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Daniel Victor Alves Vianna Azeredo

Experimento de Joule para gás perfeito

Vitória, ES
20 de abril de 2023
1. Introdução
Se perguntarmos para qualquer criança contemporânea o que é energia,
provavelmente ela não terá muita dificuldade de dar algum exemplo prático onde
ela veja energia no seu dia-a-dia, como a iluminação ou mesmo alguma fonte
renovável em voga que ela tenha ouvido na escola ou no jornal, como solar ou
hidrelétrica. Mas esse conceito já foi muito difícil de ser bem definido e foi
amplamente discutido em meados do século XVIII e XIX quando ainda era tido
como algo mágico mesmo para os curiosos e filósofos da época em termos
práticos.
No começo do século XIX surgiram as primeiras baterias que funcionavam a
partir de uma solução química e transmitiam energia através da solução, além
de serem capazes de armazenar parte dela, quando bem isoladas. Também já
surgiam diversa invenções de máquinas moto-perpétuas das quais se cria
cegamente que funcionavam, a ponto de receberem títulos de patente. Mesmo
no século XVIII já surgiam as primeiras máquinas a vapor que substituíam os
moinhos e rodas d’água que serviam para serviços de bombeamento e moagem.
Nesse ambiente tão cheio de dúvidas e com tanta possibilidade de investimento
por parte das pessoas interessadas em aproveitar essa oportunidade de
negócios, surge a figura de James Prescott Joule com a medição equivalente
mecânica do calor.
Nesse relatório buscou-se explorar a engenhosidade por trás do experimento de
Joule, bem como entender suas conclusões e entender como este experimento
foi fundamental no entendimento do que viria a se tornar a lei da conservação de
energia ou primeira lei da termodinâmica a partir das suas falhas em modelagem
e suas limitações, justificáveis pela, até então tecnologia e ciência da época.
Depois, iremos avaliar as propriedades dos gases ideais frente às propriedades
dos gases ideais e entender a confiabilidade do modelo para o gás Metano.

2. Referencial teórico
2.1. Experimento de Joule
Muitos experimentos vinham demonstrando uma estrita relação entre o atrito
e o calor, sendo o calor ainda muito mal definido até então. A partir dos
estudos de Rumford com o nome “An inquiry concerning the Source of Heat
which is excited by friction” - Uma investigação sobre a fonte de calor que é
excitada pelo atrito - Joules teve a curiosidade de estudar mais a fundo sobre
esse fenômeno. De acordo com Rumford, o calor necessário para elevar 1
Fahrenheit por libra de água seria equivalente à força representada por 1034
pés − libras, 5,56 Joules em unidades atuais (Gallo, 2015).
O aparato do seu experimento foi o seguinte:
 Uma roda de pás de latão, empregado para produzir o atrito na
água;
 Uma série de pás circulantes tinha a função de agitar a água
enquanto seções fixas impediam a geração de uma corrente
fluente.
 A água estava contida em um recipiente de cobre no qual o
aparelho giratório estava firmemente encaixado com 0,84 m de
diâmetro e 0,34 m de altura. (Passos, 2008)
 Haviam duas estruturas nos quais o eixo de rotação era fixado.
 Todo o experimento foi protegido por peças de madeira, a fim de
proteger o recipiente do calor irradiado que poderia vir do
experimentador, ou para evitar qualquer perda de calor do
recipiente por contato (Gallo, 2015).
 Joule usa 3 termômetros com uma precisão de calibração de 0,008
Fahreinheit - essa parte é incerta, pois o próprio Joules diz que
essa incerteza se deve à sua vasta experiência com uso de
termômetros (Passos 2008).

Figura 1 – Aparato utilizado para o experimento de Joules. C é a Vista da seção


vertical do calorímetro, demonstrando as pás giratórias e as estruturas que
limitavam o movimento do fluido. A e B são roldanas auxiliares que guiam o
movimento dos pesos Q e P ao longo das réguas N e M que medem o
deslocamento dos mesmos

Fonte: Wikipédia.

A metodologia da experimentação varia bastante, visto que durante toda sua


vida, Joule continuou a usar esse aparato para pesquisas.
O método de experimentação foi o seguinte:
 A temperatura do aparelho de fricção era verificada;
 Os pesos enrolados;
 O rolo era fixado ao eixo;
 “Os pesos tiveram uma queda de cerca de 63 polegadas. O rolo foi
então removido para o suporte, os pesos enrolados novamente e
a fricção renovada”, como descreve Joule (Gallo, 2005);
 Isso foi repetido vinte vezes e o experimento foi concluído com uma
nova medição de temperatura.
Imediatamente antes ou depois de fazer os experimentos, Joule fazia um
teste do efeito da radiação e condução de calor da atmosfera medindo a
temperatura da água e do ar circundante.
Uma das suas conclusões sobre o procedimento experimental foi o seguinte:
“Nestas tentativas, a posição do aparelho, a quantidade de água nele contida,
o tempo ocupado, o método de observação dos termômetros, a posição do
experimentador, em suma tudo, com exceção do aparelho estar em repouso,
foi o mesmo que nos experimentos em que o efeito do atrito foi observado”.
Então, pode-se entender que existiam propriedades úteis que poderiam ser
melhor exploradas em outros experimentos e chegou às conclusões a seguir.

2.2. Conclusões do experimento


Num dos seus experimentos, como citado acima, ele mediu uma velocidade
de descida de 2,42 polegas (0,061m/s) dos pesos, num tempo de 35
minutos. Além disso, fez medições de temperatura no início fim de cada
experimento avaliando a temperatura do ar atmosférico, da água presente
no recipiente e a temperatura média do experimento.
Repetiu este processo por 40 vezes.
No fim, suas conclusões foram que a variação média da água poderia ser
explicada como 0,57250 graus de ganho para medidas de atrito e 0,012975
graus para medidas de radiação (medidas em F°).
Pode-se, ainda, explorar suas anotações mais a fundo e a avaliar que os
valores corretos, levando-se em conta as incertezas e outros problemas
relacionados às limitações tecnológica, para o atrito com a água seria de
0,5632.
Em unidades inglesas seria 1Fahrenheit para 7,8422 libras, o que chega
com exatidão de 3 números significativos, já que o real é de 1Fahrenheit
para 7,8423 libras para o cálculo da capacidade calorífica da água.
A conclusão de Joule foi “a quantidade de calor produzida em corpos
sólidos ou líquidos é sempre proporcional à quantidade de força gasta”.
“Requer para sua evolução o dispêndio de uma força mecânica
representada pela queda de 772 lb através do espaço de um pé para que
se aumente um 1Fahrenheit em 1 lb de água”.
Fazendo-se as conversões necessárias para SI, temos:
𝐶°
772 ∙ 1,8 𝐹°
= 4,157𝐽
1 𝐽𝑜𝑢𝑙𝑒 1𝑙𝑏á𝑔𝑢𝑎

0,7376𝑝é − 𝑙𝑏 453,6𝑔
Esse valor difere do valor usado hoje para a mesma conclusão em 0,006%.

2.3. Limitações do experimento


Os experimentos de Joule tinham uma grande limitação principalmente em
se tratando de materiais sólidos fundidos, em especial os metais. O mesmo
ensaio foi feito para o mercúrio e o ferro fundido e a conclusão de Joule foi a
de que:
“É altamente provável que o equivalente do ferro fundido tenha aumentado
um pouco pela abrasão das partículas do metal durante o atrito”.
Isso levou a erros bem mais discrepantes nos seus experimentos com outros
materiais, mas pôde ser solucionado, de certa forma, com outros
experimentos posteriores usando um aparato baseado em calor por
resistência elétrica.
Outra limitação está no ponto de vista de Joule sobre o experimento. Ele
chega a conclusões muito úteis, porém não explica a origem desse
fenômeno, visto que seus experimentos tem um caráter macroscópico.
Ainda assim, ele deu os primeiros passos para o que viria a ser a primeira lei
da termodinâmica.

3. Gás perfeito x gás real


Para se comparar o gás perfeito e o gás real, uma maneira prática é usar um
método numérico a partir de algum software, avaliando o erro entre os resultados
para os dois modelo, no que tange a sua massa específica.
Para representar o gás perfeito, primeiro é necessário defini-lo. O estado de gás
perfeito tem por definição, um estado onde o fator de compressibilidade Z é igual
a 1; isso ocorre para estados onde a pressão p é pequena, quando comparada
à pressão crítica pc, e/ou estados onde a temperatura T é muito maior do que a
temperatura crítica Tc. A relação que define o fator de compressibilidade é:
𝑝𝑣 ̅
𝑅 1
𝑍= , 𝑠𝑒𝑛𝑑𝑜 𝑅 = 𝑒𝑣 =
𝑅𝑇 𝑀 𝜌
M é a massa molar, R é a constante universal dos gases.
Podemos, ainda, usar os valores reduzidos:
𝑝 𝑇
𝑝𝑅 = 𝑒 𝑇𝑅 =
𝑝𝑐 𝑇𝑐
Assim, quando Z é igual a 1, a relação a seguir vale:
𝑝𝑣 = 𝑅𝑇
Assim, para fazer a comparação, iremos usar a equação do gás perfeito e
comparar com os valores de volume específico dados pelo NIST WebBook para
o heptano.
4. Resultados da comparação
4.1. Metodologia
O heptano tem uma temperatura crítica 𝑇𝐶 = 540 𝐾 e uma pressão crítica de
𝑝𝑐 = 27,4 𝑏𝑎𝑟. Para os testes foram escolhidos, de forma arbitrária, valores
de pR iguais a 1/6, 1/4, 1/2, 2/3, 1 e 2 (respectivamente 4,57 bar, 6,85 bar,
13,7 bar, 18,2 bar, 27,4 bar e 54,8 bar).
Todos os dados foram retirados do NIST WebBook na função de dados
isobáricos no SI, para uma faixa de temperatura entre 400 K e 600 K.
Incialmente ocorreram problemas na visualização dos perfis em decorrência
do espaçamento entre dados, sendo assim, usou-se um incremento de 2 K
na temperatura.
Para encontrar a equivalência dos dados, foi necessário fazer uma análise
visual e identificar a faixa de operação, para isso, plotou-se em um gráfico
como se segue os dados reais e em seguida o equivalente a partir da
equação do gás perfeito.

Gás ideal x gás perfeito 27,4 bar (Pr=1)


0,1 6,85 bar (1/4)
4,6 bar (1/6)
Volume específico [m^3/kg]

0,08 13,7 bar (1/2)


54,8bar (2)
0,06 18,3 bar (Pr=2/3)
Ideal 4,6 bar (Pr=1/6)
0,04 Ideal 6,85 bar (Pr=1/4)
Ideal 13,7 bar (Pr=1/2)
0,02 Ideal 18,3bar (Pr=2/3)
Ideal 27,4 bar (Pr=1)
0 Ideal 54,8 bar (Pr=2)
0,74 0,84 0,94 1,04
saturação
Tr[-]

Figura 2 – Gráfico v-TR com diferentes isobáricas em proporções de PR.

Fonte: Dados encontrados no NIST WebBook.

Autoria: autor do relatório.

4.2. Discussão e análise dos resultados


À primeira vista já se nota um problema drástico com os dados fornecidos que
se dá pela baixa disponibilidade de dados acima da temperatura crítica. Como a
própria teoria nos diz, uma das maneiras de se mostrar a equivalência dos dados
é através de altar temperaturas reduzidas. No nosso caso, a máxima
temperatura reduzida é de 1,11̅. Sendo assim, torna-se difícil distinguir a real
faixa e operação para cada valor de isobárica.
Percebe-se também, um salto dos resultados depois de determinado valor. Para
as baixas temperaturas, pode-se identificar pelos dados fornecidos uma
mudança de fase com suas respectivas temperaturas de saturação, apesar
desses valores estarem fora dos valores múltiplos dos incrementos.
Entendendo-se, e plotando no gráfico, uma linha de saturação para identificar a
partir da onde a faixa onde poderia ser utilizado a consideração de gás perfeito
com pouca incerteza.
A partir dessas observações, decidiu-se avaliar o erro entre os resultados reais
e para hipótese de gás perfeito a partir da zona de saturação para uma faixa
recomendada de 5% de erro (Moran e Shapiro, 2015).

Erro - TR para T acima da saturação


80% 4,6 bar

70%
6,85 bar
Erro volume específico [%]

60%

50% 13,7 bar

40%
18,3 bar
30%

20% 27,4 bar

10%
54,8 bar
0%
0,74 0,79 0,84 0,89 0,94 0,99 1,04 1,09
TR [ - ]

Fonte: Dados encontrados no NIST WebBook.

Autoria: autor do relatório.

Percebe-se que para as pressões mais altas, mesmo com os maiores valores de
TR não se obtêm um valor apropriado para o uso da hipótese, já para o caso das
menores pressões, o erro tende a ser mais baixo desde a linha de saturação.
Para fundamentar os resultados com melhor exatidão, reduziu-se a linha de erro
para 5% atendendo-se a recomendação do livro texto.
Erro - TR para T acima da saturação abaixo de 10%
10% 4,6 bar

9%
6,85 bar
Erro volume específico [%]

8%
7% 13,7 bar
6%
5% 18,3 bar

4%
27,4 bar
3%
2% 54,8 bar
1%
0% limite
0,74 0,79 0,84 0,89 0,94 0,99 1,04 1,09
Tr [ - ]

Fonte: Dados encontrados no NIST WebBook.

Autoria: autor do relatório.

Percebe-se, que para os dados fornecidos, a hipótese apenas se aplicaria às


pressões abaixo de 6,85 bar, sendo que a mesma já se mostra próxima do limite
estabelecido de 5% de erro.

5. Considerações finais
Quanto ao experimento de Joule, pode-se ressaltar a grande importância para o
desenvolvimento do que viria a ser a primeira lei da termodinâmica, que tem
aplicações práticas em toda a área de termo-fluidos, desde aplicações comuns
de uso industrial, até às aplicações de interesse da disciplina de fluidos
compressíveis.
Vale, ainda, ressaltar a acurácia dos resultados encontrados por Joule no estudo
da Equivalência mecânica do calor para a água com a sua tecnologia limitada na
época, o que nos incentiva a ter mais esmero e cuidado com as elaborações de
bancadas experimentais.
Já quanto à comparação entre os dados reais e a hipótese do gás perfeito,
valem-se ressaltar os pontos de limitação de dados para o Heptano, que traz
barreiras na aplicação da hipótese de gás perfeito, em caso temperaturas muito
próximas à temperatura crítica, mas também pode-se fazer o uso de erros e
incertezas maiores associados às aplicações em caso de se buscar valores
menores.
Além disso, percebe-se uma tendência dos dados presentes nas isobáricas se
tenderem ao valor da linha que surgia a partir da hipótese do gás perfeito.
Levando a crer que é de bom tom utilizar a hipótese nos casos em que a
temperatura reduzida é expressiva.
6. Referências
PASSOS, J. C. Os experimentos de joule e a primeira lei da termodinâmica.
Revista Brasileira de Ensino de Física, Sociedade Brasileira de Física, v. 31, n.
Rev. Bras. Ensino Fís., 2009 31(3), p. 3603.1–3603.8, Jul 2009. ISSN 1806-
1117.
MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N. Fundamentals of engineering
thermodynamics. 7. ed. John Wiley and Sons Inc., New York, NY, 2015.
GALLO, M.P. Joule’s experiment: An historico-critical approach. Facultat de
F´ısica, Universitat de Barcelona, Diagonal 645, 08028 Barcelona, Spain. 2015.
Silva, E.P. PFC - Projeto de Fim de Curso Engenharia Elétrica (COEEL) IFBA
Campus Vitória da Conquista e Modelo de Relatório. Overleaf. Acesso
17/04/2023.

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