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Os Pais da Igreja Cristã

Quando lemos o livro dos Actos dos Apóstolos, aprendemos que as as decisões dos
seguidores de Yeshua, eram tomadas de uma forma democrática (Actos 1:21-26; 6:5-6; 15:25).

Não havia um líder que impusesse unilateralmente a sua vontade, mas sim líderes que
decidiam em conjunto em Jerusalém. Como tal, o modelo instituído por Inácio de Antioquia
(que consistia na concentração de poder na mão de um homem) é totalmente antibíblico.

Inácio acabou por usurpar a autoridade dos apóstolos e obteve o poder entre os gentios,
estimulando outros bispos gentios a fazer o mesmo. Assim, a rebelião de Inácio, estabeleceu
uma divisão entre a seita dos nazarenos, que eram os primeiros seguidores do Messias
Yeshua, e os novos cristãos.

Actualmente, muitos pastores evangélicos, movidos pela ganância e rebeldia, criam cisões nas
suas igrejas, e levam consigo uma grande parte dos crentes para uma nova denominação por
eles instituída. Foi exactamente isso que fez Inácio: promoveu uma rebelião e atraiu para si os
gentios, determinando que se afastassem dos crentes nazarenos, que tinham sucedido aos
apóstolos.

Yeshua, e os apóstolos advertiram que apareceriam falsos profetas, e um falso profeta,


segundo as Sagradas Escrituras, é aquele que fala em oposição à Torá do Eterno (Isaías 8:20).
De facto, Inácio foi um falso profeta, na medida em que ensinou que a Torá foi abolida:

“Mas se alguém vos ensinar a Lei Judaica [a Torá], não lhe dêem ouvidos…” Carta de Inácio
aos  Filipenses 2:6

  “Não sejam enganados por doutrinas estranhas; nem por fábulas antigas sem valor. Pois se
continuarmos a viver conforme a Lei Judaica [a Torá], estamos confessando que não recebemos
a graça...” Carta de Inácio aos Magnésios 3:1

Outro esquema diabólico que foi engendrado por Inácio foi a substituição do Shabat (Sábado)
pelo Domingo. Segundo as Escrituras, o Shabat foi instituído desde a criação (Génesis 2:1-3), e
a sua importância é tal, que foi um dos mandamentos gravados pelo dedo do Eterno em tábuas
de pedra (Êxodo 20:8-11 e Deuteronómio 5:12-15).

O shabat é sinal da aliança entre o Eterno e o seu povo (Êxodo 31:15-17 e Ezequiel 20:12), sendo
bem claro que o gentio deve observar o Shabat (Êxodo 20:8-11 e Isaías 56:3-7). Yeshua
guardava o shabat como era seu costume (Lucas 4:14-16; Marcos 6:1-2; Lucas 6:6; 13:10). De
igual modo, os discípulos de Yeshua e os apóstolos cumpriam o mandamento do Shabat,
mesmo após a morte de Yeshua (Actos 13:14; 43-44; 16:13; 17:2).

Desvinculando-se daquilo que as Sagradas Escrituras ensinam, Inácio substitui o Sábado pelo
Domingo:

  “...não mais observem os sábados, mas observem o dia do Senhor [o domingo], no qual também
a nossa vida floresce Nele, através da Sua morte...” Carta de Inácio aos Magnésios 3:3.

“Portanto, não precisamos mais manter o sábado, como fazem os judeus...” (Carta de Inácio aos
Magnésios 4:9).

“Aqueles que viviam na antiga ordem de coisas chegaram à nova esperança, e não observam
mais o sábado, mas o dia do Senhor, em que a nossa vida se levantou por meio dele e da sua
morte. Alguns negam isso, mas é por meio desse mistério que recebemos a fé e no qual
perseveramos para ser discípulos de Jesus Cristo, nosso único Mestre” (Carta aos Magnésios
9:1).

Atentemos bem para a jogada diabólica levada a cabo por Inácio. Primeiro usurpou a
autoridade dos verdadeiros seguidores de Yeshua; depois, afirma que os fiéis deveriam
obedecer aos respectivos Bispos locais, sendo que ele mesmo era o Bispo de Antioquia.

Seguidamente, decreta que a Torá dada pelo Eterno foi anulada; e como tal, os homens agora
não deveriam mais obedecer aos preceitos da Lei/Torá, mas sim aos mandamentos do Bispo.
Consequentemente Inácio revoga o Shabat e substitui-o pelo Domingo.

O golpe fatal do “Santo” Inácio foi a criação de uma nova religião, distinta da fé messiânica, que
passou a chamar-se “Cristianismo”. Surge, então, pela primeira vez as expressões “Cristãos” e
“Cristianismo” para designar esta nova religião:

“Vamos, portanto, aprender a viver conforme as regras do Cristianismo, pois quem quer que seja
chamado por qualquer outro nome além desse, esse não é de Deus...”.

“É absurdo nomear Jesus Cristo e judaizar. Pois a religião cristã não abraçou a judaica. Mas a
judaica abraçou a cristã...” (Carta de Inácio aos Magnésios 3:8,11)

“Permanecei em Cristo e o estranho não obterá o domínio sobre vós. É absurdo professar Jesus
Cristo com a língua e cultivar na mente o Judaísmo, que agora chegou ao fim. Onde está o
Cristianismo não pode estar o Judaísmo... (Carta de Inácio aos Magnésios 4:10)

A Bíblia é por si só suficientemente enfática para perceber que Yeshua não criou uma nova
religião, mas tão somente ensinou a fé original à luz das Escrituras. De modo totalmente
contrário às lições do Messias, Inácio de Antioquia instituiu uma nova religião, o Cristianismo, e
colocou de lado a fé original de Yeshua e os seus primeiros discípulos. Estava aberto o
caminho para a fundação do Catolicismo Romano. Eis as palavras de Inácio:

“Onde está Cristo Jesus, está a Igreja Católica” (Epístola aos Esmirniotas 8:2).

“Roma preside a Igreja na caridade.” (Carta aos Romanos, Prólogo).

Resumem-se os principais ensinamentos antibíblicos de Inácio de Antioquia nos seguintes


tópicos:

1) Concentração do poder nas mãos de um só homem, o que posteriormente veio a abalizar o


poder do Papa. Hoje, o Cristianismo ainda permanece com esta ditadura eclesiástica, inclusive
no meio evangélico, em que as ordens do Pastor devem ser obedecidas cegamente.

2) Decretação de que a Torá (“Lei”) do Eterno Deus foi abolida. É lastimável que a maioria dos
cristãos acredite que a “Lei” acabou. Por outro lado, não menos lastimável é o fato de que
muitos líderes judaico-messiânicos, influenciados pelas deturpações rabínicas, afirmam
incorrectamente que a Torá vigora apenas para os judeus, sendo facultativa aos gentios, que
devem observar apenas as sete leis noéticas.

Em verdade, Deus não faz acepção de pessoas, donde se conclui que a Torá se aplica
integralmente aos judeus e aos gentios (Êxodo 20:8-11; Exodo 12:49; Números 9:14, 15:15-16;
Levítico 16:29, 24:22; Romanos 11 e Efésios 2).
Devem os gentios começar a cumprir regras mínimas, tal como costa em Actos 15, porém, a
cada shabat (sábado) devem aprender mais mandamentos contidos na Torá (Actos 15:19-21).

3) Substituição ilegal do shabat (sábado) pelo domingo.

4) Criação de uma nova religião, o Cristianismo, no lugar da fé original ensinada por Yeshua e
vivenciada pelos seus discípulos.

Assim, já no final do primeiro século e início do segundo, Inácio de Antioquia cumpriu a profecia
de Paulo acerca da apostasia que se instalaria. O Cristianismo, nova religião criada com
alicerces antibíblicos, iria avançar e substituir a fé original pregada por Yeshua e praticada
pelos seus primeiros discípulos.

Aconselhamos o leitor a pesquisar mais sobre Inácio e outros chamados “Pais da Igreja” e
saiba porque as Igrejas são tão diferentes do modelo que vemos no livro de Actos dos
Apóstolos.

MARCIÃO: AS HERESIAS CONTINUAM!

Após a rebelião de Inácio, a expansão do Cristianismo contou com outro nocivo ingrediente
implementado por Marcião de Sínope (85 a 160 D.C), um influente bispo do Cristianismo
primitivo.

Enquanto os primeiros seguidores de Yeshua usavam o Tanach (Primeiras Escrituras,


vulgarmente conhecidas como Antigo Testamento) e os Escritos Apostólicos (vulgarmente
conhecidos como Novo Testamento), considerando todas as Escrituras como uma unidade e
sem a existência de hierarquia de uma sobre a outra, Marcião foi o primeiro a inventar os
termos “Velho Testamento” e “Novo Testamento”, expressões estas que não existem na Bíblia.

Marcião cria na existência de dois deuses distintos, ensinando que o “Velho Testamento”
revelou um deus mau, que seria o deus dos judeus; e no “Novo Testamento” se manifestou um
deus bom. Na sua mente gnóstica, o deus de Jesus seria diferente do deus dos judeus. O
pensador pagão preconizou um sistema dualista para explicar as supostas “contradições”
entre o “Velho” e o “Novo Testamento”. Para justificar a existência de dois deuses, Marcião
interpretou as Escrituras de maneira totalmente incorrecta. Vejamos alguns exemplos:

a) Disse Marcião que o deus mau dos judeus ensinou “olho por olho”, enquanto o deus bom de
Jesus ensinou o “amor”. Este conceito é erróneo, visto que “olho por olho” não significa
literalmente arrancar o olho de uma pessoa, mas sim o dever de indemnizar um dano causado
a outrém em valor proporcional à ofensa. Além disso, no Tanach (Primeiras Escrituras/“Antigo
Testamento”), O Todo-Poderoso ordenou o amor ao próximo: “amem o próximo como a vocês
mesmos” e “amem-no como a si mesmos” (Levítico 19:18 e 34). Logo, o amor de YHWH não
surgiu com Yeshua. YHWH sempre foi amoroso.

b) Alegou Marcião que o deus do “Velho Testamento” incentivava o divórcio e o adultério, e o


deus do “Novo Testamento” os proibiu. Outro equívoco crasso de Marcião. Yeshua ensinou que
o divórcio foi dado pela dureza dos corações humanos (Mateus 19:8), e a própria Torá diz que o
homem se unirá à sua mulher (palavra no singular, ou seja, apenas uma mulher) e ambos serão
uma só carne (Génesis 2:24). Deuteronómio igualmente afirma que não deveriam ser
multiplicadas as esposas  (Deuteronómio 17:17). Em suma, a Torá nunca estimulou o divórcio e
sempre abominou o adultério.

c) Sustentou que o deus do “Velho Testamento” não era omnisciente, porque perguntou para
Adão: “onde estás?” (Génesis 3:9). Esqueceu-se Marcião que YWHW é tão misericordioso que
fez esta pergunta para possibilitar a Adão e à sua mulher que se arrependessem de seus
pecados, confessando-os.

d) O deus do “Velho Testamento”, prossegue Marcião, é um deus de vingança, crueldade e ódio;


e o deus de Jesus é bondoso e amoroso. Não percebeu Marcião que YHWH não muda e
sempre exteriorizou o seu amor e a sua justiça para com todos os homens. Em hebraico, a
palavra “chessed” (graça) aparece mais de 240 vezes no Tanach (Primeiras Escrituras) e o
próprio perdão liberado pelo Eterno ao povo de Israel, após o episódio idólatra do bezerro de
ouro, demonstra o seu grande amor.

Por outro lado, no “Novo Testamento”, Ananias e Safira foram exterminados por Deus (Actos
5:1-11),  o que demonstra que mesmo após Yeshua a justiça de YHWH continua a operar. Em
suma, em todas as época da história Deus agiu com justiça e com misericórdia, aplicando uma
ou outra de acordo com sua infinita sabedoria.

5) Na visão do Marcionismo, Yeshua foi enviado pelo Deus Pai (o deus bom) para superar o
deus mau. Este conceito é tão absurdo que dispensa maiores comentários.

6) Explicava Marcião que o deus do “Antigo Testamento” criou o mundo material para alastrar o
mal, tornando-se a divindade dos judeus. Este deus perverso outorgou a Lei (Torá) com o
objectivo de promover uma justiça legalista que punisse severamente os homens pelos seus
pecados com sofrimento e morte. O deus de Jesus derrubou a Lei, olhando a humanidade com
compaixão e piedade. Outra grande heresia de Marcião! Yeshua afirmou que não veio revogar a
Torá/Lei (Mateus 5:17)  e Paulo considerou a Torá santa, justa e boa (Romanos 7:12), chegando
a dizer: “Segue-se então que abolimos a Lei por meio da fé? De maneira nenhuma! Ao contrário,
confirmamos a Lei” (Romanos 3:31).

7) Para distinguir a obra do deus amoroso em relação ao deus cruel, Marcião dividiu as
Escrituras em “Velho Testamento” e “Novo Testamento”. Ora, quem lê a Bíblia em hebraico
sabe que não existe a palavra “testamento”. A bem da verdade, o profeta Jeremias usa a
expressão “B’rit Chadashá”, que significa Aliança Renovada (ou “Nova Aliança”) –Jeremias
31:31-34).

Com base nestes textos do profeta referido, deduz-se que Yeshua veio para escrever a Torá no
coração de seus discípulos. Assim, o correcto é usar a nomenclatura judaica:

1) Tanach (Primeiras Escrituras, isto é, aquelas anteriores a Yeshua)

2) B’rit Chadashá (Aliança Renovada ou “Nova Aliança”) ou, como preferem alguns, "Escritos
Apostólicos", que são os escritos posteriores a Yeshua. Daí que o Tanach e a Brit Chadashá em
conjunto foram o que conhecemos como Bíblia, inexistindo superioridade de um sobre o outro.

8) Seguindo a linha de Inácio de Antioquia, Marcião afirmou que o Cristianismo era distinto e
oposto ao Judaísmo. Marcião atraiu um grande número de seguidores e, após ser
excomungado da Igreja de Roma, erigiu uma comunidade independente. A Igreja de Marcião se
expandiu com extrema força, alcançando multidão de pessoas, e devemos destacar que o seu
movimento perdurou por muitos séculos. Numerosos gentios se agarraram a Marcião, fugindo
do “deus mau” dos judeus, o Criador dos céus e da terra para a crueldade. O ódio pelos
israelitas, incluindo-se os primeiros discípulos, ganhou um novo propulsor.

Policarpo, que foi discípulo de João, chamou Marcião de “primogénito de Satanás”.


Lamentavelmente, o Cristianismo adoptou inúmeras heresias do bispo gnóstico. Além disso, a
teologia cristã lançou as sementes do Marcionismo e colheu heresias ainda maiores. Até hoje o
Cristianismo, na sua quase totalidade, ensina as teses antibíblicas iniciadas por Marcião:

a) “a Lei foi abolida por Cristo”;


b) “a Igreja substitui Israel nos planos de Deus”;
c) “existe uma separação entre ‘Velho’ e ‘Novo Testamento’”.

Milhares de pastores no mundo inteiro, discípulos indirectos do gnosticismo de Marcião,


ensinam para os membros de suas Igrejas: “vocês não precisam cumprir isto ou aquilo, porque
são mandamentos do ‘Velho Testamento'". Todavia são esses mesmos pastores que cobram os
dízimos (preceito da Lei), instituídos pelo “Antigo Testamento”. Que perversão! Para lucrar com
os dízimos, o “Velho Testamento” é válido, mas para cumprir a vontade do Altíssimo, pregam
os pastores: “o Velho Testamento está ultrapassado, anulado, abolido”.

No seio do Cristianismo, existe uma doutrina maligna que foi influenciada directa ou
indirectamente pelo Marcionismo: a Teologia da Substituição.

Defende a Teologia da Substituição a tese de que no “Novo Testamento” os cristãos


substituíram os israelitas nas promessas feitas por Deus. Afirma que os judeus negaram
Yeshua e, por isso, foram rejeitados por Deus, que elegeu a Igreja para ocupar o lugar que antes
pertencia ao povo de Israel. Esta teologia ensina:

1) que o “Novo Testamento” substituiu o “Velho Testamento”;


2) a Igreja substituiu Israel
3) a graça substituiu a Lei;
4) o Cristianismo substituíu o Judaísmo (a fé do Antigo Testamento).

Há diferentes modalidades da teologia da substituição, chamadas por R. Kendall Soulen de


supersessionismo. Este pode ser: punitivo, económico ou estrutural (The God of Israel and
Christian Theology, Minneapolis,1996, Fortress).

1) Supersessionismo Punitivo. Proclama que os judeus rejeitaram Yeshua como Messias e, na


sequência disso, foram punidos por Deus, perdendo todas as promessas que lhe foram feitas
no chamado Antigo Testamento. Alguns defensores deste supersessionismo: Hipólito de
Roma, Orígenes de Alexandria e Martinho Lutero.

2) Supersessionismo Económico (obs: não se refere a dinheiro, mas à função). Assevera que o
povo de Israel foi substituído pela Igreja nos planos de Deus. Por outras palavras, Israel foi
escolhido por Deus apenas para trazer Yeshua ao mundo. Com a vinda do Messias, instituiu-se
a Igreja e Israel perdeu a finalidade. Alguns defensores deste supersessionismo: Justino Mártir
e Agostinho.

3) Supersessionismo Estrutural. Promove a marginalização do “Antigo Testamento” (AT) como


norma para a vida cristã, isto é, não nega o AT, mas o desvaloriza, tornando-o inferior ao “Novo
Testamento” (NT). O AT é válido, porém o que realmente importa é o NT. As regras do AT são
vistas como de pouca relevância.

Além destes três tipos de supersessionismo apresentados por Kendall Soulen, o teólogo David
Novak apresenta os conceitos de “supersessionismo fraco” e “supersessionismo forte” (Two
Faiths, One Covenant?: Jewish and Christian Identity in the Presence of the Other: The Covenant
in Rabbinic Thought, Rowman & Littlefield, 2004.

Eis os seus conceitos:


1) Supersessionismo fraco. A Nova Aliança, instituída pelo Novo Testamento, é entendida
como uma adição à Aliança anterior (a religião dos judeus, ou seja, o Judaísmo). Assim, Deus
não revogou a Aliança com o povo de Israel, mas os gentios não precisam da Primeira Aliança,
bastando se conectar com Yeshua. Este supersessionismo é chamado de “fraco” porque é
subtil, mas mesmo assim possui um verniz antibíblico. Qual o erro desta teoria? O
supersessionismo fraco ensina que o gentio somente precisa procurar a conexão com Yeshua,
desligando-se da Torá (Primeira Aliança), o que contraria os próprios ensinos do Messias, uma
vez que todos eles estavam fundamentados na Torá (Mateus 5:17-19).

2) Supersessionismo forte. A Nova Aliança é uma substituição da Aliança Mosaica. Tanto o


supersessionismo forte quanto o fraco estão errados. Biblicamente, a Aliança Renovada (“Nova
Aliança”) é uma extensão (no sentido de prorrogação) da Aliança Mosaica.
Outra maligna herança do Marcionismo foi o Antinomianismo, expressão que literalmente
significa “contra a Lei”. De acordo com o Merriam-Webster Dictionary, o antinomianismo é
definido como “uma declaração de que, sob a dispensação do evangelho da graça, a lei moral é
de nenhum uso ou obrigação, porque somente a fé é necessária para a salvação”.

Por outras palavras, as regras morais contidas na Torá (Lei) são irrelevantes para a salvação.
Será verdade? Será que alguém dito crente pode adorar Satanás e mesmo assim estar salvo?
Será que um crente que passa a vida toda em adultério, sem arrepender-se, herdará a vida
eterna? Será que um pastor que rouba os dízimos irá para o paraíso? É claro que não. Logo,
percebe-se que as regras morais contidas na Torá são importantes.

Yeshua advertiu que quem o ama iria obedecer aos mandamentos  (João 14:15), bem como
realizaria o que o Pai deseja (Mateus 7:21). Disse ainda que aquele que não desse fruto seria
lançado no fogo (Mateus 7: 19). Tiago escreveu que a fé sem obras é morta (Tiago 2:17). Ou
seja, é necessário algum tipo de obediência às regras morais da Torá.

A ideia de que a Lei (Torá) foi abolida difundiu-se através de Inácio de Antioquia, Marcião e
todos os demais “Pais” da Igreja Católica, sendo incorporada por quase todos os protestantes
clássicos e evangélicos, o que contraria o ensino de Yeshua no sentido de que não veio revogar
a Torá (Mateus 5:17-19). Toma-se a liberdade para reproduzir mais uma vez os relatos
históricos de que os primeiros seguidores de Yeshua eram praticantes da Torá:

“Os Nazarenos... aceitam o Messias de tal maneira que eles não deixam de observar a Lei antiga
[Torá].” (Jerônimo, Commentary on Isaiah, Is 8:14).

“Eles não têm ideias diferentes, mas confessam tudo exatamente como a Lei [Torá] proclama e
na forma judaica...” (Epifânio de Salamina, Panarion 29).

Muitas pessoas não sabem que o próprio Martinho Lutero não era totalmente contrário à Torá,
porquanto defendia a vigência das leis morais do Tanach (Primeiras Escrituras/“Antigo
Testamento”).

Lutero sofreu a acusação de desprezar os preceitos morais da Lei, ocasião em que afiançou:

“Na verdade, eu muito me pergunto, como veio a ser imputado a mim que eu rejeitava a Lei ou
Dez Mandamentos, se fazem parte de minhas próprias exposições (e de vários tipos) sobre os
mandamentos, que também são diariamente pregados e utilizados em nossas Igrejas, para não
falar da Confissão e Apologia, e outros livros nossos” (A Treatise against Antinomians, written in
an Epistolary way).
Na sua obra “Introdução aos romanos”, Lutero declarou que a fé salvadora  “não pode deixar de
fazer boas obras constantemente... qualquer um que não faz boas obras dessa maneira é um
descrente...Assim, é tão impossível separar a fé das obras como separar o calor da luz do fogo’”
(An Introduction to St. Paul’s Letter to the Romans).

Comparando o pensamento dos nazarenos com Lutero, depreende-se que os primeiros


defendiam a vigência total da Torá, enquanto Lutero advogou a subsistência apenas da lei
moral (vigência parcial). O Mashiach foi contundente ao afirmar de forma contundente, no
famoso Sermão da Montanha, que absolutamente nada da Torá poderia ser retirado:

“Não pensem que vim abolir a Lei ou os Profetas. Não vim abolir, mas confirmar. Sim, é verdade!
Digo a vocês: até que os céus e a terra passem, nem mesmo um jota ou um til passará da Lei
sem que tudo seja cumpridoda Torá passará”  Mateus 5:17-18.

Logo, a extinção total ou parcial da Torá colide com a lição de Yeshua e, neste ponto, católicos
e protestantes/evangélicos igualam-se como duas faces da mesma moeda.

Logo após a morte de Marcião, entra em cena Tertuliano (160 a 220 D.C), autor cristão
responsável por lançar as bases do politeísmo. Impressionante que Tertuliano é visto pela
cristandade como um exímio escritor e teólogo, cujos ensinos foram absorvidos pela Igreja
Católica Romana e, posteriormente, pela Reforma Protestante.

Foi Tertuliano o primeiro a usar a palavra latina “Trinitas” (Trindade) para desenvolver o dogma
cristão de que Deus são Três Pessoas diferentes: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Por razões
óbvios, se Deus são Três Pessoas, então, a doutrina cristã da Trindade apregoa a existência de
Três Deuses, típico exemplo de politeísmo. Para tentar disfarçar o politeísmo tão combatido
pela Bíblia, o dogma trinitário sustenta que “Deus é um e que, por um mistério, ao mesmo
tempo são Três Pessoas”.

Vale a pena citar as palavras de Tertuliano, o pai da Doutrina da Trindade:

“... enquanto o mistério da dispensação está ainda guardado, o qual distribui a Unidade em uma
Trindade, colocando em sua ordem as três Pessoas - O Pai, o Filho e o Espírito Santo: três,
contudo não em condição, mas em grau; não em substância, mas em forma; não em poder, mas
em aspecto; ainda que em uma substância, uma condição e um poder, enquanto que Ele é um
Deus, de onde estes graus, formas e aspectos são reconhecidos, sob o nome de Pai, Filho e
Espírito Santo.” (Contra Práxeas, capítulo II).

“...nós já tivemos a oportunidade de mostrar que o Pai e o Filho são duas Pessoas separadas...”
(Contra Práxeas, capítulo IV).

“Agora, observe, minha asserção é que o Pai é um, e o Filho um,e o Espírito um, e que Eles são
distintos Uns dos Outros” (Contra Práxeas, capítulo IX)

“Onde, contudo, há um segundo, deve haver dois; e onde há um terceiro, deve haver três. Agora
de fato o Espírito é o terceiro de Deus e do Filho; assim como a fruta da árvore é o terceiro da
raiz, ou como o riacho do rio é o terceiro da fonte, ou
o ápice do raio é o terceiro do sol. Nada, contudo, é estranho à fonte original de onde deriva suas
propriedades.” (Contra Práxeas, capítulo VIII).

Incorporou o Catolicismo Romano a doutrina da Trindade nos Concílios de Niceia (325 D.C) e
de Constantinopla (381 D.C), ambos realizados sem a presença de israelitas crentes em
Yeshua (nazarenos). O primeiro Concílio referido estabeleceu a divindade de duas Pessoas da
Trindade (o Pai e o Filho) e o segundo acrescentou o Espírito Santo, assentando de uma vez por
todas o dogma trinitário.

Consulte-se a Catholic Encyclopedia (Enciclopédia Católica) acerca do verbete “trindade”


(“trinity”):

“A Trindade é o termo empregado para significar a doutrina central da religião cristã - a verdade
que na unidade da Divindade há três Pessoas, o Pai, o Filho, e o Espírito Santo, sendo estas Três
Pessoas verdadeiramente distintas umas das outras. Assim, nas palavras do Credo de Atanásio:
‘o Pai é Deus, o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus, e ainda não há três Deuses, mas um só
Deus’. Nesta Trindade de Pessoas, o Filho é o unigénito do Pai por uma geração eterna, e o
Espírito Santo procede de uma procissão eterna do Pai e do Filho. No entanto, apesar desta
diferença quanto à origem, as Pessoas são co-eternas e co-iguais: todos são igualmente
incriados e omnipotentes. Este, a Igreja ensina, é a revelação sobre a natureza de Deus que
Jesus Cristo, o Filho de Deus, veio sobre a terra para entregar para o mundo: e que ela propõe ao
homem como fundamento de seu inteiro sistema dogmático”.

Este conceito católico romano foi absorvido por absolutamente quase todas as denominações
cristãs protestantes (salvo raras excepções). Roger Olson, historiador evangélico, aponta que a
Trindade tornou-se um consenso no seio da cristandade:

“O resultado dos dois concílios do século IV e do Credo niceno promulgado é o consenso real
entre os cristãos sobre o Deus adorado: três pessoas (hypostaseis) e uma substância (ousia) ou
ser. Deus é um – devido à sua essência ou substância comum, e é três pela distinção de pessoas
na divindade.” (História das Controvérsias na Teologia Cristã, editora vida, 2004, página 192).

Mas como será que pensavam os discípulos de Yeshua antes de a Igreja Católica determinar
ostensivamente o dogma trinitário? Consultando Tertuliano, o pai da Trindade, nota-se que
escreveu a sua obra no século II e que, nesta época, a maioria dos crentes NÃO cria na
Trindade, como admite este próprio escritor:

“Os simples, de fato, (não os chamarei de não-sábios nem de indoutos), que constituem a
maioria dos crentes, ficam assombrados com a dispensação (dos três em um), no sentido de que
a sua própria regra de fé os afasta da pluralidade de deuses para um único e verdadeiro Deus...’”
(Contra Práxeas, Capítulo 3).

É de clareza solar que a maioria dos fiéis ficou “assombrada” com a dispensação dos três em
um (Trindade), isto é, refutava o conceito de Três Pessoas. Então, no período do segundo
século para trás, em que realmente acreditava esta grande multidão de seguidores de Yeshua?
Apesar de criticá-los, chamando-os de “monarquistas”, por crerem no governo de um só
ETERNO, Tertuliano registra o pensamento da maioria:

"Os primeiros crentes judeus e gentios, acreditavam que o Eterno é Um (e não três), lutavam
contra a Doutrina da Trindade, até então num estágio inicial, acusando Tertuliano de pregar o
politeísmo. Eis o dizer de Tertuliano: “Eles estão constantemente atacando-nos, dizendo que
somos pregadores de dois deuses e de três deuses, enquanto eles mantêm preeminentemente o
crédito para eles mesmos de serem adoradores do Único Deus...’” (Contra Práxeas, Capítulo 3).

Estão correctos os nazarenos e os primeiros cristãos gentios ao proclamarem que o ETERNO é


UM, uma vez que a Torá é bastante contundente a este respeito:

 “Ouve, ó Israel, YHWH, é o nosso Elohim, YHWH é UM”  (Deuteronómio 6:4).


Podemos avançar que Tertuliano veio de uma família pagã, e provavelmente foi influenciado
pela cultura idólatra acerca da existência de um panteão com três deuses. Escreveu o erudito
Andrew Gabriel Roth:

“A teologia de Tertuliano muito se assemelha a Nimrod, Semíramis e Tamuz, que eram


originalmente a trindade da Babilônia, e ele [Tertuliano] inseriu as ‘pessoas’ do Pai, do Filho e do
Espírito Santo, tornando-os extremamente populares entre os cristãos gentios pagãos.” (Aramaic
English New Testament, 4ª edição, 2011, página 834).

Com efeito, a crença em Três Deuses permeou diversas culturas pagãs. Nas religiões da
Babilónia e Assíria, já se pregava uma tríade, pois os idólatras pensavam que o Universo foi
dividido em três regiões (céu, terra e água), cada uma sob o domínio de um deus (Anu, Enlil e
Ea).

No antigo Egipto, também vigia a trindade dos deuses Hórus, Ísis e Osíris. Igualmente, no
hinduísmo se destacam Brahma (deus da criação), Vishnu (deus da preservação) e Shiva (deus
da destruição).

Muito antes do advento do Messias de Israel, os religiosos da Grécia e de Roma adoptavam


três principais deuses no panteão. Em síntese, o paganismo, que formava o pano de fundo
cultural dos “Pais” da Igreja, terminou a exercer uma poderosa influência na teologia cristã.

É fundamental ler  a opinião de renomados historiadores:

“O cristianismo não destruiu o paganismo; ele o adoptou... Do Egipto vieram as ideias de uma
trindade divina...” (Will Durant, The Story of Civilization, Caesar and Christ, Part III, 1944, página
595).

“Se o Paganismo foi conquistado pelo Cristianismo, é igualmente verdade que o Cristianismo foi
corrompido pelo Paganismo. O puro deísmo dos primeiros cristãos foi mudado pela Igreja de
Roma para o incompreensível dogma da trindade. Muitos dos dogmas pagãos, inventados pelos
egípcios e idealizados por Platão, foram retidos como sendo dignos de crença.” (Edward Gibbon,
History of Christianity, 1891, página 16).

Os três pilares centrais do paganismo, conforme destacado, foram Inácio de Antioquia, Marcião
e Tertuliano, cujas doutrinas até hoje se fazem presentes no Cristianismo.

Inácio rebelou-se contra a autoridade israelita dos nazarenos, promovendo a primeira grande
cisão entre os seguidores de Yeshua. Criou a religião chamada Cristianismo, abalizada nas
seguintes características:

a) distanciamento total do Judaísmo de Yeshua e dos nazarenos;

b) revogação da Lei (Torá);

c) substituição do sábado (shabat) pelo domingo;

d) concentração do poder nas mãos de um homem, reputado o representante de Deus na terra.


Em sequência, Marcião reforça o paganismo,
ao ensinar:

a) que existem dois deuses em conflito no universo;


b) o deus dos judeus é malvado e perverso, logo, deveriam os cristãos rejeitar tudo o que
proviesse da religião judaica;

c) anulação da Lei (Torá); d) divisão entre “Velho Testamento”, repleto de regras ímpias
instituídas pelo deus dos judeus, e “Novo Testamento”, que revela o deus bom e amoroso, o Pai
de Jesus. Para engrossar as fileiras da heresia, Tertuliano cria a doutrina da Trindade e lança
para dentro do Cristianismo o politeísmo idólatra.

Tudo isto foi chancelado pela Igreja Católica e, posteriormente, encontrou eco na teologia
protestante, filha de Roma. A partir de então, o Cristianismo foi afundando na areia movediça
dos absurdos. Justino Mártir (100 a 165 D.C) cresceu no meio a uma família pagã e, durante os
seus estudos, adoptou o platonismo. Após se tornar cristão, ensinou acerca da eucaristia
(“santa ceia”), prescrevendo que o pão e o vinho servidos eram literalmente o corpo e o sangue
de Cristo (teoria da transubstanciação):

“Pois não tomamos estas coisas como pão ou bebida comuns; senão que assim como Jesus
Cristo, feito carne pela palavra de Deus, teve carne e sangue para salvar-nos, assim também o
alimento feito eucaristia (...) é a Carne e o Sangue de Jesus encarnado.” (Primeiro livro das
Apologias de Justino, páginas 65-67).

Tal como os outros “Pais” da Igreja, Justino Mártir divulgou a separação total entre cristãos
gentios e judeus (nazarenos ou não), sob o fundamento de que a Lei foi anulada por Cristo.

No livro “Diálogo com Trifão”, assevera Justino que o Cristianismo é a nova lei para todos os
homens. Já que na Lei (Torá) existem várias promessas aos filhos de Israel, Justino advoga a
tese de que os cristãos são o Verus Israel (Verdadeiro Israel), ou seja, o povo eleito do SENHOR
deixa de ser o Israel propriamente dito (descendentes carnais de Jacob) e passa a ser a Igreja.
Poderiam os cristãos desfrutar das bênçãos do ETERNO sem a necessidade de obediência à
Torá (Lei). Escreveu Justino:

“Com efeito, ó Trifão, eu li que deveria vir uma lei perfeita e uma aliança soberana em relação às
outras, que agora devem ser guardadas por todos os homens que desejam a herança de Deus. A
Lei dada sobre o monte Horeb já está velha e pertence apenas a vós. A outra, porém, pertence a
todos. Uma lei colocada contra outra lei anula a primeira; uma aliança feita posteriormente
também deixa sem efeito a primeira.” (Diálogo com Trifão, 11:2).

Na visão de Justino, a Lei (Torá) não deveria ser cumprida, pois se tornou velha. Porém, o
próprio ETERNO ordenou que sua palavra (a Torá) iria durar para sempre (Salmos 119:160), e
Yeshua testificou que não veio revogar a Torá Mateus 5:17-19.

Para justificar o motivo pelo qual os cristãos não guardam o sábado (o quarto dos Dez
Mandamentos; Êxodo 20:88-11), Justino tem a ousadia de declarar que o mandamento criado
pelo ETERNO deriva da iniquidade do povo judeu:

“Também nós observaríamos essa circuncisão carnal, guardaríamos os sábados e todas as


vossas festas se não soubéssemos o motivo pelo qual vos foram ordenadas, isto é, por causa de
vossas iniquidades e da vossa dureza de coração.”  (Diálogo com Trifão, 18:2).

Tendo por objectivo a separação total entre judeus e gentios, que outrora viviam em comunhão
nas comunidades do Caminho, Justino acusa os judeus de serem responsáveis pela morte de
Cristo. Escreveu o historiador Juan Pablo Sena Pera:

“Mais uma vez, Justino retoma o discurso rotulante e estigmatizante, ao afirmar que nem toda
água do mar seria suficiente para apagar os assassinatos cometidos pelos judeus, e ainda
caracteriza os rituais prescritos na Lei como incapazes de remover estes pecados, que somente
poderiam ser removidos pela morte de Cristo. Há uma clara intenção de circunscrever a Lei ritual
ao povo judaico, caracterizado como povo de assassinos, praticantes de rituais que em si
mesmos seriam vazios, mas que encontrariam sua razão de ser apenas se entendidos como
tipos proféticos de Jesus Cristo.” (O Antijudaísmo de Justino Mártir no Diálogo com Trifão,
Mimeografado, Vitória, 2009, página 85).

Responsabilizar os judeus pela morte do Messias tornou-se um dos grandes slogans do


Cristianismo, resultando em milhões de mortes ao longo da história, principalmente durante as
Cruzadas, a Inquisição e o holocausto nazi – este último evento levou o extermínio cobarde de
seis milhões de judeus.

Muitos protestantes e evangélicos lavam as suas mãos achando que as suas Igrejas não
participaram da chacina, não sabendo que Martinho Lutero incentivou o assassinato de judeus,
e a sua obra foi usada por Adolph Hitler ao propagar o antissemitismo no livro “Mein Kampf”
(Minha Luta).

Hitler citou expressamente a teologia de Lutero para sustentar o extermínio de judeus!!!


Enquanto seis milhões de pessoas eram dizimadas pelo regime nazi, apoiado pela Igreja
Católica, a Igreja Protestante calou-se cobardemente. Preciosa e verídica o provérbio popular:
“quem cala consente”.

Prosseguindo na manchada história da Igreja Cristã, Irineu de Lyon (130 a 202 D.C) divulga o
dogma de que Maria permaneceu perpetuamente virgem e é co-redentora e salvadora ao lado
de seu filho Jesus (Yeshua). Inicia-se a adoração à “Virgem Maria”, que passa a ser
considerada a “mãe de Deus”:

“... Maria, embora tivesse marido, ainda era virgem e, obedecendo, tornou-se causa de salvação
para si e para toda a raça humana.” (Irineu de Lyon, Contra as Heresias, 3:22).

“A Virgem Maria... sendo obediente à sua palavra, recebeu do anjo a boa nova de que ela daria
à luz Deus.” (Irineu de Lyon, Contra as Heresias, V, 19:1).

Apesar de ser óbvio, lembra-se que Maria, após o nascimento de Yeshua, teve relações sexuais
com José, nascendo da união vários filhos e filhas (Mateus 13:53/56).

E mais: o ETERNO é o Criador e não uma criatura, donde se conclui que não existe a figura da
“mãe de Deus”, e tão somente a mãe terrena de Yeshua enquanto homem.

Outro grande problema da Igreja Gentílica diz respeito ao abuso da interpretação alegórica. Os
cristãos, que eram oriundos do paganismo, tentaram conciliar o pensamento semita contido no
Tanach (Primeiras Escrituras/“AntigoTestamento”) com a filosofia grega, usando um método
de exegese que extrapola a literalidade do texto. Eis alguns exemplos:

“Justino afirmava que Léa representava os judeus, Raquel simboliza a igreja e Jacó é Cristo, que
serve a ambos. A atitude de Arão e Hur de sustentar as mãos de Moisés simboliza a cruz.
Justino afirmava que o Antigo Testamento era pertinente aos cristãos, mas essa pertinência,
dizia ele, era percebida por meio de alegorização (...) Irineu morou em Esmirna... Ele [Irineu]
afirmou, por exemplo, que os três espias (e não dois!) que Raabe escondeu representam Deus
Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo (...) Em sua excessiva alegorização, Clemente ensinava que
as proibições mosaicas de comer porco, falcão, águia e corvo (Levítico 11:7, 13-19)
representavam respectivamente a ânsia impura pela comida, a injustiça, o roubo e a cobiça. No
episódio em que 5000 pessoas foram alimentadas (Lucas 9.10-17), os dois peixes simbolizam a
filosofia grega (As Miscelâneas, 6.11) (...)  Mediante a alegorização, Orígenes ensinava que a arca
de Noé simboliza a igreja e que Noé simbolizava Cristo. O episódio em que Rebeca tirou água do
poço para os servos de Abraão significa que devemos recorrer diariamente às Escrituras para ter
um encontro com Cristo. Na entrada triunfal de Jesus, a jumenta representa o Antigo
Testamento, o jumentinho o Novo Testamento e os dois apóstolos os aspectos moral e místico
das Escrituras. Orígenes desconsiderou a tal ponto o sentido literal e normal das Escrituras que
seu estilo alegórico passou a ser caracterizado por um exagero incomum. Como disse certo
autor, era ‘fantasia desmedida’.” (A Interpretação Bíblica, Roy B. Zuck, Vida Nova, 2008, páginas
39, 41 e 42).

Apesar de a interpretação judaica admitir algum tipo de alegorização, esta possui limites
estabelecidos e não pode se constituir um “cheque em branco” a ser preenchido ao alvedrio do
intérprete. O Cristianismo pagão, fundado na filosofia grega, passou a deturpar as Escrituras
Sagradas, criando fantasias que até hoje se encontram presentes.

Actualmente, vários textos bíblicos são distorcidos, por meio de alegorias, para sustentar a
maligna teologia da prosperidade, que prega o acúmulo de riquezas materiais na terra através
da “fé em Jesus”.

Famosos pregadores proclamam: "morreu para você ficar rico”; “Você é o Senhor e Deus é
Servo para lhe dar prosperidade”; “Muitas riquezas são sinais de muita unção”; “O pobre está
vivendo debaixo de maldição”. Todas estas afirmaçõdx absurdas são extraídas de
interpretações equivocadas das Escrituras, pautadas em abuso manifesto da interpretação
alegórica.

Já que o a Bíblia narra inúmeras promessas do ETERNO ao povo de Israel, a solução dada
pelos teólogos cristãos é alegorizar o texto e dizer que onde está escrito “Israel” deve ser lido
“Igreja”. Esta técnica aniquiladora das Escrituras tem por objectivo legitimar o Cristianismo
como religião criada pelo homem, bem como a manutenção do poder social, político, religioso e
econômico das Igrejas.

O vendaval pagão também exerceu influência sobre aspecto medular do Cristianismo: a liturgia.
Inicialmente, surgiu a liturgia católica no meio do ambiente idólatra.

Posteriormente, a liturgia protestante também se valeu dos mesmos elementos pagãos. Tanto
a missa católica quanto o culto protestante possuem idêntica fórmula:

a)    cânticos;
b)    sermão
c)    oração ou cântico no final.

No sermão, somente o Padre ou o Pastor podem pregar, todos ficam calados e nenhuma
pergunta pode ser feita. Este não era e nunca foi o modelo adoptado pelos primeiros
seguidores de Yeshua, os chamados nazarenos.

Nas reuniões da "seita" chamada "Caminho", todos os membros participavam de forma


espontânea, livre e aberta, podendo ler as Escrituras, ensinar e formular perguntas. Os
encontros eram participativos e todos eram considerados iguais, inexistindo a hierarquia
eclesiástica que torna um homem superior ao outro. Actualmente, o Padre, o Pastor e o Rabino
são reputados, na prática, como pessoas mais importantes do que os membros de suas
congregações, o que é totalmente incompatível com as Escrituras.
Essas conclusões são endossadas pelo autor cristão Frank Viola:

“Os pastores falam rotineiramente a suas congregações, ‘fazemos tudo conforme a Bíblia’,
contudo, praticam esta férrea liturgia. Eles não agem correctamente. (Acredito que esta falta de
veracidade deve-se mais à ignorância do que à má fé). Verifique a sua Bíblia do princípio ao fim,
você não encontrará nada semelhante a isso. Os cristãos do século I nada sabiam sobre tais
coisas. Na realidade, essa liturgia protestante tem tanto apoio bíblico quanto a Missa católica!
Nenhuma das duas têm qualquer ponto de contacto com o N.T.” (Cristianismo pagão, 2005,
página 14).

Pior que isso, embora Lutero falasse muito sobre ‘sacerdócio de todos os crentes’, ele nunca
abandonou a prática de ordenação do clero. De facto, a sua crença era tão forte num clero
ordenado que escreveu:

‘O ministério público da Palavra deve ser estabelecido pela ordenação santa como a mais
importante das funções da igreja’. Sob a influência de Lutero, o pastor protestante simplesmente
substituiu o sacerdote católico. (Ob.Cit., página 18).

Após comparar a liturgia católica com a protestante/evangélica, ambas inspiradas no


paganismo, Frank Viola conclui:

“Enfim, a liturgia de Lutero era nada menos que uma versão truncada da Missa Católica! A Missa
de Lutero detinha os mesmos problemas da Missa Católica: Os paroquianos continuaram sendo
espectadores passivos (com a excepção de poderem cantar), e toda liturgia era dirigida por um
clérigo ordenado (o pastor tomando o lugar do sacerdote).” (Ob. Cit. página, 17).

O modelo do sermão vigente é antibíblico, porque é estruturado da seguinte forma:

a) é pregado de cima do púlpito sempre por uma mesma pessoa (Padre, Pastor ou Rabino);

b) trata-se de um monólogo dirigido a uma plateia passiva, que na maior parte das vezes está
completamente alheia ao que está a ser dito;

c) contém uma introdução, o desenvolvimento (dois ou três tópicos) e uma conclusão.

Nas sinagogas do primeiro século, frequentadas pelos primeiros crentes em Yeshua, havia
liberdade para que qualquer membro pudesse pregar a Torá, e todos poderiam formular
perguntas e debater os temas examinados (David C. Norrington, To Preach or Not to Preach? The
Church’s Urgent Question,.Carlisle: Paternoster Press, 1996, página 4).

Se no primeiro século não existia a figura do “sermão” tal qual hoje é conhecido, visto que a
participação era colectiva, de onde surgiu o sermão cristão?

Recorre-se ao magistério de Frank Viola:

“O sermão cristão foi adotado diretamente da fonte pagã da cultura grega!” (Ob.Cit., página 35).

“O sermão do púlpito não é o equivalente à pregação encontrada nas Escrituras. A prática do


sermão não é encontrada no Judaísmo do AT. Não é encontrada no ministério de Jesus, nem na
vida da Igreja Primitiva. Além disso, Paulo disse aos gregos convertidos que ele próprio recusou
ser influenciado pelas formas de comunicação utilizadas pelos pagãos de seu tempo. O sermão
é uma ‘vaca sagrada’ concebida no ventre da retórica grega. Nasceu na comunidade cristã
quando os ex-pagãos (agora cristãos) começaram a levar seus estilos de oratória para a igreja.
No século III era comum o líder cristão proferir sermões. No século IV virou norma. O
cristianismo absorveu sua cultura circundante. Quando o pastor sobe ao púlpito exibindo sua
veste clerical e proferindo seu sermão sagrado, ele exerce o papel do antigo orador grego.”
(Ob.Cit., página 42).

Também deriva do paganismo a obsessão cristã pelo edifício da Igreja como sendo “a Casa de
Deus” (Não há nada de errado em se reunir em um local, como, por exemplo, uma congregação.
O que é deplorável é o pensamento de que o ETERNO somente irá abençoar o homem caso
este esteja num local específico, a Igreja.

Os nazarenos reuniam-se em sinagogas e em casas, porém, não supervalorizavam o lugar em


si. Milhões de cristãos acham que precisam ir à Igreja para serem abençoados, porque “Deus
opera na Igreja, que é a Sua Casa”.

Este não é o pensamento dos nazarenos, porquanto Estevão discursou que o Eterno  “não
habita em lugares feitos por mãos humanas” (Actos 7:48), e Paulo declarou:  “O Elohim que criou
o Universo e tudo o que nele há, que é Senhor do céu e da terra, não habita em templos erigidos
por mãos humanas.” (Actos 17:24).

Com a oficialização do Cristianismo no século IV pelo Imperador Constantino, este começou a


construir edifícios de Igrejas nos mesmos moldes do paganismo. Proliferaram-se as igrejas ao
longo do Império Romano, seguindo-se a metodologia pagã de “erigir templos para adorar aos
deuses”.

Curioso que Constantino designou as suas Igrejas com nomes de santos, tal como os pagãos
nomeavam seus templos com os nomes de seus deuses. Os edifícios tornaram-se lugares
“sagrados”, dotados de uma aura mística que abençoaria seus frequentadores. Tal noção
profana subsiste até hoje no âmbito das denominações cristãs (católicas e
protestantes/evangélicas), explícita ou implicitamente.

Quem nunca ouviu Pastores falando na televisão: “Venham para o culto da nossa Igreja e você
sairá abençoado”? Aliás, certa vez ouvimos um evangélico dizer a outros: “vocês não devem
orar em casa, porque a bênção não está lá; vocês devem vir para orar nos cultos da Igreja”. Isto
é, nada mais nada menos, do que idolatria ao local de culto!

Se de um lado líderes católicos e evangélicos constroem faraónicos Templos, por outro, esta
prática nunca foi adoptada pelos nazarenos. Reconhecido como um dos maiores estudiosos da
História do Cristianismo, Philip Schaff escreveu que os discípulos originais de Yeshua não
edificaram Igrejas, concluindo:

“O Salvador do mundo nasceu em um estábulo e subiu aos céus desde um monte. Seus
Apóstolos e sucessores até o século III pregaram nas ruas, mercados, montes, barcos, sepulcros,
cavernas, desertos e nas casas dos seus convertidos. Contudo, milhares de igrejas e capelas
caras foram e continuam a ser construídas em todo mundo para honrar o Redentor crucificado
que nos dias de sua humilhação não possuiu nenhum lugar onde repousar a cabeça!”.

Considerando que este artigo não tem como objecto a História do Paganismo Cristão e diante
da impossibilidade de se analisar dois mil anos de história em poucas páginas, coloca-se uma
pausa na narrativa. Aliás, é desnecessário relatar todas as características pagãs do
Cristianismo neste trabalho, uma vez que as marcas heréticas descritas acima vigoram até os
dias de hoje, sendo facilmente constadas por qualquer pessoa.

Coloquemos apenas algumas palavras finais. Todos os elementos pagãos referidos estão
presentes tanto na teologia católica quanto na protestante/evangélica. Já que os gentios
cristãos se afastaram dos nazarenos, perderam a oportunidade de aprender com os homens
que receberam instruções pessoais e directas de Yeshua ou de seus apóstolos.

Todos os fundadores do Cristianismo pregaram a separação entre gentios e judeus, porquanto,


se a união permanecesse, seria extremamente difícil que heresias se alastrassem. No final, a fé
ensinada por Yeshua e os seus discípulos, foi substituído pelo Cristianismo pagão, cujas
doutrinas são estranhas à correcta interpretação das Escrituras.

Actualmente, muitas pessoas estão a descobrir a verdade e retornando à verdadeira fé de


Yeshua e de seus apóstolos, descartando toda a contaminação espiritual pagã que se infiltrou
no corpo do Messias. Que as palavras do professor Andrew Gabriel Roth e a profecia de
Jeremias possam tocar a vida dos leitores:

“O Cristo-Paganismo denota a assimilação do paganismo dentro do Cristianismo, introduzido


no mundo das igrejas pelos ante mencionados e altamente venerados pós-apostólicos
fundadores do Cristianismo Gentílico (...) Estes ‘fundadores” da Igreja nunca conheceram os
originais apóstolos, nenhum deles teve as instruções de Deus sobre justiça escritas em seus
corações. De facto, estes prematuros filósofos cristãos e oportunistas não tiveram mais
conhecimento em primeira mão dos ensinos de Yeshua e Paulo do que os teólogos de hoje.
Porém, actualmente, ao termos acesso aos Escritos Semitas [do ‘Novo Testamento’], podemos
comparar por nós mesmos os escritos dos pós-apostólicos fundadores do ‘Evangelho Cristão’
e ver que estão muito longe da original Fé Nazarena (...) Apesar do rude, cruel e odioso ataque
contra a Fé Nazarena pela multidão de opositores, que são ignorantes nas Escrituras, está a
crescer a olhos vistos o número de Judeus e Gentios que estão a voltar-se para YHWH e a viver
a Fé em Yeshua, o Messias, que foi entregue para os justos.

Claramente há uma forte diferença entre o que os pós-apostólicos fundadores da Igreja Gentia
ensinaram e o que os originais apóstolos do Messias viveram e ensinaram. Os movimentos
messiânicos e nazarenos bem presentes nos dias de hoje é o cumprimento da seguinte
profecia:

YHWH, minha força e fortaleza, meu refúgio no dia da aflição, os Gentios virão a ti desde os
confins da terra, e dirão: ‘Nossos antepassados herdaram mentiras, vaidade, e coisas sem
nenhum proveito. Porventura fará um homem deuses para si, que contudo não são deuses?
Portanto, Eu lhes farei conhecer de uma vez por todas, Eu os farei conhecer minha mão e meu
poder; e eles saberão que meu nome é YHWH’  (Jeremias 16:19-21)”.

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