Você está na página 1de 7

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL (UFFS)

LINGUÍSTICA APLICADA AO ENSINO E APRENDIZAGEM


DA LÍNGUA PORTUGUESA

PROFA. ANA BEATRIZ

Carolina de Lima Andrighetti

Apresentação histórica da Linguística Aplicada

Como qualquer outra área do conhecimento a Linguística Aplicada surge


de uma necessidade, a de comunicação. Durante a Segunda Guerra a
diferença de línguas era muito presente, por isso, havia a busca científica de
métodos de aprendizagem de línguas em curto período de tempo. Por este
motivo, surge o questionamento sobre da eficácia dos métodos de ensino de
línguas estrangeiras na época, os de gramática e tradução. Historicamente,
podemos dizer que a Linguística Aplicada nasceu há sessenta anos como uma
disciplina do estudo de línguas estrangeiras. O primeiro curso aconteceu na
Universidade Michigan em 1946. Ainda, a Inglaterra e os Estados Unidos
tinham uma abordagem mais científica da Linguística Aplicada (LA) no ensino
de línguas estrangeiras. Estes países utilizavam os conhecimentos
behavioristas para realizarem seus estudos que teriam relação com o
comportamento humano.

A Linguística Aplicada tem como objeto de estudo a linguagem na


prática social, hodiernamente não somente em relação às línguas estrangeiras,
mas também no contexto do ensino aprendizagem da língua materna e dentre
outros contextos. A área é fortemente voltada a ciência dos métodos e técnicas
de ensino de línguas. Então, se pode afirmar que a LA possui três direções
atualmente, sendo elas o ensino e aprendizagem, aplicação da linguagem e
investigações obre o estudo de linguagem como prática social.

Na metade do século XX as ideias de Chomsky começam a ficar muito


conhecidas depois de anos de teorias saussurianas. E a LA inicia um longo
processo de consolidação, pois a linguagem precisava ser estudada em seu
uso, sendo o oposto de estudos saussurianos e chomskyanos. A escola
gerativista de Chomsky se tornou quase um estudo matemático e exato da
língua, onde ela passa a ter um status diferente dentro das ciências humanas.
Como Rodrigues e Rizzatti (2011. p. 19) afirma:

O grande sucesso do programa gerativista e a excelência


reconhecida do pensamento de Chomsky parecem ter sido fatores
determinantes para a secundarização de grande parte dos estudos
linguísticos de base sociocultural e histórica. Nesse contexto, teóricos
que tratavam a língua como representação cultural, não raro, foram
tidos como atuantes em áreas que não correspondiam à Linguística.

Logo, a busca por estes estudos cresceu e devido a complexidade dos


estudos chomskyanos o formalismo torna se uma ciência para os
pesquisadores que buscavam aprofundar-se nela.

Na década de 1980 no Brasil surgem algumas marcas do crescimento


da LA, como a criação do Programa de Linguística Aplicada ao Ensino de
Línguas da PUC-SP e a criação do doutorado e pós-graduação no mesmo ano.
Também, o surgimento do Programa de Pós-Graduação em Linguística
Aplicada da Unicamp o que possibilitou que muitas outras universidades
pudessem ter seus próprios programas em LA. Com essa grande expansão
inicia um processo de estudo através da gramática e o ensino de línguas
maternas. Segundo Rodrigues e Rizzatti (2011. p.22):

Vários estudiosos, sobretudo nas décadas finais do século passado,


debruçaram-se sobre a discussão da necessidade de rever princípios
norteadores da atividade escolar em língua materna, movidos, tais
estudiosos, por teorizações linguísticas de caráter mais formal.
Estudos sobre leitura, por exemplo, fundamentaram-se em pesquisas
psicolinguísticas que descreviam modelos de processamento
cognitivo – como a informação “entra” no cérebro, e o que o cérebro
“faz” com ela –, particularizando o funcionamento da memória, da
percepção e de outros itens afins.

Neste período, de modo mais evidente, passam a ser realizados estudos


de sujeitos interactantes, ou seja, humanos em situações de fala reais. Neste
ponto, diversas disciplinas como a Sociolinguística Interacional, a Linguística
Textual, a Análise do Discurso, a Análise da Conversa e a Etnolinguística,
potencializaram o estudo de dimensões sociais, culturais e históricas do uso da
língua. Essas disciplinas unem uma concepção de língua como objeto social
em teorizações que impactaram os estudos aplicacionistas, que da mesma
forma, repercutiram sobre a concepção de Linguística Aplicada contribuindo
positivamente em sua modificação A recorrência de publicações nessas áreas
oportunizou olhares sobre a usualidade de teorias atribuídas até então à LA.

Linguística Aplicada ao ensino de Língua Portuguesa

Conforme o texto de Larossa, podemos perceber que a vocação é algo


que conhecemos de forma pré-destinada. É o instinto agindo de forma natural
nos mostrando qual caminho tomar. Dentro da Língua Portuguesa tem-se um
mundo de possibilidades para ensinar e aprender. O signo ao qual mais me
identifico é a literatura e a forma como encontramos nela um método de ensino
mais leve. Que permite ao aluno ter sua própria imaginação sobre o que lê. A
literatura por sua vez, faz com que conheçamos novos mundos através de seus
gêneros e também nasce a possibilidade de escolher sobre o que queremos
aprender. De acordo com Larossa (2019. p. 62):

Descobrir uma vocação não é apenas averiguar o que gostamos ou o


que nos satisfaz, mas o que ela exige de nós. Essa exigência tem a
ver com co-responder ao que há aí para aprender, para interpretar,
para fazer, para pensar. Sem essa dimensão que, para Deleuze, tem
a ver com a verdade, com a exigência da verdade, a prática de
qualquer atividade, qualquer um ofício, permanece na frivolidade, na
superficialidade, na aparência, no engano, na dissipação, no
egocentrismo e nas insatisfações do meramente amoroso (no sentido
emocional).

A citação de Deleuze em “Signos do mundo” faz menção ao aprender os


signos. A vocação é o aprendizado e interpretação dos mesmos e como o autor
mesmo cita “A vocação é sempre a predestinação em relação aos signos”.
Portando, como professora de língua portuguesa, pretendo levar essa forma de
aprender para a sala de aula.

As instituições de ensino ao utilizar a Linguística Aplicada devem buscar


incentivar o aluno a desenvolver-se neste campo, porém, as matérias estão
todas fragmentadas em leitura, compreensão, literatura, gramática e produção
textual. Esta divisão faz com que os alunos sintam-se confusos e não os
permite refletir de maneira correta sobre a linguagem. Primeiro há a
decodificação e depois a análise.

Um dos pontos mais abordados é o uso excessivo da gramática em


alguns casos. Ela se torna um aliado e um conforto do professor ao ter como
base algo que leve suas aulas a diante, porém, tornam-se aulas cansativas e
com pouco ensino-aprendizagem e mais a repetição insistente de que
português é somente gramática. O professor precisa lembrar que o ensino de
línguas não está apenas na gramática, seu papel não é apenas fazer com que
seus alunos adquiram uma variante da língua, mas também ajudá-los a ampliar
seus conhecimentos em outros níveis de uso dessa língua. Por este motivo, é
necessário mostrar que as variantes existem e permitir ao aluno conhecê-las
levando diferentes textos e gêneros para a sala de aula.

Marcos Bagno (2013) expõe que é encargo do professor de língua


portuguesa favorecer a reeducação sociolinguística com seus alunos. A fim de
que, se formem cidadãos que possuam noção da complexidade social de
possuir direitos, deveres e obrigações. As crianças, em sala de aula, ficam
frente a usos da língua que não são comuns em sua vida e não aprendendo
essas novidades está submetido ao julgamento quando interagir com os outros.

Portanto, os estudos da gramática devem ser desenvolvidos de forma


que se possa ampliar a capacidade de comunicação dos alunos. O professor
precisa dedicar-se a produção e exposição de textos com diferentes variedades
lingüísticas, fazendo com que se tenha relação com o mundo real. Rajagopalan
(2003. p. 127) afirma que:

A linguística é uma prática social como qualquer outra e tem por seu
objeto a própria linguagem, que, conforme abordagem teórica que se
adota, se esforça para caracterizar ela como uma realidade mental ou
um objeto de natureza algoritmo etc.

A LA quer mostrar que o ensino de língua deve partir da valorização da


língua falada, a qual se aprende desde a infância e que está em constante
mudança. É imprescindível considerar as evoluções lingüísticas e utilizar a
gramática apenas para ter-se o domínio da língua escrita. É necessário trazer
que a língua falada possui pontos que devem ser aprimorados na sala de aula.
A gramática precisa estar sempre articulada a produção de texto e relacionada
a outros elementos do processo de ensino-aprendizagem de línguas. Sobre a
gramática Marcos Bagno (2007) afirma:

Por isso, para as pessoas que a todo momento nos perguntam: “É ou


não é para ensinar gramática?”, a resposta é: se for para ensinar
gramática como mera repetição da doutrina tradicional, anacrônica e
encharcada de preconceitos sociais, definitivamente não é para
ensinar gramática. Se “ensinar gramática” for entendido como
decoreba da nomenclatura sem nenhum objetivo claro e relevante,
análise sintática de frases descontextualizadas e às vezes até
ridículas, definitivamente não é para ensinar gramática. Mas se por
gramática entendermos o estudo sem preconceitos do funcionamento
da língua, do modo como todo ser humano é capaz de produzir
linguagem e interagir socialmente através dela, por meio de textos
falados e escritos, portadores de um discurso, então, definitivamente
é para ensinar gramática, sim. Na verdade, mais do que ensinar, é
nossa tarefa construir o conhecimento gramatical dos nossos alunos,
fazer com que eles descubram o quanto já sabem da gramática da
língua e como é importante se conscientizar desse saber para a
produção de textos falados e escritos coesos, coerentes, criativos,
relevantes etc.

Diante do posicionamento do autor, compreende-se que a gramática


deve ser trabalhada, entretanto com a finalidade de contribuir na formação do
aluno, é necessário que as regras ensinadas disponham do propósito de dispor
sentido aos textos que serão utilizados nas circunstâncias de comunicação e
que o mesmo consiga, por meio de produções textuais apropriadas, interagir
socialmente.

Letramento e a Linguística Aplicada

O letramento está relacionado ao uso da língua em sociedade e com o


impacto da língua escrita na vida moderna. O conceito de letramento surge
com Paulo Freire que se aproxima da caracterização que temos
hodiernamente. O uso da língua mudou com o passar dos anos e suas formas
também, em relações cotidianas, científicas, tecnológicas e de mesmo modo
escolares. Hoje, espera-se que o aluno ao invés de ser somente alfabetizado
também seja letrado.

Uma das razões para as incertezas do professor frente à mudança


paradigmática profissional é desconhecer as teorias que embasam os
documentos oficias que necessitam cumprir para aplicação de uma aula de
Língua Portuguesa. Para justificar a utilização do livro didático e o desânimo do
professor em relação a criação de suas próprias didáticas Kleiman (2008)
afirma que:

As mudanças no sistema educacional em curso, decorrentes de todo


esse trabalho, criam uma situação de incerteza que desestabiliza o
professor alfabetizador e o professor de língua materna, como já
apontei em trabalho anterior (KLEIMAN, 2006). De fato, a publicação
dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o Ensino
Fundamental (1997) e para o Ensino Médio (1999, 2001, 2006), o
estabelecimento de um sistema de avaliação permanente do livro
didático (PNLD, 1997); as diversas avaliações dos alunos das escolas
públicas (SAEB, 1997; ENEM, 1999), a obrigatoriedade de curso
universitário para professores (Lei de Diretrizes e Bases no 9.394/96);
o exame nacional de egressos dos cursos universitários (Provão
(1996-2003) e ENAD, 2004), que trazem novas exigências e deveres
sem os concomitantes direitos, contribuem para o desânimo
generalizado que reina entre esses profissionais. (KLEIMAN, 2008, p.
488).

Dessa forma, podemos compreender o motivo do grande


desencorajamento do professor poder ter sua autonomia em sala de aula é
devido aos inúmeros parâmetros que eles precisam obedecer e não possuem
muito conhecimento sobre os mesmos. O próprio governo federal cria esses
materiais didáticos que são enviados as escolas para utilização do professor
que por fim se vê impotente e frustrado com a situação. Segundo Kleiman
(2008):

Contribuindo para a instabilidade, estão as complexas relações entre


o professor e os órgãos que formam e regulam a carreira docente,
entre as quais a relação quase simbiótica que existe entre escola e
academia, e que se manifesta de maneiras potencialmente
empobrecedoras para o professor. Por exemplo, sala de aula,
professor, aluno, sua interação e seus textos são, todos eles,
separada ou conjuntamente, objeto de constante escrutínio por parte
de pesquisadores da universidade, sem que haja um retorno
reconhecido como tal pelos professores que, muitas vezes, não
prevêem quanto pode ser inquisitiva a pesquisa. Outra manifestação
dessa relação é fornecida pela presteza com que teorias sobre a
linguagem são adotadas e adaptadas por professores e
coordenadores pedagógicos, como foi o caso, na última década, dos
estudos do letramento e das teorias de gênero, mesmo quando as
teorias estão ainda em elaboração ou quando não são oferecidas
como remédio para os males do ensino de português pelos seus
proponentes. (KLEIMAN, 2008. p. 489).

Por fim, posso afirmar que existem grandes incógnitas a serem


resolvidas nos sistemas de educação que grande parte da responsabilidade
está destinada ao governo, mas também, as instituições de ensino que devem
tentar propiciar aos seus professores maior entendimento a essas situações
que causam instabilidade. Todo o reflexo destes problemas está resultando em
alunos não letrados, com dificuldade de escrita e compreensão de simples
textos que, de mesma forma, precisam encarar um mundo sem qualquer
preparação para ele.
Referências

BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da


variação linguística. São Paulo: Parábola, 2007.

BAGNO, Marcos. Sete erros aos quatro ventos: A variação linguística no


ensino de português. São Paulo: Parábola, 2013.

KLEIMAN, Ângela B. Os estudos de letramento e a formação do professor de


língua materna. Linguagem em (Dis)curso – LemD, v. 8, n. 3, p. 487-517,
set./dez. 2008

LAROSSA, Jorge. Esperando não se sabe o que: sobre o ofício de ser


professor. Signos do Mundo. Belo Horizonte. Editora Authêntica. 2018

RAJAGOPALAN, Kanavillil. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade


e a questão ética. São Paulo. Editora Parábola. 2003. Pág. 126-127

RODRIGUES, Rosângela Hammes. RIZZATTI, Mary Elizabeth Cerutti.


Linguística Aplicada: ensino de língua materna. Florianópolis: LLV/ CCE/UFSC.
2011.

Você também pode gostar