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RECIFE
2018
ROGRIGO NETTO DE SOUZA
RECIFE
2018
Catalogação na fonte
Bibliotecária Margareth Malta, CRB-4 / 1198
UFPE
Em sessão pública, após exposição de cerca de 30 minutos, o(s) candidato(s) foi (foram) arguido(s)
oralmente pelos membros da banca com NOTA: 10,0 (deixar ‘Exame Final’, quando for o caso).
1) ( X ) aprovado(s) (nota > = 7,0), pois foi demonstrado suficiência de conhecimento e
capacidade de sistematização no tema da monografia e o texto do trabalho aceito.
As revisões observadas pela banca examinadora deverão ser corrigidas e verificadas pelo orientador
no prazo máximo de 30 dias (o verso da folha da ata poderá ser utilizado para pontuar revisões).
O trabalho com nota no seguinte intervalo, 3,0 = < nota < 7,0, será reapresentado, gerando-se uma
nota ata; sendo o trabalho aprovado na reapresentação, o aluno será considerado aprovado com
exame final.
2) ( ) reprovado(s). (nota <3,0)
Na forma regulamentar foi lavrada a presente ata que é assinada pelos membros da banca e pelo(s)
candidato(s).
Orientador: .............................................................
Avaliador 1: .............................................................
Avaliador 2: .............................................................
Candidato 1: .............................................................
Candidato 2: .............................................................
Aos meus pais, Ana Maria Souza e Alfredo Souza, e ao meu irmão, Renato Netto de
Souza, pelo apoio incondicional nestes difíceis anos de universidade.
À minha cunhada, Gabriela Cysneiros, e à minha sobrinha, Serena, pelo amor e ternura
que abastecem a minha alma.
Aos meus queridos amigos, Aline Cavalcanti, Andreyna Javorski, Beltrando Holanda,
Carolina Santos, Danilo Coêlho, Janiele Custódio, Júlia Petrucelli, Juliana Justino, Juliana
Matos, Mariana Phryston, Natália Hazin, Pedro Schobiner, Rayza Siqueira, Thalles Lopes,
Victor Pedrosa e Yasmin Rodrigues, que sempre acreditaram no meu potencial acadêmico.
À Maia Melo Engenharia, pela oportunidade de trabalhar com o que gosto e me
aprimorar profissionalmente – em particular ao colega Glauber Carvalho, pela orientação e
suporte recebidos.
Aos professores que me inspiraram nesta jornada acadêmica: Giovannia Pereira,
Maurício Pina, Roberto Azevedo, Suzana Montenegro, Washington Moura e, em especial, ao
meu professor orientador, Fernando Jordão, por me guiar e apoiar neste trabalho.
“A menos que modifiquemos a nossa maneira
de pensar, não seremos capazes de resolver os
problemas causados pela forma como nos
acostumamos a ver o mundo. ”
- Albert Einstein
RESUMO
Transport has been present in mankind since the beginning of its history, and is an essential
factor in the evolution of any society. The use of railroads as an alternative for freight and
passenger transportation dates back to the 16th century in precarious wooden facilities, and
since then, this mode has been constantly evolving, as evidenced by the materials used in its
superstructure, the different types of metal profiles used as rails, and the design, engine power
and speed of the rolling stock. Safety and comfort criteria are of fundamental importance in
determining the design parameters used in a railroad project. The adoption of railway
superelevation is a solution to the discomfort and risk of derailment in curves and is based on
counterbalancing the centrifugal force that acts on a railway vehicle through its own weight.
The design of railway superelevation can come from empirical methods, based on experience,
or rational methods, based on physical models of the equilibrium of train compositions. In this
work, different equations for railway superelevation design were applied separately to freight
and passenger trains. By means of the superelevations calculated in the two scenarios, a
comparative analysis of these methods was performed, based on the safety factors provided
against derailment and on the active centrifugal accelerations allowed to the vehicles. All
methods converged to satisfactory results on horizontal curves of sufficiently large radii; for
small radii curves, however, empirical methods have led to relatively smaller safety factors
and comfort conditions, in opposition to rational methods. Choices relating to superelevation
design methods are the engineer’s role; normative guidelines and the assurance of economic
and operational viability of the enterprise must be kept in mind.
1 INTRODUÇÃO ___________________________________________________ 12
1.1 JUSTIFICATIVA E MOTIVAÇ ÃO ____________________________________ 13
1.2 OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS ________________________________ 14
1.2.1 Objetivo geral _____________________________________________________ 14
1.2.2 Objetivos específicos________________________________________________ 14
1.3 ESTRUTURA DO TRABALHO _______________________________________ 14
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA _______________________________________ 16
2.1 MODO FERROVIÁRIO _____________________________________________ 16
2.2 HISTÓRICO DAS FERROVIAS_______________________________________ 16
2.2.1 Cenário nacional ___________________________________________________ 18
2.3 MALHA FERROVIÁRIA ____________________________________________ 22
2.4 SUPERESTRUTURA FERROVIÁRIA _________________________________ 22
2.4.1 Sublastro _________________________________________________________ 24
2.4.2 Lastro ____________________________________________________________ 24
2.4.3 Dormentes ________________________________________________________ 26
2.4.4 Trilhos ___________________________________________________________ 27
2.5 BITOLA FERROVIÁRIA ____________________________________________ 29
2.6 FATORES IMPORTANTES DE PROJETO ______________________________ 30
2.6.1 Material rodante ___________________________________________________ 31
2.6.2 Curva horizontal___________________________________________________ 31
2.6.3 Velocidade ________________________________________________________ 32
2.7 SUPERELEVAÇÃO ________________________________________________ 33
2.7.1 Superelevação teórica_______________________________________________ 34
2.7.2 Superelevação prática ______________________________________________ 36
2.7.2.1 Critérios empíricos __________________________________________________ 37
2.7.2.2 Critérios racionais___________________________________________________ 38
2.7.2.2.1 Critérios de segurança _______________________________________________ 38
2.7.2.2.2 Critério do conforto _________________________________________________ 42
2.7.3 Considerações práticas a respeito da superelevação ______________________ 44
2.7.3.1 Determinação da superelevação prática __________________________________ 44
2.7.3.2 Valores mínimos e arredondamento da superelevação ______________________ 44
2.7.3.3 Execução da superelevação ___________________________________________ 45
2.7.3.4 Superelevações máximas _____________________________________________ 49
2.7.3.5 Velocidade limite nas curvas __________________________________________ 50
3 METODOLOGIA__________________________________________________ 52
3.1 TRENS DE CARGA ________________________________________________ 52
3.2 TRENS DE PASSAGEIRO ___________________________________________ 58
4 ANÁLISE DOS RESULTADOS ______________________________________ 64
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS_________________________________________ 73
REFERÊNCIAS ___________________________________________________ 75
12
1 INTRODUÇÃO
Sendo transporte o conjunto de materiais e instrumentos técnicos utilizados no
deslocamento de pessoas e cargas de um lugar para o outro (PENA, 2018), podemos afirmar
que o mesmo está presente na história da humanidade desde os seus primórdios, quando o
homem, utilizando os próprios pés descalços, percorria grandes distâncias em busca de sua
sobrevivência. Com o passar do tempo, o transporte foi evoluindo à medida que o homem se
desenvolvia intelectualmente, de modo a permitir que o mesmo pudesse ir para lugares cada
vez mais distantes. As primeiras mudanças ocorreram de modo básico, quando o homem teve
a ideia de proteger seus pés com couro de animais e cruzar corpos hídrico. Posteriormente,
com o avanço da ciência, foram desenvolvidos meios de transporte mais rápidos, seguros e
capazes de percorrer maiores distâncias, de modo que o homem conseguisse chegar até
mesmo ao espaço.
Nesse contexto, podemos afirmar que os meios de transporte são reflexo da sociedade,
visto que se transformam no mesmo compasso em que o homem evolui. Isso é refletido no
fato de que o transporte é um elemento essencial para garantir o desenvolvimento econômico
de uma comunidade, uma vez que quanto maior o número de atividades econômicas em uma
região, maior a sua demanda por modais de transporte; consequentemente, se esses modais
tiverem uma infraestrutura boa o suficiente para suprir tal demanda, mais provável será o
desenvolvimento econômico da comunidade.
O mundo dispõe, atualmente, de diversos modais de transporte. Os mais utilizados são
o rodoviário, o ferroviário, o aéreo, o fluvial e o marítimo. A viabilidade de utilização dessas
diversas modalidades depende das características e exigências do material a ser transportado,
da distância a ser percorrida, do tempo máximo que este material pode ser mantido em
trânsito, dentre outros fatores (PORTO, 2004). Os modais ferroviário e rodoviário prevalecem
no transporte de cargas e passageiros por terra, representando, segundo dados da CNT (2015),
pouco mais de 80% do transporte de cargas dentro do Brasil. Diante disso, há uma
necessidade de que sejam construídas vias com um projeto geométrico bem desenvolvido, de
modo a permitir um transporte eficiente e seguro. Para tal, é necessário seguir as premissas
construtivas e operacionais, tais como os tipos de veículos que podem circular na via e as
definições de elementos horizontais e verticais que transmitem segurança aos usuários e às
cargas transportadas (PAZ; OLIVEIRA, 2015).
Ao comparar as diretrizes de projeto adotadas em rodovias e em ferrovias, encontram-
se semelhanças e diferenças. Dentre os pontos em comum entre os dois tipos de projeto está
um elemento da geometria dito superelevação que, por definição, corresponde a um desnível
13
No capítulo 1, é feita uma breve apresentação da temática que será abordada, dos
objetivos a serem alcançados, e da motivação para este trabalho.
No capítulo 2, encontra-se a revisão bibliográfica utilizada como base para a
realização deste trabalho, com conceitos acerca do modo ferroviário, uma breve narrativa de
sua história nos cenários nacional e internacional, suas partes integrantes e, por fim, uma
discussão focada na superelevação ferroviária, tema principal deste trabalho.
No capítulo 3, discorre-se acerca da metodologia utilizada na análise comparativa dos
métodos de cálculo de superelevação ferroviária.
No capítulo 4, há a aplicação dos métodos de cálculo para a determinação da
superelevação ferroviária para trens de carga e para trens de passageiro, assim como a
realização da análise comparativa a partir dos resultados obtidos.
15
2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Define-se transporte como o deslocamento de uma massa, constituída por pessoas e/ou
bens, de um lugar a outro do espaço, ao longo de uma trajetória, durante certo período de
tempo, por ação de uma força exterior (VASCONCELOS, 2016). Portanto, sendo entendido,
em resumo, como qualquer ato de transportar ou conduzir um determinado ente, cada
modalidade de transporte possui suas particularidades, estando as mesmas associadas ao tipo
de veículo utilizado, à infraestrutura e ao tipo de energia adotados e, também, ao modo como
o mesmo é gerenciado. Estas particularidades caracterizam individualmente cada modo de
transporte – rodoviário, ferroviário, dutoviário, aeroviário ou hidroviário.
Similarmente aos demais modais de transporte, o modo ferroviário provém de
motivações socioeconômicas, de modo a sanar ou potencializar determinados aspectos de uma
economia particular. Seu suporte físico é a ferrovia que, além de conter todas as partes
previamente definidas em projeto em sua infraestrutura e superestrutura, deve atender a todas
as necessidades funcionais que permitam o funcionamento seguro da mesma. A ferrovia pode
ser um bem público ou privado, gerenciada por empresas especializadas que, através de
direito obtido por concessão, detêm o direito exclusivo à exploração da mesma. Os veículos
desse modo de transporte são chamados de materiais rodantes; estes, por sua vez, podem ser
tratores ou rebocados.
Além dos aspectos relacionados aos recursos humanos e veículos, o modo ferroviário
em sua plenitude abrange também aspectos de capital social, patrimônio imobiliário
(edificações administrativas, estações, oficinas), patrimônio mobiliário físico (equipamentos
de escritório e controle de tráfego) e patrimônio mobiliário financeiro. Todas essas partes
precisam existir de maneira coesiva para o bom funcionamento do modo ferroviário
(BORGES NETO, 2016).
Assim como muitas das grandes invenções da humanidade, a invenção das ferrovias
proveio da necessidade de melhorar um determinado tipo de produto ou serviço. De acordo
com a Enciclopédia Delta Universal (1985, apud BORGES NETO, 2012), o transporte sobre
trilhos decorre do início do século XVI, constituindo-se, na época, de trilhos de madeira,
utilizados como infraestrutura para o transporte de carvão e minérios.
17
e a segurança dos usuários foram sendo apresentadas. Dentre elas, tem-se o vagão dormitório,
inventado pelo norte-americano George Pullman, que deu origem a demais estilos de vagões,
deixando-os cada vez mais luxuosos; o freio a ar, patenteado pelo norte-americano George
Westighouse em 1869, que permitia uma redução de velocidade de maneira mais rápida e
segura aos trens quando comparado aos tradicionais freios manuais; e o dispositivo de engate
de vagões, patenteado em 1873 pelo norte-americano Ely Janney, que garantia o engate
automático do trem, evitando qualquer tipo de acidente que era ocasionado pelo engate
manual.
No final do século XIX e começo do século XX, iniciaram-se as tentativas de
aplicação da energia elétrica na tração de trens. As primeiras tentativas bem-sucedidas, nesse
sentido, foram realizadas pela Baltimore e Ohio Railroad, nos Estados Unidos, e por Von
Siemens, na Alemanha. Por produzir menores custos operacionais, a eletrificação das
ferrovias se popularizou, atingindo, ainda no começo do século XX, a maior parte dos trilhos
dos Estados Unidos e da Europa. Porto (2004) afirma que a eletrificação ocorria, sobretudo,
em vias de tráfego intenso, com maiores necessidades de parada, pois o modelo de tração a
vapor demandava muito combustível para aceleração e frenagem.
No que concerne à evolução dos trilhos, os mesmos começaram a ser produzidos em
aço na segunda metade do século XIX, proporcionando uma maior durabilidade e resistência
quando comparados aos tradicionais trilhos de ferro. Além disso, o aço passou também a ser
utilizado na construção de vagões, de modo que, no final de 1920, os antigos vagões de
madeira deixaram de ser utilizados.
O início da história das ferrovias nacionais decorreu do sucesso inglês ainda no século
XIX. O governo imperial brasileiro decretou uma lei em 1835 incentivando a construção de
ferrovias que ligassem o Rio de Janeiro, capital do império naquela época, às capitais das
províncias de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul. A primeira estrada de ferro no
Brasil foi construída com o incentivo de Irineu Evangelista de Souza, popularmente
conhecido como Barão de Mauá. Em 1852, deu-se início à construção da ferrovia que
realizaria a ligação do Porto de Mauá, na Baía de Guanabara, à Raiz da Serra (Petrópolis). Em
1854, a ferrovia foi inaugurada com 14,5km de extensão percorridos a uma velocidade média
de 38 km/h (RODRIGUEZ, 2004).
Após a inauguração dessa ferrovia, outras foram construídas em diferentes partes do
país. A segunda estrada de ferro do Brasil tinha como objetivo ligar Recife ao rio São
19
Francisco, no sertão de Pernambuco. Ela foi inaugurada em 1858 e, apesar de não concretizar
seu principal objetivo, protagonizou o surgimento e o desenvolvimento de diversas cidades do
sertão pernambucano. A tabela a seguir dispõe diversas estradas de ferro construídas no
mesmo período. É importante ressaltar que todas elas foram construídas com bitola de 1,60m,
sendo a bitola métrica empregada apenas posteriormente, próximo ao final do século XIX.
Ferrovia Data da Inauguração
Estrada de Ferro Mauá 30/04/1854
Recife ao São Francisco 08/02/1858
D. Pedro II 29/03/1858
Bahia ao São Francisco 28/06/1860
Santos a Jundiaí 16/02/1867
Companhia Paulista 11/08/1872
Tabela 1. Primeiras estradas de ferro construídas no Brasil.
Fonte: BORGES NETO (2012); RODRIGUEZ (2014), adaptada pelo autor.
Segundo Borges Neto (2012), pode-se considerar que a construção das ferrovias no
Brasil experimentou, historicamente, três diferentes fases, todas associadas à Segunda Guerra
Mundial. Na primeira fase, durante o período anterior à guerra, a maior parte das linhas foi
construída e explorada por concessões estrangeiras, de modo manual. Durante a Segunda
Guerra, houve um notável desenvolvimento do maquinário de terraplanagem, que, uma vez
mecanizado, passou a possibilitar uma geometria mais refinada nas estradas de ferro. Por fim,
após a Segunda Guerra Mundial, houve um acelerado desenvolvimento não só da tecnologia
do maquinário, mas também nas ciências do solo e levantamento topográfico, melhorando a
concepção de projetos e, consequentemente, dos traçados.
O poderio de empresas ferroviárias privadas e independentes entre si remonta até o
fim da década de 1930, quando o então presidente Getúlio Vargas incorporou diversas
ferrovias à União, de modo a iniciar um processo de reorganização das estradas de ferro, cuja
administração ficou por conta da Inspetoria Federal de Estradas – IFE, órgão que, na época,
pertencia ao Ministério de Viação e Obras Públicas. Por meio dessa encampação, buscava-se
evitar a brusca interrupção do tráfego ferroviário, além de prevenir o desemprego e propiciar a
melhoria operacional das ferrovias por meio da reorganização administrativa e da recuperação
de linhas e materiais rodantes.
Posteriormente, em 1957, com o objetivo de unificar todas as empresas ferroviárias
pertencentes à União, foi criada a Rede Ferroviária Federal S.A. – RFFSA, com o objetivo de
administrar, explorar, conservar, reequipar, ampliar e melhorar o tráfego das estradas de ferro
da União à ela incorporadas (BORGES NETO, 2012). A RFFSA atuou, unificada, até 1969,
quando as ferrovias que à ela pertenciam foram agrupadas em quatro grandes sistemas
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regionais, sendo eles: o Sistema Regional Nordeste; o Sistema Regional Centro; o Sistema
Regional Centro-Sul; e o Sistema Regional Sul. Posteriormente, em 1971, o Governo do
Estado de São Paulo, objetivando concentrar todas as ferrovias do Estado em uma só empresa,
criou a FEPASA – Ferrovia Paulista S.A..
Entre 1975 e 1984, a RFFSA e a FEPASA atuaram no território nacional com enorme
incentivo, de modo a dar abertura a novas linhas e modernizar as linhas existentes. Além
disso, nesta mesma época, a RFFSA passou por vários processos de reestruturação, visando a
reorganizar e a reestruturar o seu funcionamento. A partir da década de 1980, os
investimentos no transporte ferroviário decresceram substancialmente; a RFFSA passou a
enfrentar problemas não somente na área financeira, mas também na área técnico-operacional,
decorrentes da degradação de sua infraestrutura e da ausência de manutenção na mesma. Em
1984, a empresa não conseguia mais gerar recursos suficientes para cobrir as próprias dívidas.
Ainda em 1984, a RFFSA foi afastada das linhas de trens urbanos e substituída pela CBTU –
Companhia Brasileira de Transportes Urbanos.
Em 1990, ao perceber que não conseguia garantir recursos necessários para realizar a
administração das ferrovias, a União colocou em prática ações que incentivavam a
intervenção da iniciativa privada. O processo de desestatização da RFFSA ocorreu, por fim,
em 1995, com base na lei nº 8987/95 (lei das concessões), que estabeleceu os direitos e as
obrigações das partes envolvidas em uma concessão, por um período de 30 anos, prorrogáveis
por mais 30 anos. O leilão das malhas da RFFSA foi concluído em 1998 e, em 1999, o
governo federal dissolveu, liquidou e extinguiu a Rede Ferroviária Federal S.A. – RFFSA
(BORGES NETO, 2012).
Atualmente, cabe à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a fiscalização
e o controle das malhas ferroviárias pertencentes à antiga RFFSA; também estão sob sua
responsabilidade as estradas de ferro da Companhia Vale do Rio Doce, atual Vale S.A., e
outras pequenas ferrovias. A realização da operação das ferrovias é feita por diversas
empresas, públicas e privadas, reconhecidas pela ANTT, como a VALEC, a CBTU, a ALL
(América Latina Logística) e a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional). A figura 1, extraída
da Pesquisa CNT de Ferrovias da Confederação Nacional de Transportes (2015) ilustra os
mais de 29 mil quilômetros de malha ferroviária do Brasil.
21
Brina (1983, p.5) afirma que os três principais elementos da superestrutura ferroviária
– também chamada de via permanente – são o lastro, os dormentes e os trilhos – estes últimos
23
2.4.1 Sublastro
Segundo Brina (1983), o sublastro deve atender a determinadas funções, dentre elas:
a) Aumentar a capacidade de suporte da plataforma, permitindo elevar a taxa de
trabalho no terreno, ao serem transmitidas as cargas através do lastro, reduzindo,
desta forma, a sua superfície de apoio e sua altura, com consequente economia
de material;
b) Evitar a penetração do lastro na plataforma;
c) Aumentar a resistência do leito à erosão e à penetração da água, concorrendo,
pois, para uma melhor drenagem da via;
d) Permitir relativa elasticidade ao apoio do lastro, para que a via permanente não
seja excessivamente rígida.
O sublastro normalmente é composto por material granular de boa graduação, devendo
ser empregado, sempre que possível, um material existente nas proximidades da ferrovia, de
modo a garantir economia nos custos de execução e de manutenção. A espessura do sublastro
é calculada com base na distribuição de pressões em sua base, devendo esta ser compatível
com a capacidade de suporte do subleito.
2.4.2 Lastro
Ainda quanto ao seu papel na superestrutura ferroviária, Brina (1983) afirma que o
lastro possui como funções principais:
a) Distribuir convenientemente sobre o sublastro os esforços resultantes das cargas
dos veículos, transmitindo-os em menor amplitude por meio de dissipação de
tensões;
b) Proporcionar um suporte aos dormentes e trilhos que seja, até certo ponto,
elástico, atenuando as trepidações resultantes da passagem de veículos;
c) Sobrepor-se à plataforma, suprimindo suas irregularidades, formando uma
superfície contínua e uniforme para os dormentes e trilhos;
d) Impedir o deslocamento dos dormentes nos sentidos longitudinal e transversal;
e) Facilitar a drenagem da superestrutura.
O lastro pode ser composto por diferentes tipos de materiais granulares, tais como
terra, areia, escória, cascalho ou pedra britada; no entanto, segundo Brina (1983), o material
utilizado deve atender às seguintes características:
a) Ser resistente aos esforços transmitidos pelos dormentes;
b) Possuir elasticidade limitada para abrandar os choques;
c) Ter dimensões que permitam sua interposição entre os dormentes e abaixo dos
mesmos, preenchendo as depressões da plataforma e permitindo um perfeito
nivelamento dos trilhos;
d) Ser resistente aos agentes atmosféricos;
e) Deve ser permeável para permitir uma boa drenagem;
f) Não produzir particulados finos, de modo a evitar incômodos aos passageiros ou
depósitos no material rodante.
Brina (1983) aborda que o material mais econômico para o lastro é, normalmente,
terra; em contrapartida, afirma que este material, com o tempo, pode provocar o
desnivelamento da linha e causar descarrilamentos e acidentes devido a possíveis infiltrações.
Ainda com relação a materiais para uso em lastro, Brina (1983) afirma que a areia, apesar de
possuir boa permeabilidade e baixa compressibilidade, é um material de fácil carreamento
pela água, o que pode, inclusive, causar desgaste nas partes móveis dos veículos. Por fim, o
autor conclui que, dentre os materiais listados, a pedra britada é a melhor escolha para o
lastro, uma vez que possui boas resistência e permeabilidade, além de não sofrer alteração sob
a ação de agentes atmosféricos, permitir bom nivelamento, possuir boa elasticidade e não se
fragmentar com facilidade a ponto de produzir poeira.
26
Ainda com relação à pedra britada, segundo Porto (2004), quando em formato cúbico,
em oposição ao formato lamelar, evita-se os recalques que ocorreriam com a passagem do
tráfego. É importante ressaltar que o material do lastro inevitavelmente sofre uma
fragmentação intensa e constante, sendo necessário, com o tempo, a sua substituição.
2.4.3 Dormentes
2.4.4 Trilhos
devido aos apoios nos dormentes, comportam-se como vigas contínuas e devem resistir aos
esforços solicitantes como tais. O aço é, atualmente, o material mais empregado na construção
de trilhos e, também, o que melhor atende aos requisitos necessários para este papel (BRINA,
1983).
O trilho ferroviário é composto por dois perfis metálicos paralelos e fixados aos
dormentes por meio de acessórios (PAIVA, 2016). Individualmente, cada perfil metálico em
um trilho é composto por três partes fundamentais: o boleto, a alma e o patim, como ilustrado
na figura 4. O boleto corresponde à pista de rolamento da ferrovia e possui bordas
arredondadas para proporcionar o aumento da superfície de contato com as rodas dos
veículos; a alma é o elo entre o boleto e o patim; o patim, por sua vez, corresponde à base de
apoio do trilho (WANKE, 1978, apud ALBUQUERQUE, 2011).
A forma e o comprimento dos trilhos passaram por uma evolução gradativa até se
moldarem ao que conhecemos atualmente; seus perfis passaram de seções simples do tipo
duplo “T” às modernas seções que, atualmente, conseguem suportar intensos valores de carga
por eixo dos trens. A ideia da seção em duplo “T” surgiu no início do processo de evolução
dos trilhos, uma vez que é econômica e estruturalmente eficiente; contudo, verificou-se que,
com o tempo, esse perfil sofria grande desgaste por conta do atrito das rodas. Como solução,
para permitir seu uso continuado mesmo após um considerável tempo de serviço, Stephenson
desenvolveu o chamado “trilho de duas cabeças”, em que a mesa da seção possuía espessura
maior que a da alma. Devido às dificuldades de fixação, os trilhos propostos por Stephenson
foram substituídos pelos trilhos idealizados pelo engenheiro inglês Vignole, especificados no
Brasil pela NBR 7950 (NABAIS, 2014).
29
Define-se bitola ferroviária como a distância, normal aos trilhos, entre as faces
internas dos boletos, a 15,88mm abaixo do plano de rolamento da via (figura 5). É importante
ressaltar que uma linha ferroviária pode ter mais de um tipo de bitola, de modo a permitir a
circulação de mais de um tipo de trem.
No Brasil, os três tipos mais comuns de bitola ferroviária são a bitola métrica,
correspondente a 1.000 mm; a bitola padrão, de 1.435 mm; e a bitola larga, de 1.600 mm. A
30
escolha do tipo de bitola que será adotada em uma ferrovia está associada a fatores de
interesse do projeto, à conjuntura econômica à época de sua construção, ao tipo de roda dos
trens que nela circularão e ao órgão responsável pela execução do projeto. A tabela 3 ilustra a
utilização dos diferentes tipos de bitola no território nacional.
Bitola Frequência absoluta (km) Frequência relativa (%)
1,600m 5.746 19,4
1,435m 194 0,6
1,000m 23.207 78,2
0,762m 13 0,1
Mista 510 1,7
Dentre os três tipos de bitola citados, a métrica é a mais empregada nas ferrovias
brasileiras. Isto se deve, primeiramente, ao fato da bitola métrica reduzir custos de execução
em comparação às bitolas larga e padrão, uma vez que sua utilização proporciona grande
economia de material empregado para uso em lastro, dormentes, obras de arte especiais e até
mesmo como material rodante; além disso, a bitola métrica permite o uso de curvas de menor
raio e menores larguras de plataforma, o que se traduz em menores gastos com terraplenagem.
A bitola métrica é ideal para o transporte de cargas, uma vez que, para a realização do mesmo,
não são necessários vagões confortáveis ou elevadas velocidades de operação, características
típicas do transporte de passageiros, mais comum em ferrovias de bitola larga. A bitola padrão
internacional é pouco utilizada no Brasil, representando apenas 0,6% da malha ferroviária do
país. A inexistência de uma bitola padronizada no cenário nacional dificulta a interligação
entre diferentes ferrovias e, consequentemente, a evolução, no Brasil, desse modo de
transporte.
Em qualquer projeto de estrada, seja rodovia ou ferrovia, certos fatores devem ser
considerados de modo a permitir que se enquadre às necessidades do cliente e seja
desenvolvido de maneira eficiente. Em ferrovias, sobretudo no tocante ao dimensionamento
da superelevação, fatores importantes de projeto incluem as características do material
rodante, as especificações das curvas horizontais e a velocidade prevista para operação dos
veículos na via. A definição desses fatores normalmente cabe à empresa contratante do
projeto.
31
tipo de esforço superior ao programado, o material rodante não pode recorrer a uma rota de
fuga, uma vez que é mantido entre os trilhos. Por esses motivos, curvas horizontais geram
desconforto e risco de descarrilamento ou tombamento dos veículos que trafegam em uma
ferrovia (PAZ; OLIVEIRA, 2015).
Como forma de amenizar os citados riscos, há três soluções que podem ser adotadas:
utilização de superelevação nas curvas, de modo a promover um alívio de tensões na
passagem do veículo; utilização dos maiores raios possíveis nas curvas horizontais, buscando-
se diminuir as acelerações transversais atuantes sobre os veículos e dispensar o uso da
superelevação; e por fim, aplicação de restrição de velocidade nos trechos em que as duas
primeiras soluções não sejam possíveis (NABAIS, 2014).
O raio mínimo empregado em ferrovias é determinado por norma. Sua imposição visa
a limitar o escorregamento entre o trilho e as rodas dos veículos e a permitir a inscrição da
base rígida dos truques (PORTO, 2004). Brina (1983) explica que a essa restrição ocorre
devido à inscrição dos veículos se aproximar à de um retângulo com base rígida de
comprimento igual à distância entre seus eixos extremos.
2.6.3 Velocidade
operação como a mais alta velocidade de percurso que o veículo pode realizar, em uma dada
via, sob condições favoráveis de tempo e tráfego, sem exceder a velocidade diretriz.
A definição da velocidade diretriz de uma ferrovia é de extrema importância na fase de
projeto; dela decorre o raio mínimo permitido para as curvas horizontais e todo o
dimensionamento das superelevações, além de critérios de traçado referentes à aparência da
ferrovia.
2.7 SUPERELEVAÇÃO
A mecânica clássica postula que um corpo, ao percorrer uma curva, se submete a uma
força perpendicular à sua trajetória, responsável pela mudança na direção de seu vetor
velocidade. Esta força, em magnitude, pode ser calculada por meio da equação abaixo:
uma elevação do trilho externo, dita superelevação, de modo a fazer uso do peso próprio do
veículo em prol de sua estabilidade.
Precisamente, segundo Nabais (2014), a superelevação ferroviária pode ser definida
como “a maior altura do trilho externo em relação ao interno” em uma curva na qual a via é
inclinada de um ângulo α. Esta inclinação da via é proporcionada pela inclinação dos
dormentes e advém do nivelamento da camada de lastro.
A figura 9 ilustra um veículo ferroviário em uma curva horizontal. Sobre ele atuam a
força peso P, a força centrifuga Fc e a reação normal dos trilhos sobre o trem, representados
no centro de gravidade (G) do veículo.
35
O módulo da força peso é dado pelo produto da massa do veículo ferroviário pela
aceleração da gravidade (adotada, comumente, como g = 9,81m/s2 ).
Desta forma:
Ou, simplesmente:
Simplificando:
Ou, simplesmente:
38
Desde que esse valor não seja inferior a uma superelevação mínima, descrita como
“aquela que resulta a aceleração lateral não compensada de 0,65m/s²”.
Figura 10. Forças atuantes em um plano transversal à direção do movimento de um veículo ferroviário .
Fonte: COSTA; BARROS (2016).
Em que:
Mt = Momento de tombamento do veículo com relação ao trilho externo (N.m)
Mct = Momento de contra-tombamento do veículo com relação ao trilho externo (N.m)
P = Peso do veículo (N)
Fc = Força centrífuga atuante (N)
b = Bitola da ferrovia (m)
Lb = Largura do boleto (m)
B = Distância entre os eixos do boleto (m)
V = Velocidade diretriz da via (km/h)
d = Deslocamento do centro de gravidade, advindo da compressão das molas do
sistema de amortecimento do veículo (m)
hsegurança = Superelevação resultante do critério de segurança (m)
H = Altura do centro de gravidade com relação aos trilhos (m)
A força centrífuga não compensada ou não equilibrada pelo peso do veículo é dada
por:
40
Como já discorrido, o ângulo α é, na prática, muito pequeno. Desta forma, seu cosseno
pode ser considerado unitário sem perda significativa de precisão nos cálculos, resultando em:
A altura do centro de gravidade dos veículos ferroviários com relação aos trilhos (H)
varia em função de suas dimensões, materiais e ocupações, devendo ser analisada para cada
modelo e situação particular. De acordo com Brina (1983), seu valor é de 1,50m para algumas
locomotivas a diesel e pode atingir 1,80m em vagões fechados e com carregamento até o teto.
Para o deslocamento do centro de gravidade dos veículos (d), por sua vez, costuma-se adotar
o valor de 0,10m. O coeficiente de segurança η comumente adotado é igual a 5, sendo
adimensional.
A adoção da superelevação prática calculada por este critério garante, com segurança,
a estabilidade de veículos em movimento sob velocidade máxima de operação, sendo, no
entanto, desfavorável à estabilidade de trens que, porventura, permaneçam parados nas curvas
superelevadas. Nestes casos e, também, nas situações em que os veículos operam em
41
velocidade reduzida, a força peso produz um momento de tombamento para dentro das curvas
cujo contrabalanceamento pela força centrípeta é inexpressivo ou inexistente. A figura 11
ilustra as forças atuantes sobre os veículos nestas situações.
Portanto:
m/s², valor inferior ao citado anteriormente, de modo a garantir o conforto dos passageiros
com uma margem de segurança.
Deste raciocínio, podemos deduzir uma equação para a superelevação prática
conforme o critério do conforto, em que, seja inicialmente ht a superelevação teórica
calculada para uma curva horizontal. Esta superelevação é obtida fazendo-se γc = γt, ou seja,
em função da aceleração centrípeta teórica γt, cujo valor corresponde a V²/R, com V igual à
velocidade máxima de operação esperada na correspondente curva.
Assim temos:
Portanto:
em que γa é a aceleração centrífuga ativa admissível pelo critério do conforto A tabela abaixo
dispõe os valores os valores comumente adotados para γa em projetos no Brasil. Estes valores
coincidem com os adotados pela extinta RFFSA.
Trens de Passageiros Trens de Carga
Bitola larga (1,60m) 0,65m/s² 0,00m/s²
Bitola métrica (1,00m) 0,55m/s² 0,00m/s²
Tabela 4. Acelerações centrífugas ativas máximas admitidas para veículos ferroviários .
A superelevação prática deve ser calculada ou por meio de um critério empírico ou por
meio dos critérios racionais de segurança e conforto. Neste último caso, deve-se adotar, para
cada curva, o maior dentre os valores obtidos pelos dois critérios. A velocidade adotada nos
cálculos é, normalmente, a velocidade máxima de projeto, que, como sugere Brina (1983),
pode ser tomada como a maior das velocidades para um dado trecho da ferrovia – entre
estações, por exemplo. Este valor é função do raio mínimo do trecho e, operacionalmente,
varia em função da lotação e dos tipos de trem e também do perfil da via.
Para trens de carga, o critério do conforto é desconsiderado, adotando-se,
normalmente, o máximo dentre as superelevações teórica e prática pelo critério de segurança.
Tanto para trens de carga quanto para trens de passageiros, a superelevação não deve ser
superior à calculada, pelo critério de segurança, sob a hipótese do veículo parado na curva.
nas réguas graduadas com nível, instrumento comumente utilizado pelas equipes de
manutenção em ferrovias.
Uma vez que determinadas parcelas de aceleração centrípeta são toleráveis, deduz-se
que a superelevação ferroviária pode ser dispensada em curvas com raios suficientemente
longos.
Tomando-se as acelerações centrípetas ativas admitidas pela RFFSA, conforme tabela
4, pode-se determinar os correspondentes raios de curvatura, em função da velocidade de
operação, que nelas resultam.
Relacionamos a velocidade de operação V, expressa em km/h, com seu valor
correspondente v, expresso em m/s, por meio da equação abaixo:
Figura 12. Representação esquemática da variação da superelevação ao longo de uma curva com transição .
Fonte: GAZABIM (2008), adaptada pelo autor.
A variação do desnível entre os bordos (ou trilhos) de uma ferrovia, em uma dada
curva, pode ser visualizada por meio de um diagrama de superelevação. O diagrama de
47
Fixar valores máximos para a superelevação tem como objetivo evitar o tombamento
de veículos parados ou em baixa velocidade para dentro das curvas. Veículos ferroviários
parados ficam sob ação exclusiva de seus pesos próprios. Em trechos curvos superelevados, a
componente do peso próprio paralela ao plano de rolamento dos veículos atua de maneira a
forçar o encontro dos frisos das rodas com o trilho interno da curva, induzindo-lhe ao
tombamento. De acordo com Mundrey (2000), valores acentuados de superelevação podem
ainda levar ao tombamento de trens de carga vazios sob a ação de ventos intensos.
Consideremos um veículo ferroviário parado sobre uma curva (figura 11).
Desprezando-se uma possível carga lateral, resultante, por exemplo, da ação dos ventos, a
única força atuante sobre o mesmo seria seu peso próprio (P), que, em função da inclinação
da plataforma (α), pode ser decomposto em uma componente normal e em uma componente
paralela ao plano dos trilhos.
Admitindo-se ainda um deslocamento do centro de gravidade do veículo (d), então os
momentos produzidos pelas citadas componentes do peso próprio, em relação ao trilho interno
da via, são dados por:
50
Para que haja segurança do veículo, é preciso garantir que, para um fator n, maior que
1:
A velocidade limite é definida por Brina (1983) como a velocidade máxima com que
um trem pode percorrer uma curva, e é função do raio desta curva e da superelevação de sua
plataforma.
Pelo critério da segurança contra o tombamento de veículos em curvas, a
superelevação é definida como:
51
Do critério do conforto, por sua vez, decorre a superelevação calculada por meio da
equação abaixo:
A velocidade máxima do veículo ferroviário pode ser isolada nas equações acima e
escrita em função da aceleração centrífuga ativa admissível:
Por comparação das equações obtidas para a velocidade máxima, conclui-se que ela é,
sob a ótica de cada critério adotado, diretamente proporcional à raiz quadrada do raio da curva
horizontal. Desta forma, a velocidade limite de um veículo ferroviário, numa dada curva de
raio R, pode ser genericamente descrita por meio da equação:
3 METODOLOGIA
Tabela 6. Valores adotados, pelo autor, na análise comparativa dos métodos de superelevação aplicados a trens
de carga.
Fonte: BRINA, 1983; VALE, 2009; VALEC, 2011.
Conforme apresentado, o estudo foi realizado considerando-se os dois tipos de bitola
ferroviária mais utilizados no país – a bitola métrica e a bitola larga. Como referência, foram
53
consultados os manuais técnicos das empresas VALE e VALEC, ambas responsáveis pela
construção e operação de ferrovias para trens de carga no Brasil. A velocidade máxima de
projeto foi tomada como 80km/h, valor adotado em projetos da VALEC. Com relação aos
trilhos, considerou-se o perfil UIC-60, adotado em ferrovias tanto da VALE quanto da
VALEC. A largura do boleto para este trilho, conforme ilustrado abaixo, é de 72mm. Com
relação às alturas dos centros de gravidade, considerou-se, para a bitola métrica, um vagão
GDE carregado, e, para a bitola larga, um vagão GDT carregado. Para estes vagões, o manual
da via permanente, da VALE, fornece os valores de 1578mm e 1895mm, respectivamente. Os
deslocamentos dos centros de gravidade, por sua vez, foram estipulados com base em Brina
(1983), e considerados iguais a 0,10m sempre que necessário. Quando pertinente, adotou-se 5
como fator de segurança.
A figura abaixo exibe a seção transversal do Perfil UIC – 60. Suas principais
dimensões correspondem a: 172mm de altura; 150mm de base; 72mm de largura no boleto;
16,5mm de largura na alma.
Tabela 7. Superelevações ferroviárias calculadas, por diferentes critérios, para um trem de carga .
Fonte: Autoria própria.
56
Tabela 8. Valores adotados, pelo autor, na análise comparativa dos métodos de superelevação aplicados a trens
de passageiros.
Fonte: BRINA, 1983; VALEC, 2011.
As bitolas métrica e larga foram novamente consideradas nesta análise. O manual IT-
07 da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), responsável pela operação de trens de
passageiros em diversas cidades brasileiras, foi a fonte utilizada para a obtenção de valores de
referência. O tipo de trilho admitido nos cálculos foi o TR-57, adotado pela VALEC, com
seção transversal exibida na figura 19. Suas principais dimensões correspondem a: 168,28mm
de altura; 139,7mm de base; 69,06mm de largura no boleto; 15,88mm de largura na alma.
59
A velocidade máxima de projeto, por sua vez, foi tida como 90km/h, valor
representativo do sistema metroviário de Recife (METROREC apud SILVA FILHO, 2011).
Os demais parâmetros da análise, como as alturas dos centros de gravidade (H), seus
deslocamentos (d), e o fator de segurança (n), foram mantidos iguais à análise feita para os
trens de carga.
Conforme manual IT-07 da CBTU, “em bitola larga e em qualquer hipótese de
definição da superelevação, o seu valor máximo é limitado a Smáx = 160mm; em bitola
métrica será Smáx = 100mm”. Por esse motivo, valores superiores a estes limites foram
identificados como inválidos na análise realizada. Da mesma forma, superelevações
calculadas com valores inferiores a 10mm, para a bitola métrica, e 20mm, para a bitola larga,
foram identificadas como inválidas, conforme diretrizes de Steffler (2013).
A tabela 9 exibe, em função dos raios das curvas horizontais, os resultados das
superelevações calculadas por meio das diferentes equações consideradas neste estudo. As
figuras 20 e 21, por sua vez, dispõem, graficamente, os resultados obtidos, permitindo a
60
Tabela 9. Superelevações ferroviárias calculadas, por diferentes critérios, para um trem de passageiros.
Fonte: Autoria própria.
62
Equação Empírica
Tabela 10. Fatores de Proporcionalidade, com relação à superelevação teórica, correspondentes aos métodos
empíricos utilizados.
Fonte: Autoria própria.
Desta forma, conclui-se que as curvas obtidas constituem uma família de hipérboles
com ordenadas proporcionais às da função recíproca f(R) = 1/R. A análise gráfica evidencia
que as diferenças, em valor absoluto, entre as superelevações obtidas pelos diferentes métodos
empíricos se tornam praticamente irrelevantes para raios de curvas suficientemente grandes.
Com relação aos métodos racionais, excetuando-se o que visa à segurança dos
veículos em baixas velocidades, é possível identificar, em suas equações, uma parcela
correspondente à superelevação teórica e outra que combina parâmetros de projeto e da
geometria da via.
65
em que Ksegurança e Kconforto são constantes. Desta forma, concluímos que as superelevações
práticas calculadas pelos supracitados critérios se comportam semelhantemente à
superelevação teórica. Graficamente, estes critérios racionais produzem translações verticais
da curva de superelevação teórica. Para raios de curva consideravelmente grandes, a
superelevação teórica pode assumir valores inferiores a Ksegurança e Kconforto , o que resulta em
valores negativos de superelevação por meio destes critérios racionais. Isso implicaria numa
inversão do trilho superelevado - na prática, no entanto, esses valores negativos são
considerados nulos. Neste estudo, os raios a partir dos quais a aplicação dos métodos
racionais resultou em valores negativos estão listados na tabela 11:
Método da segurança – Veículos em
Método do conforto
movimento
Trens de Trens de Trens de
Trens de carga
passageiros carga passageiros
Bitola métrica (1,00m) 1000 m 1200 m N/A 1200 m
Bitola larga (1,60m) 700 m 900 m N/A 1000 m
Tabela 11. Tabela-resumo dos raios de curva horizontal acima dos quais os métodos racionais produziram
superelevações negativas.
Fonte: Autoria própria.
bitola. Tanto na análise realizada para trens de carga quanto na análise realizada para trens de
passageiros, a superelevação calculada por estes dois critérios assumiu valores maiores para a
bitola larga do que para a bitola métrica apenas para curvas de pequenos raios.
O critério de segurança para veículos em baixas velocidades, diferentemente dos
demais critérios, não depende do raio; por isso, produziu um valor constante para cada bitola
em cada caso do estudo. Deste método, resulta um valor de superelevação que garante, com
um fator de segurança pré-estabelecido, a estabilidade de veículos eventualmente parados em
curvas. No estudo realizado, adotou-se fator de segurança igual a 5, o que resultou em
superelevações máximas admissíveis de 59,2mm (bitola métrica) e 129,9mm (bitola larga)
para trens de carga e 58,9mm (bitola métrica) e 129,4mm (bitola larga) para trens de
passageiros. Estes valores são inferiores aos limites máximos de 10% da bitola admitidos
pelas empresas VALE, VALEC e CBTU.
A segurança dos veículos em movimento pode ser avaliada pelo cálculo de um fator de
segurança contra o tombamento, derivado do equilíbrio dos veículos rodantes. Pelo método
racional correlato, o fator de segurança empregado foi de η = 5; para os demais métodos, ele
pode ser calculado por meio da equação abaixo:
Tabela 12. Fatores de Segurança contra o tombamento de trens de carga em movimento implicitamente adotados
pelo uso dos critérios de cálculo da superelevação avaliados neste trabalho .
Fonte: Autoria própria.
68
Tabela 13. Fatores de Segurança contra o tombamento de trens de passageiros em movimento implicitamente
adotados pelo uso dos critérios de cálculo da superelevação avaliados neste trabalho .
Fonte: Autoria própria.
69
Tabela 14. Acelerações centrífugas ativas admitidas a trens de carga pelo uso dos critérios de cálculo de
superelevação avaliados neste trabalho.
Fonte: Autoria própria.
71
Tabela 15. Acelerações centrífugas ativas admitidas a trens de passageiro pelo uso dos critérios de cálculo de
superelevação avaliados neste trabalho.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para curvas com raios menores, de até 600m, a análise evidenciou que a aplicação dos
métodos empíricos resulta em fatores de segurança contra o tombamento de veículos
inferiores a 5 e em acelerações centrífugas descompensadas que superam os valores máximos
normalmente adotados em projetos de ferrovias no Brasil. Nestes casos, recorrer aos métodos
racionais seria uma alternativa plausível, de modo a garantir a segurança dos veículos e, no
caso dos trens de passageiros, o conforto dos usuários da linha. No entanto, sobretudo nos
dimensionamentos que partem de velocidades elevadas, como nas linhas para trens de
passageiros, a utilização dos métodos racionais resulta em valores de superelevação que, para
curvas fechadas, muitas vezes superam 10% da bitola ferroviária, valor máximo normalmente
admitido em projeto. Este impasse pode ser contornado ora por meio da adoção de curvas
com raios maiores – o que pode gerar cortes, aterros ou desapropriações que inviabilizem o
projeto - ora por meio do controle da velocidade de operação dos veículos na via, que não
deve ser elevada o suficiente para justificar grandes superelevações nem pequena demais, de
modo a colocá-los sob o risco de tombar. Alternativamente, também é possível permitir,
nestas curvas, fatores de segurança contra o tombamento menores que o supracitado,
limitando suas superelevações aos valores máximos admitidos em norma.
À figura do engenheiro cabe, portanto, compreender as condições de operação de uma
ferrovia para que suas tomadas de decisão, no que tange à determinação das superelevações
nas curvas, sejam eficazes economicamente e operacionalmente. É a sua experiência o
elemento que garante não somente a segurança dos veículos e o conforto dos usuários do
sistema, mas, também, quando não a viabilidade, ao menos, a otimização do projeto e da
operação da via.
75
REFERÊNCIAS
BRINA, H. L. Estradas de Ferro Vol. 1. 2 ed. Reimpressão. Rio de Janeiro: LTC, 1983.
MUNDREY, J. S. Railway Track Engineering. 3 ed. New Delhi: McGraw-Hill. India, 2000.
661p.
PONTES FILHO, G. Estradas de Rodagem - Projeto Geométrico. São Carlos: IPC, 1998.
PORTO, T. G. PTR2501 – Ferrovias. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2004. 81p.
Notas de Aula. Disponível em: <https://www.labtopope.com.br/material-
didatico/disciplinas/ferrovias-eng1637/>. Acesso em: 14 de abril de 2018.
SENÇO, W. Manual de Técnicas de Projetos Rodoviários. 1 ed. São Paulo: Pini, 2008.
STEFFLER, F. Via Permanente Aplicada: Guia Teórico e Prático. Rio de Janeiro: LTC.
2013. 314p.