Você está na página 1de 15

1 ANÁLISE DOS CONCEITOS DE PUBLICIDADE,

PROPAGANDA E MARKETING À LUZ DO CÓDIGO DE ÉTICA


DOS ADVOGADOS DO BRASIL NA DIVULGAÇÃO DOS
SERVIÇOS JURÍDICOS

A fim de proceder a uma análise precisa acerca do debate que cerca a temática dos
modos de divulgação dos serviços jurídicos face aos instrumentos normativos que regem a
atividade da advocacia, buscar-se-á, em um primeiro momento, responder ao seguinte
questionamento inicial: como como compreender os conceitos de publicidade, propaganda e
marketing, dentro e fora do âmbito jurídico, de modo a verificar os limites que tornam a
atividade da advocacia mercantilizada?

Entretanto, para que a presente discussão encontre a devida profundidade, para além da
observação fria e isolada dos dispositivos correntes acerca da temática, é mister instituir uma
profunda análise das bases conceituais e deontológicas do exercício da própria advocacia,
investigando a maneira pela qual foram estabelecidas tais diretrizes, que definem o papel da
advocacia na sociedade, questionando ainda se, em razão da acelerada evolução da profissão,
seria viável entender tais bases como inertes e à prova de mudanças.

Ademais, para que se complete o objeto da presente reflexão, a fim de compreender o


que, de fato, poderia ser enquadrado como uma prática mercantilizadora da advocacia, cabe
ainda uma análise acerca das regras que regem a divulgação dos serviços jurídicos no Brasil,
as quais encontram lugar nos dispositivos do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos
Advogados do Brasil (CEDOAB), Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil
(EOAB) e Provimento No. 94/2000.
1. 1 Conceitos gerais de publicidade, propaganda e marketing na
propagação de serviços

Inicialmente, é de tamanha importância compreender a construção genérica dos


conceitos de propaganda, publicidade e marketing, para somente então proceder a uma análise
específica acerca da manifestação de tais ferramentas no âmbito do CEDOAB. Nesta senda,
observa-se que, inobstante a existência de conceituações diversas para os termos de
publicidade e propaganda, de modo prático ocorre uma identidade entre ambos os conceitos.
Consoante ensinamentos de Sant`Anna (2015, p. 68):

a publicidade é um meio de tornar conhecido um produto, um serviço ou uma


marca; seu objetivo é despertar, nos consumidores, o desejo pela coisa anunciada, ou
destacar aspectos que diferenciam o produto de seus concorrentes ou o aumento de
seu valor junto ao target; ela faz isso abertamente, sem encobrir o nome e as
intenções do anunciante;

Para além de tais funções comerciais, observa-se que, para o autor, a publicidade é
essencial até mesmo como um dos modos de se concretizar a liberdade de expressão, sendo
este um dos corolários fulcrais ao estado democrático de direito brasileiro (SANT’ANNA,
2015).

Ainda que seja considerado de modo praticamente semelhante à publicidade, o conceito


de propaganda tem o diferencial de não necessariamente visar o lucro. Para além disso, tem-se
que a propaganda objetiva o estímulo a adesão de uma determinada ideia ou posicionamento
de natureza não necessariamente comercial, podendo englobar as mais diversas esferas, como
a política ou religiosa, fazendo, para isso, uso de ferramentas de convencimento e persuasão, a
fim de que haja um estímulo específico para que o alvo da propaganda possa tomar uma ação
no sentido desejado pelo propagador da ideia (SANT’ANNA, 2015).

Neste sentido, observa-se que, em termos históricos, a propaganda sempre foi vista
como um meio para disseminar ideologias religiosas e políticas, no intuito de angariar adeptos
às mesmas e fortalecer movimentos, sendo aplicada em contextos relacionados a cruzadas
religiosas, ou até mesmo a propagação de ideias em movimentos políticos, encontrando lugar,
principalmente na Alemanha nazista, na qual muitos foram levados a crer, por meio de
diversas ferramentas de persuasão empregadas na propaganda política, que aderir à ideologia
do estado totalitário poderia fortalecer uma nação.
Com a evolução do contexto das relações de consumo, tem-se observado, cada vez
mais, uma incessante busca por conhecimento, por parte daquele que se propõe a adquirir
determinado produto ou serviço. Soma-se a isto o fato de existir ainda uma crescente
necessidade de diferenciação de mercado, pautada em quesitos de autoridade e entrega de
valor aos clientes, o que tem sido posto em prática usualmente por meio do marketing.

Segundo o entendimento de Drucker (1975), sendo este um dos autores consagrados da


Administração, a venda em si é considerada essencial e primordial. Entretanto, ainda assim,
por meio do marketing, é possível que tal atividade seja sobremaneira otimizada, tendo em
vista que o objetivo de tal ferramenta reside em estabelecer um profundo conhecimento do
cliente e de suas necessidades, a fim de que o produto oferecido possa suprir as expectativas e
as necessidades de um potencial cliente, o qual, no momento da aquisição do produto ou do
serviço, irá encontrar uma conexão entre sua necessidade e que é oferecido por meio do
vendedor ou prestador de serviços. Para que tudo isto ocorra, é preciso somente publicizar a
existência do produto ou serviço de modo direcionado.

Depreende-se, portanto, que segundo o conceito supracitado de marketing, qualquer


divulgação direcionada dos serviços jurídicos teriam uma finalidade de otimizar o trabalho e o
esforço do advogado, tornando cada vez mais valioso o exercício da advocacia, se tão
somente o serviço fosse disponibilizado ao mercado de maneira direcionada e visível àqueles
que principalmente necessitam que seja concretizado o corolário constitucional do acesso à
Justiça.

Entretanto, tendo em vista principalmente a evolução do atual contexto, levando-se em


consideração a migração das mais diversas atividades para o âmbito digital e a mudança no
modo de consumir produtos e serviços, não somente se afigura como suficiente a mera
divulgação direcionada de serviços, mas surge cada vez mais a necessidade de engajar o
consumidor no processo e provar a ele que o advogado realmente é o profissional correto para
defender seus interesses.

Para que isso realmente ocorra, deve haver um destaque do serviço proposto, levando o
consumidor a se tornar um defensor fiel do produto ou serviço, o que é conseguido por meio
da diferenciação de mercado e do estudo do caminho percorrido pelo consumidor, até que ele
decida pela contratação do serviço, sendo o principal objetivo o encantamento do cliente, a
fim de torná-lo um grande recomendador dos serviços (KOTLER, 2017).
Do modo mais basilar, o conceito aplicado do marketing na seara dos serviços jurídicos
pode ser compreendido como uma ferramenta de comunicação da área de atuação do
advogado de maneira direcionada e assertiva, que atende aos ditames do Código de Ética da
OAB acerca da temática e que proporciona o encaixe perfeito entre a área de atuação de foco
do advogado e a demanda que o futuro representado busca solucionar.

Para além da aquisição de clientes, esta técnica, que exige um extenso e direcionado
planejamento de estratégia, tem como um dos seus focos principais trazer clientes com
demandas qualificadas e conferir aos mesmos um relacionamento exclusivo e especial, por
meio do qual, neste contexto de tratamento personalizado, observam-se imensos ganhos
como, por exemplo, clientes que se tornam advogados de marca e passam a divulgar os
serviços do advogado.

Segundo dados do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (2021),


atualmente o quadro institucional de advogados regulares e cadastrados conta com 1.210.314
advogados em todos os estados da federação brasileira, isto sem contabilizar os cadastros
suplementares e os de estagiários. Com tais números, a diferenciação de mercado passa a ser
um objetivo praticamente intangível, principalmente no que diz respeito àqueles recém-
formados e recém-inscritos no quadro de advogados regulares da OAB.

Por tais motivos, pode-se afirmar ainda que o marketing jurídico surge como uma
inteligente solução para a questão do crescente número de advogados no Brasil, estabelecendo
um confronto com o pensamento fixado no senso comum, segundo o qual a propagação
facilitada e direcionada dos serviços jurídicos poderia vir a ferir a dignidade da profissão em
uma suposta onda de mercantilização dos serviços jurídicos.

Em verdade, a inexistência de técnicas direcionadas de publicidade, propaganda e


marketing jurídico proporcionariam uma verdadeira situação de defasagem do exercício de tal
mister, uma vez que ausente a diferenciação e a especialização do causídico, a contratação
para a solução de demandas poderia ocorrer sem qualquer consideração pela técnica e pela
especificidade da área de atuação do advogado.

Entretanto, se o advogado usa corretamente as ferramentas de marketing jurídico, ele


pode conseguir se destacar da multidão de advogados, e isso vale, inclusive, para aqueles
recém-formados, que irão começar a construir sua carteira de clientes do zero.
Além disso, merece destaque a aplicação da estratégia de marketing de conteúdo, que
destaca o conhecimento jurídico do advogado como ativo principal para atrair clientes. A
técnica consiste em dar ao cliente informações práticas e relevantes sobre seus direitos, o que
é extremamente valioso, considerando que o comportamento padrão atual daqueles que
consomem produtos e serviços é o de fazer pesquisas sobre os atributos daquilo que se busca,
para somente então concretizar a compra ou a contratação.

Por tal motivo, demonstrar que tem conhecimento é, na verdade, um grande fator que
gera confiança para que a contratação seja feita, além de proporcionar ao advogado uma
imagem de especialista e autoridade no assunto que se propõe a divulgar, fato este que é capaz
de não somente elevar a busca por seus serviços, mas que também faz com que o cliente
permaneça fiel ao causídico, confiando neste para solução de demandas futuras.

1.2 Visão histórica acerca da regulamentação da prática da advocacia no


CEDOAB e análise dos demais dispositivos que regem a divulgação de
serviços jurídicos no Brasil

Durante todo o desenrolar histórico, observa-se a advocacia como uma atividade quase
nunca atrelada a um sentido mercantil, desde o momento em que surgiu de modo
regulamentado, no Império Romano do século VI (LÔBO, 2019 p. 22), até o momento em
que a mesma foi estabelecida no Brasil-Colônia, por meio das Ordenações Filipinas (LÔBO,
2019 p. 23).

Embora houvesse, no Brasil, a prévia regulamentação do exercício da advocacia em si,


consoante ensinamentos de Braga (2016), as primeiras vedações na propagação de serviços
jurídicos tomaram forma tão somente no momento em que foi estabelecido o Instituto dos
Advogados de São Paulo (IASP), instituto este que veio a editar, posteriormente, um código
de ética que deveria trazer algumas diretrizes principais sobre o exercício do mister
advocatício, sobretudo aquelas atinentes à publicidade na advocacia.

Tais normas preconizaram pontos fulcrais sobre a publicidade, como a impossibilidade


de angariar clientes por meio de agenciamentos de terceiros, bem como a vedação acerca de
propagandas indiretas acerca dos atributos do advogado (BRAGA, 2016).
Para entender a razão de ser de tais regras, mister ressaltar ainda que, neste contexto, o
exercício da atividade da advocacia era compreendido verdadeiramente como uma função
pública e de alta honra, tendo em vista que o advogado estaria atuando não em busca de uma
aferição direta de renda, mas sim em busca da defesa de seu cliente e da satisfação dos
direitos do mesmo.

Nesta senda, dado o contexto do exercício da advocacia, a mercantilização pareceria


algo totalmente avesso à função de honra desempenhada pelo advogado, sendo praticamente
incompatível imaginar a mercantilização, ou seja, a oferta dos serviços do advogado em um
mercado aberto, visão esta que, de certo modo, perdura até a atualidade.

Entretanto, ocorre que se observa uma tremenda diferença de cenários. Embora seja
peculiar à profissão do advogado, seria extremamente dificultoso imaginar que cerca de
1.210.314 de advogados praticam seu mister única e exclusivamente pela paixão na defesa
dos direitos e interesses de seus clientes.

É verídico que esta vontade também precisa estar presente no momento em que o
advogado opta por representar aquele que o procura. Entretanto, dada a evolução de todo o
contexto mundial, colocam-se nesta equação diversos fatores, como a compreensão da
advocacia como um serviço disponível no mercado, e a mudança na forma de contratação de
produtos e serviços, os quais agora, mais do que nunca, precisam se tornar públicos aos olhos
dos consumidores, sendo estes alguns dos fatores propulsores da necessidade de mudança na
compreensão dos modos que são utilizados para divulgar serviços jurídicos na atualidade.

Em se tratando especificamente da questão da publicidade à luz do Código de Ética da


OAB, denota-se que, historicamente, tal questão somente veio a ser expressamente tratada no
Código de Ética de 1995, uma vez que tal ponto não foi abordado naquele de 1934, o qual não
trouxe em seu conteúdo qualquer especificidade atinente às diretrizes da publicidade na
advocacia, ainda que fosse inspirado no Código de Ética do Instituto dos Advogados de São
Paulo (IASP), o qual já trazia um princípio de normas regulamentadoras acerca da
publicidade.

Inobstante a construção específica de um Código de Ética para o exercício do mister da


advocacia, posteriormente observou-se o gradativo surgimento de uma força de mudança para
o código de 1934, sendo um dos fatores propulsores de tal modificação a recente edição do
Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil em 1994 e a necessidade da adequação das
normas do Código de Ética ao mesmo, bem como a segunda força propulsora foi justamente a
necessidade repensar as normas que haviam sido estabelecidas a mais de meio século, tendo
em vista a premente necessidade de torná-las pensadas à luz de um novo contexto social
(MEDINA, 2016, p. 11).

Entretanto, apesar desta ampliação de previsões no Código de Ética de 1995,


posteriormente, esta mesma pauta da publicidade na advocacia seria, novamente, uma das
principais forças propulsoras da modificação do código, sendo esta premente, novamente, em
razão da mudança de contexto social e da evolução da sociedade, bem como dos meios de
comunicação, os quais passaram cada vez mais a assumir uma forma digitalizada e eletrônica
(MEDINA, 2016, p. 13).

A disciplina da matéria da publicidade no Código de Ética da OAB de 2015 foi


marcada pela dedicação de um capítulo exclusivo ao assunto, qual seja o capítulo VIII,
intitulado "Da publicidade profissional". Em um primeiro momento, consoante palavras do
então Presidente Nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, em seu texto de
apresentação ao supracitado diploma, trouxe à baila alguns pontos fulcrais acerca da nova
regulamentação da publicidade na advocacia, conclamando que, no contexto de 2015:

A publicidade na advocacia é versada em face da nova realidade eletrônica e


tecnológica, considerando os instrumentos inexistentes há vinte anos. Permite-se a
utilização da telefonia e da internet como veículos de publicidade, com as cautelas e
o disciplinamento que a profissão reclama.

De fato, atendendo ao comentário do anterior Presidente Nacional da OAB, o novo


código encerrou tais avanços em seus dispositivos. Entretanto, mediante a realização de uma
análise holística acerca dos dispositivos do referido capítulo VII, observa-se, sobretudo e
inobstante os avanços observados, uma certa cristalização do conservadorismo que refreia
maiores avanços no que tange ao emprego de ferramentas para a divulgação de serviços
jurídicos, encerrada, em particular, no artigo 39 do CEDOAB de 2015, “A publicidade
profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e
sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão.”

Portanto, consoante o entendimento supracitado, torna-se completamente abominável


toda e qualquer divulgação de caráter ridicularizador ou aviltante do exercício jurídico, sendo
feito em prol de uma captação de clientela, tendo em vista que tal atitude fere diretamente o
artigo 5º do CEDOAB de 2015, o qual preleciona que “O exercício da advocacia é
incompatível com qualquer procedimento de mercantilização”.

Entretanto, ainda que haja uma celeuma acerca do termo da mercantilização em si,
consoante podemos observar a seguir, quaisquer divulgações que firam o referido dispositivo,
e que de fato podem vir a extrapolar o bom senso, tendo em vista a agressividade da
divulgação empregada, podem ser alvo de procedimentos disciplinares, tendo em vista a
infração ética cometida face aos dispositivos reguladores da divulgação de serviços
advocatícios:

Figura 1 – Publicidade advocatícia em ônibus

Fonte: ORSINI (2017)

Figura 2 – Publicidade advocatícia em muro


Fonte: ORSINI, Ricardo (2017).

Segundo a compreensão de Medina (2016), a justificativa para tal conservadorismo na


abertura da publicidade na advocacia, reside no fato de que o código de ética pátrio espelhou
seus fundamentos na visão do Règlement intérieur national, correspondente francês de um
código regulamentador de condutas do advogado, o qual, de acordo com Taisne, (2013 apud
MEDINA, 2016), preza bastante pela discrição do advogado quando da divulgação de seus
serviços, evitando, a todo custo, qualquer extravagância que venha a ultrapassar os limites do
mero caráter informativo da publicidade. Mister ressaltar que tal tradição aqui exposta,
também é seguida por países como Portugal, Honduras, Costa Rica, e também pelo Código
de Ética para a Advocacia do Mercosul.

Mister ressaltar ainda que, inobstante a referência primariamente feita em relação ao


CEDOAB, a temática da publicidade encontra lugar ainda no Provimento 94/2000, o qual
dispõe especificamente acerca de questões atinentes à publicidade, em tópicos como conceito
do que seria uma publicidade verdadeiramente informativa, por meio de quais canais o
advogado pode ou não vir a divulgar sua publicidade, bem como as previsões acerca da
conduta do advogado em manifestações públicas, além de prever também quais podem ser os
elementos utilizados na divulgação dos serviços do advogado.

Entretanto, de modo semelhante às demais regulamentações da questão da publicidade


advocatícia, observa-se que o referido Provimento, embora preveja em seu artigo 5º, "a", a
internet como um dos meios de divulgação de serviços, deixa a desejar no que tange a
utilização de tantas outras ferramentas específicas que foram desenvolvidas como, por
exemplo, instagram, google ads, dentre diversas outras ferramentas válidas.
Ademais, não se observa uma abertura tão maior em relação aos demais instrumentos
regulatórios, posto que, de modo semelhante ao Código de Ética pátrio, o Provimento preza
por uma publicidade consoante os moldes franceses, ou seja, prezando por tamanha
discricionariedade e pelo caráter informativo das divulgações dos serviços jurídicos.

Após esclarecidas as bases da compreensão acerca da publicidade na advocacia que,


destaca-se que, na senda do Código de Ética da OAB de 2015, não houve modificação
substancial acerca da regulamentação dos meios de propagar os serviços jurídicos, restando
quase que cristalizado o entendimento de que a publicidade advocatícia deve ter tão somente
o cunho informativo, havendo uma vedação completa acerca do emprego de qualquer
tentativa de levar um possível cliente a tomar uma decisão com base em estratégias de
marketing que visem a orientação expressa para uma determinada tomada de decisão,
tornando quase que “maligno” o emprego de qualquer ferramenta utilizada neste sentido.

Ora, é preciso refletir que, consoante os conceitos anteriormente empregados, em


especial atenção àquele que define o marketing, observa-se que, se há o desejo de que uma
pessoa que busca seus direitos em potencial venha a ser um cliente, esta precisa receber
algumas ativações de convencimento, o que implica na aplicação de estratégias, por parte do
advogado, que possam ir além da mera publicização dos serviços jurídicos no mercado, mas
que sejam capazes de gerar também uma conexão entre advogado e cliente, papel este
exercido pelo marketing jurídico na atualidade.

A questão é que, à luz dos conceitos de marketing, publicidade e propaganda


anteriormente empregados, observa-se que, no contexto atual, seria praticamente impossível a
dissociação da aplicação dos mesmos na divulgação dos serviços jurídicos, ao passo que tão
somente a publicidade, ou seja, o ato de tornar público e informativo o serviço do advogado,
faz com que o exercício profissional reste fadado ao insucesso, posto que, atualmente, não
basta ser conhecida a existência de determinado produto ou serviço, mas é preciso que o
possível contratante tenha a mínima conexão com o advogado.

Nesta senda, a fim de corroborar com a presente compreensão, observa-se uma nova
força de transformação em relação às normas regulamentadoras da divulgação dos serviços
advocatícios, tendo em vista a inevitabilidade da mudança do cenário atual em relação aos
modos de fazer publicidade no âmbito da advocacia, a qual conta, hoje, com elementos e
ferramentas extremamente avançadas, proporcionadas pelo avanço da internet, que vem
tornando o exercício da profissão cada vez mais sem fronteiras.

De tal modo, Ary Raghiant Neto, atual corregedor nacional do Conselho Federal da
OAB (CFOAB), começou a mover uma força tarefa no ano de 2019, constituindo um novo
grupo de trabalhos voltado para analisar de que modo as regras da publicidade na advocacia
poderiam ser modernizadas, de modo a contemplar os anseios da nova advocacia em relação
às redes sociais, garantindo, assim, que os advogados recém-formados pudessem ter a
oportunidade de colocação no mercado de trabalho, por meio do uso de recursos tecnológicos,
desta feita, regulamentados e seguindo devidamente os ditames éticos e deontológicos que
regem o exercício da profissão (ANGELO, 2021).

Para isto, foi estabelecido um cronograma de audiências públicas, as quais foram


realizadas em algumas seccionais por todo o Brasil. Além disso, houve também a instauração
de uma consulta pública a todos os advogados do Brasil, e que, consoante relato de Angelo
(2021). contava com os seguintes questionamentos:

É a favor da publicidade/propaganda da advocacia em redes sociais?;


É a favor da flexibilização das regras de publicidade da advocacia?;
É a favor da utilização de plataformas digitais para intermediação e divulgação de
serviços profissionais?;
É a favor da divulgação de serviços jurídicos específicos?;
Devem ser regulamentados limites da publicidade da advocacia nas redes sociais
(p.ex.: patrocínio de postagens, comentários de casos concretos, etc.)?

Ademais, o atual corregedor do CFOAB, em manifestação pública, relatou que o novo


pacote normativo, que ainda se encontra pendente de aprovação para o ano de 2021 em sessão
presencial, traria não somente inovação em relação à regulação das ferramentas digitais, mas
também, uma fiscalização bem estruturada, de modo que eventuais infrações possam ser
prontamente comunicadas e analisadas, tendo em vista que, ao que parece, a publicidade
advocatícia manterá os critérios de discrição e sobriedade, seguindo fielmente o modelo
francês, o qual, inobstante eventuais forças de avanço, permanece dando um tom de
conservadorismo à legislação pátria (OAB Goiás, 2020).

1.3 Bases deontológicas e constitucionais acerca do exercício da advocacia

Antes mesmo de proceder a uma abordagem específica da ética profissional no âmbito


da advocacia, é mister analisar o cenário geral no qual tal conceito se encontra inserido,
encontrando ainda sua relação com a deontologia. Neste sentido, a concepção de ética
segundo Adeodato (2002, p. 139 - 140) consiste em:

A tradição do termo ética é milenar. Com a expressão ethos os gregos antigos


queriam significar aquela dimensão da vida humana sobre que incidem
normas, nomoi, normas destinadas a fornecer parâmetros para decidir entre
opções de conduta futura igualmente possíveis e mutuamente contraditórias.
O conceito de ética sofreu profundas modificações desde então e tem quase
tantas definições quantas são os autores que o examinam. Sua aplicabilidade
prática, porém, permanece fiel ao sentido original de hábito, uso, costume,
direito. De uma perspectiva pragmática, as normas éticas preenchem a
mesma função vital: reduzem a imensa complexidade das relações humanas e
ajudam o ser humano a decidir sobre como agir.

Pode-se ainda afirmar que, nesta senda, diretamente atrelado ao estudo da ética, surge a
deontologia, disciplina esta que em si forma um estudo da ética profissional, atuando como
um verdadeiro guia de conduta profissional, ressaltando-se ainda que Bobbio (2013) afirma
que a ética, neste contexto específico, exerce justamente um papel de reger a conduta daquele
profissional, no intuito de estabelecer normas básicas direcionadas ao agir, consistindo estas
em um verdadeiro dever que precisa ser obedecido pelo profissional de determinada área, o
qual, na presente discussão, é o advogado.

Perante este contexto, observa-se que, corroborando com tal compreensão, a


deontologia jurídica, no entendimento de Costa (2013), visa não compreender o direito formal
ou material, mas tão somente o agir do profissional jurídico (promotor, juiz ou advogado)
consoante as normas estabelecidas para a sua atuação, tendo em vista que as mesmas são
fixadas no intuito de orientar a melhor conduta profissional a ser seguida, de modo a manter a
dignidade não somente do profissional, mas também de seus clientes, concretizando
verdadeiramente a função social da advocacia.

Portanto, o consoante a compreensão aqui construída, o objetivo da ética é estabelecer


bases para uma ação acertada da conduta, e no âmbito da deontologia jurídica, para uma
conduta proba do profissional do direito, aqui em específico o advogado. Isto porque, para a
concretização do corolário constitucional da advocacia, é preciso que o advogado atue
consoante as bases deontológicas estabelecidas, as quais encontram lugar no exercício de uma
conduta dissociada de uma predominante subjetividade decorrente da moral, pois, segundo
Medina (2016), é preciso que o advogado seja capaz de cumprir as normas éticas
estabelecidas no intuito de reger sua conduta enquanto profissional, eximindo-se de atuar tão
somente consoante suas próprias convicções morais, tendo em vista que a advocacia em si
possui uma alta carga de compromisso social, o qual, inclusive, encontra-se insculpido no
atual Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, em seu artigo 2º, §1º, o qual preleciona
que " No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social ".

Nesta senda da discussão acerca dos limites da propagação de serviços jurídicos, é


preciso ainda proceder a uma análise do real papel do exercício da advocacia, ressaltando-se
ainda a existência da dicotomia entre compreender a advocacia como uma função essencial à
Justiça e entender que a mesma também seria um negócio, que pode exigir planejamento
estratégico e emprego de ferramentas de marketing e propaganda, por exemplo.

Consoante entendimento de Lôbo (2019), somente com o Estatuto da Advocacia de


1994 surgiu a figura do advogado como aquele que é capaz de postular os direitos do seu
cliente perante a Justiça, ressaltando-se ainda seu atributo constitucional, cristalizado no
artigo 133 da CF/88, qual seja o da indispensabilidade do advogado à administração da
Justiça.

Nesta vereda, a razão de ser para o estabelecimento da advocacia como função


indispensável à administração da Justiça reside mormente no fato de que esta implica em
pensar a advocacia como uma parte do serviço público, ressaltando-se ainda que tal condição
confere ao advogado não uma prerrogativa em seu favor, mas tão somente uma obrigação
para com a realização da Justiça e para com seus clientes. Portanto, consoante a compreensão
de Lôbo (2019, p. 48), a natureza jurídica da advocacia resta enquadrada como:

É serviço público, na medida em que o advogado participa necessariamente da


administração pública da justiça, sem ser agente estatal; cumpre uma função social,
na medida em que não é simples defensor judicial do cliente, mas projeta seu
ministério privado na dimensão comunitária, tendo sempre presente que o interesse
individual que patrocine deve estar plasmado pelo interesse social.

De tal modo, compreende-se que a finalidade maior do exercício do mister da advocacia


é atender ao corolário constitucional, cristalizado na literalidade do artigo 133 da Constituição
Federal de 1988, o qual preleciona que “O advogado é indispensável à administração da
justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites
da lei.”

Entretanto, inobstante a dignidade de tais colocações, observa-se que tal característica


da natureza jurídica da advocacia não suprime a capacidade de a mesma passar a atender
demandas mercadológicas. Isto porque não mais basta o exercício da advocacia pura e
simples como bastante para tornar um profissional destacado perante o mercado.

Tal cenário reflete a necessidade de se captar e aplicar conceitos e práticas que


pertencem a outras áreas, principalmente aquelas ligadas à Administração, e também, de se
estar atento a questões como planejamento estratégico, uso de redes sociais, produção de
conteúdo, sucesso e experiência do cliente, conceitos estes que são usualmente aplicados em
negócios de outros ramos, e atualmente, por grandes sociedades de advogados, que
verdadeiramente passam a se organizar como uma verdadeira empresa, sendo dotadas de
setores de gestão, planejamento estratégico e marketing para a divulgação de suas atividades
de modo efetivo. Consoante a acertada compreensão de Motta (2019, p. 52):

Migramos, portanto, do “advogado romântico” para o “advogado empresário”, que


concatena todos os conceitos, envolvendo aqueles da era romântica e mais uma série
de outros que vão desde a forma como organizam e conduzem seus escritórios, até a
estratégia de formato de atendimento ao cliente, passando obviamente pela produção
jurídica acentuada e uma atuação mercadológica voltada ao fortalecimento de sua
marca institucional. Enfim, uma advocacia mais abrangente, corporativa e
empresarial.

Ressalte-se que não é que a advocacia perca o atributo de essencialidade à Justiça ou de


honra, mas sim que ela tem acrescida à sua função as ferramentas de negócio suficientes para
elevar ainda mais a respeitabilidade e a diferenciação do exercício da advocacia, fato este que
inicia uma era de empreendedorismo jurídico, no sentido de o advogado ou a sociedade de
advogados, buscar uma diferenciação de mercado, sob pena de restar fadado ao obsoleto.

Deste modo, tendo em vista o estabelecimento da presente dicotomia, que esbarra


diretamente naquelas questões atinentes à publicidade no âmbito da advocacia, é de basilar
importância proceder a uma análise ainda mais detida dos dispositivos atualmente existentes,
a fim de se enxergar, de modo claro, quais são as limitações impostas ao advogado em termos
de divulgação de serviços jurídicos, bem como de que modo as mesmas proibições impactam,
de modo prático, o exercício da advocacia, mediante a execução de procedimentos
disciplinares, tópico este que será objeto de análise do capítulo seguinte.

Você também pode gostar