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Camões Épico (Os Lusíadas)

Os Lusíadas é um poema épico, pertencente ao género narrativo epopeia, concebido


segundo o modelo clássico. Uma epopeia era um género narrativo greco-latino que
contava as aventuras de um herói grandioso, cujos feitos alteraram o mundo em que
vivia.
Segundo o modelo antigo, a narração numa epopeia deveria começar in medias res (a
meio da viagem), toda a obra deveria ser um só poema narrativo, ter personagens
mitológicas e ter um estilo grandioso e elevado. Deveria também dividir-se em 4
partes:
Proposição – apresentação do assunto do poema (proposta de leitura)
Invocação – pedido de ajuda às Ninfas inspiradoras dos poetas para conseguir fazer
justiça aos feitos do herói.
Dedicatória – Opcional; dedicação do poema a alguém.
Narração – O poeta conta a(s) história(s) do herói

Camões respeita a estrutura de uma epopeia clássica e as características deste género


narrativo (semelhanças):
- O poema é constituído por 1102 estrofes, cada uma com 8 versos, todos eles com 10
sílabas métricas (estrutura externa).
- A estrutura interna é:
Proposição (estâncias 1-3)
Invocação (estâncias 4-5) – pede ajuda às Tágides do Tejo e às musas inspiradoras dos
poetas
Dedicatória (6-18) – dedica o poema ao rei de Portugal na sua época (D. Sebastião –
jovem rei que representava toda a esperança num futuro independente e glorioso do
país.
Narração (19-até ao fim)
- A história contada por Camões inclui 4 histórias diferentes a que se dá o nome de
planos narrativos:
. Plano da Viagem de Vasco da Gama à Índia (plano central que liga todos os
outros)
. Plano da História de Portugal (histórias contadas pela personagem Vasco da
Gama ao rei de Melinde quando este lhe pergunta quem são os portugueses)
. Plano do Maravilhoso/ da mitologia/ dos deuses (sempre que figuras
mitológicas participam na ação. Ex. Consílio dos Deuses, ilha dos Amores, ajudas de
Vénus, armadilhas de Baco, etc.)
. Plano das Reflexões do Poeta (Camões faz pausas na narração para comentar
o que acabou de contar, fazendo pontes entre as ações contadas e os acontecimentos
da sua época de vida – Camões escreve os Lusíadas cerca de 70 a 80 anos depois da
viagem de Vasco da Gama; críticas à sociedade da segunda metade do séc. XVI: falta
de amor e respeito pelas artes, ganância e sede de poder, corrupção, vaidade,
ostentação e importância dada ao dinheiro)

A obra escrita por Camões diferencia-se da epopeia clássica porque apresenta uma
nova matéria épica: o tema d’Os Lusíadas é histórico e real (as epopeias antigas
baseavam em acontecimentos de ficção) e as descrições da Natureza expressam um
saber resultante da experiência vivida pelo poeta (exemplo: a tempestade, a tromba
marítima, a informação geográfica sobre povos e costumes, etc.)

Mitificação do Herói
O herói d’Os Lusíadas é um herói coletivo, os Portugueses. Embora Vasco da Gama seja
uma personagem central na obra, a sua valentia, capacidade e honra representam as
de todo o povo português “Que eu canto o peito ilustre Lusitano” (C.1, est. 3).
Ao longo da obra, as personagens lusitanas vencem todos os obstáculos e dificuldades
e tornam-se iguais aos deuses, sendo-lhes até concedida a honra de confraternizarem
com figuras mitológicas numa ilha preparada exclusivamente como prémio do seu
esforço. E ainda, suprema recompensa, é-lhes dado o privilégio de contemplar a
máquina do mundo e todo o cosmos. Camões, sendo um homem da Renascença,
celebra com alegria a vitória dos homens que, com confiança em si próprios,
quebraram os limites (“os vedados términos” C.V, est. 41), os obstáculos
aparentemente transcendentes e inultrapassáveis que barravam o conhecimento do
mundo e da Natureza.
Assim, os momentos em que os homens interagem com os deuses revelam sempre a
grandiosidade do povo português. Os deuses reúnem-se no Consílio dos Deuses e os
lusitanos são o tema da sua conferência. Tanto os que apoiam os portugueses (Vénus,
Marte e Júpiter) como os que se opõem (Baco) revelam a sua importância, quer no
passado (referem as vitórias, a coragem, a inteligência, a curiosidade, reveladas em
diversas ocasiões), no presente (aventurarem-se no desconhecido, enfrentando o mar
gigante e imprevisível) ou no futuro (feitos que conquistarão, domínio do mar e, no
caso de Baco, superação da glória).
No entanto, não é só na mitologia que se glorifica o herói, também nas histórias
contadas ao rei de Melinde (plano da História de Portugal), os portugueses enfrentam
corajosamente inimigos muito mais poderosos em número e armas, as lendas
misturam-se com a realidade e Camões utiliza sempre uma linguagem de elogio, com
adjetivos e advérbios que colocam os lusitanos num plano de super-humanos (“Mais
do que prometia a força humana”).

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