Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Alphabeto
Dactilas-me o corpo
de A a Z
e reconstróis
asas
seda
puro espanto
por debaixo das mãos
enquanto abertas
aparecem, pequenas
as cicatrizes
- Paula Tavares, em "Ritos de passagem". Luanda: União dos Escritores Angolanos, 1985,
Cadernos Lavra & Oficina, 55, p. 32.
Nos últimos anos tem desempenhado diversas atividades profissionais: foi professora de
História em Angola desde 1973; delegada do Ministério da Cultura no Kwanza-Sul, Angola,
de 1978 a 1980; Técnica Superior do Museu Nacional de Arqueologia, em Benguela,
Angola, de 1980 a 1983; Diretora Nacional do Património Cultural em Luanda, de 1985 a
1987; Diretora do Gabinete Técnico da Secretaria de Estado da Cultura, em Luanda, de
1987 a 1991; Professora Assistente da Universidade Católica
Portuguesa, em Lisboa, de 1994 a 2000, entre outros cargos.
As suas obras literárias publicadas são: Ritos de passagem (1985), O sangue da Buganvília
(1998), O Lago da lua (1999), Dizes-me coisas amargas como os frutos (2001), Ex-votos
(2003), A cabeça de Salomé (2004), Os olhos do homem que chorava no Rio, em parceria
com Manuel Jorge Marmelo (2005), Manual para amantes desesperados (2007), Como
velas finas na terra (2010).
Participou do filme 'Cartas para Angola' (2011), dirigido por Coraci Ruiz e Júlio Matos. Trata-
se de um documentário notável construído entre os dois lados do Atlântico, focando Brasil,
Angola e Portugal.
Desossaste-me
cuidadosamente
inscrevendo-me
no teu universo
como uma ferida
uma prótese perfeita
conduziste todas as minhas veias
para que desaguassem
nas tuas
sem remédio
meio pulmão respira em ti
e outro, que me lembre
mal existe
Paula Tavares, em "Ritos de passagem". Luanda; União dos Escritores Angolanos, 1985, p.
30-31.
Perguntas-me do silêncio
eu digo
- Ana Paula Tavares, em "O lago da lua". Lisboa: Editorial Caminho, 1999, p. 29.
PRÊMIOS
2004 - Prémio Mário António de Poesia 2004, da Fundação Calouste Gulbenkian, pelo livro
"Dizes-me coisas amargas como os frutos".
2006 - Prémio Nacional de Cultura e Artes de Angola, pelo livro "Manual para amantes
desesperados".
2013 - Premio Internazionalle Ceppo/Pistoia, Firenze - Itália.
"A oralidade é meu culto. As mães embalam os filhos cantando ou dizendo palavras nas
nossas línguas todas. Se os meus textos puderem ser lidos em voz alta fico muito
contente."
- Ana Paula Tavares, em "A oralidade é meu culto”, entrevista a Ana Paula Tavares, in
AUSTRAL nº 78/ Buala, por Pedro Cardoso. novembro, 2010. (acessado em 16.6.2015).
Poesia
Ritos de passagem. Luanda: União dos Escritores Angolanos, 1985; 2ª ed., Lisboa:
Editorial Caminho, 2007, 70p.
O lago da lua. Lisboa: Editorial Caminho, 1999.
Dizes-me coisas amargas como os frutos. Lisboa: Editorial Caminho, 2001.
Ex-votos. Lisboa: Editorial Caminho, 2003.
Manual para amantes desesperados. Lisboa: Editorial Caminho, 2007.
Como velas finas na terra. Lisboa: Editorial Caminho, 2010.
Crônicas
O sangue da Buganvília. Praia: Centro Cultural Português, 1998.
A cabeça de Salomé. Coleção Outras Margens. Lisboa: Editorial Caminho, 2004, 144p.
Romance
Os olhos do homem que chorava no rio. [em co-autoria com Manuel Jorge
Marmelo]. Colecção O campo da palavra. Lisboa: Editorial Caminho, 2005.
PUBLICAÇÕES NO BRASIL
Agrupam-se todos
(arrumadinha)
No pequeno útero verde
Da casca
- Ana Paula Tavares, em "Ritos de passagem". Luanda: União dos Escritores Angolanos,
1985.
A abóbora menina
Tão gentil de distante, tão macia aos olhos
vacuda, gordinha,
de segredos bem escondidos
estende-se à distância
procurando ser terra
quem sabe possa
acontecer o milagre:
folhinhas verdes
flor amarela
ventre redondo
depois é só esperar
nela desaguam todos os rapazes.
- Ana Paula Tavares, em "Ritos de passagem". Luanda: União dos Escritores Angolanos,
1985.
como os frutos.
- Ana Paula Tavares, em "Dizes-me coisas amargas como os frutos". Lisboa: Editorial
Caminho, 2001, p. 9.
Canto de nascimento
Aceso está o fogo
prontas as mãos
panos brancos
uma panela a ferver
mais a faca de cortar
Mukai (I)
Corpo já lavrado
equidistante da semente
é trigo
é joio
milho híbrido
massambala
resiste ao tempo
dobrado
exausto
sob o sol
que lhe espiga
a cabeleira.
- Ana Paula Tavares, em "O lago da lua". Lisboa: Editorial Caminho, 1999, p. 30.
O cercado
De que cor era o meu cinto de missangas, mãe
feito pelas tuas mãos
e fios do teu cabelo
cortado na lua cheia
guardado do cacimbo
no cesto trançado das coisas da avó
Onde está a panela do provérbio, mãe
a das três pernas
e asa partida
que me deste antes das chuvas grandes
no dia do noivado
O lago da lua
No lago branco da lua
lavei meu primeiro sangue
Ao lago branco da lua
voltaria cada mês
para lavar
meu sangue eterno
a cada lua
No lago branco da lua
misturei meu sangue e barro branco
e fiz a caneca
onde bebo
a água amarga da minha sede sem fim
o mel dos dias claros.
Neste lago deposito
minha reserva de sonhos
para tomar.
- Ana Paula Tavares, em "O lago da lua". Lisboa: Editorial Caminho, 1999, p. 11.
Vieram muitos
"A massambala cresce a olhos nus"
Vieram muitos
à procura de pasto
traziam olhos rasos da poeira e da sede
e o gado perdido.
Vieram muitos
à promessa de pasto
de capim gordo
das tranqüilas águas do lago.
Vieram de mãos vazias
mas olhos de sede
e sandálias gastas
da procura de pasto.