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COMPREENSÃO DO PAPEL DO HOMEM NO PROCESSO DE AMAMENTAÇÃO


SOB ÓTICA DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE

Fernanda Paula Cerântola Siqueira1, Joyce Caroline Calixta da Silva1, Fernanda Moerbeck Cardoso Mazzetto1,
Sandra Renata Albino Marques1 e Julia Tavares de Oliveira Prado1

1Departamento de Enfermagem Faculdade de Medicina de Marília, Brasil. fercerantola@yahoo.com.br;


joyce_-_100@hotmail.com; fmcmazzetto@hotmail.com; sandramesquita26@gmail.com;
julia.tavares237@gmail.com

Resumo.Objetivo: Compreender o papel do homem no processo de amamentação sob ótica dos


profissionais de saúde. Método: Estudo qualitativo realizado com 32 profissionais da saúde que atuam em
um hospital materno infantil Amigo da Criança. Os dados foram coletados por meio de um formulário e
utilizou-se a análise de conteúdo na modalidade temática. Resultados: Identificaram-se três temas "Apoio à
mulher/nutriz", "Dificuldades apontadas para o apoio paterno à mulher/nutriz" e "Estratégias que
possibilitam o apoio paterno à mulher/nutriz". Conclusão: Evidenciou-se o apoio do homem como elemento
fundamental no processo de amamentação, sendo necessário seu preparo para compartilhar de forma
segura o cuidado do filho e possibilitar o empoderamento da mulher/nutriz. O pai, então, deve ser
preparado e incluído em todas as fases do ciclo gravídico puerperal nos diversos cenários da rede de
cuidado à saúde materna infantil.
Palavras-chave: Aleitamento materno; Saúde da criança; Saúde materno-infantil.

UNDERSTANDING THE ROLE OF MEN IN THE BREASTFEEDING PROCESS FROM THE PERSPECTIVE
OF HEALTH PROFESSIONALS

Abstract. Objective: To understand the role of men in the breastfeeding process from the perspective of
health professionals. Method: A qualitative study carried out with 32 health professionals working in a
maternity and children’s hospital. Data collection was performed through a questionnaire and content
analysis, thematic modality was used. Results: Three themes were identified: "Support for women/nursing
mothers", "Perceived difficulties for paternal support for women/nursing mothers" and "Strategies for
aiding paternal support for women/nursing mothers". Conclusion: The investigation highlights men’s
support as a fundamental element in the breastfeeding process, in addition to the need for their
preparation to safely share the care of the child and to empower the woman/nursing mother. The father
should, therefore, be prepared and included in all phases of the puerperal pregnancy cycle in the various
scenarios of the network of maternal child health care.
Keywords: Breast feeding; Child health; Maternal and child health

1 Introdução

O leite materno tem superioridade nutricional, afetiva e protetora comprovada cientificamente,


sendo o alimento ideal e suficiente para os primeiros anos de vida da criança. Entre os vários
benefícios, destaca-se a resposta imunológica contra as infecções respiratórias, otites, reações
alérgicas e diarreias, proporcionada pelos probióticos existentes no leite materno (Brasil, 2015).
Há proteção também contra as doenças cardiovasculares, o que se dá devido ao menor consumo de
sódio, maior consumo de ácidos graxos e polissacarídeos provenientes das membranas do endotélio
vascular e menor estimulação da secreção insulínica, que reduz o risco de diabetes. A proteção
contra a obesidade se dá pelo balanceamento ideal entre os nutrientes existentes no leite materno,
que, por si só, contém todas as proteínas, vitaminas e lipídios, em quantidades necessárias e
suficientes para o lactente. O ato de amamentar propicia gasto calórico pela mobilização de toda a

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musculatura da face e promove, também, o desenvolvimento motor da cavidade bucal,


principalmente pelo movimento de sucção (Masquio, Ganen, & Dâmaso, 2014).
Além dos benefícios transmitidos à criança, o aleitamento materno proporciona benefícios às
nutrizes, como a diminuição do risco de osteoporose devido aumento da densidade mineral óssea,
redução do risco de câncer de mama, endométrio e ovário e de desenvolvimento de doenças
cardiovasculares (Brasil, 2015, Mariani Neto & Corintio, 2015). Também contribui economicamente
com a família pelos menores gastos com fórmulas e bicos artificiais, e possíveis gastos médicos
devido à exposição da criança a riscos propiciados pela interrupção precoce da atividade. Para a
sociedade, oportuniza redução da poluição com a diminuição de lixo inorgânico e transportes de
substituto (Mariani Neto & Corintio, 2015).
O ato de a mãe alimentar o filho em seu seio propicia momentos de interação intensa com a criança,
favorecendo o desenvolvimento de vínculo entre eles, fazendo com que o momento seja prazeroso
para ambos. E mais, fortalece o interesse nos cuidados e reduz taxas de inadvertência materna
(Mariani Neto & Corintio, 2015).
Diante de tais benefícios, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda a amamentação
exclusiva por seis meses e o fornecimento de alimentação complementar adequada, com
prolongamento da amamentação por dois ou mais anos (Brasil, 2015, Brasil, 2011).
Em estudo realizado e publicado na revista britânica “The Lancet” em 2016, o Brasil foi eleito, dentre
153 países participantes, referência mundial em aleitamento materno, mesmo que cerca de 61% dos
bebês não sejam amamentados exclusivamente até o 6º mês de vida, como preconizado pelo
Ministério da Saúde (MS) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Observa-se, apesar disso, que
apenas 50% das crianças brasileiras são amamentadas até o 1º ano de vida e, dessas, 25% são
amamentadas até o 2º ano de vida (Victora et al., 2016).
No município de Marília, a taxa de prevalência de crianças menores de 6 meses em amamentação
exclusiva é de 30%, sendo inferior à média nacional (Brasil, 2009).
O desmame precoce pode ser explicado pelos vários fatores que agem sobre a nutriz, como a
situação confortável da lactante com seu próprio corpo, o tipo de apoio familiar e social recebido, o
que, por sua vez, exerce influência sobre a capacidade de amamentar, o empenho em sua execução
e a adaptação à nova prática (Silva, Santiago, & Lamonier, 2012).A mulher sofre várias mudanças
biológicas, psicológicas e sociais, que ocorrem desde o período gestacional. Diante do nascimento do
filho, ela tende a assumir nova identidade, a de mãe e nutriz, necessitando adaptar-se aos novos
cuidados com o recém-nascido, evidenciando a amamentação como o ponto crucial desses cuidados
(Boccolini, 2012).
Neste novo período, o apoio das pessoas que convivem com a nutriz, sobretudo os
maridos/companheiros, as avós da criança e outras pessoas significativas para a mulher são de
extrema importância. No entanto, o homem, provavelmente por falta de informação, muitas vezes
não sabe de que maneira pode apoiar sua companheira. Tal dificuldade, comum diante do
nascimento de um filho, poderia ser minimizada se os pais estivessem conscientes da importância do
seu papel, não apenas nos cuidados com o bebê, mas também nos cuidados com a mulher (Brasil,
2015).
Há pesquisas que apontam o companheiro como principal fonte de encorajamento e intensificação
do ato de amamentar, prolongando a amamentação até os períodos recomendados pela OMS. Mas
para tanto, o homem deve ter participação ativa durante o gestar, o parir e o amamentar. O pai,
nesse período, poderá sentir ciúmes, exclusão e até mesmo inveja, dificultando o processo e
influenciando a mulher a optar pelo uso de mamadeiras (Pontes, Alexandrino, & Osório, 2009). Como
o instinto materno de proteger também limita a participação do pai, esse fato, somado à falta de
incentivo por parte dos profissionais de saúde ao acompanhamento paterno durante todas as fases

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da gestação e a defasagem existente no acolhimento do homem, delimita a amamentação ao corpo


biológico materno (Pontes, Alexandrino, & Osório, 2009).
Embora o número de pesquisas relacionadas ao aleitamento materno seja vasto, este estudo se
justifica pela escassez de abordagem referente ao papel do homem em relação à prática de
amamentação.
Há pouca clarificação quanto ao despreparo dos profissionais de saúde devido à escassez de fontes
bibliográficas elucidando tal aspecto, o que acaba dificultando a participação da figura paterna
durante o aleitamento materno. Trata-se de fator de risco importante para o desmame precoce
(Zutin & Silva, 2014).
Considerando a inserção do homem um dos pontos importantes para o sucesso da prática de
amamentação e que os profissionais de saúde devem estar aptos a acolhê-los de modo adequado,
questiona-se: como os profissionais compreendem o papel do homem no processo de
amamentação?
A resposta a esta questão sob ótica dos profissionais de saúde possibilitará compreender como isso
se reflete no processo de amamentação no cotidiano dos cenários de cuidado à saúde. Desta forma,
o objetivo deste estudo é compreender o papel do homem no processo de amamentação sob ótica
dos profissionais de saúde.

2 Material e Método

Estudo de campo de abordagem qualitativa. Busca compreender crenças, percepções, opiniões e


interpretações que as pessoas fazem a respeito de si mesmas ou das situações que vivenciam
(Minayo, 2013).
O estudo foi desenvolvido nas unidades de obstetrícia, pediatria e UTI neonatal de um hospital
materno-infantil, integrado à Rede de Hospitais “Amigo da Criança”, do Ministério da Saúde, desde
2003, desenvolvendo ações de cuidado individual e coletivo, nas áreas de Atenção à Saúde da
Criança e da Mulher.
Dos profissionais convidados que faziam parte da equipe multiprofissional do referido cenário, 32
aceitaram participar desta pesquisa, sendo um médico, sete enfermeiros, 13 auxiliares de
enfermagem, quatro técnicos de enfermagem, duas psicólogas, uma nutricionista, duas
fonoaudiólogas, uma assistente social e uma fisioterapeuta.
Os dados foram coletados, no período de janeiro a abril de 2018, por meio de um formulário, guiado
por um roteiro apropriado e destinado ao profissional da saúde (Minayo, 2013). Este formulário foi
construído pelos próprios autores. Dele constam dados para caracterização dos participantes e uma
questão aberta: “Como os profissionais compreendem o papel do homem no processo de
amamentação”.
A coleta de dados foi iniciada após apreciação e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com
Seres Humanos e contato prévio com os possíveis participantes deste estudo. Diante do aceite do
convite, foi distribuído o formulário, considerando a disponibilidade dos participantes, bem como a
rotina do cenário do estudo para que pudessem preencher o formulário sem atrapalhar o
desenvolvimento das atividades profissionais.
Os dados coletados foram analisados pela técnica de Análise de Conteúdo na modalidade temática
para identificar os núcleos de sentido dos registros das respostas, cuja presença ou frequência fosse
significativa para o objetivo deste estudo. Esta técnica compreende três etapas, sendo a pré-análise,
a exploração do material e tratamento dos resultados obtidos e a interpretação (Minayo, 2013).
O desenvolvimento da pesquisa seguiu os preceitos éticos contidos na Resolução nº466 de 2012. Foi
aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Marília sob CAAE

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80437717.5.0000.5413 e o parecer nº 2.439.169. Aos participantes foi solicitado o Consentimento


Livre e Esclarecido, assinado por eles, sendo uma via do participante e outra do pesquisador. E para
garantir o sigilo e o anonimato dos profissionais participantes, os registros foram identificados por
“P”, seguidos numericamente, como por exemplo: “P1”, “P2” sucessivamente.

3 Resultados

3.1 Perfil dos participantes

Entre os 32 profissionais participantes, constatou-se que, a maioria era do sexo feminino e com
idades entre 20 e 40 anos de idade, branca e, em relação ao estado civil, possuíam união estável. A
profissão com mais profissionais atuantes e participantes deste estudo foi a equipe de enfermagem.
Entre os 32 profissionais da equipe multiprofissional que presta assistência na unidade materno-
infantil, cenário desta pesquisa, a maioria atua na profissão há mais de 5 anos e já realizaram curso
de capacitação para promoção do aleitamento materno. Dos participantes, 13 referiram desenvolver
algum tipo de atividade que incentive o aleitamento materno.

3.2 Categorias temáticas

Pelos depoimentos dos profissionais participantes deste estudo foi possível identificar três categorias
temáticas, apresentadas a seguir.

Tema 1. Apoio à mulher/nutriz

Nesta categoria evidencia-se o apoio à mulher/nutriz como elemento importante do papel do


homem. Os profissionais apontam que esse apoio paterno deve permear todas as fases, a gestação,
o parto e o puerpério para que sejam capazes de apoiar e empoderar a mulher. Reconhecem que o
apoio do homem é fundamental pelo fato de a mulher vivenciar o período puerperal de forma frágil,
repleta de dúvidas ao ter que cuidar do filho recém chegado, tendo que superar também desafios
impostos pelo processo de amamentação, como sentir-se dividida entre amamentar e realizar os
afazeres domésticos. Consideram, ainda, que o apoio paterno nesse momento proporciona
segurança à mulher.
A participação do homem na amamentação é fundamental para incentivo e apoio à mulher
[...].(P17; P21; P23; P28; P29; P31)
O papel do homem é fundamental, pois nesse período a mãe está frágil, cansada [...] (P3; P7; P21;
P30)
O papel do homem na amamentação é de extrema importância para a mulher, pois é um
momento difícil e cheio de dúvidas.(P18)
O homem, se orientado e capacitado pela equipe, tem papel de auxiliar, apoiar e empoderar a
mulher durante todo esse processo. Inclusive ele deve ser estimulado desde o pré-natal e não
somente na rede hospitalar, assim ele poderá auxiliar melhor a mulher no pós-parto e em
casa.(P27)
Evidenciou-se, na fala dos profissionais, que o papel do homem no processo de amamentação é
importante porque a família é considerada um elemento fundamental na rede de apoio à nutriz.
De extrema importância, visto que a mulher precisa de apoio durante este período. A família é a
primeira rede de apoio.(P14)

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Aflora, nas falas dos profissionais participantes, que o apoio do homem à mulher no processo de
amamentação pode ser de ordem emocional ou física. Destacam que o homem, para contribuir com
a nutriz nessa fase, deve ser paciente, afetivo, utilizar linguagem de incentivo, buscando tranquilizá-
la. Apontam também que, quando o homem acolhe as orientações dos profissionais e compartilha os
cuidados do recém-nascido, não permite influências negativas no processo de amamentação, o que
fortalece a relação do casal e a segurança deles para cuidarem do filho.
[...] O homem deve contribuir com o apoio físico e emocional, ajudando a esposa com o bebê para
o sucesso do aleitamento materno [...]. O papel dele é apoiar a esposa no aleitamento materno
sendo paciente, utilizando palavras de fortalecimento para a esposa, além do apoio emocional,
apoiando também nos cuidados ao bebê para não sobrecarregar a esposa. Pois somente o fato de
ele estar por perto já está ajudando, ele deve estar aberto para as orientações de profissionais e
não permitir que atrapalhem no aleitamento.(P17; P18; P28)
Sugerem ainda, que o homem pode apoiar a mulher dividindo as diversas tarefas, como, por
exemplo, em alguns cuidados com o filho, nos afazeres domésticos e no manejo adequado da
amamentação. A importância do apoio do homem nas atividades com o filho é fundamental no
período noturno. A nutriz quando apoiada pelo parceiro se sente motivada para amamentar o filho.
[...] como no incentivo, principalmente no período noturno, ajuda física e emocional no convívio
familiar e no afeto com o bebê, a colaboração nos cuidados gerais com o bebê. A puérpera se
sentirá mais motivada a amamentar se for ajudada.(P23; P27)
Colaboração do homem nos afazeres da casa enquanto a mãe amamenta o filho.(P11; P13)
Os participantes salientam que o papel do homem nessa fase traz incentivo e apoio à mulher para
amamentar e possibilita o crescimento e o desenvolvimento saudável da criança.
O homem deve e tem que participar apoiando a mulher e incentivando a amamentação para o
filho crescer com saúde.(P4; P5)
O papel do homem tem a sua importância centrada na segurança que transmite à mulher no período
de amamentação, bem como na relação que irá estabelecer com o filho.
Muito importante, sem dúvidas. O pai irá passar segurança para a mãe e também na interação
pais e filhos, no que se diz respeito à família que nada mais é que amor, afeto, carinho e
cumplicidade.(P6; P24; P26)

Tema 2. Dificuldades apontadas para o apoio paterno à mulher/nutriz

Nesta categoria, os profissionais referem que os homens se deparam com dificuldades para
apoiarem o processo de amamentação. Acreditam que uma das dificuldades possa estar relacionada
à construção do papel social da mulher. Referem que a amamentação ainda é reconhecida,
culturalmente, como papel exclusivo da mãe.
O homem não tem uma participação ativa, por compreender ou entender que a função da
amamentação é processo com figura de importância apenas a mãe.(P8; P28)
Outra dificuldade apontada pelos profissionais participantes é o despreparo do homem em relação
ao seu próprio papel no processo de amamentação, bem como no processo de cuidado do filho de
uma forma geral.
[...] por falta de orientação e incentivo de como seu papel faria a diferença.(P8)
A pouca participação do homem, sua resistência e o preconceito quanto à amamentação em público
foram relatados como fatores que dificultam a promoção do aleitamento materno. Os participantes
referem que estes aspectos ainda precisam ser melhor informados para a população.
[...] os homens precisam quebrar o “tabu” da amamentação e deixar o preconceito e crítica de
lado quando a mulher está amamentando e com o seio à mostra em determinados lugares.(P10;
P32)

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Outro entrave citado é que a organização dos leitos na maternidade, que pode dificultar o início do
processo de amamentação quando há compartilhamento do quarto, pois algumas mulheres poderão
se sentir constrangidas na presença de pessoas que ela não conhece.
[...] penso que é complicado em um mesmo quarto dois casais, porque as lactantes podem ficar
constrangidas com um homem desconhecido no quarto.(P30)

Tema 3. Estratégias que possibilitam o apoio paterno à mulher/nutriz

Nesta categoria, os participantes expressam estratégias que contribuem para que o apoio do homem
seja efetivo no processo de amamentação. Destacam a importância da participação do homem, junto
com sua companheira, em cursos e grupos desde o período gestacional. Sugerem também que as
orientações devem ser realizadas pela equipe multiprofissional na rede de cuidados.
[...] o pai deve participar, junto com a esposa, dos cursos para gestantes para que, após o parto,
grande parte das dúvidas estejam esclarecidas.(P7)
Os incentivos e orientações podem ser feitos através de grupos nas unidades básicas de saúde
com a presença de médico, enfermeira, auxiliares, pessoas capacitadas para tal explicação e
orientação. Além dos hospitais e maternidades.(P12)
Os profissionais destacaram a necessidade de o cenário hospitalar desenvolver também grupo de
apoio com a inclusão e maior valorização do homem nesse espaço para que, de fato, ele possa
ampliar seu conhecimento.
[...] incentivos como grupos de apoio na maternidade [...] contribuem na ampliação de
informações e valorização do papel do homem no processo.(P28)
Os profissionais acreditam que, quando o homem se sente preparado quanto ao manejo da
amamentação e suas complicações e quando reconhece a importância do aleitamento materno para
a saúde do filho, ele poderá contribuir de forma efetiva e segura. Referem que a presença do homem
no momento da amamentação minimiza as incertezas, colabora no enfrentamento das dificuldades
que sua parceira vivencia e fortalece o vínculo pai-mãe-filho.
[...] É importante que o homem saiba as vantagens do aleitamento, para entender o porquê de
apoiar sua companheira. Além disso, é interessante conhecer as técnicas de amamentação e
quais suas possíveis intercorrências para poder ajudar melhor a mulher.(P21)
[...] O homem pode estar atento para acalmar o bebê quando este estiver chorando\irritado,
apoiar, auxiliar e deixar a mulher confortável e segura, ou simplesmente se manter presente no
momento da amamentação. Amamentar é difícil para algumas mulheres, a presença do homem
durante o processo fortalece o vínculo afetivo entre pai- mãe- bebê.(P31)

4 Discussão

Nesta pesquisa, identificou-se um maior número de profissionais participantes da equipe de


enfermagem, o que pode ser explicado pelo fato de trabalharem em maior número no cenário desta
pesquisa. A literatura aponta que a equipe de enfermagem é composta pelos profissionais que mais
se relacionam com a mulher durante a gestação e o puerpério, lidando diretamente com as ações
sobre a prática de aleitamento materno. Por meio dessa relação entre a equipe de enfermagem e a
mulher, esses profissionais incentivam e apoiam, de maneira efetiva o ato de amamentar,
contribuindo para o sucesso e maior duração do aleitamento materno em todos os períodos
recomendados (Marinho, Andrade, & Abrão, 2015).
A maioria desses profissionais foram capacitados para desenvolver ações promotoras do aleitamento
materno. Acredita-se que isso se deve ao fato de esse cenário ser uma das unidades que compõem a
rede hospitalar Amigo da Criança, que visa à capacitação e mobilização profissional nos serviços que

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fornecem cuidado materno-infantil e às famílias, de modo a favorecer o cumprimento dos dez passos
para o sucesso dessa estratégia definidos pela portaria nº 1.153 de 22/05 de 2014 (Brasil, 2017).
Os profissionais de saúde ainda destacaram a importância do papel do homem enquanto apoiador
no processo de cuidado do filho e a necessidade de ser incluído nos diversos cenários de cuidado.
Esses resultados são reiterados por outras pesquisas, que aponta que, a partir da inserção do homem
e do acolhimento do casal em relação às dúvidas e aos sentimentos vivenciados, há possibilidade
estarem atentos às singularidades de cada família (Rêgo, Alves, Rocha, & Alves, 2016), não tornando
a obrigatoriedade do aleitamento materno como única forma de cuidar (Seixas, Siqueira, & Mazzeto,
2017).
Nesta pesquisa evidenciou-se o apoio paterno como elemento fundamental do papel do homem no
processo de amamentação. Os participantes reconheceram que a fase de amamentação é um
período em que a mulher se sente frágil e sobrecarregada pelas diversas demandas de cuidado à
criança, à família e até mesmo ao lar. Nessa ocasião, o apoio paterno torna-se um recurso valioso
para a mulher resolver seus próprios problemas, uma vez que o homem estando presente e
dividindo a responsabilidade dos cuidados com o filho, contribui para o estado de bem-estar físico,
psicológico e social da mãe (Seixas et al., 2017).
Para que o apoio paterno seja efetivo, esta pesquisa corrobora os resultados obtidos por outros
estudos, segundo os quais a valorização da participação paterna deve ocorrer desde o pré-natal,
buscando quebrar barreiras de adaptação, ensinando o cuidado do filho ao casal para contribuir de
fato no manejo da amamentação, evitando o desmame precoce (Brasil, 2015, Rêgo et al., 2016,
Silveira, Barbosa, & Vieira 2016, Siqueira, Castilho, Kuabara, 2017).
Os profissionais de saúde que participaram do estudo consideram-se atores fundamentais para o
cuidado integral, sendo disseminadores de orientações para que o empoderamento e o cuidado com
o filho sejam continuados em casa. Essas orientações devem ser passadas para todos aqueles que
sejam capazes de influenciar nos sentimentos, aflições e decisões da mulher, sendo o pai da criança o
ator principal (Seixaset al., 2017).
O cuidado dispensado deve ter um eixo mãe-pai-filho, sustentado por uma comunicação clara em
todas as fases e cenários de cuidado à saúde. Acredita-se que, com as informações adequadas
transmitidas por pessoas capacitadas aos atores envolvidos no processo de cuidado à criança, o
processo de amamentação será eficaz (Siqueira & Santos, 2017).
Com a melhor interação do homem junto à mulher e ao seu filho, ele percebe que a sua participação
influencia positivamente no aleitamento materno (Piazzalunga & Lamounier, 2011). As mulheres
percebem que, quando os homens estão envolvidos nos cuidados com o filho, há também benefícios
para as transformações conjugais e familiares como um todo (Siqueira et al., 2017), assim como foi
apontado pelos profissionais participantes, evidenciando fortalecimento do vínculo familiar.
O papel paterno neste estudo foi considerado, então, importante no processo de amamentação, pois
os profissionais apontaram a família como a primeira rede de apoio à nutriz. Como a amamentação
sofre influência do ambiente em que a nutriz está inserida, não basta a mulher optar pelo
aleitamento. As pessoas que a rodeiam, principalmente sua família, devem apoiar sua escolha (Brasil,
2015, Cabral, Barros, Vasconcelos, Javorski, & Pontes, 2013).
Segundo a literatura e os participantes, alguns serviços de saúde têm incentivado a criação de grupos
de apoio à amamentação realizados por equipe multiprofissional, destinados não somente à nutriz,
mas também à família, com especial atenção ao pai da criança, visto que o apoio paterno fortalece o
processo de aleitamento materno. Tais grupos são apontados por pediatras como uma ferramenta
importante para o sucesso do aleitamento materno (Coca, Pinto, Westphala, Mania, & Abrão, 2018).
Os resultados desta pesquisa reforçam a importância do preparo familiar no ciclo gravídico
puerperal, especialmente do homem, para os cuidados do filho e as formas de apoiar a esposa no
processo de amamentação. Com isso, faz-se necessário que se valorize o potencial de apoiador e

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influenciador do pai, para que participe desses cuidados desde a descoberta da gestação. É
necessário incentivar as mulheres a valorizar as iniciativas desse pai, fazendo com que seu
companheiro, seja um “pai participante“, estruturando uma relação favorável para toda a família
(Rêgo et al., 2016).
Embora neste estudo os pais tenham sido identificados como importante fonte de apoio à
amamentação, muitos não sabem de que maneira podem apoiar as mulheres, provavelmente por
falta de informação. Alguns sentimentos negativos dos pais, comuns após o nascimento de um filho,
poderiam ser aliviados se eles estivessem conscientes da importância do seu papel, não apenas nos
cuidados com o filho, mas também nos cuidados com a nutriz (Brasil, 2015). Parece que a
paternidade nessa relação de cuidado produzido por homens muitas vezes não vem sendo
compreendida como experiência genuinamente masculina, o que evidencia um “tabu” imposto pela
sociedade. Talvez esse fato, citado por alguns profissionais participantes deste estudo, seja um dos
obstáculos para o sucesso do aleitamento materno.
Na atual sociedade, o pai é uma figura que apresenta novas funções, como companheiro, cuidador e
protetor (Jeneral, Bellini, Duarte, & Duarte, 2015). O papel do pai é tornar possível o
encaminhamento da criança desde sua realidade biológica de pequeno ser vivo até a maturidade e
sua integração social (Carvalho, 2018). Essas relevantes funções do pai na sociedade puderam ser
identificadas nos depoimentos como a valorização do papel paterno para torná-lo mais participante
e contribuir para a quebra de barreiras de adaptação e cuidados ao filho e à sua companheira para
além do manejo da amamentação, evitando o desmame precoce (Rêgo et al.,2016). Os pais devem
ter papel importante na divisão de responsabilidades ante o binômio mãe-filho, já vulnerável.
De acordo com a literatura, a escolha de amamentar se desenvolve dentro de um contexto
sociocultural influenciado pela cultura, crenças, tabus e pessoas da rede social daquele contexto
(Piazzalunga & Lamounier, 2011). A amamentação não deve vista apenas como prática biológica. Ela
perpassa funções sociais, levando à necessidade de desconstruir certos aspectos culturais,
principalmente os relacionados ao papel da mulher (Siqueira et al., 2017, Cabral et al., 2013,
Carvalho, 2018).
Destaca-se, portanto, a importância do preparo dos profissionais de saúde para desenvolverem
estratégias na rede de atenção aos cuidados materno-infantil que possibilitem e assegurem a
inclusão do homem no ciclo gravídico puerperal. Acredita-se, pois, que o homem, quando preparado
para exercer seu papel como pai apoiador, poderá dar segurança e contribuirá para o
empoderamento da mulher no processo de amamentação, garantindo assim uma prática
amamentação eficaz.

5 Considerações Finais

Os resultados obtidos nesta pesquisa evidenciaram, na fala dos profissionais de saúde, o quão é
importante o apoio do homem no processo de amamentação, ainda que se destaque que esse apoio
deve permear o período gestacional, parto e puerpério. Ressaltam que, quando o homem se sente
preparado e seguro quanto aos benefícios do aleitamento materno para a saúde do filho, ele não
permite influências negativas, compartilha os cuidados da criança e isso fortalece a relação do casal.
Embora os profissionais tenham apontado o papel do homem como um elemento importante no
processo de amamentação, também reconhecem dificuldades como o fato de o cuidado do filho
ainda ser centrado no papel da mulher, haver despreparo do homem e preconceito em relação à
amamentação em público, citando também o compartilhamento do quarto no hospital, que inibe
muitas lactantes.

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Os participantes indicaram estratégias que fortalecem o apoio paterno no processo de


amamentação, como o preparo do homem desde o pré-natal juntamente com sua parceira, sua
inclusão em grupos nos diversos cenários na rede de cuidado à saúde materno-infantil.
Diante de tais resultados, torna-se oportuno realizar a capacitação da equipe multiprofissional nos
diversos cenários da rede de cuidado à saúde materno-infantil para a inclusão do homem no
processo de cuidado ao seu filho, não só para a amamentação.

Referências

Boccolini, C. S. (2012). Aleitamento materno: determinantes sociais e repercussões na saúde infantil


(tese de doutorado, Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca,
Rio de Janeiro, Brasil).
Brasil.Ministério da Saúde (2009). II Pesquisa de prevalência de aleitamento materno em municípios
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http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pesquisa_prevalencia_aleitamento_materno.pdf
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