose a fotografia aos 15 anos, depois
sensual para Eisenberg
que uma amiga pediu algumas
imagens ao estilo fashion, feitas
com a câmera Mamiya 500 TL
e alguns rolos de filme P&B do
pai dele. O primeiro trabalho
profissional foi com fotos de
bebês recém-nascidos para
bancar o curso de fotografia na
Universidade de Ryerson, em
Toronto. Depois de fotografar
1.280 bebês e concluir o curso,
ele foi para a área de fotos de
casamento, somando 235 no total.
Mesmo assim David ainda procurava
um caminho na fotografia.

80 Fotografe Melhor no 278


As atrações do Canon
Zoom In Project
Na segunda quinzena de
setembro de 2019, a Canon
promoveu pela primeira vez no
Brasil o evento Zoom In Project,
que nasceu em 2015 na Cidade do
México. Com entrada gratuita, foi
realizado no prédio da Bienal do
Ibirapuera, em São Paulo (SP), com
o objetivo de oferecer um dia inteiro
de experiências para o visitante.
O público pôde fazer retratos
em cenários montados por Araquém Alcântara se apresenta no palco do Canon Zoom In Project, em São Paulo
patrocinadores (a Editora Europa
marcou presença com uma capa
gigante de Fotografe), além de
imprimir arquivos nas impressoras
Canon, experimentar câmeras e
lentes da marca, ter acesso a
uma exposição exclusiva e
contar com serviço de limpeza e
verificação de câmeras e lentes
com preço especial.
Palestras ao vivo ocorreram
em três palcos distintos, montados
em pontos diferentes do espaço.
Cerca de 15 fotógrafos estavam
presentes para contar experiências
e dar dicas para os participantes do
evento. O palco principal, Photo
Talks, era o mais concorrido e só
acessado por portadores de uma
credencial especial. David Eisenberg
foi a grande atração internacional.
Depois, uma mesa de mulheres
fotógrafas, mediada por João Kulcsár,
e composta por Júlia Pontés, Camila
Fontineli e o coletivo YVY, promoveu Cenas do Canon Zoom In Project, realizado no prédio da Bienal, com a participação de
a discussão sobre a presença da fotógrafos renomados; Fotografe esteve presente com estande e capa gigante (abaixo)
mulher no mercado fotográfico. Em
seguida, veio Araquém Alcântara, a
atração mais esperada. Ele mostrou
fotos e recitou poemas, além de
anunciar o lançamento de mais um
livro. A programação foi fechada
com Bob Wolfenson, que falou sobre
sua carreira.
Paralelamente ao palco
principal com acesso restrito,
outros dois tiveram palestras de
fotógrafos como Alexandre Urch,
Roberta Tavares, Isis Lacombe,
Clício Barroso e Bel Ferreira.
Fotos: Livia Capeli

O evento global seguiu para


Santiago, no Chile, e ainda não
há confirmação se ocorrerá
novamente no Brasil.

Fotografe Melhor no 278 81


VIDA DE FOTÓGRAFO
Fotos: David Eisenberg

Acima, bailarina à beira-mar;


ao lado, ensaio com Romina
Gaetani, atriz argentina
radicada no México

fotográficas: um é o já falecido Don


Alejandro Robaina, um camponês
cubano mestre na produção
de charutos, de quem admiro a
sabedoria e gentileza, e o outro
é Bill Gates, pela sensibilidade,
humanidade e inteligência”, conta.
DIvulgação

David Eisenberg nasceu em


uma família onde o bem-estar da
comunidade é muito importante David Eisenberg durante o Canon
e cresceu vendo a mãe sempre Zoom In Project, em São Paulo (SP)
receber as pessoas com uma xícara
de café e muito calor humano. primeiros embaixadores da Canon
Aprendeu que a socialização é muito mexicana, e desde 2004 se apresenta
importante também no trabalho em conferências e seminários
de retratar pessoas. Explica que a promovidos nos eventos da Canon
maioria das “vítimas” chega tensa Day em mais de 60 universidades
ao estúdio. Por isso, é fundamental do México. Ele desabafa que o
que o profissional saiba técnicas profissional de fotografia, com a
de como relaxar o fotografado. exigência de se expor nas redes sociais
Foi então que ele conseguiu “Ofereça algo para beber, um café atualmente, se esquece de aproveitar
alguns trabalhos nas áreas editorial ou um drinque, talvez. Reserve meia o momento, de que é um artista
e comercial, e se apaixonou. hora para conversar, quebre o gelo, criativo, e não um competidor em
“A fotografia tem me dado o dê risadas, mostre como quer a foto busca de likes. “Temos que ajudar uns
privilégio de conhecer criaturas e faça o modelo pular junto com aos outros”, lembra. Para saber mais
extraordinárias. Na minha trajetória você”, esclarece sobre o que chama sobre o trabalho dele, acesse: www.
existem duas pessoas que marcaram de técnica de entusiasmo. portfolioeisenberg.photoshelter.com
momentos envolventes nas sessões O fotógrafo também foi um dos ou @davidseisenberg.

82 Fotografe Melhor no 278


EQUIPAMENTO
Modelo de ponta,
a Sony a9 II tem
battery pack e
opcional (esq.)

Fotos: Divulgação
Sony a9 II
chega com novidades
A Sony anunciou o
lançamento do modelo
profissional mirrorless
Alpha a9 II com uma atualização que
mantém muitas das especificações
de 693 pontos, cobre 93% da área
enquadrada e apresenta o mais
recente sistema de rastreamento
em tempo real da Sony. No quesito
sensibilidade, trabalha no intervalo
milhões de pontos, é móvel e ativado
por toque. A câmera ganhou também
um novo battery pack, com disparador
na vertical, que acomoda duas baterias
e agora oferece dois slots para cartão
principais do modelo anterior, de ISO 50 a 204.800, sendo SD (ambos suportam mídia UHS-
mas acrescenta capacidades possível salvar o arquivo em RAW -II), além de portas Gigabit Ethernet e
aprimoradas de conectividade e totalmente expandido e 14 bits USB 3.2, permitindo transferência de
fluxo de trabalho para fotógrafos não compactados. arquivos por FTP. O preço nos EUA é
profissionais e fotojornalistas, O corpo de liga de magnésio de US$ 4.500, só o corpo, com vendas
segundo a empresa. Com isso, ela é à prova de intempéries, possui previstas a partir de novembro de 2019.
recebeu um recurso interessante: o estabilização de imagem integrada em
Voice Memo. Esse recurso possibilita 5 eixos e oferece dois mostradores e
anexar arquivos de áudio às imagens, um joystick para selecionar um ponto
que podem ser reproduzidas pelos AF. O monitor de 3 polegadas tem 3,7
editores ao revisar envios dos
fotógrafos em campo.
A câmera tem sensor full frame
de 24 MP com perfil especial para
coberturas esportivas, já que tem
velocidade máxima de disparo
de 20 imagens por segundo
(ims). Essa rapidez é graças ao
obturador eletrônico, mas mesmo
com o obturador mecânico ela
não decepciona: atinge 10 ims. O Modelo tem sensor full frame
autofoco, com detecção de fase e corpo em liga de magnésio

86 Fotografe Melhor no 278


90D É A NOVA
DSLR DA CANON
Depois de lançar vários modelos Nova Canon EOS
mirrorless, compactas premium e 90D é uma DSLR
reflex digitais de entrada, a Canon intermediária com
finalmente anunciou uma DSLR sensor APS-C de
32,5 MP e grava
intermediária, que serve tanto ao vídeos em 4K 30p
público profissional quanto ao e full HD 120p
entusiasta: a EOS 90D. A substituta da
80D, de 2016, tem um novo sensor
APS-C CMOS de 32,5 megapixels
(fator de corte de 1,6x) assessorado foco automático
pelo processador de imagem DIGIC funcione até sob a
8. Um recurso interessante é a luz da lua, segundo
velocidade de disparo contínuo: até a Canon. Para
11 imagens por segundo. retratos, a 90D tem
Ela opera com sensibilidade autofoco de detecção de
ISO de 100 a 25.600 (expansível rosto e de detecção de olhos.
para 51. 200) e conta com o sistema Na parte traseira há um monitor 120p e oferece conectividade Wi-Fi e
AF Dual Pixel de 45 pontos para o sensível ao toque de 1,04 milhão Bluetooth. A EOS 90D é vendida nos
autofoco do tipo cruzado (100% de pontos que permite alterar EUA por US$ 1.199 (apenas para o
do quadro na vertical e 88% na configurações, selecionar pontos de corpo), US$ 1.349 em kit com a lente
horizontal). A faixa de trabalho foco e revisar imagens. Em vídeo, 18-55 mm IS STM e US$ 1.599 com a
vai até -3EV, permitindo que o pode gravar em 4K 30p e full HD 18-135 mm IS USM.

Fotografe Melhor no 278 87


EQUIPAMENTO
Nikkor 58 mm f/0.95
montada no corpo de um
Z7: modelo amplia linha
de lentes para mirrorless

A Nikkor Z 58 mm LENTE SUPERLUMINOSA


f/0.95 Noct é a
objetiva mais
DA NIKON SURPREENDE
luminosa já A Nikon provocou surpresa ao para as mãos do cineasta Stanley Kubrick
produzida pela lançar a objetiva Nikkor Z 58 mm f/0.95 (1928-1999). Isso permitiu a Kubrick
Noct, modelo desenhado para câmeras filmar uma cena iluminada apenas
Nikon e funciona mirrorless da série Z. Assim que surgiram a luz de velas no filme Barry Lyndon
somente com as os rumores sobre o lançamento, (1975), ganhador do Oscar de melhor
mirrorless da muitas especulações circularam nos fotografia na ocasião. Já no mercado de
bastidores, até que a marca anunciasse hoje apenas a Leica tem uma lente tão
nova série Z as especificações completas. A abertura luminosa como a da Nikon, a Noctilux-M
máxima de f/0.95 a transforma na lente 50 mm f/0.95, vendida por US$ 11.300.
mais luminosa já fabricada pela Nikon. A nova Nikkor Z 58 mm f/0.95 Noct
Ela conta com 17 elementos pesa dois quilos e tem distância mínima
dispostos em 10 grupos, sendo de foco de 50 cm (magnificação de
três elementos asféricos. O 0,19x). Construída em liga de magnésio,
revestimento de Nano Crystal chega ao mercado dos EUA pela
reduz os efeitos de reflexos e “bagatela” de US$ 8 mil.
contraluz, segundo a Nikon.
Já o nome Noct indica que foi
desenvolvido especialmente
para a fotografia noturna.
Segundo a Nikon, ela é capaz
de reproduzir a luz com igual
intensidade ao longo de todo
o enquadramento.
A lente mais luminosa
produzida até hoje é a Carl Zeiss
Planar 50 mm f/0.7, criada em
1966 para a Nasa fazer imagens
do lado mais distante da Lua.
Somente dez exemplares foram
fabricados e quatro deles foram
Fotos: Divulgação

Nova lente da Nikon é


tão exclusiva que vem
em um estojo feito
especialmente para ela

88 Fotografe Melhor no 278


NIKON LANÇA
MIRRORLESS Z50
A Nikon lançou a Z50, primeiro
modelo de mirrorless da marca com
sensor de formato DX (tamanho
APS-C com fator de corte de 1,5x)
de 21 megapixels de resolução.
Diferentemente dos modelos Z6 e Z7,
a Z50 não conta com estabilização
de imagem no próprio sensor. Vem
com monitor sensível ao toque de 3,2
polegadas articulado na parte inferior, o
que facilita na hora de fazer selfies. Além
disso, conta com visor digital OLED de não oferece saída para fone
2,36 milhões de pontos. de ouvido. Com a Z50 foram
A Z50 é desenhada para objetivas lançadas as objetivas Nikkor Z DX
de baioneta Z, oferece disparo contínuo 16-50 mm f/3.5-6.3 VR e Nikkor Z
de até 11 imagens por segundo e foco DX 50-250 mm f/4.5-6.3 VR, ambas
automático contínuo. Grava vídeos em 4K com estabilização de imagem. O modelo
30p e full HD 120p, conta com conexão chega ao mercado dos EUA custando
Micro USB, para carregamento da bateria US$ 860, apenas o corpo, US$ 1.000, O monitor articulado de
EN-EL25, sem retirá-la da câmera, e tem com a 16-50 mm, e US$ 1.350, no kit 3,2 polegadas da Z50 é
entrada para microfone externo, porém com as duas objetivas. sensível ao toque

Fotografe Melhor no 278 89

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