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UFPR - SACOD - DeArtes


Disciplina OA851
História da Música Brasileira I 2023 I
Professor José Estevam Gava

Atividade: fichamento nº 8

VITÓRIA CAROLINA CUNHA

Endereço eletrônico: vitoria.cunha98@gmail.com

Identificação do artigo aqui resumido: O disco e a música popular na primeira metade do


século XX

A inclusão de ritmos populares em danças de salão


O desenvolvimento das danças de salão, no fim do Segundo Império, fez com que as
mesmas, ao se infiltrar nos meios periféricos, fossem transformadas, misturando-se a elementos
da música popular. A polca, a valsa, a quadrilha e o tango passaram a sofrer influência de danças
como o lundu, o batuque, o corta-jaca e, principalmente, o maxixe. Esse último representou a
principal forma de pressão que a cultura popular exerceu sobre a cultura da elite, o qual passou a
ser, aos poucos, assimilado pelos centros urbanos. Essa assimilação, no entanto, foi feita de
maneira a transformar o maxixe original em algo mais “civilizado”, que se assemelhasse às
danças de salão de origem europeias. Por volta de 1900, o maxixe, já com esse título, passou a ser
aceito como dança de salão e impresso em partituras. As peças nesse estilo eram executadas ao
piano, por conjuntos instrumentais e por bandas.
Essa conversão de danças populares em danças de salão foi muito ampla na Primeira
República, surgindo, em partituras e gravações do período, polcas e tangos com ritmos de
batuque, lundu, samba etc. Nessa fase os músicos normalmente tinham origem humilde. Muitos
eram negros que conseguiram fugir do desemprego atuando como instrumentistas e/ou
compositores. Os próprios músicos tinham essa preocupação de controlar seu comportamento a
fim de encaixar-se nos critérios da elite. Entre os compositores mais representativos da música de
salão com ritmos populares estão: Joaquim Antônio da Silva Callado (1848-1880), Chiquinha
Gonzaga (1847-1935), Ernesto Nazareth (1863-1934), Patápio Silva (1881-1907), João
Pernambuco (1883-1947), Canhoto (1887-1928) e Eduardo Souto (1882-1942).
Embora as polcas e tangos com ritmos populares tenham sido praticados até a década de
1930, a explosão da música popular após o final da Primeira Guerra Mundial transformou esse
panorama, gerando uma maior permissividade em relação à música de origem popular, que cada
vez mais se distanciaria do rigor formal da música culta. Com o passar do tempo, essas danças
foram cada vez mais assumindo sua origem popular, sem passar pela higienização de suas
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melodias, coreografias e instrumentação. Assim, a Belle Époque criou a separação definitiva


entre música “erudita” e “popular” urbana.

Os “chorões”
O fenômeno musical do qual participaram os chamados chorões se insere perfeitamente
no contexto descrito anteriormente. Nas últimas décadas do século XIX, surgiram nas grandes
cidades – principalmente no Rio de Janeiro – conjuntos instrumentais semiprofissionais,
formados majoritariamente por pessoas negras, os quais atuavam no mercado periférico, em
salões, em clubes carnavalescos e em serenatas de rua. Os músicos integrantes desses grupos
tinham empregos de baixo salário, portanto, fazer parte de tais conjuntos os fornecia uma renda
extra. Esses grupos tocavam polcas, mazurcas, valsas, tangos, quadrilhas etc., mas sem se
comportarem no padrão cultural exigido nos salões. A sua instrumentação geralmente era
composta de madeiras (flauta, clarinete e clarone), metais (bombardino, oficleide e trombone),
cordas (violão, cavaquinho e bandolim) e percussão (pandeiro e reco-reco). Há, inclusive, uma
semelhança com a formação das bandas de música, pela preferência de instrumentos que podiam
ser tocados em pé.
Os chorões trouxeram uma grande inovação para a música popular das primeiras
décadas do século XX. Adicionando um caráter improvisado às suas execuções das danças em
voga na época, principalmente o maxixe, esses músicos contribuíram com o surgimento do choro
– uma nova maneira de se tocar polcas, maxixes, tangos e valsas. O choro não pode ser visto
como uma forma musical propriamente, mas sim como uma forma de execução dessas danças
baseada em conjuntos de sopros e violões e na constante improvisação. A origem da palavra
“choro”, inclusive, possivelmente deriva da expressão “tocar chorando”, o equivalente a tocar
improvisando. Ritmicamente, uma de suas características específicas era a sincopação do
acompanhamento, surgida com os tangos de Nazareth e popularizada entre os chorões.
Até o fim dos anos 1910, os chorões eram extremamente malvistos pelas elites
brasileiras. Foi apenas na década de 20 que eles começaram a ser amplamente aceitos, passando,
entretanto, por um processo higienizatório – os grupos de choro foram transformados nas
chamadas “orquestras típicas” ou “conjuntos regionais” e passaram a frequentar espaços
privilegiados da sociedade. Um dos últimos grupos remanescentes dos chorões foi Os Oito
Batutas, dirigido por Pixinguinha. Era um grupo formado por negros que começou a tocar nos
saguões de cinemas em 1918 e alcançou sucesso internacional a partir de 1922. Tal sucesso, no
entanto, é uma comprovação da transformação pela qual esses grupos passaram, deixando de
existir como se originaram. As orquestras típicas que os substituíram, além de formas brasileiras,
tocavam formas norte-americanas que começaram a ser exportadas em massa, sendo a principal
delas o fox-trot. A execução das jazz-bands, além de criar o estilo em todo o Brasil, influenciou o
repertório e as técnicas das orquestras típicas das décadas de 30 e 40. No fim da década de 1910,
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os últimos chorões e as primeiras orquestras regionais passaram a tocar sambas, estilo que
convite até hoje com o choro.

O samba e as marchas carnavalescas


O samba surgiu nos morros e favelas cariocas, no fim do período colonial, tendo sua
ampla difusão somente a partir das concentrações populacionais periféricas do Rio de Janeiro no
fim do Segundo Império. Tratava-se de uma dança exclusiva de classes baixas, formadas por
negros e mestiços, assim, foi uma manifestação radicalmente oposta à “alta cultura” das elites. A
palavra “samba” provavelmente tem sua origem no termo angolano semba, que significa
umbigada, um elemento coreográfico do batuque e do lundu de negros brasileiros desde o fim do
séc. XVIII. Assim como o choro, o samba em suas origens não foi um estilo com características
definidas, representando um conjunto de manifestações que mesclavam aspectos de origem
africana a contribuições portuguesas.
Nos sambas primitivos – os quais ainda estão presentes em muitas regiões brasileiras –
era comum a alternância de um verso cantado, muitas vezes de improviso, por um solista, seguida
por um refrão entoado por coral. A umbigada e a disputa entre os participantes pelo melhor
improviso do verso e melhor dança foram os elementos mais marcantes desse samba inicial.
Além disso, era também característico o acompanhamento de instrumentos de percussão, palmas
ou de batuques em objetos como caixas e aparelhos de cozinha. Nos últimos anos do século XIX,
o samba já dava início ao processo de invasão das cidades, porém, tal fenômeno foi concretizado
de fato com a gravação da canção de Pelo telefone, em 1917.
O que ocorreu com o samba a partir de sua urbanização, nas décadas de 10 e 20, é
semelhante ao que ocorreu com o maxixe. O samba urbano foi perdendo o caráter de dança de
roda improvisado e se tornando uma dança de pares nos salões ou de blocos nos bailes de
Carnaval. O seu canto também foi sendo, aos poucos, conformado aos padrões das danças de
salão ou de chorões, que exigiam maior variedade harmônica e melódica, além da utilização de
um instrumental mais rico, como das orquestras típicas da década de 20. Outro fator que
explicitou a transformação do samba de morro no samba urbano foi o enriquecimento formal,
aproximando-o das danças de salão da Bélle Époque – o samba urbano exigia também uma
introdução e, pelo menos, uma segunda parte, como ocorria nos tangos, valsas e polcas.
Depois da primeira fase de urbanização (1917-1930), o samba urbano entrou em um
novo processo evolutivo, no qual prevalecia a visão bem-humorada do quotidiano da classe
média, a exaltação nacionalista e uma criatividade não mais ligada às classes baixas. O estilo
contou, também, com os refinamentos poéticos e melódicos de compositores como Noel Rosa e
Ary Barroso. Com a urbanização, o samba derivou em manifestações múltiplas a partir da década
de 20, como o samba-de-breque, o samba-canção, o samba carnavalesco, o samba-choro, o
samba-enredo, o samba-exaltação, o samba de gafieira, o samba de partido alto e o sambalanço
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(precursor da bossa nova). Além do samba e de suas inúmeras ramificações, também surgiu a
marcha ou marchinha carnavalesca – nome que indicava o caráter ingênuo e alegre das
composições. Esse estilo foi derivado das marchas militares e a primeira composição nessa linha
foi a canção Ó abre alas, de Chiquinha Gonzaga (1899). Essas marchas passaram a formar o
repertório das orquestras típicas na década de 20 e tiveram seu andamento acelerado por
influência das jazz-bands norteamericanas.

O impacto do disco na música popular brasileira do século XX


Com o advento do disco e do rádio, a partir de 1922, os choros e os sambas se
difundiram amplamente, dando início a uma evolução própria, repleta de transformações e
inovações. Essas invenções causaram um grande impacto na música ao vivo e, a partir da década
de 1920, poucos grupos sobreviveram sem vender sua música como produto – o capitalismo
finalmente se consolidou no universo musical. Durante a década de 20, o disco propagou diversos
tipos de dança e de canção no Brasil, sejam nacionais ou importados, como valsas, toadas
nordestinas e canções regionais, tangos argentinos e brasileiros, marchas, samba, polca, maxixe,
coco e rag-time. Alguns dos músicos populares de destaque no período foram: Catulo da Paixão
Cearense (1866-1946), Baiano (1887-1944), Pixinguinha (1898-1973), Donga (1889-1974) e
Cornélio Pires (1884-1958).

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