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PLANO DE TRABALHO DO DOUTORAMENTO

CAPÍTULO TEÓRICO
DOMÍNIOS A EXPLORAR
1. FRASEOLOGIA
Recorre-se principalmente à teoria fraseológica da escola espanhola (Corpas Pastor,
1996) que se baseia na frequência de uso, institucionalização, estabilidade,
lexicalização, idiomaticidade, variação, gradação, entre outros, para considerar que dada
combinação de palavras é uma expressão idiomática. Assim, Corpas define EI como “a
combinação de pelo menos duas palavras ortográficas, que apresenta certo grau de
lexicalização e a alta frequência de coocorrência na língua” (Corpas Pastor 1996: 20).
Por sua vez, Monteiro (2011:164), releva as fronteiras entre a semântica e sintaxe como
aspetos essenciais na identificação de vários tipos de fraseologismos. Quanto à função e
ao significado que uma EI cumpre na oração, Corpas Pastor (1996: 33) realça o seu
funcionamento como “elemento oracional”, já que o sentido unitário não resulta da
soma normal dos seus componentes”. Autores como Vilela (2002), Xatara (1998) e
Ortiz Alvarez (2017) propõem dois critérios para uma tipologia das EI, embora usem
terminologias diferentes: 1. a natureza morfossintática das expressões, as quais podem
assumir funções de sintagmas nominais, verbais, adjetivais, adverbiais, de determinante
nominal e de fórmulas interjecionais; 2. o valor semântico (conotativo), avaliando-se o
grau de idiomaticidade de uma EI (valor figurado ou metafórico forte, fraco, alto, baixo,
semi ou total). A peculiaridade destas combinações, leva autores como Zavaglia
(2014), Xatara, Riva e Rios (2002: 184), Oliveira e Rocha (2016: 62, 63) a avaliarem as
EI à luz de aspetos socioculturais (crenças, história e estados afetivos), ora definindo-as,
por isso, como fórmulas coletivas e tradicionais, capazes de refletir o mundo em função
das perspetivas de um povo, ora como “lexia complexa indecomponível, conotativa e
cristalizada em um idioma pela sua tradição cultural”, ou ainda como sequências que
“constituem criações fora do idioma, por meio de neologismos e culturemas, e que
induzem ao surgimento de simbolismo dentro da língua”, respetivamente. Só assim se
explica a existência de EI em Angola constituídas por unidades do léxico português e
das línguas africanas que aí fala.
2. FRASEODIDÁTICA
De acordo com SZYNDLER (2015, p. 201), a Fresodidática emergiu com as primeiras
manifestações de interesse dos professores de língua estrangeira, tendo o termo sido
utilizado pela primeira vez em castellano por Larreta Zulategui em 2001 e, mais tarde,
por Corpas Pastor em 2003.
Definida como “didáctica de toda una lengua a través de su fraseologia” (GONZALEZ
REY, 2012, p. 67), a Fraseodidática corresponde a um campo interdisciplinar de estudos
que congrega áreas como a Fraseologia, ensino de línguas (LM, L2 ou LE), Linguística
Contrastiva, Psicolinguística, Sociolinguística e outras, cuja finalidade levar o aprendiz
a perceber em que contexto e com que intenção um falante nativo recorre às UF, em
particular às EI, de modo que seja capaz de reconhecê-las, aprendê-las e usá-las em
contextos adequados (TERMIGNONI e FINATTO, 2017, pp. 115-116).
O ensino de expressões idiomáticas constitui um processo extremamente difícil para o
professor, na medida em que, na maioria dos casos, este não possui nem preparação
nem materiais didáticos que o orientem. Neste sentido, a Fraseodidática surge para
colmatar este défice, visto fornecer ao professor as ferramentas necessárias para ensinar
este tipo de estruturas. A este propósito, SZYNDLER (2015, p. 201) recomenda que o
estudo de EI seja antecedido de uma introdução de natureza cultural sobre as mesmas,
ou seja, dotar os alunos de informações os usos e costumes da sociedade em que estão
inseridas as EI, sua origem e seu significado. De acordo com a autora, o processo de
ensino e aprendizagem pode ser resumido em três passos, nomeadamente:
1. O aluno deve identificar uma determinada fraseologia num texto oral ou escrito
autêntico. Na primeira etapa, na qual todos os processos de decodificação são
ativados. Deve enfatizar possíveis anomalias morfossintáticas ou
incompatibilidades semânticas para que o possam ajudar a conhecer uma UF
específica mais facilmente;
2. O aluno deve entender ou decifrar o significado fraseológico que aparece em
uma determinada situação comunicativa (a fase de reprodução);
3. O aluno deve usar a UF que acabou de aprender num contexto semelhante (a
fase de produção).

Desta forma, o aluno alcança a competência comunicativa desejada, uma vez que o mal
uso destas estruturas pode resultar em rompimento da convencionalidade, em mal-
entendidos, prejudicando, assim, o processo de comunicação.
Para a autora, estes passos trouxeram avanços significativos ao processo de ensino e
aprendizagem de EIs:
En el primer paso, en el que se activan todos los procesos de descodificación, el aprendiz tiene que
identificar un fraseologismo dado en un texto auténtico oral o escrito. Cabe recalcar que las posibles
anomalías morfosintácticas o las incompatibilidades semánticas le pueden servir de ayuda, esto es,
pueden facilitarle el reconocimiento de una UF determinada. En lo que concierne al segundo paso, este
tiene por objetivo comprender o descifrar el significado fraseológico que aparece en una situación
comunicativa dada (la fase de reproducción); mientras que en el paso tercero el discente debe usar la UF
que acaba de aprender en un contexto parecido (la fase de producción). Parece indudable que la
aplicación de estos tres pasos, que trajeron “un aire fresco” a la enseñanza de lenguas6, desarrolla la
competencia fraseológica productiva del alumno, dado que las UF se introducen (y aprenden) no de forma
pasiva, sino activa o, más bien, interactiva. Dicho de otro modo, el estudiante no solo “recibe” las UF,
sino que también tiene que “producirlas” en un contexto concreto (SZYNDLER, 2015, p. 201)

3. LEXICOLOGIA
Embora as EI apresentem particularidades muito específicas, o que faz com que o seu
estudo não encontre espaço em áreas como a sintaxe e a semântica, elas não deixam de
pertencer ao léxico da língua ou da comunidade linguística que as acolhem. Por esta
razão, devem também ser analisadas no âmbito da Lexicologia, uma vez que a sua
aquisição e uso amplia o vocabulário dos falantes.
Neste sentido, a Lexicologia, definida por COSERIU (1978, p. 111) como “o ramo da
Linguística que estuda a estrutura do vocabulário da língua, sua composição, variedade,
origem, mudanças históricas e adaptações às condições sociais da comunidade
respetiva”, ou por LORENT (2004, p.19) como “disciplina que se ocupa do léxico das
línguas de forma completa e integrada”, abarca todos os fenómenos que ocorrem na
língua, sejam eles determinados por fatores linguísticos, sejam resultantes de fatores
extralinguísticos. Ademais, ARAGÃO (2016, p.35) considera que o objeto de estudo da
Lexicologia é o “léxico, no seu mais amplo sentido, incluindo aí os neologismos, os
arcaísmos, e, naturalmente, as unidades fraseológicas”.
Assim, entende-se que uma EI deve ser adquirida sob a perspetiva de um vocábulo
como qualquer outro pertencente à mesma língua, apesar de este processo encerrar
algumas especificidades que devem ser levadas em consideração. Todavia, levanta-se a
questão se as mesmas devem ser adquiridas de forma implícita ou explícita. De acordo
com XATARA (1995), citada por RUBERT (2016, p.15), o ensino das EI devia ocorrer
de forma explícita, lamentando o facto de tal processo ocorrer de forma implícita, no dia
a dia, uma vez que elas raramente encontram espaço na sala de aulas. RUBERT (2016)
entende que a aprendizagem das EI ocorre mais rapidamente quando é feita
explicitamente, não descartando, no entanto, a possibilidade de usar os dois tipos de
ensino (o implícito e o explícito) dentro da sala de aulas, visto terem cada um as suas
vantagens.
4. PSICOLINGUÍSTICA VS AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
A linguagem humana e as suas condições de aquisição têm sido estudadas e discutidas
há vários séculos. Entre as teorias que abordam a questão da aquisição da linguagem,
destaca-se o gerativismo de Chomsky. De acordo com KUPSKE (2011, p.177),
Chomsky defende que a criança nasce com capacidade inata para desenvolver a
linguagem, ou seja, a criança serve-se de fatores ambientais para ativar os recursos
biológicos de que dispõe de modo a desenvolver a linguagem.
Nesta linha de pensamento, SIM-SIM (1998, p.23) considera a aquisição da linguagem
como um processo que ocorre por meio da exposição da criança ao meio, não sendo
necessário a ativação de qualquer mecanismo formal de ensino. No entanto, a autora
realça que o sistema linguístico que a criança adquire de forma natural e espontânea
identifica-a como membro da sua comunidade linguística, ao mesmo tempo que
constitui a sua língua materna, cujo uso das palavras que integram o seu léxico
dependerá sempre do contexto sociocultural em que a criança se insere.
Por se tratar de estruturas complexas, a aquisição de EI deve ocorrer apenas quando a
criança já tem desenvolvido uma consciência linguística que lhe permite ter
conhecimento explícito da sua língua, que, segundo GONÇALVES, GUERREIRO e
FREITAS (2009, p.16), consiste na “consciencialização e sistematização do
conhecimento da língua, com vista à sua utilização adequada nos modos oral e escrito”.
Uma vez que as EI resultam de processos metafóricos, a sua aquisição passa pela
compreensão da linguagem figurada por parte da criança, sendo necessária a sua
familiarização com a realidade e com o significado da expressão.

PLANO DE TRABALHO
TEMA: FRSEODIDÁTICA PARA O PORTUGUÊS DE ANGOLA: ESTUDO E
ENSINO DE EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS

CAPÍTULO I – OS ESTUDOS FRASEOLÓGICOS


1. Surgimento e evolução da Fraseologia como disciplina
2. As unidades fraseológicas
2.1. Critérios de classificação das unidades fraseológicas
2.2. Classificação das unidades fraseológicas
3. As expressões idiomáticas: definição e problemas
3.1. Classificação quanto à tipologia
3.2. Processos de aquisição das expressões idiomáticas
3.3. Do sentido literal ao sentido figurado
4. As expressões idiomáticas no contexto do português falado em Angola
5. Inserção das expressões idiomáticas no sistema de ensino angolano
5.1. Os manuais e programas do Ensino Primário e do I Ciclo do Ensino
Secundário

CAPÍTULO II – A FRASEODIDÁTICA
1. A Fraseodidática como disciplina
2. O papel da Fraseodidática no processo de ensino e aprendizagem de unidades
fraseológicas
3. Uma fraseodidática adaptada à realidade angolana

CAPÍTULO III – ENSINO DO LÉXICO


1. As ciências do léxico
2. Teorias de ensino e aprendizagem do léxico (vocabulário)
2.1. Ensino implícito e explícito do léxico
3. As expressões idiomáticas como partes integrantes do léxico de uma língua

CAPÍTULO IV – METODOLOGIA
1. Os métodos de pesquisa
1.1. Métodos quantitativos e qualitativos
2. População estudada: caraterização e razões de escolha
3. Instrumentos de recolha
3.1. O inquérito
3.2. A entrevista
3.3. Critérios de seleção de EI para cada nível de ensino
4. Constituição do corpus

CAPÍTULO V – ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DO CORPUS


1. Apresentação do corpus
1.1. Análise do corpus
2. Análise dos programas de Língua Portuguesa do Ensino Primário e I Ciclo do
Ensino Secundário
3. Análise dos manuais de Língua Portuguesa do Ensino Primário e I Ciclo do
Ensino Secundário
4. Discussão dos resultados

CAPÍTULO VI – PROPOSTA DE DIDATIZAÇÃO


1. Proposta de inclusão de EI nos programas e manuais de Língua Portuguesa do
Ensino Primário e I Ciclo do Ensino Secundário
2. Elaboração de caderno de exercícios
2.1. Tipos de exercícios
2.1.1. Exercícios de preenchimento de lacunas
2.1.2. Exercícios de substituição
QUESTINÁRIO

FASE 1
1. Produção livre de um pequeno texto com a inclusão de EI, com vista a
avaliar o grau de conhecimento que os alunos têm sobre EI e o uso que
fazem delas
FASE 2
1. Apresentação de um texto;
2. Selecção ou detecção de todas as EI constantes no texto;
3. Análise e discussão sobre os seus significados, sua origem e situação de uso;
FASE 3
1. Exercícios de preenchimento de lacunas;
2. Exercícios de substituição;
FASE 4
1. Exercício de produção livre para aplicação das EI aprendidas

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1. Completa as frases com as seguintes expressões idiomáticas.
Bolo e leite; dar gasosa; mata enteado; manga de 10
a) Ao pequeno almoço, comemos _____________________ com ovos e
chá.
b) Com o combate à corrupção, levada a cabo por João Lourenço, os
cidadãos vão deixar de _____________________ para a obtenção de
vagas nas escolas.
c) Tens que deixar de ser __________________ se te quiseres impor no
seio dos teus amigos.
d) Sou um homem adulto e muito sério. Por isso, não me meto com
____________ para evitar problemas.
2. Reescreve as frases, substituindo as expressões idiomáticas pelos seus
sinónimos.
a) O Vavá do Kwanza Sul é uma pessoa muito conhecida por ser gira
bairro.
__________________________________________________________
b) Aconselho sempre os mais novos a não partirem o lápis muito cedo
caso queiram ser alguém na sociedade.
__________________________________________________________
c) Não bebas vinho de forma exagerada ao ponto de chamares diogo.
__________________________________________________________
d) Felizmente, nenhuma pessoa deu o caldo em Angola por causa do
corona vírus.
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QUESTINÁRIO A APLICAR AOS PROFESSORES E COORDENADORES DE LÍNGUA


PORTUGUESA

1. Em que medida o preconceito existente em Angola a respeito das EI - vistas


como linguagem de baixa condição social ou de indivíduos menos escolarizados
- afeta as políticas de ensino e, portanto, os programas e os instrumentos
didáticos?
2. c) Que medidas poderiam alterar os documentos orientadores do ensino-
aprendizagem, no que diz respeito às EI?
3. d) Que propostas de didatização das EI, baseadas em literatura e modelos
internacionais para a L1 e a L2, poderão aplicar-se ao caso do Português em
Angola?
4. e) Como promover e valorizar tanto as EI de raiz portuguesa como as criadas
numa variedade linguística cuja norma ainda está em elaboração?
5. f) Como promover as EI vernáculas de Angola, dado o crescente desinteresse
pelas línguas nacionais e pelos valores culturais tradicionais do país?
6. g) Como melhorar o estado dos estudos sobre a Fraseologia angolana, e,
especificamente, sobre as EI? As perguntas atrás articulam-se com outras
questões, às quais se procurará dar resposta:
7. 1. Compreender os fundamentos político/linguísticos das orientações seguidas
pelo INIDE, levando-o a não incluir a exploração das EI no domínio do
funcionamento gramatical e pragmático da língua portuguesa em Angola. 2.
Caraterizar a visão dos Coordenadores e Professores de Língua Portuguesa sobre
o papel das Línguas Nacionais no processo de formação de novas EI. 3.
Contribuir para atualizar as políticas linguísticas definidas pelo INIDE, tendo em
vista a valorização quer das Línguas Nacionais quer, neste caso, das EI com
origem naquelas.

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