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VITAMINAS NO METABOLISMO ANIMAL

Félix H. D. González
Sérgio Ceroni da Silva

Laboratório de Análises Clínicas Veterinárias


Faculdade de Veterinária
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, Brasil
2020

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Extraído do livro

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Os autores

Félix H. Diaz González é médico veterinário formado pela Universidade Nacional da Colômbia
(Bogotá, 1979), com mestrado em Fisiologia Animal pela Escola de Pós-Graduação ICA/UNC
(Colômbia, 1985) e doutorado em Bioquímica Animal pela Universidade Federal de Viçosa
(Brasil, 1990). De 1983 a 1995 foi professor e pesquisador da Faculdade de Medicina Veterinária
e Zootecnia da Universidade Nacional da Colômbia, nas áreas de Bioquímica e Fisiologia Animal,
onde participou como orientador no Programa de Pós-Graduação em Saúde e Produção Animal.
Desde 1996 atua em docência, extensão e pesquisa na Faculdade de Veterinária da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, onde atualmente é Professor Titular. É orientador
do Programa de Pós-graduação em Ciências Veterinárias na área de metabolismo e transtornos
metabólicos em animais domésticos, onde já orientou 50 alunos de mestrado e/ou doutorado. Foi
professor convidado na Universidade de Los Llanos (Colômbia), na Universidade Federal do
Espírito Santo, na Universidade de Santiago de Compostela (Espanha), na Universidade Nacional
da Colômbia, na Universidade da República (Uruguai) e na Universidade Federal de Santa Maria.
Autor de 14 livros e coeditor em outros 10, publicou 138 artigos científicos. É bolsista de
produtividade em pesquisa do CNPq.

Sérgio Ceroni da Silva é médico veterinário formado pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (Porto Alegre, 1982), com mestrado em Genética e Biologia Molecular pela UFRGS (Porto
Alegre, 1986) e doutorado em Biologia Molecular pela Universidade de Glasgow (Reino Unido,
1993). Desde 1987 é professor de Bioquímica Clínica Veterinária na Faculdade de Veterinária da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atuando também como pesquisador no Laboratório de
Biologia Molecular Aplicada desta mesma faculdade.

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Dedico com amor: Laurita, Lupita, Rezinha, Rosita

FHDG

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Prefácio

As vitaminas são moléculas orgânicas essenciais com múltiplas funções no metabolismo animal.
Frequentemente este grupo de biomoléculas é estudado de forma tangencial nos cursos de
bioquímica, o que deixa a impressão, nos estudantes de ciências veterinárias e biomédicas em geral,
que não seriam tão importantes. É por isso que o presente livro tem seu foco nesses compostos, tão
essenciais como fundamentais no contexto das rotas e processos de controle metabólico. A revisão
prioriza conceitos em animais domésticos relativos às funções e às deficiências dessas
biomoléculas. A publicação pretende servir como texto de apoio nas disciplinas de bioquímica,
nutrição e transtornos metabólicos para alunos de Medicina Veterinária e Zootecnia.

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Sumário

Introdução 1

Vitamina A 4
Funções da vitamina A 6
Deficiência de vitamina A 8
Toxicidade 8
Vitamina D 10
Funções da vitamina D 13
Deficiência de vitamina D 14
Toxicidade 15
Vitamina E 16
Funções da vitamina E 18
Deficiência de vitamina E 19
Toxicidade 20
Oxidação e antioxidantes 20
Vitamina K 25
Funções da vitamina K 26
Deficiência de vitamina K 28
Toxicidade 29
Tiamina (vitamina B1) 30
Funções da tiamina 31
Deficiência de tiamina 32
Toxicidade 33
Riboflavina (vitamina B2) 34
Funções da riboflavina 35
Deficiência de riboflavina 36
Toxicidade 37
Niacina (vitamina B3) 38
Funções da niacina 39
Deficiência da niacina 40
Toxicidade 41
Piridoxina (vitamina B6) 42
Funções da piridoxina 42
Deficiência da piridoxina 43
Toxicidade 44
Ácido pantotênico 45
Funções do ácido pantotênico 45
Deficiência do ácido pantotênico 46
Toxicidade 47
Biotina 48
Funções da biotina 48
Deficiência de biotina 49
Toxicidade 50
Folacina (ácido fólico) 51
Funções do ácido fólico 52
Deficiência do ácido fólico 53
Toxicidade 53
Cianocobalamina (vitamina B12) 54
Funções da vitamina B12 56

vi
Deficiência da vitamina B12 57
Toxicidade 58
Colina 59
Funções da colina 60
Deficiência da colina 60
Toxicidade 61
Ácido ascórbico (vitamina C) 62
Funções da vitamina C 63
Deficiência de vitamina C 63
Toxicidade 64
Carnitina 65
Funções da carnitina 65
Deficiência da carnitina 66
Toxicidade 66
Bibliografia 67

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Introdução

No último século ficou evidenciada a necessidade de alguns fatores que eram necessários em
pequenas quantidades para as funções vitais e assim foram sentadas as bases do metabolismo das
vitaminas. As vitaminas são biomoléculas que sobressaem no metabolismo animal por estarem
comprometidas como cofatores enzimáticos. Diferem dos minerais por serem moléculas orgânicas,
mas compartilham algumas características funcionais, como estarem no organismo em quantidades
pequenas, e por algumas delas participarem como cofatores enzimáticos. As deficiências de
vitaminas podem levar a doenças comprometidas com o metabolismo. Embora a maioria das
vitaminas deva ser consumida na dieta, algumas delas podem ser sintetizadas no organismo
(vitamina C, vitamina D, niacina, carnitina) e uma grande parte pode ser sintetizada por bactérias
intestinais.
A primeira doença reconhecidamente devido a deficiências nutricionais foi a cegueira
noturna, que no antigo Egito e na China ancestral era tratada com aplicações tópicas de fígado sobre
os olhos. No século 18, o médico James Lynn, da marinha britânica, demonstrou os efeitos
curativos de frutas e vegetais frescos sobre o escorbuto que afetava os marinheiros em longas
viagens. No século 19 foi descoberta a relação entre pelagra e dieta de milho. Esses três exemplos
plantaram as bases do conhecimento do que posteriormente foi chamado de vitaminas
(respectivamente, vitamina A, C e niacina). Em 1911, Casimir Funk, um jovem bioquímico polonês
do Lister Institute de Londres, isolou, da casca do arroz, uma substância cristalizada que possuía
uma função amina, e que se revelou capaz de prevenir e curar o “beribéri” (polineurite)
experimental em frangos, razão pela qual Funk a chamou de “vitamina”, para salientar que era uma
amina indispensável à vida. Tratava-se do que posteriormente foi identificado como tiamina.
Embora nem todas as vitaminas sejam aminas, o termo prevaleceu.
Não existe uma definição totalmente satisfatória das vitaminas. A definição de substâncias
orgânicas presentes em quantidades muito pequenas nos alimentos e essenciais para o metabolismo,
cuja deficiência provoca doenças, pode não ser específica, pois se pode aplicar a outros compostos.
As vitaminas são um grupo de compostos orgânicos que não se ajustam à classificação de
macronutrientes. Não são quimicamente relacionadas entre si, estando distribuídas nos reinos
vegetal e animal. Embora necessárias em pequeníssimas quantidades na alimentação, as vitaminas
são consideradas essenciais, ou seja, que o organismo não as sintetiza ou as sintetiza em baixas
quantidades, sendo necessário seu consumo na alimentação. Algumas vitaminas podem ser
sintetizadas pelo organismo, como é o caso da niacina (a partir de triptofano), ácido ascórbico (a
partir de glicose, exceto em primatas) e vitamina D (a partir de colesterol). Assim, estes compostos

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em algumas espécies e condições fisiológicas podem não preencher, a rigor, a definição clássica de
vitamina.
As vitaminas são classificadas quanto à solubilidade, em vitaminas lipossolúveis e
hidrossolúveis. Onze vitaminas (tiamina, riboflavina, niacina, piridoxina, ácido pantotênico,
biotina, ácido fólico, cianocobalamina, colina, ácido ascórbico e carnitina) são classificadas como
hidrossolúveis, enquanto quatro vitaminas (A, D, K e E) são lipossolúveis. As vitaminas
hidrossolúveis constituem um grupo de compostos estrutural e funcionalmente independentes que
compartilham a característica de serem essenciais para o metabolismo animal, participando como
coenzimas. De maneira geral (salvo a cianocobalamina), não são armazenadas em quantidades
significativas no organismo, sendo o excesso rapidamente excretado via urinária, o que leva muitas
vezes a necessidade de um suprimento diário dessas vitaminas.
As vitaminas lipossolúveis são compostos constituídos de unidades de isopreno e
desempenham papéis essenciais no metabolismo ou na fisiologia dos animais. São encontradas na
fase lipídica nos alimentos e sua absorção intestinal está regulada pelos mesmos mecanismos de
absorção de lipídeos. Exceto pela vitamina K, as vitaminas lipossolúveis podem ser armazenadas,
principalmente no fígado. A vitamina A fornece o pigmento fotossensível dos olhos dos vertebrados
e é um regulador de expressão gênica durante o crescimento das células epiteliais. A vitamina D é
precursora de um hormônio que regula o metabolismo do Ca. A vitamina E funciona na proteção
dos lipídeos de membrana contra o dano oxidativo, e a vitamina K é essencial no processo de
coagulação sanguínea. Estas vitaminas podem se acumular e, ocasionalmente em casos de excesso,
podem causar transtornos. Na Tabela 1 constam as principais vitaminas, suas funções essenciais e
fontes alimentares.

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Tabela 1. Principais vitaminas, suas funções e fontes e nível plasmático de deficiência
Vitamina Função Fontes Nível plasmático
de deficiência
Vitamina A Visão, transcrição gênica, Plantas contendo
manutenção dos epitélios, carotenos, fígado < 20 µg/dL
desenvolvimento ósseo
Vitamina D Manutenção da calcemia (absorçãoPeixes, ovos, fígado,
< 25 ng/mL
de Ca) carne
Vitamina E Antioxidante Óleos vegetais, sementes,
< 0,5 µg/mL
folhas verdes, castanhas
Vitamina K Coagulação sanguínea, formação de Plantas verdes, gema do
< 0,5 ng/mL
osteocalcina ovo, leite
Tiamina Metabolismo de glicídeos, Sementes, castanhas,
decarboxilação do piruvato, carne, leveduras < 2 µg/dL
transmissão nervosa
Riboflavina Cofator enzimático de reações de Leite, carne, ovos,
óxido-redução (coenzimas FAD, castanhas, sementes < 0,1 µg/dL
FMN)
Niacina Cofator enzimático de reações de Alimentos ricos em
óxido-redução (coenzimas NAD, triptofano, leite, carne < 0,5 µg/mL
NADP), poliadenilação
Piridoxina Transaminação, decarboxilação, Leveduras, carne, germe
< 0,5 µg/dL (PLP)
síntese de heme de trigo
Ácido Transporte e transferência de Leveduras, plantas, grãos,
pantotênico grupos acila (formação de ovos, carne < 100 µg/dL
coenzima A)
Biotina Carboxilação, desaminação Leveduras, gema de ovo,
< 100 ng/dL
carne, grãos
Folacina Transferência de unidades de Plantas verdes, carne,
carbono, síntese de purinas e ovos, queijo < 0,3 ng/mL
pirimidinas, hematopoiese
Cianocobalamina Coenzima de enzimas mutases, Leite, peixe, ovos, carne
hematopoiese, transferência de < 150 pg/mL
grupos metila
Colina Transporte de lipídeos, fator Cereais, carne,
lipotrópico, neurotransmissão, leguminosas, gema de < 1 µg/mL
síntese de metionina e creatina ovo
Ácido ascórbico Antioxidante, síntese de colágeno, Frutas cítricas, vegetais
< 0,5 mg/dL
proteção de membranas
Carnitina Transporte de ácidos graxos na Carne, fígado
< 30 µmol/L
célula (intramitocondrial)

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Vitamina A

Doenças relacionadas à deficiência de vitamina A e seus benefícios são descritas ao longo


da história. Os egípcios observaram que problemas de cegueira noturna e xeroftalmia
(ressecamento da conjuntiva), típicos sinais da deficiência de vitamina A, eram curados com a
ingestão de fígado de animais. Hopkins e Stepp, no início do século 20, observaram que um fator
estimulante do crescimento podia ser extraído do leite, o que finalmente levou à identificação da
vitamina A. A presença desse fator promotor de crescimento foi descrita também na gema do ovo,
manteiga e óleo de fígado. McCollum e Davis, em 1915, descreveram um “fator A” de gordura
animal, que tinha efeito estimulante do crescimento. Mais tarde, Drummond propôs que o fator A
deveria ser chamado de vitamina A. Moore, em 1929, observou que os carotenos de origem vegetal,
podiam ser convertidos em vitamina A no organismo animal.
A estrutura química da vitamina A (retinoides e carotenoides) foi determinada em meados
do século 20, e em seguida estudos sobre sua função biológica e a síntese comercial dessa vitamina
foram rapidamente desenvolvidos. O termo retinoide refere-se à classe de compostos que inclui
retinol e seus derivados químicos, com quatro unidades de isoprenoides. A vitamina A engloba um
grupo de carboidratos insaturados, incluindo retinol e compostos relacionados, bem como alguns
carotenoides. A atividade da vitamina A em tecidos animais é encontrada predominantemente sob
a forma de retinol, retinal e, em menor quantidade, ácido retinoico (Figura 1).

Figura 1. Moléculas do retinol, retinal e ácido retinoico

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O retinol é um álcool primário que contém um anel β-ionona com cadeia lateral insaturada,
sendo encontrado em tecidos animais como éster retinila com ácidos graxos de cadeia longa. O
retinal é o aldeído derivado da oxidação do retinol. O retinal e o retinol podem ser facilmente
interconvertidos. O ácido retinoico é o ácido derivado da oxidação do retinal. Este ácido não pode
ser reduzido no organismo e, assim, não pode originar retinal ou retinol.
A maior concentração de vitamina A nos animais é no fígado, principal órgão armazenador
(90% do total), no qual o retinol e seus ésteres são as principais formas presentes. A vitamina A
como tal não está presente nas plantas, porém elas contêm seus precursores, os carotenoides, os
quais podem ser convertidos em vitamina mediante reação enzimática no intestino dos animais. Os
carotenoides contribuem significativamente para a atividade da vitamina A em alimentos tanto de
origem animal como vegetal. Frutas, plantas e vegetais amarelos e verde-escuros são boas fontes
dietéticas de carotenos. Dos 600 carotenoides conhecidos, cerca de 50 apresentam alguma atividade
de pró-vitamina A. Alimentos de origem vegetal contêm β-caroteno, que pode ser clivado
oxidativamente no intestino em duas moléculas de retinal. Entre todos os carotenoides, o β-caroteno
é o que apresenta maior atividade pró-vitamínica A (Figura 2).

Figura 2. Molécula do β-caroteno

Para ocorrer a conversão metabólica de caroteno para vitamina A, o β-caroteno deve ter o
anel β-ionona livre. A conversão ocorre por ação de duas enzimas: a primeira (β-caroteno-15, 15´-
dioxinase) cliva o β-caroteno produzindo duas moléculas de retinal. A segunda enzima
(retinaldeído redutase) converte o retinal em retinol. Gatos não possuem a enzima clivante e,
portanto, não podem usar carotenos como fonte de vitamina A. O potencial de pró-vitamina A em
plantas é mais bem preservado quando pastagens são conservadas sob a forma de feno, porém há
declínio quando a armazenagem é realizada na ausência de oxigênio. Grãos, com algumas exceções
(por exemplo, milho amarelo), são menores fontes de pró-vitamina A. Dentre os grãos de
leguminosas, o grão-de-bico tem a melhor fonte carotenoide. A fonte mais rica de carotenos é o

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óleo de palma vermelha. Fontes ricas de vitamina A estão nos óleos de peixe. Embora haja a
possibilidade de serem produzidas duas moléculas de vitamina A, por cada molécula de β-caroteno,
a ineficiência desse processo contribui para que o β-caroteno exiba apenas 50% de atividade da
vitamina A.
Na maioria dos animais, a absorção da vitamina A varia de 70 a 90%, mas a eficiência na
absorção de carotenoides adicionados à dieta é de 40 a 60%, dependendo do carotenoide. As
espécies que absorvem carotenos (bovinos, equinos, aves, humanos) podem apresentar tecido
adiposo amarelo, uma vez que os carotenos se armazenam no fígado e na gordura. As espécies que
clivam totalmente os carotenos no intestino (ovinos, caprinos, suínos, caninos) possuem gordura
branca. As vacas da raça Holandesa têm mais eficiência na clivagem de carotenos no intestino,
tendo gordura e leite de cor branca, enquanto as raças Jersey e Guernsey absorvem mais carotenos
e possuem leite e tecido adiposo amarelados.
Nos animais, a vitamina A está presente, em grande quantidade, como ésteres lipídicos no
fígado e no rim, mas também é encontrada na gordura do leite e na gema de ovo. No plasma, a
vitamina A é transportada desde seus estoques no fígado até os tecidos na sua forma álcool (retinol)
ligada a uma proteína ligante de retinol (RBP). Quando há deficiência de vitamina A, ocorre
bloqueio da secreção de RBP hepática e os níveis plasmáticos desta proteína diminuem. Os
requerimentos e vitamina A na dieta estão em torno de 3.000 UI/kg (matéria seca). Caprinos e
felinos têm requerimentos maiores (cerca de 5.000 U/kg). Os requerimentos aumentam em animais
expostos a condições estressantes e a doenças.

Funções da vitamina A

A vitamina A é essencial para a visão, reprodução, crescimento e a manutenção dos tecidos


epiteliais. O ácido retinoico, derivado da oxidação do retinol da dieta, é intermediário da maioria
das ações dos retinoides, exceto para a visão, que depende do retinal (derivado aldeídico do retinol).
A deficiência de ácido retinoico causa defeitos na reprodução e na diferenciação dos epitélios. As
ações do ácido retinoico sobre a regulação da transcrição de muitos genes têm levado a considerar
este composto como um hormônio. A função fisiológica da vitamina A sobre a visão é a mais
entendida do ponto de vista bioquímico.
No ciclo visual ou ciclo do retinol (Figura 3), a vitamina A é componente dos pigmentos das
células cones e bastonetes da retina. A rodopsina, o pigmento visual dos bastonetes na retina, é
originada do 11-cis-retinal ligado especificamente à proteína opsina. Quando a rodopsina é exposta
à luz, ocorre uma série de isomerizações fotoquímicas, as quais resultam no desbotamento do

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pigmento visual e a liberação de trans-retinal e opsina. A energia deste processo origina um impulso
nervoso, que é transmitido pelo nervo óptico para o encéfalo, provocando o efeito da visão. A
deficiência de vitamina A causa cegueira noturna (nictalopia), típico sinal clínico em animais. A
regeneração da rodopsina necessita da isomerização do trans-retinal, formando novamente o 11-
cis-retinal. O transretinal, após ser liberado da rodopsina, é isomerizado a 11-cis-retinal, que se
combina espontaneamente com a opsina, para formar a rodopsina, completando o ciclo.
A vitamina A é necessária para a manutenção dos epitélios, de forma que sua deficiência
causa falhas de queratinização e de funcionalidade principalmente nas células epiteliais dos tratos
gastrointestinal, respiratório e urogenital, além do olho. A possível relação da vitamina A com a
manutenção dos epitélios pode estar no papel desta vitamina na formação de glicosamina, composto
que faz parte dos mucopolissacarídeos, componentes do muco epitelial.
A vitamina A também tem um papel no desenvolvimento normal dos ossos, através da
atividade exercida sobre os osteoclastos do epitélio da cartilagem. Na deficiência de vitamina A, a
atividade osteoclástica é reduzida e podendo causar crescimento desorganizado dos ossos e
inflamação das articulações. Na reprodução, a vitamina A tem importante função na manutenção
do epitélio germinativo e nos túbulos seminíferos nos machos e na sobrevivência embrionária. Em
algumas espécies, a deficiência de vitamina A pode causar retenção de placenta. Nas vacas, a
vitamina A e os carotenos têm importante função na proteção contra numerosas infecções,
incluindo mastite.

Figura 3. Ciclo da visão

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Deficiência de vitamina A

A deficiência de vitamina A leva ao menos a quatro tipos de lesões diferentes: diminuição


de visão por falha na formação de rodopsina, defeitos no crescimento ósseo, falhas na reprodução
(espermatogênese diminuída e morte embrionária ou fetal) e defeitos no crescimento e
diferenciação dos tecidos epiteliais (resulta em queratinização). A deficiência prolongada de
vitamina A leva à diminuição da visão, principalmente à noite (nictalopia) por bloqueio do ciclo do
retinol e ausência de rodopsina. A deficiência grave leva a xeroftalmia, o ressecamento patológico
da conjuntiva e da córnea. Se não for tratada, a xeroftalmia resulta em ulceração da córnea e, por
fim, cegueira devido à formação de tecido de cicatrização opaco, quadro que pode ser observado
em bovinos e suínos, nos quais a carência da vitamina A pode causar também queratinização
epitelial.
Na derme, a falta de vitamina A resulta em uma sobrecamada escamosa, que leva à perda da
funcionalidade da célula epitelial. Nos pulmões, a deficiência de vitamina A pode causar
diminuição da secreção mucosa, o que facilita o estabelecimento de infecções. No intestino, a
queratinização induz à perda de função prematura dos enterócitos e síndrome de má-absorção,
causando diarreia. Além disso, a carência de vitamina A resulta em uma diminuição da taxa de
crescimento e do desenvolvimento ósseo em animais jovens. Quantidade adequada de vitamina A
na dieta garante a normal resistência a estresse e infecções. Entretanto, um consumo além das
necessidades desta vitamina não garante uma maior resistência na prevenção de infecções. Outros
sinais clínicos observados na deficiência de vitamina A incluem perda de apetite e de peso, descarga
nasal, conjuntivite, lacrimejamento, fertilidade reduzida, aborto e aparência emaciada, entre outros.
A deficiência de vitamina A pode resultar indiretamente de deficiência de Zn, uma vez que
este mineral é necessário para a síntese da proteína transportadora de retinol (RBP). Uma
diminuição de RBP tem como consequência uma deficiência de vitamina A.

Toxicidade

A vitamina A pode ser problema tanto em sua deficiência como em seu excesso. Os
ruminantes são mais tolerantes a altas doses de vitamina A devido à degradação desta vitamina no
rúmen. Os principais sinais da hipervitaminose A incluem malformações ósseas, fraturas
espontâneas, hemorragia interna, perda de apetite e de peso, engrossamento da pele, incremento do
tempo de coagulação, anemia e conjuntivite. A toxicidade da vitamina A pode ser classificada sob

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três categorias: aguda, crônica e teratogênica. Quando uma única dose de vitamina A (maior do que
100 mg) é injetada em animais de 20-50 kg de peso corporal, aparecem sinais como náusea, vômito,
aumento de pressão do fluido espinhal e fragilidade muscular. A toxicidade crônica pode ser
induzida por doses 10 vezes acima do recomendado. Essa dose pode levar à alopecia, ataxia, dores
ósseas e musculares e prurido.
Embora gatos tenham alta tolerância a doses excessivas de vitamina A, ocorre
hipervitaminose A em animais que possuam dieta baseada em fígado. Gatos afetados apresentam
deformação no esqueleto, particularmente exostose de vértebras cervicais. A vitamina A é também
um poderoso teratogênico. Uma dose excessiva única (100 mg), durante a gestação, para animais
que pesem entre 20 e 50 kg, pode resultar em malformação fetal. No caso dos humanos, a
hipervitaminose A está relacionada ao abuso das suplementações e às automedicações. Ao contrário
dos retinoides, os carotenoides geralmente não são tóxicos, e muitos animais os ingerem sem efeitos
deletérios. A eficiência da conversão de caroteno em vitamina A diminui quando há aumento da
vitamina, o que se considera um mecanismo de controle homeostático que protege de um excesso
de caroteno.

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Vitamina D

Desde a antiguidade, o raquitismo era conhecido como uma doença que causava deformação
dos ossos e que estava relacionada com o fato de não receber sol. Sniadecki, em 1822, foi o primeiro
a propor que o raquitismo ocorria pela falta de exposição à luz solar. A maioria dos cientistas à
época não acreditavam que uma doença podia ser curada apenas pela exposição ao sol. Em 1921,
Sir Edward Mellanby reportou a indução de raquitismo em cães através da manipulação da dieta (a
base de farinha de aveia e – sem que ele o planejasse – em ausência de luz solar). Ele descobriu
que a doença podia ser revertida com óleo de fígado de bacalhau, pelo qual erroneamente pensou
se tratar de deficiência de vitamina A. McCollum, em 1922, reportou que o fator curativo do óleo
de fígado de bacalhau não era a vitamina A, mas sim outra substância lipossolúvel, que
posteriormente foi identificada como vitamina D. A observação de que a irradiação de alimentos
(leite, manteiga) resultava na produção de um fator antirraquitismo, levou à identificação da
vitamina D2 a partir da pró-vitamina ergosterol e da vitamina D3 a partir da pró-vitamina 7-
deidrocolesterol. Em 1932, a estrutura da vitamina D2 foi determinada simultaneamente por
Windaus, na Alemanha (quem a chamou vitamina D2) e por Askew, na Inglaterra (quem a chamou
ergocalciferol). Em 1936, Windaus também determinou a estrutura da vitamina D3.
A atividade da vitamina D está associada a vários esteroides, incluindo o colecalciferol, de
fontes animais, e o ergocalciferol, uma forma exclusivamente sintética de vitamina D, a qual é
formada pela irradiação do fitoesterol (esterol vegetal), com luz ultravioleta, comumente
adicionada ao leite e à manteiga como suplemento alimentar para humanos. O ergocalciferol e o
colecalciferol são fontes de vitamina D pré-formada e diferem pela presença de uma ligação dupla
adicional e de um grupo metila no esterol vegetal (Figura 4).
Na década de 1960 começou um novo patamar no estudo da vitamina D, quando se
reconheceu que ela é o precursor do hormônio esteroide 1,25-di-hidroxi-colecalciferol (1,25-
DHCC). De Luca, em 1966, demonstrou que o colecalciferol é convertido em 25-hidroxi-
colecalciferol (25-HCC) no fígado, e no início dos anos 1970 se determinou que o 1,25-DHCC era
produzido no rim. A partir daí, a vitamina D e seus derivados adquiriram a categoria de hormônios.
O colecalciferol é formado na pele mediante a exposição à luz solar. Esse processo é constituído
de várias etapas, as quais envolvem a modificação fotoquímica do 7-dehidrocolesterol seguida por
isomerização não enzimática. Por esse motivo, na síntese in vivo, as exigências de vitamina D da
dieta dependem da exposição à luz solar. Apesar de a maioria das espécies animais possuírem o 7-
dehidrocolesterol, de forma abundante na pele, gatos, cães e outros carnívoros contêm apenas

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pequenas quantidades deste composto, o que não permite uma adequada síntese de vitamina D,
fazendo com que dependam quase que exclusivamente da dieta.

Figura 4. Estrutura do ergocalciferol e colecalciferol. Setas indicam a


presença de um grupo metila no esterol vegetal e a sua ausência no
esterol animal

O ergocalciferol e o colecalciferol não são biologicamente ativos, mas são convertidos in


vivo na forma ativa da vitamina D por reações sequenciais de hidroxilação (Figura 5). A primeira
reação ocorre na posição 25 e é catalisada por uma hidroxilase específica, no fígado. O produto da
reação, 25-HCC, é a forma predominante da vitamina D no plasma e a principal forma de
armazenamento da vitamina. Essa forma é posteriormente hidroxilada na posição 1 pela 25-
hidroxicolecalciferol-1α-hidroxilase específica, encontrada principalmente no rim, resultando na
formação de 1,25-DHCC (vitamina D3 ativa ou calcitriol). Essa hidroxilase, assim como a 25-
hidroxilase, no fígado utiliza citrocomo 450, oxigênio molecular e NADPH. O 1,25-DHCC é o
mais potente metabólito da vitamina D e está envolvida na regulação da absorção e do metabolismo
do Ca. Sua formação é regulada pelos níveis plasmáticos de P e Ca. Nos tecidos, o 1,25-DHCC
pode ser catabolizado mediante a enzima 24-hidroxilase a ácido calcitroico, composto inativo
biologicamente que é excretado pela bile.
A atividade da enzima 25-HCC-1α-hidroxilase aumenta diretamente em função de baixo P
plasmático, ou indiretamente por diminuição do Ca no plasma, que dispara a liberação do hormônio
paratireoidiano (PTH), o qual induz a síntese da enzima no rim. Assim, a hipocalcemia causada por
deficiência ou balanço negativo de Ca na dieta resulta em aumento da secreção de PTH, o que
posteriormente deriva em níveis elevados de 1,25-DHCC no plasma pela ação estimuladora do PTH
sobre a síntese da enzima 1α-hidroxilase renal. A atividade de 1α-hidroxilase é diminuída por

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excesso de P e de 1,25-DHCC. Outra enzima do rim pode hidroxilar o 25-HCC na posição 24,
formando o composto 24, 25-di-hidroxi-colecalciferol (24,25-DHCC), composto inativo, quando a
atividade da 1α-hidroxilase está reduzida, isto é, quando há níveis plasmáticos normais de Ca e de
P.

Figura 5. Reações da biossíntese da vitamina D3

A vitamina D é suscetível à degradação pela luz. Nos alimentos, essa degradação pode
ocorrer durante o armazenamento. De modo geral, no entanto, a estabilidade da vitamina D em
alimentos, em especial em condições anaeróbicas, não é uma preocupação importante. A vitamina
D é encontrada em maiores quantidades em peixes, particularmente, de água salgada, como salmão,
sardinhas e no óleo de fígado de peixe. No plasma, a vitamina D é transportada por uma proteína
hepática específica, denominada proteína ligante de vitamina D (DBP) ou transcalciferina. A
maioria dos animais, salvo os carnívoros, não tem requerimento de vitamina D desde que tenham
disponível suficiente luz solar. Os requerimentos na dieta estão entre 200-400 UI/kg (base seca).

12
Funções da vitamina D

Inicialmente, a vitamina D foi identificada como um cofator para reações que serviam para
manter os níveis de Ca e P. Nas décadas de 1960 e 1970 uma série de descobertas levou a ampliar
o conhecimento do metabolismo da vitamina D. A vitamina D pertence a um grupo de esteroides
que apresentam funções semelhantes às dos hormônios e sua ação precípua é na estimulação da
absorção intestinal de Ca e de P. A vitamina D regula a expressão gênica interagindo com receptores
nucleares específicos das células epiteliais do intestino, que induzem a síntese de transportadores
de Ca e P.
O 1,25-DHCC entra na célula intestinal e liga-se a um receptor citosólico. O complexo 1,25-
DHCC-receptor move-se para o núcleo, onde interage seletivamente com o DNA celular
estimulando a síntese de calbindina, proteína ligadora de Ca específica, que atua estimulando a
absorção intestinal de Ca. O 1,25-DHCC também estimula a produção de ATPases dependentes de
Ca e Na, que facilitam o movimento vetorial de Ca para fora da célula intestinal e para dentro da
circulação. Além disso, o 1,25-DHCC é indiretamente requerido para a mineralização óssea durante
o crescimento do esqueleto. Receptores de vitamina D nos ossos estão localizados nos osteoblastos,
que controlam a síntese e secreção de proteínas específicas nos osteoblastos como osteocalcina,
osteopontina, colágeno e fosfatase alcalina. Sobre os ossos, os efeitos da vitamina D são similares
ao PTH, mobilizando Ca e P da matriz óssea e da fração mineral através de um efeito osteolítico.
Aparentemente, o hormônio requer a presença do PTH para atuar no osso (efeito permissivo). Como
sua ação é bloqueada pela actinomicina D, acredita-se que a transcrição para formar mRNA e
sintetizar proteína é um requerimento para poder causar seu efeito. Sobre o rim, o 1,25-DHCC
diminui a excreção renal de Ca e P, poupando esses minerais no organismo.
Os receptores de vitamina D são encontrados em um grande número de células, desde células
do músculo esquelético até células importantes para a imunidade e funções fagocíticas, como os
macrófagos. No raquitismo dependente de vitamina D, doença genética causada pela alteração de
um gene autossômico recessivo, observada em suínos e em humanos, ocorre falha na síntese da
enzima 1α-hidroxilase, não podendo sintetizar 1,25-DHCC, embora o organismo tenha as
moléculas precursoras. As recentes pesquisas sobre receptores da vitamina D em diferentes órgãos
revelam que os metabólitos desta vitamina podem estar exercendo outras funções, além das
reguladoras sobre o metabolismo do Ca e do P. Existem, por exemplo, evidências de regulação de
crescimento e diferenciação de vários tipos de células, bem como de regulação da hematopoiese e
dos sistemas imunes. Em humanos tem sido relatado que a deficiência de vitamina D pode
promover câncer de próstata por mecanismos não esclarecidos.

13
Deficiência de vitamina D

A deficiência de vitamina D causa a desmineralização dos ossos (diminui concentração de


Ca e de P na matriz orgânica da cartilagem e nos ossos), resultando em raquitismo nos animais
jovens e em osteomalacia nos adultos. O raquitismo caracteriza-se pela formação contínua de
matriz de colágeno nos ossos, mas com mineralização incompleta, resultando em ossos flexíveis e
maleáveis. Os ossos se apresentam frágeis, com possibilidades de fraturas espontâneas, além de
terem seu crescimento alterado, principalmente observável nos ossos longos como o fêmur, tíbia,
úmero e costelas. Os ossos longos das extremidades tendem a se arquearem, ocasionando defeitos
de aprumo (postura) desses animais e inflamação das articulações, devido à fragilidade desses
ossos. Por ser de ocorrência na fase do crescimento, tais defeitos de aprumo são praticamente
insanáveis na vida adulta. Na osteomalácia, existe desmineralização de ossos preexistentes, porém
com matriz orgânica normal (diferente da osteoporose em que está diminuída tanto a mineralização
quanto a matriz proteica dos ossos). Quando a massa óssea reduz, perde-se o suporte mecânico e a
integridade do esqueleto, aumentando a suscetibilidade a fraturas. Outros sinais de raquitismo
envolvem perda de peso, inibição do crescimento, rigidez na marcha, dispneia, irritabilidade,
fraqueza e diminuição do apetite. Em fêmeas gestantes, a osteomalacia pode produzir
malformações congênitas em recém-nascidos e lesões ósseas na mãe.
Em vacas leiteiras, a deficiência de vitamina D pode causar diminuição da produção de leite
e inibição do estro. Nestes animais, a idade é um fator predisponente para sofrer febre do leite,
transtorno em que ocorre uma hipocalcemia em função da alta produção de leite, que pode estar
sendo induzido tanto por uma síntese diminuída como por uma baixa resposta dos órgãos alvo ao
1,25-DHCC (baixa síntese de receptores em ossos e rim).
O raquitismo renal (osteodistrofia renal) resulta de insuficiência renal crônica e, portanto, da
diminuição na capacidade de produzir a forma ativa da vitamina D. A administração de 1,25-DHCC
é uma terapia de reposição eficiente. No hipoparatireoidismo a ausência do PTH causa
hipocalcemia e hiperfosfatemia. Esses pacientes podem ser tratados com qualquer forma de
vitamina D, juntamente com o PTH. Vitamina D deve ser suplementada a animais em crescimento
ou em produção que recebem pouca luz solar em dias nublados ou por manejo em confinamento.
Em vacas leiteiras, devido à toxicidade da vitamina D3 em gestantes, não é recomendável usar
vitamina D3 para prevenir febre do leite em injeções no pré-parto. Nesses casos, é preferível usa
vitamina D2.

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Toxicidade

A vitamina D é a mais tóxica das vitaminas. Como composto lipossolúvel, a vitamina D pode
ser armazenada no organismo, sendo metabolizada lentamente. A maioria dos animais requer no
máximo 5 μg de vitamina D por 1.000 Kcal da dieta. Quando a ingestão excede 5 a 10 vezes essa
quantia, há risco de toxicidade. A hipervitaminose D se caracteriza por hipercalcemia e calcificação
de tecidos moles, particularmente articulações, membranas sinoviais, pulmões, rins, artérias, córnea
e miocárdio. A hipervitaminose D pode causar calcificação ectópica, como consequência do
aumento da desmineralização óssea. Os ossos tornam-se frágeis e suscetíveis de fraturas. São
observadas hipercalcemia e hipercalcinúria, com concentrações normais ou diminuídas de P. Os
efeitos da hipervitaminose D são devidos ao 25-HCC, pois o 1,25-DHC está regulado de forma
rigorosa, a menos que seja diretamente administrado no organismo via parenteral. Doses muito
altas de vitamina D (100 vezes o requerimento) podem resultar em balanço negativo de Ca, porque
a ressorção óssea é acelerada, além de sinais como perda de apetite, náuseas, sede e estupor.
Apesar de que os vegetais não contêm vitamina D2, algumas plantas (Solanum malacoxylon
[espichadeira], Cestrum diurnum [dama-da-noite] e Trisetum flavescens [aveia amarela]) contêm
compostos com atividade de vitamina D (um glicosídeo hidrossolúvel de 1,25-DHCC) e o seu
consumo por animais herbívoros pode levar a toxicidade, causando calcinose, manifestada por
deposição de Ca nos tecidos moles, que em casos severos pode levar a insuficiência cardíaca e
pulmonar agudas. A toxicidade da vitamina D3 é 10 a 20 vezes mais tóxica que a vitamina D2.

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Vitamina E

Em 1922, Herbert Evans e Kathryn Bishop observaram que ratos desenvolviam problemas
reprodutivos quando alimentados com dieta contendo gordura rançosa, a menos que fossem
suplementados com alface, alfafa ou gérmen de trigo. Mais tarde, foi descoberto que óleo de gérmen
de trigo continha um princípio ativo que parecia ser responsável por melhorar o desempenho
reprodutivo. O composto foi designado como vitamina E por Sure (1924) e Evans (1925), e mais
tarde foi batizado como α-tocoferol, do grego tokos que significa nascimento. Ao longo da década
de 1920, a vitamina E foi reconhecida apenas como um fator que era necessário para a reprodução
dos ratos, mas em 1931, Pappenheimer e Goettsch observaram que a vitamina E também era
requerida para evitar degeneração muscular em coelhos e cobaias e encefalomalacia em frangos.
Posteriormente, outros sinais foram identificados na deficiência de vitamina E, incluindo diátese
exudativa em frangos, e necrose hepática e anemia hemolítica em outros animais. Com a elucidação
da estrutura do α-tocoferol por Fernholz, em 1938, estudos demonstraram que a deficiência de
vitamina E podia resultar em falha embrionária. Em 1957, Schwartz descobriu que levedura de
cerveja (que não contém vitamina E) era efetiva, assim como a vitamina E, em prevenir necrose
hepática. Após este descobrimento, se encontrou que o Se era o ingrediente ativo da levedura de
cerveja nesta função e para prevenir a diátese exudativa em frangos e a degeneração muscular em
bezerros.
Os tocoferóis e os tocotrienóis, que são os principais compostos com atividade de vitamina
E nos alimentos, são derivados do composto original tocol, que apresenta um ou mais grupos metila
nas posições 5,7 ou 8 da estrutura do anel cromano (Figura 6). As formas α, β, γ e δ de tocoferol e
tocotrienol diferem conforme o número e a posição dos grupos metila e, portanto, diferem
significativamente quanto à atividade de vitamina E. O α-tocoferol apresenta a maior atividade de
vitamina E tendo função antioxidante. Os três carbonos assimétricos (2´, 4´ e 8´) da molécula de
tocoferol e a configuração estereoquímica dessas posições na vitamina E influenciam na atividade
vitamínica do composto. Os tocoferóis e os tocotrienóis são muito apolares, existindo
principalmente na fase lipídica dos alimentos. Todos os tocoferóis e tocotrienóis, quando não
esterificados, têm a capacidade de agir como antioxidantes. Eles desativam radicais livres, doando
um H+ fenólico e um elétron. Os tocoferóis são constituintes naturais de todas as membranas
biológicas. Acredita-se que eles contribuam para a estabilidade da membrana devido a sua atividade
antioxidante. Os tocoferóis e os tocotrienóis de ocorrência natural também contribuem para a
estabilidade de óleos vegetais altamente insaturados, por meio de sua ação antioxidante. Os
compostos vitamínicos E apresentam estabilidade razoável na ausência de oxigênio e lipídeos

16
oxidantes. Tratamentos anaeróbicos no processamento de alimentos, como os enlatados
autoclavados, exercem pouco efeito sobre a atividade de vitamina E. Em contrapartida, a taxa de
degradação da vitamina E aumenta na presença de oxigênio molecular, podendo ser particularmente
rápida quando radicais livres também estão presentes.

Figura 6. Estruturas da vitamina E: tocoferol, tocotrienol e tocol

A vitamina E se armazena no organismo em todos os tecidos, mas os maiores depósitos são


fígado, tecido adiposo e músculo. Os requerimentos de vitamina E na dieta das diferentes espécies
estão entre 15 a 60 UI/kg (base seca) com valores que podem atingir 80 UI/kg em animais em
crescimento. Esses requerimentos podem aumentar em situações de estresse, exercício, infecções e
trauma. Os requerimentos de vitamina E e Se são mutuamente substituíveis. A vitamina E reduz as
necessidades de Se de duas maneiras: prevenindo perdas corporais de Se e prevenindo a
peroxidação dos lipídeos de membranas poupando glutation peroxidase (GPx), que contém Se. Por
sua vez, o Se pode reduzir as necessidades de vitamina E de três formas: preservando a integridade
do pâncreas para a normal digestão das gorduras e, portanto, da absorção de vitamina E, reduzindo
a quantidade de vitamina E requerida para manter a integridade dos lipídeos de membrana via GPx,
e facilitando a retenção de vitamina E no plasma. A vitamina E está amplamente distribuída na

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natureza, mas as fontes mais ricas são óleos vegetais, óleos de cereais particularmente no gérmen,
ovos e fígado.

Funções da vitamina E

Os tocoferóis são os únicos, dentre as vitaminas, que agem primariamente como


antioxidantes, ou seja, eles não servem como cofatores e não estão envolvidos diretamente como
fatores específicos na regulação celular. Primariamente, essa vitamina protege os ácidos graxos
insaturados da camada fosfolipídica da membrana celular. A fração quinona dos tocoferóis é capaz
de desativar radicais livres, como os radicais de hidrogênio (H·), radicais superóxido (O2·), radicais
hidroxila (OH·), peróxido de H (H2O2) e outros radicais derivados de lipídeos. As membranas
celulares contêm vitamina E na concentração de 1 mg a cada 5-10 g de lipídeos de membrana, uma
concentração suficiente para retardar a oxidação dessas membranas. A vitamina E atua como um
agente eliminador dos radicais livres à custa da sua depleção. Quanto mais gordura insaturada
contiver a dieta, mais vitamina E vai ser utilizada, podendo precipitar uma deficiência. Os
tocoferóis, antes de serem absorvidos, integram micelas no intestino. Depois da absorção, a
vitamina E é transferida para a circulação linfática associada aos quilomícrons, similarmente ao
que ocorre com outras vitaminas lipossolúveis. A vitamina E penetra na célula através de receptores
de membrana para LDL. Uma vez na célula, a vitamina é incorporada à membrana lipídica. Em
torno de 40% da vitamina E é encontrada nas membranas nucleares e 60% é dividida entre as
membranas lisossomais, mitocondriais e outras.
A vitamina E, como composto antioxidante, está associada com o aumento da resposta
imune, por manter a integridade estrutural e funcional das células do sistema imune e estimular a
síntese de anticorpos (IgG). O tocoferol também participa na manutenção da estabilidade das
hemácias, o melhoramento da qualidade da carne e da cicatrização e tem um papel decisivo na
resistência a infecções virais. Macrófagos e neutrófilos têm atividade fagocítica diminuída em
animais com deficiência de vitamina E. Vários estudos relacionam a vitamina E ao Se, e esta
associação se mostrou benéfica. Trabalhos mostram que o uso concomitante destes compostos
diminuiu a incidência de retenção de membranas fetais em vacas leiteiras, assim como a ocorrência
de mastite. O sinergismo existente deve-se ao fato de ambos atuarem contra os peróxidos no
organismo animal. A vitamina E age prevenindo-os e o Se destruindo-os.
O Se atua como cofator e parte integrante da enzima GPx, que é um dos sistemas
responsáveis contra a oxidação. A vitamina E está na primeira linha de defesa contra a oxidação
lipídica. O Se, como parte da GPx, está na 2ª linha de defesa antioxidante e os aminoácidos

18
sulfurados aparecem na 3ª linha de defesa como precursores da GPx. Consequentemente, enzimas
como superóxido dismutase e catalase e outros sistemas de defesa contra a oxidação podem
moderar a necessidade por vitamina E. A vitamina C também atua como antioxidante por regenerar
a forma reduzida do α-tocoferol: no processo de inibição da oxidação de ácidos graxos, o tocoferol
é oxidado a radical livre de tocoferol e o ácido ascórbico pode doar um elétron a este radical para
regenerar a forma antioxidante (reduzida) do tocoferol.

Deficiência de vitamina E

A deficiência de vitamina E mostra uma grande variedade de sinais clínicos nas diferentes
espécies. O grau de severidade da deficiência depende da ingestão de ácidos graxos poli-insaturados
e da disponibilidade de Se, antioxidantes e aminoácidos sulfurados. A distrofia muscular
nutricional é uma síndrome comum em todas as espécies quando há deficiência de vitamina E,
sendo também chamada de degeneração de Zenker, no qual ocorrem lesões nos músculos
esqueléticos e cardíacos e substituição do tecido muscular por conectivo, originando estrias
esbranquiçadas nas fibras musculares. A condição responde a tratamento com vitamina E / Se. Em
ruminantes, o transtorno é conhecido como doença do músculo branco, ocorrendo em animais
jovens primariamente por deficiência de Se, mas influenciado pelo status de vitamina E. Esta
doença pode se apresentar em animais neonatos ou na idade de 3 a 4 semanas em cordeiros ou de
1 a 4 meses em terneiros. Caracteriza-se por fraqueza e deterioração muscular, dificuldade de ficar
em pé e de amamentar (os músculos da língua podem ser afetados). A morte pode ocorrer por dano
severo no miocárdio. Fatores estressantes como transporte ou movimentação, ou mudanças bruscas
na alimentação podem precipitar a doença. Embora a doença seja mais descrita em animais jovens,
também pode afetar adultos com deficiência de vitamina E / Se, ocasionando miopatia
degenerativa, aborto, natimortos e síndrome de vaca caída.
A relação entre a vitamina E com a reprodução adquiriu interesse devido aos primeiros
relatos de que a deficiência desta vitamina afetava esta função em ratos machos e fêmeas.
Entretanto, em outras espécies não têm sido encontradas evidências desta relação, salvo em casos
de diminuição da toxicidade do gossipol em touros. O gossipol é uma substância encontrada na
farinha de algodão (sementes), que tem efeitos tóxicos sobre a reprodução (azoospermia).
Suplementação de vitamina E foi efetiva na prevenção de retenção de placenta em vacas. A
deficiência de vitamina E também causa aumento da sensibilidade dos eritrócitos a peróxidos e o
aparecimento de membranas celulares anormais. Por este motivo, o teste de hemólise in vitro é
considerado um indicador de deficiência de vitamina E. Necrose hepática e síndrome mastite-

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metrite-agalactia têm sido relatadas em suínos por deficiência de vitamina E / Se. Em frangos a
deficiência de vitamina E pode resultar em diátese exudativa, um edema subcutâneo severo causado
por aumento da permeabilidade capilar, encefalomalácia (doença do frango louco), que resulta de
hemorragia e edema do cerebelo, muito influenciada pela quantidade de ácido linoleico na dieta, e
distrofia muscular.

Toxicidade

A vitamina E, comparada às vitaminas A e D, é relativamente não tóxica. Porém, uma


hipervitaminose E pode ter efeitos deletérios. Em várias espécies animais são indicados níveis
máximos toleráveis de 1.000 a 2.000 UI/kg na dieta. Em aves, os efeitos tóxicos de um excesso de
vitamina E estão relacionados com taxa de crescimento reduzida, anemia, reticulocitose, aumento
do tempo de protrombina e reduzida concentração de Ca e P nos ossos.

Oxidação e antioxidantes

A oxidação é parte fundamental da vida aeróbica e do metabolismo celular, produzindo


radicais livres de forma natural. Pode-se dizer que é o preço que o organismo paga por manter a
energia necessária à vida. No organismo, estão envolvidos na produção de energia, fagocitose,
regulação do crescimento celular, sinalização intercelular, imunidade e defesa celular e síntese de
substâncias biológicas. Isto significa que os radicais livres têm um aspecto positivo, além de ser
um subproduto da obtenção de energia, pois são substâncias que atacam células estranhas ao
organismo, como bactérias e vírus.
Os radicais livres têm um elétron desemparelhado nos átomos de oxigênio, sendo
denominados de ERO (espécies reativas de oxigênio, ou em inglês ROS). Entretanto, quando em
excesso, as ERO podem causar efeitos prejudiciais, como a peroxidação dos lipídeos de membrana
e agressão às proteínas dos tecidos e das membranas, às enzimas, carboidratos e ao DNA. A
produção de ERO está elevada nas lesões teciduais causadas por traumas, infecções, parasitas,
radiações, hipóxia, toxinas e exercícios extremos. O estresse oxidativo é um termo que designa o
aumento indesejado das ERO, encontrando-se relacionado com diversas patologias, como artrite,
choque hemorrágico, doenças cardíacas, sepse, mastite, enterites, pneumonia e doenças
respiratórias. A mitocôndria é a principal fonte geradora de radicais livres, por meio da cadeia
transportadora de elétrons, durante a produção de ATP a partir da oxidação de substratos
energéticos e da redução do O2 em água (Figura 7).

20
Figura 7. Redução do O2 em água durante a cadeia de transporte de elétrons

As principais ERO são radicais, como hidroxila (HO∙), íon superóxido (O2∙-), peroxila
(ROO∙) e alcoxila (RO∙), e não radicais (sem elétrons desemparelhados), como oxigênio singlet
(1O2) e peróxido de hidrogênio (H2O2). O radical hidroxila (HO∙) é o mais deletério ao organismo
por possuir curta meia-vida, o que dificulta o sequestro in vivo. É formado no organismo
principalmente por dois mecanismos (Figura 8): reação do peróxido de hidrogênio (H2O2) com
metais de transição e homólise da água por exposição à radiação ionizante. Causa danos a DNA,
RNA, proteínas, lipídeos e membranas celulares. Nos aminoácidos e proteínas, o radical pode reagir
na cadeia lateral, onde ataca preferencialmente cisteína, histidina, triptofano, metionina e
fenilalanina, gerando danos com consequente perda de atividade enzimática, dificuldades no
transporte ativo através das membranas celulares, citólise e morte celular. A forma mais deletéria
do oxigênio ao organismo é o oxigênio singlet (1O2), forma excitada de oxigênio molecular que não
possui elétrons desemparelhados em sua última camada. Podem atuar de forma benéfica, na defesa
contra infecção, quando a bactéria estimula os neutrófilos a produzirem ERO com a finalidade de
destruir o micro-organismo. O peróxido de hidrogênio (H2O2) é gerado in vivo pela dismutação do
ânion-radical superóxido (O2∙-) por enzimas oxidases ou pela β-oxidação de ácidos graxos. O
peróxido de hidrogênio é pouco reativo frente às moléculas orgânicas na ausência de metais de
transição. No entanto, exerce papel importante no estresse oxidativo por ser capaz de transpor
facilmente as membranas celulares e gerar radical hidroxila.
No organismo, os metais de transição mais importantes para a ocorrência dessa reação são
Cu1+ e Fe2+. O peróxido de hidrogênio é utilizado pelos fagócitos do organismo para combater vírus,
bactérias e outros corpos estranhos, muito embora apresentem também efeitos deletérios às
moléculas biológicas. O radical superóxido (O2∙-), ao contrário da maioria dos radicais livres, é
inativo, e sua reação principal é a dismutação, na qual é produzida uma molécula de peróxido de
hidrogênio e uma molécula de oxigênio. Apesar dos efeitos danosos no organismo, o radical O2∙-
possui importância vital para as células de defesa, protegendo contra infecções causadas por vírus,
bactérias e fungos, sendo produzido in vivo pelos fagócitos ou linfócitos e fibroblastos, durante um
processo inflamatório.

21
Figura 8. Formação das espécies reativas de oxigênio (ERO) e ação dos antioxidantes
SOD: superóxido dismutase, Cat: catalase, GSH: glutation reduzido, GSSH: glutation oxidado

Os sistemas biológicos estão continuamente em risco de sofrer injúrias em nível celular em


função dos efeitos tóxicos dos ERO. Dessa forma, desenvolveram-se sistemas de defesa
antioxidantes, que permitem a proteção contra os efeitos deletérios dos radicais livres. Esses
antioxidantes são produzidos pelo organismo ou absorvidos na dieta, sendo definidos como
qualquer substância que regenera o substrato ou previne significativamente a sua oxidação. São
conhecidos três sistemas enzimáticos antioxidantes (Figura 8): (i) enzimas superóxido dismutase
(SOD), que catalisam a dismutação do radical ânion superóxido O2∙-, convertendo-o em O2 e H2O2.
Existem duas formas de SOD no organismo: uma que contém Cu2+ e Zn2+ como centros redox e
ocorre no citosol e outra que contém Mn2+ como centro redox; (ii) enzima catalase que atua na
dismutação do H2O2 em O2 e H2O, com participação da coenzima NAPH; (iii) sistema do glutation
(GSH), que atua em conjunto com duas enzimas, a glutation peroxidase (GPx) e a glutation redutase
(GR). A primeira enzima é uma Se-enzima, denotando a importância desse mineral e sua atuação

22
como antioxidante no organismo. O sistema glutation catalisa a dismutação do H2O2 em O2 e H2O,
operando em ciclos entre a sua forma oxidada e reduzida.
Outros compostos antioxidantes são os carotenoides, o ácido ascórbico, o α-tocoferol, a
ubiquinona, ácido úrico, a bilirrubina e os flavonoides. Os carotenoides agem in vivo como
desativadores do O2 singlet ou como sequestradores dos radicais peroxila, reduzindo a oxidação do
DNA e lipídeos, que está associada a doenças degenerativas. Dentre eles, o β- caroteno é a mais
importante fonte de vitamina A, e formam um tipo incomum de agentes redutores biológicos. O
ácido ascórbico é agente redutor e pode poupar a oxidação de vários antioxidantes, entre eles a
vitamina E. O α-tocoferol é o principal antioxidante lipossolúvel nas membranas celulares, sendo
responsável pela remoção dos radicais livres na membrana eritrocitária e tendo importante papel
em inibir a propagação da lipoperoxidação, atuando assim na prevenção da hemólise, por manter a
estabilidade das membranas. A ubiquinona possui grande poder oxidante através do sequestro dos
radicais livres e na desativação do radical ânion superóxido.
Outra importante função é a regeneração do tocoferol na membrana mitocondrial, onde exerce
a mesma função regenerativa que o ácido ascórbico. O ácido úrico é a principal forma de excreção
de nitrogênio das aves e dos répteis; nos mamíferos é um produto secundário de excreção, derivado
das bases purínicas. Encontra-se, na maioria dos tecidos, na forma de ânion urato, que é um
antioxidante efetivo nos sistemas biológicos, capaz de proteger o DNA e lipídeos de ERO, mediante
a reação com os radicais peroxila (ROO∙). Além disso, é capaz de recuperar estruturas já atacadas
que se tornaram radicais livres, e é responsável por estabilizar o ascorbato. Tanto a biliverdina
quanto a bilirrubina, produtos do catabolismo do grupo heme, possuem propriedades antioxidantes.
A atividade antioxidante da bilirrubina ocorre principalmente quando se encontra ligada à albumina
plasmática. Os flavonoides são substâncias polifenólicas, pigmentos naturais amplamente
distribuídos em plantas, frutas, verduras e em diversas bebidas. Já foram identificados mais de
5.000 flavonoides diferentes. Possuem um ou mais núcleos aromáticos, contendo substituintes
hidroxilados e/ou derivados funcionais, como ésteres, glicosídeos e outros. Os flavonoides têm
apresentado importância farmacológica em função da descoberta de seus efeitos antitumorais, anti-
inflamatórios, antioxidantes, antivirais e antimicrobianos.
Além do oxigênio, o nitrogênio também participa da estrutura dos radicais livres, em especial o
óxido nítrico (NO2). Entre suas principais funções, destacam-se a regulação da pressão arterial e a
sinalização intercelular. Seu efeito tóxico, como radical livre, pode levar a lesão tecidual em
processos inflamatórios crônicos. O NO2 é sintetizado a partir da arginina por ação da enzima óxido
nítrico sintetase, presente no endotélio e nos macrófagos. O NO2 promove vasodilatação com

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redução da resistência periférica, inibe a agregação plaquetária e desempenha um papel importante
na síndrome de lesão por isquemia-reperfusão.

24
Vitamina K

Em 1929, Henrik Dam notou que aves alimentadas com dietas em que foram utilizados
solventes apolares para remover esteróis, em um estudo para determinar a capacidade de sintetizar
colesterol, desenvolviam hemorragias musculares e subcutâneas. Estes estudos foram estendidos
por MacFarland, que observou que defeitos de coagulação em aves alimentadas com dietas
baseadas em extrato lipídico de peixe ou farinha de carne não podiam ser revertidos com o uso das
vitaminas conhecidas até então, e a doença hemorrágica em frangos foi associada com um novo
fator, designado de vitamina K, a vitamina da coagulação, tornando-se assim a última vitamina
lipossolúvel a ser descoberta. Mais tarde, em 1935, Almquist e Stokstad demonstraram que a
doença hemorrágica em frangos podia ser revertida com extrato de alfafa. Em 1940, se tornou claro
que substâncias sintetizadas por bactérias também possuíam atividade de vitamina K. Informações
também se tornaram disponíveis a respeito de um composto em trevo e gramíneas estragadas que
pareciam ser causa de desordens hemorrágicas em bovinos e serviam como antagonista da vitamina
K. Mais tarde, este composto foi identificado como dicumarol. Foi apenas em 1974 que foi
esclarecido o papel metabólico da vitamina K, quando se descobriu que γ-carboxiglutamato estava
presente em todas as proteínas dependentes de vitamina K.
A vitamina K existe em diversas formas (Figura 9), por exemplo, nas plantas como
filoquinona (vitamina K1) e nas bactérias da flora intestinal como menaquinona (vitamina K2). Para
a terapia, está disponível um derivado sintético, a menadiona (vitamina K3).

Figura 9. Estruturas químicas das formas de vitamina K

25
Grande parte da vitamina K é sintetizada por bactérias intestinais, e várias espécies animais
conseguem incorporar esta vitamina mediante coprofagia. Os micro-organismos ruminais
sintetizam grandes quantidades de vitamina K, de forma que os ruminantes não necessitam de
fontes externas. Dietas de frangos e suínos são regularmente suplementadas com menadiona, mas
a necessidade de suplementação na dieta para outras espécies é controversa. Os frangos não
conseguem suficientes quantidades de menaquinona a partir da síntese microbiana intestinal.
Aproximadamente metade do estoque de vitamina K – principalmente filoquinona e menaquinona
– do organismo está no fígado. A menadiona, por ser mais hidrossolúvel, tem distribuição mais
abrangente em todos os tecidos, sendo rapidamente excretada.
Existem compostos antagonistas da vitamina K, como os derivados cumarínicos (Figura 10),
originados a partir de fungos contaminantes de trevo. Micotoxinas e sulfonamidas também são
antagonistas da vitamina K. O dicumarol é utilizado farmacologicamente como anticoagulante para
prevenir a formação de coágulos intravasculares. A warfarina é usada como potente rodenticida. A
vitamina K é encontrada em vegetais escuros e frescos, principalmente na alfafa, couve-flor,
repolho verde, alface, brócolis e espinafre. Também se encontra na gema do ovo, no tomate e no
fígado. Os requerimentos de vitamina K estão na ordem de 0,5-1,0 ppm (base seca), sendo que os
ruminantes não requerem consumir esta vitamina, que é produzida em quantidade suficiente pelos
micro-organismos ruminais.

Figura 10. Estruturas de antagonistas da vitamina K

Funções da vitamina K

O principal papel da vitamina K é a modificação pós-traducional de vários fatores de


coagulação sanguínea, em que essa vitamina serve como coenzima na carboxilação de certos
resíduos de ácido glutâmico presentes nessas proteínas. A vitamina K é necessária para a síntese
hepática de protrombina (Fator II) e dos fatores de coagulação sanguínea VII (pró-convertina), IX

26
(Fator Christmas) e X (Fator Stuart-Prower) (Figura 11). Essas proteínas são sintetizadas como
moléculas precursoras inativas.

Figura 11. Mecanismo da coagulação


Fatores dependentes de vitamina K são: IX (Christmas), X (Stuart-Prower),
VII (pró-convertina), II (protrombina)

A formação dos fatores de coagulação requer carboxilação de resíduos de ácido glutâmico,


que é dependente de vitamina K, para formar γ-carboxiglutamato (Gla), capaz da subsequente
ativação. A protrombina, por exemplo, possui 10 resíduos de Gla. Carboxilases microssomais
específicas são responsáveis pela formação de Gla. A reação requer O2, CO2 e vitamina K (como
cofator). Apenas a forma reduzida da vitamina K serve como cofator (forma hidroquinona),
portanto é necessário um sistema de redução para a regeneração da vitamina (forma quinona), via
vitamina K-epóxido (Figura 12).
Muitos antagonistas da vitamina K funcionam como inibidores das enzimas redutases
importantes para a regeneração da vitamina K. A formação de Gla é sensível à inibição por
dicumarol, anticoagulante de ocorrência natural nas células de trevo em deterioração, e por
warfarina, análogo sintético da vitamina K. A warfarina inibe a formação da protrombina ativa,
sendo usado como um potente rodenticida e uma droga anticoagulante para tratar pacientes em
risco por coagulação excessiva. Os resíduos da Gla da protrombina são quelantes de íons Ca,
carregados positivamente, devido à presença de dois grupos carboxilato adjacentes, negativamente
carregados. O complexo prototrombina-Ca é capaz de ligar-se a fosfolipídeos essenciais para a
coagulação sanguínea, na superfície das plaquetas. A ligação às plaquetas aumenta a taxa de

27
conversão proteolítica de protrombina em trombina. A protrombina é uma enzima proteolítica que
quebra ligações peptídicas no fibrinogênio para convertê-lo em fibrina, a proteína fibrosa insolúvel
que mantém unidos os coágulos sanguíneos. O Gla está também presente em outras proteínas, por
exemplo, na osteocalcina, envolvida na remodelação dos ossos.

Figura 12. Reação de carboxilação do ácido glutâmico (Glu) para a


formação de γ-carboxiglutamato (Gla), que é dependente da
vitamina K
(1) oxidação, (2) carboxilação, (3, 4) reciclagem da forma oxidada da
vitamina K a sua forma reduzida (hidroquinona)

Deficiência de vitamina K

A deficiência de vitamina K é incomum, pois quantidades adequadas são produzidas pelas


bactérias intestinais ou obtidas pela dieta na forma K2 (menaquinona). O principal sinal de
deficiência de vitamina K é falha na coagulação, que pode estar evidenciada por baixo nível de
protrombina, aumento no tempo de coagulação (tempo de protrombina acima de 40 s) e
hemorragias subcutâneas e internas, por vezes fatais. A deficiência pode ser resultado de
insuficiente vitamina K na dieta, falta de síntese microbiana no intestino, problemas de absorção
intestinal ou incapacidade hepática de usar a vitamina K disponível. Se a população bacteriana

28
diminui, por exemplo, pelo uso de antibióticos, a quantidade de vitamina formada endogenamente
diminui e pode levar a hipoprotrombinemia em indivíduos subnutridos. Certas cefalosporinas de
segunda geração podem causar hipoprotrombinemia. Em função disso, seu uso geralmente é
associado à suplementação de vitamina K. A deficiência de vitamina K costuma estar associada a
síndromes de má absorção ou ao uso de anticoagulantes farmacológicos. Recém-nascidos possuem
intestinos estéreis e, inicialmente, não possuem as bactérias que sintetizam a vitamina K. Em
ruminantes alimentados com trevo contaminado com fungos pode haver alto consumo de dicumarol
causando intoxicação hemorrágica devido ao antagonismo da vitamina K. Outra causa de
deficiência de vitamina K induzida é pelo consumo acidental de warfarina, cumarina sintética usada
como rodenticida. Filoquinona, assim como menadiona, devem ser usadas parenteralmente para
tratar animais que ingeriram warfarina e outros anticoagulantes. Alguns cavalos chamados
“sangradores”, que sofrem hemorragias após o exercício, geralmente respondem a tratamento de
suplementação de vitamina K. Profilaticamente, a administração intramuscular de vitamina K pode
ser indicada contra doenças hemorrágicas, mas não como tratamento farmacológico em condições
hemorrágicas.

Toxicidade

Poucos perigos são atribuídos à ingestão de vitamina K por longo tempo e em doses de 10-
100 ppm na dieta sob a forma de filoquinona. As formas naturais de vitamina K, filoquinona e
menaquinona, não são tóxicas em doses elevadas. Porém, a forma sintética da vitamina K, a
menadiona, em doses de 100 ppb na dieta pode agir como pró-oxidante, e sua alta concentração na
dieta pode produzir hemólise. Doses de menadiona de 2-8 mg/kg de peso corporal podem ser letais
em cavalos, provocando sinais de cólico, hematúria, azotemia e falha renal aguda. A administração
prolongada de vitamina K pode produzir anemia hemolítica e icterícia em filhotes, devido a efeitos
tóxicos na membrana dos eritrócitos.

29
Tiamina (Vitamina B1)

A tiamina ou vitamina B1 foi a primeira vitamina a ser descoberta. Eijkman, em 1890,


descobriu que frangos alimentados com arroz branco e afetados de beribéri (polineurite), doença
descrita desde tempos ancestrais em humanos, principalmente asiáticos, se recuperavam quando
alimentados com arroz integral. O pesquisador atribuiu o fato a uma toxina do arroz branco que
seria contrarrestada ao consumir o arroz integral, mas seu sucessor, Grijns, postulou que o beribéri
era causado pela falta de um importante componente do alimento. Funk obteve em 1911 um
componente da casca do arroz com característica de amina e então foi cunhado o termo “vitamina”
ou “amina vital”, muito embora depois se descobrisse que muitas vitaminas não são aminas. A
estrutura da tiamina consiste de uma molécula de pirimidina mais uma molécula de tiazol ligados
por uma ponte metileno, que na sua forma ativa está ligada a um grupo pirofosfato (Figura 13).

Figura 13. Estrutura da tiamina na sua forma de vitamina (tiamina pirofosfato)

Existem compostos sintéticos que são antagonistas da tiamina por possuir similar
composição e atuam por inibição competitiva, interferindo em diferentes pontos do metabolismo.
Assim, a piritiamina bloqueia a esterificação da tiamina com o ácido fosfórico, impedindo a ação
da coenzima co-carboxilase (que contém tiamina); a oxitiamina também inibe a ação da co-
carboxilase e o amprólio (usado como coccidiostático), inibe a absorção intestinal e a fosforilação
de tiamina. As plantas também podem conter antagonistas da tiamina estáveis ao calor, como os
polifenóis, que se encontram em algumas samambaias, no pasto festuca e no chá. Os polifenóis
servem como agentes antioxidantes, mas, no caso do antagonismo à tiamina, oxidam o anel tiazol
para produzir um dissulfeto não absorvível. Algumas samambaias também contêm tiaminase,
enzima que quebra a estrutura da tiamina na ponte metileno em tiazol e pirimidina, inativando-a. A
tiaminase também tem sido identificada em certos peixes, e animais que os consomem podem sofrer
transtorno neurológico conhecido como paralisia de Chastek.

30
A tiamina é uma das vitaminas com menor capacidade de armazenamento e por isso uma
deficiência pode manifestar sinais clínicos em pouco tempo. Em condições de alimentação
costumeira (cereais, hortaliças tuberosas) os animais monogástricos dificilmente terão deficiência
desta vitamina, a menos que os alimentos contenham antagonistas da tiamina (tiaminase, por
exemplo, na samambaia) ou sofram inativação por calor. A tiamina é encontrada principalmente
em cereais e milho, levedura de cerveja, vegetais, frutas, batata, fígado animal, gema de ovo e leite.
Os animais ruminantes e equinos adultos podem obter a vitamina B1 através das bactérias do rúmen
ou do ceco, respectivamente, enquanto coelhos e ratos dependem da coprofagia como fonte desta
vitamina. Nos ruminantes praticamente não se consideram requerimentos de tiamina devido a sua
síntese pelas bactérias ruminais, porém deve-se levar em consideração a possibilidade de
deficiência em ruminantes jovens que ainda não tem um rúmen funcional. Requerimentos em
animais monogástricos rondam 1,0 a 3,0 ppm (matéria seca), sendo os felinos os que possuem
maiores requerimentos. Tendo a tiamina importante participação no metabolismo dos glicídeos, o
aumento deste nutriente na dieta aumenta os requerimentos da vitamina. Gestação, lactação e idade
aumentam os requerimentos de tiamina.

Funções da tiamina

O pirofosfato de tiamina (TPP) ou coenzima co-carboxilase é a forma biologicamente ativa


da vitamina B1, formada pela transferência do grupo pirofosfato do ATP para a tiamina. A TTP
funciona como coenzima na descarboxilação-oxidação do piruvato, com sua conversão em acetil-
CoA possibilitando sua entrada no ciclo de Krebs. Neste mesmo ciclo, a TPP atua na
descarboxilação do α-cetoglutarato formando succinil-CoA. Estas duas reações são essenciais para
a produção de energia, sendo de vital importância no tecido nervoso. Na deficiência de tiamina, a
atividade dessas duas reações de descarboxilação/oxidação esta diminuída, resultando na
diminuição de produção de ATP e, consequentemente, em prejuízo na função celular.
O TPP também atua como coenzima na formação ou degradação de α-cetóis pela
transcetolase, na via das pentoses-fosfato. A vitamina B1 é importante na síntese de ácidos graxos
e colesterol e participa diretamente na excitação dos nervos periféricos. A falha na síntese desses
lipídeos para a estrutura das membranas das células nervosas parece ser a causa das mudanças
degenerativas que se observam na deficiência de tiamina. Esta vitamina funciona também na
manutenção do apetite e do tônus muscular. A vitamina B1 também é recomendada para a
manutenção, o crescimento e a reprodução dos animais. A TTP parece ter importante papel na
transmissão do impulso nervoso: a coenzima se localiza nas membranas periféricas dos neurônios,

31
sendo requerida na biossíntese de acetilcolina e nas reações de translocação de íons na estimulação
nervosa. Também tem sido postulada a ação da tiamina na síntese de insulina.

Deficiência de tiamina

O clássico sinal da deficiência de tiamina (beribéri em humanos e polineurite em aves) é


atingido no estágio final de deficiência, provavelmente devido ao acúmulo de intermediários do
catabolismo de glicídeos no tecido nervoso, explicado pela dependência da glicose para a obtenção
de energia nesses tecidos. O conhecimento da ação bioquímica da TTP não explica, entretanto, de
forma clara outros sinais decorrentes da sua deficiência: perda do apetite, constipação, enjoo,
depressão, irritabilidade e fadiga. Deficiência de moderada a severa causa confusão mental, ataxia
(andar cambaleante e disfunção motora) e oftalmoplegia (perda da coordenação ocular).
Deficiência severa causa beribéri em humanos e polineurite em aves (as mais sensíveis são os
frangos e pombos), doenças caracterizadas por acúmulo de fluidos (edema) no sistema
neuromuscular, dor, atrofia e debilidade muscular, paralisia e morte. Também pode ocorrer falha
cardíaca congestiva. Em humanos, a deficiência de tiamina é observada em desnutrição avançada,
em alimentação exclusiva a base de arroz polido e em alcoolismo crônico.
A tiamina é instável no calor e em meios alcalinos, podendo haver a sua destruição em várias
etapas do processamento dos alimentos e a conservação. Também pode ser destruída por tiaminases
presentes na carne de alguns peixes e no processo de fermentação por algumas bactérias. A
deficiência de tiamina foi observada em raposas alimentadas com peixes crus e gatos alimentados
tanto com peixe cru como em comida de gato enlatada. Rações enlatadas preservadas com
metabissulfito de Na também causaram deficiência de tiamina em felinos. A chamada síndrome da
mortalidade precoce é uma doença não infecciosa que afeta a truta do lago e outros salmonídeos
associada à deficiência de tiamina. Em herbívoros a deficiência de tiamina pode ocorrer a partir da
ingestão de Marsilea drummondii ou a samambaia Pteridium aquilinum. A característica mais
predominante da deficiência é a poliencefalomalácia com sinais de andar em círculos, convulsões,
cegueira e postura da cabeça em opistótono. Têm sido estabelecidas quatro condições para
diagnosticar a ocorrência de poliencefalomalácia: (1) dieta com alto conteúdo energético; (2)
aumento de piruvato e lactato sanguíneos (4-5 vezes o normal) e diminuição de atividade
transcetolase eritrocitária; (3) resposta positiva a tratamento com tiamina; e (4) lesões cerebrais de
necrose cortical bilateral à necropsia. A suplementação com grandes quantidades de melaço pode
causar o que se conhece como toxicidade ao melaço, na qual ocorrem sinais clínicos similares à
poliencefalomalácia.

32
Toxicidade

Grande ingestão ou administração parenteral de tiamina não produz efeitos tóxicos, uma vez
que a vitamina é rapidamente excretada pelo rim. Entretanto, repetidas e grandes doses parenterais
podem causar reação anafilática, com sinais como convulsões, paralisia, arritmia cardíaca e
respiratória e depressão.

33
Riboflavina (vitamina B2)

A riboflavina foi uma das primeiras vitaminas B identificadas. Em 1932, Warburg e Christain
isolaram uma enzima oxidativa de leveduras que continha uma fração proteica e outra não proteica,
sendo a primeira identificação de um grupo prostético (ativador) de uma enzima. Assim, a
riboflavina foi encontrada em uma coenzima antes de ser descoberta na sua forma livre. Em 1933,
Kuhn isolou um pigmento amarelo da clara do ovo que tinha propriedades oxidativas e funcionava
como fator de crescimento em ratos. Ele deu o nome de flavina (ovoflavina por ser do ovo). Mais
tarde se descobriu que continha ribose e foi dado o nome de riboflavina. A riboflavina consiste em
um núcleo de dimetilisoaloxazina ligado à ribose através de um grupo álcool (Figura 14).

Figura 14. Estrutura da riboflavina

As duas formas biologicamente ativas da vitamina B2 são a flavina mononucleotídeo (FMN,


Figura 15) e a flavina adenina dinucleotídeo (FAD, Figura 16). FMN e FAD são capazes de aceitar
reversivelmente dois átomos de hidrogênio, formando FMNH2 ou FADH2. FMN e FAD são
fortemente ligados, algumas vezes covalentemente, a flavoenzimas que catalisam a oxidação ou a
redução de um substrato. Nos alimentos ingeridos, FMN e FAD são hidrolisados na parte superior
do intestino para libertar a riboflavina. A riboflavina é absorvida por processos ativos e transportada
pelo sangue para os tecidos alvos em associação com a albumina. Uma vez na célula, a riboflavina
é convertida em FMN utilizando um ATP em reação catalisada pela enzima flavoquinase. Depois
o FMN se combina com uma 2ª molécula de ATP para formar FAD em reação catalisada pela
enzima FAD pirofosforilase. A urina é a principal via de excreção da riboflavina e do FMN, embora
FAD possa ser excretado na bile. A forma livre da riboflavina constitui menos de 5% das flavinas
no organismo, enquanto de 70 a 90% está na forma de FAD. Os requerimentos de riboflavina não
são considerados em ruminantes por causa da sua síntese microbiana ruminal e nos monogástricos

34
são da ordem de 2,0 a 4,0 ppm (matéria seca). Fontes de riboflavina se encontram nas plantas
verdes, em leveduras, fungos e algumas bactérias.

Figura 15. Estrutura da flavina mononucleotídeo (forma oxidada:


FMN; forma reduzida: FMNH2)

Figura 16. Estrutura da flavina dinucleotídeo


na forma oxidada (FAD)

Funções da riboflavina

As formas ativas da riboflavina, principalmente o FAD, participam como ativadores de mais


de 100 enzimas que catalisam reações de oxidação-redução. FMN e FAD atuam como grupos
prostéticos (não proteicos) de muitas flavoenzimas. A sua participação no metabolismo é
fundamental na oxidação de substratos e geração de energia (ATP), sofrendo alternativas de
oxidação e redução. Algumas flavoenzimas contêm metais (Fe, Mo, Cu, Zn) que participam de

35
reações de transferência de elétrons. As 40 flavoenzimas conhecidas têm sido classificadas nos
seguintes três grupos: (1) NADH2 desidrogenases que tem como substrato NAD reduzida e como
aceptor de elétrons enzimas do sistema citocromo, na cadeia de transporte de elétrons, sendo
fundamental na geração de ATP. (2) Oxidases que aceitam elétrons de substratos reduzidos e os
transferem ao oxigênio, para depois reduzir o O2 a H2O2. (3) Desidrogenases que aceitam elétrons
de substratos reduzidos e os transferem para o sistema citocromo. A riboflavina participa como
fator essencial no metabolismo dos aminoácidos, sendo parte das oxidases que oxidam α-
aminoácidos e os convertem em seu correspondente α-cetoácido, liberando amônia. Uma FMN-
oxidase é necessária para a conversão de piridoxina fosforilada (vitamina B6) em uma coenzima
funcional. Isto significa que uma deficiência de riboflavina pode também causar deficiência de
vitamina B6. A riboflavina tem papel importante na absorção intestinal de Fe. Riboflavina é
necessária no metabolismo dos ácidos graxos, tanto para a oxidação (FAD acil-CoA-desidrogenase)
como para a síntese a partir de acetato (FMN flavoproteína). Parece que a riboflavina é necessária
para a regeneração de glutation reduzido nas hemácias, fazendo que a deficiência torne as
membranas das hemácias mais vulneráveis ao estresse oxidativo.

Deficiência de riboflavina

Tanto humanos como animais não podem sintetizar riboflavina nos tecidos, devendo,
portanto, ingerir na alimentação ou adquirir por síntese microbiana intestinal. Neste sentido, os
ruminantes são muito mais eficientes que os monogástricos, não tendo requerimentos nutricionais,
pois os micro-organismos do rúmen sintetizam quantidades adequadas de riboflavina. Os lactentes
em geral não sofrem de deficiência, pois o leite constitui uma boa fonte de riboflavina. Em todas
as espécies, a deficiência se manifesta por uma taxa de crescimento diminuída, inflamação da
mucosa oral, perda de pelo e produção excessiva de lágrimas e saliva. Outros sinais incluem
anorexia, diarreia, dermatite, queilose (fissuras nos cantos da boca) e glossite (a língua parece lisa
e púrpura). As dietas típicas fornecidas a suínos e frangos, principalmente a base de grãos, as tornam
marginais na deficiência de riboflavina. Porcos jovens em crescimento são mais vulneráveis e
apresentam anorexia, baixo crescimento, pelo áspero, alopecia e manqueira. Em ocasiões também
acompanham neutrofilia e diminuição da resposta imune. Nas porcas, a deficiência de riboflavina
se manifesta por falhas reprodutivas. Em frangos aparece uma típica condição denominada
paralisia de dedos tortos, em casos de severa deficiência, em que o animal caminha sobre os jarretes
com os dedos curvados para dentro. Também em frangos de corte a deficiência de riboflavina causa
atraso no crescimento, diarreia e alta mortalidade nas primeiras semanas de vida. Em galinhas de

36
postura diminui a eclodibilidade e a produção de ovos. Nesta espécie, a dosagem de riboflavina na
ovoalbumina é um excelente indicador do status de riboflavina (deve estar entre 2-3 ppm). O
método bioquímico mais adequando para detectar deficiência de riboflavina é medir a atividade da
FAD-enzima glutation redutase nas hemácias.

Toxicidade

A riboflavina é uma vitamina que tem muito pouca toxicidade. Quantidades de riboflavina
na dieta de até 100 vezes os requerimentos diários em ratos podem ser toleradas sem problema.
Quando doses elevadas são fornecidas por via oral, apenas uma pequena fração se absorve e a
maioria é excretada pelas fezes. Isto ocorre porque o sistema de absorção de riboflavina via
intestinal é rapidamente saturado, além de que a capacidade para armazenar a vitamina nos tecidos
é limitada. A administração parenteral de riboflavina pode atingir toxicidade com doses de 600
mg/kg de peso em ratos. Nesses casos ocorre anúria e acúmulo de cristais nos túbulos renais.

37
Niacina (vitamina B3)

Depois do descobrimento da tiamina e da riboflavina, a niacina foi a 3ª vitamina do complexo


B identificada. Os primeiros indícios de a niacina ser um nutriente essencial vieram do estudo da
doença conhecida como pelagra em humanos e língua preta em cães. Esta doença foi descrita no
norte da Espanha por Gaspar Casal, médico da corte de Felipe V, em 1735, onde a população a
conhecia como mal de la rosa, e Casal a relacionou com pobreza e má alimentação. Estudos
posteriores a identificaram em outras latitudes e começaram a relacioná-la com deficiência de
proteína. O termo pelagra significa pele áspera, e se manifesta com dermatite, diarreia, demência
e morte. No século 20 foi identificado o aminoácido triptofano como o limitante nas condições de
pelagra e língua preta. Em 1937, Elvehjem isolou a nicotinamida do fígado como o fator que podia
curar língua preta em cães. Em 1945, Krehl descobriu que o triptofano era tão ativo quanto a niacina
no tratamento da pelagra. Depois, Heidelberg deu a prova definitiva de que o triptofano é convertido
em ácido nicotínico (vitamina B3).

Figura 17. Estrutura da niacina


(ácido nicotínico)

A niacina ou ácido nicotínico (Figura 17) é um derivado substituto da piridina. As formas


biologicamente ativas da coenzima são nicotinamida-adenina-dinucleotídeo (NAD, Figura 18) e
seu derivado fosforilado nicotinamida-adenina-dinucleotídeo-fosfato (NADP). A nicotinamida é
rapidamente desaminada no organismo e, dessa forma, é nutricionalmente equivalente ao ácido
nicotínico. A niacina é encontrada em cereais, grãos, no leite e na carne, especialmente no fígado.
A rigor, a niacina não é uma vitamina (composto essencial que precisa ser incorporado na dieta),
pois ela pode ser sintetizada no organismo a partir do triptofano (Trp). Porém, a conversão de Trp
em niacina é relativamente ineficiente e só acontece depois que os requerimentos de Trp estão
cobertos. Por outro lado, a biossíntese de niacina necessita de tiamina, riboflavina, e piridoxina.

38
Assim em termos práticos, tanto a niacina quanto o Trp são essenciais e precisam estar na dieta. Os
requerimentos de niacina variam amplamente dependendo da disponibilidade de Trp e da
capacidade de converter Trp em niacina. Nos ruminantes não se consideram requerimentos, pois
obtém a niacina através da síntese microbiana ruminal, salvo nos ruminantes jovens e em vacas
leiteiras de alta produção, que requerem consumo de fontes de niacina e Trp (6 g de
niacina/vaca/dia). Os cavalos também não têm requerimentos, pois sintetizam a niacina nas
bactérias do trato digestivo inferior e possuem boa capacidade de síntese de niacina a partir do Trp.
Nas demais espécies, os requerimentos de niacina variam entre 20 a 40 ppm na dieta (MS).

Figura 18. Estruturas de NAD+ e NADH

Funções da niacina

A principal função da niacina é na formação das coenzimas NAD e NADP, as quais atuam
em reações de oxidação-redução, comprometidas no fornecimento de energia dentro do
metabolismo animal. Nessas reações, a coenzima sofre redução do anel piridina, pela incorporação
de um íon hidreto (átomo de hidrogênio + um par de elétrons). As formas reduzidas do NAD e do
NADP são NADH e NADPH, respectivamente (Figura 18). Elas participam ao menos de 200
reações no metabolismo de glicídeos, ácidos graxos e aminoácidos, de fundamental importância,
principalmente nos tecidos cutâneo, gastrointestinal e nervoso. NAD é uma coenzima aceptora de

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elétrons nas reações de oxidação dos nutrientes, e depois serve como doadora de elétrons na cadeia
de transporte de elétrons na mitocôndria, onde se realiza a síntese de ATP. Isto significa que NAD
é um composto intermediário entre os processos de oxidação, no catabolismo dos nutrientes, e os
processos de transferência de elétrons até o O2, na produção de ATP. Muitas enzimas que
participam de processos de óxido-redução são específicas em utilizar a coenzima NADP, como no
caso da via das pentoses-fosfato e na síntese dos ácidos graxos. Tanto NAD como NADP estão
envolvidas na síntese e degradação de aminoácidos. Poli(ADP-ribose) são moléculas niacina-
dependentes que participam da modificação pós-traducional de proteínas nucleares. As proteínas
poli ADP-ribosiladas parecem funcionar na reparação e na replicação de DNA e na diferenciação
celular. A deficiência severa de niacina pode aumentar a suscetibilidade ao dano oxidativo sobre o
DNA, devido a pouca disponibilidade de NAD.

Deficiência da niacina

A deficiência de niacina se caracteriza por transtornos na pele e no trato gastrointestinal, com


sinais como perda de apetite, crescimento retardado, fraqueza, dermatite, desordens digestivas e
diarreia. Uso de dietas a base de milho podem ser indutoras de deficiência devido ao baixo conteúdo
de Trp e niacina nesse cereal. A deficiência de niacina causa pelagra em humanos, uma doença
envolvendo a pele, o trato gastrointestinal e o sistema nervoso central. Os sinais da evolução da
pelagra compreendem dermatite, diarreia, demência e, se não tratada, morte. A doença chamada de
língua preta é consequência de deficiência de niacina em aves e cães, e consiste numa inflamação
da língua e da cavidade bucal, que leva a crescimento retardado por diminuição do consumo de
alimento. Nos cães, um sinal característico é babar uma saliva grossa e viscosa, devido a glossite e
gengivite. Deficiência não corrigida pode levar a desidratação severa, emaciação e morte. Devido
à coceira cutânea, podem desenvolver dermatite traumática.
No gato não ocorre síntese de niacina a partir de Trp, sendo dependentes da inclusão desta
vitamina na dieta. Na deficiência, apresentam sinais clínicos similares aos apresentados pelo cão.
Em humanos, a quantidade de NAD nas hemácias é considerada um bom indicador do status de
niacina. A suplementação de niacina em bovinos pode ser benéfica, principalmente em animais
estressados (transporte de gado), durante o período pós-parto e em vacas com cetose subclínica.

40
Toxicidade

Podem ocorrer efeitos tóxicos de niacina em níveis muito além dos seus requerimentos (10
a 20 vezes). A nicotinamida é 2 a 3 vezes mais tóxica que o ácido nicotínico. Administração de
elevadas doses de ácido nicotínico em humanos podem causar vasodilatação, coceira, sensação de
calor, náusea, vômito e lesões cutâneas. Em cães, doses de 2 g de ácido nicotínico por dia produzem
sinais de fezes sanguinolentas, convulsões e morte.

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Piridoxina (vitamina B6)

A vitamina B6 é um termo coletivo para piridoxina (piridoxol), piridoxal e piridoxamina


(Figura 19), todos derivados da piridina e com atividade bioquímica equivalente. Eles diferem
apenas na natureza do grupo funcional ligado ao anel. A piridoxina ocorre principalmente nas
plantas, enquanto o piridoxal e a piridoxamina são encontrados em alimentos de origem animal. A
maioria das dietas para animais contém quantidades adequadas de vitamina B6, mas em algumas
condições, deficiências podem ocorrer, principalmente em aves e suínos. György foi o primeiro
pesquisador em reconhecer a vitamina B6 como uma vitamina específica, quando demonstrou que
uma doença similar à pelagra em ratos, conhecida como acrodinia, podia ser prevenida por esta
vitamina, mas não por tiamina, riboflavina ou niacina e propôs o nome de piridoxina a este
composto. A forma coenzimática da vitamina B6 é o piridoxal-fosfato (PLP). Os ruminantes e os
equinos obtêm vitamina B6 a partir de síntese microbiana ruminal ou intestinal, respectivamente, e
os requerimentos em monogástricos são da ordem de 2 a 4 ppm na dieta (MS).

Figura 19. Estrutura das três formas mais importantes da vitamina B6

Funções da piridoxina

Todos os três compostos podem servir como precursores da coenzima biologicamente ativa,
o PLP, o qual funciona como uma coenzima para um grande número de enzimas (em torno de 60),
particularmente aquelas que catalisam reações envolvendo aminoácidos, como coenzima de
reações de transaminação, descarboxilação e racemização de aminoácidos. A maioria das enzimas
dependentes de vitamina B6 são as transaminases, as quais usam α-cetoglutarato como o composto
aceptor de grupos amina. As aminotransferases são específicas para pares específicos de
aminoácidos e cetoácidos (nas reações chamadas de “pingue-pongue”). Elas representam uma

42
importante ligação entre o metabolismo de aminoácidos, glicídeos e ácidos graxos, bem como no
ciclo de Krebs. Também PLP participa em reações de descarboxilação não oxidativa convertendo
aminoácidos em suas aminas correspondentes (por exemplo, histamina, serotonina, taurina, γ-
aminobutírico, etanolamina), as quais atuam em eventos fisiológicos relacionados ao metabolismo
hormonal e como componentes de fosfolipídeos e sais biliares. Adicionalmente, a vitamina B6
participa nas seguintes funções: síntese de niacina (a partir de Trp), formação de ácido δ-
aminolevulínico (primeiro passo da síntese de porfirina), conversão de ácido linoleico em
araquidônico, síntese de adrenalina e noradrenalina, incorporação de Fe no grupo heme, transporte
de aminoácidos e formação de anticorpos.

Deficiência da piridoxina

Em função da importante atividade da piridoxina no metabolismo de aminoácidos e


proteínas, uma deficiência vai acarretar uma diminuição na retenção de nitrogênio e pobre
utilização das proteínas da dieta com excessiva excreção de nitrogênio. É possível observar retardo
no crescimento, dermatite, convulsões, anemia e alopecia. A deficiência de vitamina B6 é raramente
vista em animais, pois a maioria das dietas possuem adequadas quantidades da vitamina. Os
ruminantes e os equinos praticamente não sofrem de deficiência. Porém, gado estressado, por
exemplo, por transporte de longa distância, pode sofrer diminuição de vitamina B6. No caso dos
equinos, apesar de não sofrerem deficiência em condições normais, é recomendável fornecer uma
suplementação de vitamina B6 em situações de treinamento ou atividade intensa.
Em geral, a deficiência de vitamina B6 está caracterizada por baixa resposta imune humoral
e celular. Em suínos, caninos e felinos afetados por deficiência severa de vitamina B6 é possível
encontrar sinais como baixo apetite e crescimento, anemia microcítica hipocrômica, esteatose
hepática, pelo áspero, dermatite e edema subcutâneo. Situações avançadas podem causar
degeneração de nervos periféricos, manifestada por desordens do movimento, ataxia e, no fim,
convulsões. Nas aves, é típica a postura de asas estendidas e cabeça apoiada no chão. Em deficiência
severa, os frangos se tornam excitáveis com movimentos sem sentido e terminando em convulsões
violentas e morte, o que faz necessária a diferenciação com encefalomalácia. Anemia e depressão
de imunoglobulinas M e G também são um sinal frequente em aves com deficiência de vitamina
B6. A dosagem da forma fosforilada da vitamina B6 (PLP) no plasma pode ser uma boa ferramenta
diagnóstica para determinar o status desta vitamina no organismo.

43
Toxicidade

Como as demais vitaminas do complexo B, a vitamina B6 exibe uma toxicidade muito baixa.
Entretanto, doses excessivas de vitamina B6 podem causar sinais clínicos relacionados com o
sistema nervoso periférico, tais como alterações na marcha, incoordenação motora, convulsões,
paralisia e morte. Piridoxal é duas vezes mais tóxica que piridoxina ou piridoxamina.

44
Ácido pantotênico

O ácido pantotênico foi descoberto em 1933 por Roger Williams. Em 1937, Snell observou
que era um fator essencial para o crescimento de leveduras e de bactérias ácido-lácticas e ácido-
propiônicas. Mais tarde, Elvehjen, Jukes e outros demonstraram que o ácido pantotênico era
essencial para os animais e, em 1940, Williams isolou e determinou a estrutura e deu o nome ao
ácido pantotênico, inspirado na palavra grega pantos, que significa “encontrado em toda parte”.
Lipmann e Kaplan, em 1947, descobriram no fígado que a forma ativa do ácido pantotênico é a
coenzima A. Os ovos, o fígado e as leveduras são as mais importantes fontes de ácido pantotênico,
embora a vitamina seja amplamente distribuída em todos os alimentos. Não se reconhecem
deficiências de ácido pantotênico em ruminantes devido a sua síntese no rúmen. Em monogástricos
são mais frequentes as deficiências em suínos e aves. Os requerimentos nestas espécies são da
ordem de 10 a 12 ppm na dieta (MS). O ácido pantotênico é uma amida composta de ácido pantoico
unido a β-alanina (Figura 20).

Figura 20. Estrutura do ácido pantotênico

Ele pode ser encontrado na forma livre ou unido, principalmente como coenzima A ou como
transportadora de grupos acila (ACP). Para ser absorvido no intestino, deve estar na forma livre.
Em todos os tecidos, o ácido pantotênico pode ser convertido em coenzima A ou em outros
compostos em que a vitamina é grupo funcional. A maioria do ácido pantotênico no sangue é
encontrada nas hemácias como coenzima A, mas no plasma existe na sua forma livre.

Funções do ácido pantotênico

O ácido pantotênico é um componente da coenzima A (Figura 21), que contém, além do


ácido pantotênico, uma molécula de ADP em um extremo e outra de β-mercaptoetilamina no outro

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extremo. Esta última possui um grupo tiol (SH) que constitui o sítio ativo da vitamina, atuando na
transferência de grupos acila. O grupo tiol da coenzima A (CoA) transporta compostos acila como
ésteres do tiol ativados. Exemplos de enzimas que têm as coenzimas do ácido pantotênico como
cofator (com sua respectiva forma ativa) incluem: piruvato desidrogenase (CoA), α-cetoglutarato
desidrogenase (CoA), ácido graxo oxidase (CoA), ácido graxo sintetase (ACP), propionil-CoA
carboxilase (CoA) e acetil-CoA sintetase (fosfopanteteína). Essas coenzimas participam em mais
de 100 vias metabólicas, envolvendo o catabolismo de glicídeos, proteínas e lipídeos, e a síntese de
lipídeos, neurotransmissores, hormônios esteroidais, porfirinas e hemoglobina. A função mais
importante da CoA é atuar no transporte de ácidos carboxílicos, que têm o potencial de se transferir
a outros grupos e estando na forma ligada à CoA se tornam “ativos”. A forma mais comum é a que
liga o ácido acético para formar acetil-CoA, composto comum de rotas catabólicas e anabólicas,
tendo atividade fundamental no ciclo de Krebs. A proteína transportadora de grupos acila (ACP)
substitui a CoA durante o processo de síntese de ácidos graxos. O ácido pantotênico também
estimula a formação de anticorpos através da incorporação de aminoácidos às imunoglobulinas.

Figura 21. Estrutura da coenzima A

Deficiência do ácido pantotênico

A deficiência de ácido pantotênico produz, em geral, os seguintes sinais: retardo no


crescimento e na eficiência de conversão de alimento, lesões na pele, transtornos do sistema
nervoso, desordens gastrointestinais, inibição da formação de anticorpos e diminuição da função
adrenal. Em suínos é característico ocorrer desordens do sistema locomotor. Em condições severas,
observa-se “passo militar ou de ganso”. Com o avanço do problema podem cair ou sentar na
“posição de cachorro”. O problema ocorre por desmielinização dos nervos braquial e ciático. Nas

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porcas ocorre falha na fertilidade. Nas aves, a deficiência de ácido pantotênico se reflete em baixa
produção e eclodibilidade de ovos, além de dermatite, problemas de locomoção, anomalias na
plumagem e inflamação das pálpebras, fazendo com que os olhos fiquem grudados. Em cães se
observa apetite errático, perda de peso, baixa resposta imune e diminuição de colesterol e de
lipídeos no sangue.

Toxicidade

Como a maioria das vitaminas do complexo B, o ácido pantotênico não apresenta toxicidade
conhecida em doses relativamente elevadas. Em ratos se observa dano hepático com doses de 100
vezes o requerimento nutricional.

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Biotina

O nome biotina foi dado por Kögl e Tönnis em 1936 a um fator de crescimento isolado da
gema de ovo necessário para leveduras. Por muitos anos acreditou-se que a biotina não era um
composto essencial devido a sua ampla distribuição nos alimentos e a sua síntese pela microflora
intestinal. Entretanto, o achado de lesões de pele e perda de pelo em animais e pessoas que
consumiam grandes quantidades de ovo cru levou à identificação de um composto antagonista da
biotina (avidina) e à revisão da essencialidade desta vitamina. A avidina é uma proteína termolábil,
secretada pelo oviduto das aves, que se encontra na clara do ovo. A biotina é uma molécula orgânica
nitrogenada com um núcleo de enxofre e grupo funcional carboxílico (Figura 22). Pode existir em
forma livre (biotina) ou ligada a proteínas (biocitina) através do grupo carboxila a um aminoácido,
geralmente lisina. Está presente em muitos alimentos e deve ser absorvida na forma livre no
intestino, para o qual conta com uma enzima de origem pancreática e intestinal chamada
biotinidase, que rompe a ligação presente na biocitina. Ruminantes e equinos não possuem
requerimentos de biotina devido à síntese desta vitamina pelas bactérias do trato intestinal. Nas
demais espécies os requerimentos rondam 0,1-0,2 ppm na dieta (MS). Perus têm maiores
requerimentos do que frangos.

Figura 22. Estrutura da biotina

Funções da biotina

A biotina é uma coenzima nas reações de carboxilação, nas quais ela serve como carregador
do dióxido de carbono ativado. A biotina liga-se covalentemente ao grupo ε-amino de resíduos de
lisina nas enzimas dependentes de biotina. A biotina constitui um grupo prostético de várias
enzimas que participam em reações de carboxilação. As mais importantes dessas enzimas são a

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piruvato carboxilase (que catalisa a conversão do piruvato em oxalacetato, participando de forma
essencial na via de gliconeogênese), a acetil-CoA carboxilase (que catalisa a conversão do acetil-
CoA em malonil-CoA, participando na biossíntese de ácidos graxos), e a propionil-CoA carboxilase
(produzindo metil-malonil-CoA, essencial no aproveitamento de propionato para a gliconeogênese
nos ruminantes e de ácidos graxos de número ímpar de carbonos em todas as espécies animais). No
metabolismo dos glicídeos, a biotina participa como coenzima nas seguintes reações: carboxilação
de piruvato a oxalacetato, conversão de malato a piruvato, interconversão de succinato a propionato
e conversão de oxalosuccinato a α-cetoglutarato. No metabolismo nitrogenado, a biotina participa
em reações de síntese proteica, desaminação de aminoácidos, síntese de purina e metabolismo dos
ácidos nucleicos. No metabolismo dos ácidos graxos participa da primeira reação de síntese como
coenzima da acetil-CoA carboxilase que converte acetil-CoA em malonil-CoA. A biotina é
requerida na síntese de ácidos graxos insaturados de cadeia longa. Na deficiência de biotina está
comprometida a síntese de ácido araquidônico e, portanto, de prostaglandinas.

Deficiência de biotina

Apesar de a biotina ser essencial para o funcionamento normal de adrenal, tireoide, trato
reprodutivo e sistema nervoso, o sinal clínico mais característico da sua deficiência é a dermatite.
Os casos de deficiência são raros porque a vitamina está amplamente distribuída nos alimentos e
uma grande proporção das necessidades de biotina é suprida por bactérias intestinais. Em vacas
leiteiras, casos de deficiência são relatados esporadicamente, onde se observam lesões nos cascos
devido à falha na síntese de proteína da camada granular na sola do casco. Em suínos foram
relatados casos de deficiência de biotina por uso de sulfatalidina ou clara de ovo cru. No primeiro
caso por depressão da microflora intestinal e no segundo por efeito antagônico da avidina sobre a
biotina. Também pode ocorrer deficiência na presença de streptavidina, proteína proveniente da
actinobactéria Streptomyces avidinii, que liga a biotina com muita avidez, inviabilizando sua
utilização. A bactéria está presente no solo, em alimentos mofados e em excrementos. Os sinais
clínicos de deficiência de biotina em suínos se caracterizam por alopecia, dermatite, úlceras
cutâneas, inflamação da mucosa oral e lesões dos cascos (rachaduras), além de crescimento
retardado e prejuízo na conversão alimentar. Em aves, os sinais de deficiência são crescimento
reduzido e ineficiente conversão, além de dermatite, problemas de plumagem (penas quebradas),
deformações em pernas e bicos e inflamação das pálpebras. Os sinais em aves são similares à
deficiência de ácido pantotênico, mas na deficiência de biotina primeiro aparecem as lesões nas
pernas e depois em bico e olhos, enquanto na deficiência de ácido pantotênico aparecem antes os

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problemas nos olhos e só em casos severos se observam problemas nas pernas. A deficiência de
biotina em aves pode causar perose, sinal típico da deficiência severa de Mn. Em cães, a deficiência
de biotina se manifesta por pelo sem brilho e quebradiço, dermatite e prurido. Em gatos se observa
diarreia sanguinolenta, anorexia e emaciação, além de dermatite, alopecia e hipersalivação.

Toxicidade

A biotina aparentemente não é tóxica, mesmo em grandes doses. Em suínos e aves, espécies
em que se acostuma suplementar esta vitamina, são indicados níveis de tolerância de até 10 vezes
os requerimentos. A suplementação desta vitamina deve ser realizada de forma muito criteriosa,
devido a ser uma das vitaminas mais caras.

50
Folacina (ácido fólico)

O ácido fólico ou folacina começou seu protagonismo como molécula essencial no


metabolismo quando foi descoberto, em 1931 por Willis, que um fator presente em leveduras
funcionava para tratar anemia macrocítica tropical em mulheres na Índia. Day e colaboradores em
1935 também descreveram um fator presente em leveduras e extratos hepáticos que prevenia
anemia em macacos e que designaram como vitamina M. Similar achado em frangos foi relatado
em 1939 por Hogan e Parrot, que identificaram um fator hepático chamado Bc. Finalmente, em
1940, Snell descreveu um fator de crescimento obtido de folhas de espinafre, sendo designado como
ácido fólico, do latim folium (folhas). Ele identificou o ácido fólico como sendo a mesma vitamina
M e o fator Bc. A deficiência de ácido fólico é mais relatada em mulheres grávidas como fator de
prevenção de anemia megaloblástica, doenças cardiovasculares e defeitos da medula espinhal em
fetos, como espinha bífida e anencefalia. Em animais, as necessidades de folacina são preenchidas
pelos alimentos e pela síntese bacteriana intestinal. A folacina está amplamente distribuída nos
alimentos, especialmente nas carnes. Aves e suínos podem requerer suplementação de folacina em
determinadas condições, como em alimentos contendo sulfas ou grãos contaminados com fungos.
As células cancerosas, devido a seu rápido crescimento, têm maiores necessidades de folacina, fato
que motivou o uso de drogas inibidoras da síntese de folacina em terapia oncológica química
(metotrexate e 5-fluorouracila).
A estrutura da folacina tem 3 partes diferenciadas (Figura 23): um núcleo de pteridina, uma
molécula de ácido p-aminobenzoico (PABA) e uma molécula de glutamato. Nos alimentos naturais,
podem existir de um a nove resíduos de glutamato em sua estrutura. Na forma sintética, existe
apenas um resíduo. Depois de ser absorvido no intestino, o ácido fólico é reduzido a sua forma
ativa, o tetra-hidrofolato (THF ou H4folato) nos lisossomos, pela enzima H2folato-redutase. Na
circulação, a vitamina encontra-se como N5-metil-H4folato. Dentro das células, o H4folato aparece
na forma poliglutâmica, a qual é biologicamente mais potente, sendo, dessa forma, armazenado no
fígado. Os inibidores da ação de folacina, usados como drogas anticancerígenas, atuam bloqueando
a conversão do ácido fólico a H4folato ou bloqueando a transferência de unidades de carbono do
H4folato às moléculas aceptoras. Os requerimentos de folacina são desconhecidos para ruminantes
e equinos devido à síntese microbiana intestina. Nas demais espécies são da ordem de 0,2 a 1,3
ppm na dieta (MS), sendo maior em porcas gestantes. Em todas as espécies as necessidades de
folacina aumentam na lactação e na gestação.

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Figura 23. Estrutura do ácido fólico

Funções do ácido fólico

A forma ativa do ácido fólico é o ácido 5, 6, 7, 8-tetra-hidrofolato (Figura 24), o qual está
envolvido com a transferência de unidades de carbono em várias reações de síntese de lipídeos,
proteínas, ácidos nucleicos, hormônios e neurotransmissores.

Figura 24. Estrutura do tetra-hidrofolato


(THF ou H4folato)

As unidades de C podem ser grupos metila, metilene e formila. Uma importante reação é a
transferência de unidades simples de C da serina ao THF para formar 5-metilTHF. Este composto
fornece os grupos metila para a homocisteína, passo necessário para a síntese de metionina. Outras
transferências de grupos metila são essenciais na síntese de purinas e pirimidinas, na formação de
ácidos nucleicos, ressaltando a importância da folacina na reprodução e multiplicação celular, efeito

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que é mais notório em tecidos de rápido crescimento. O THF também participa na interconversão
de serina e glicina, na degradação de histidina e na síntese de grupos metila para compostos como
metionina, colina e timina. A atividade desta vitamina é necessária na hematopoiese, na
manutenção do sistema imune e na função exócrina do pâncreas. A vitamina B12 está estreitamente
ligada à ação da folacina, pois regula a proporção de grupos metila a serem transferidos pelo THF
e também é necessária para o transporte de metil-THF através das membranas.

Deficiência de ácido fólico

Uma dieta sem folato pode causar uma deficiência em poucas semanas. O principal resultado
da deficiência de ácido fólico é a anemia megaloblástica (macrocítica) e leucopenia, causadas pela
diminuição na síntese de purinas e pirimidinas, que leva a uma incapacidade das células sanguíneas
precursoras em produzir DNA e, portanto, se dividir.
Os tecidos mais afetados na deficiência de ácido fólico são aqueles de rápida taxa de
crescimento ou regeneração, como epitélio gastrointestinal, epiderme e medula óssea. Nos
ruminantes, as bactérias ruminais preenchem as necessidades de folacina. Porém, animais jovens
podem sofrer deficiências, as quais se manifestam por leucopenia, com predisposição a sofrer
infecções que podem causar diarreia, pneumonia e morte. Em porcas gestantes com deficiência de
folacina ocorre mortalidade embrionária ou diminuição da leitegada. As aves são talvez a espécie
que sofre mais com dietas deficientes de folacina. Nesses casos ocorre uma severa anemia
megaloblástica, baixo crescimento e eficiência alimentar, além de problemas na plumagem, a qual
sofre descoloração, baixa produção de ovos e eclodibilidade e até perose. Em humanos, a
deficiência de folacina é a deficiência vitamínica mais comum, estando muito associada a condições
de pobreza e má nutrição.

Toxicidade

A folacina é considerada uma vitamina não tóxica.

53
Cianocobalamina (vitamina B12)

A vitamina B12 foi a última vitamina a ser descoberta em 1948 por Rickes e colaboradores,
e possui algumas características que a fazem única entre as demais vitaminas: é a mais potente das
vitaminas com baixas quantidades requeridas, é sintetizada somente por micro-organismos, de
forma que não se encontra nos vegetais, e tem na sua estrutura um núcleo de cobalto (Co). Os
animais obtêm a vitamina pré-formada, a partir de sua flora bacteriana natural ou pela ingestão de
alimentos derivados de outros animais. A cianocobalamina está presente em quantidades
apreciáveis no fígado, no leite, em ovos, camarões frescos, carne de porco e de galinha. A história
da cianocobalamina se remonta a início do século 19, quando Combe descreveu uma anemia fatal
em humanos, que foi chamada de anemia perniciosa. Vários pesquisadores procuravam um fator
hepático que fosse efetivo no tratamento da anemia perniciosa, que inicialmente foi confundido
com o ferro. Em 1929, Castle postulou que a anemia perniciosa era devida a uma interação entre
um fator extrínseco (na dieta) e um fator intrínseco (no suco gástrico). Após a descoberta da
vitamina B12 por Rickes, foi elucidada a sua complicada estrutura em 1956 e em 1961 foi relatada
a forma coenzimática da vitamina (coenzima B12) por Lenhert e Hodgkin. Esta última pesquisadora
recebeu o prêmio Nobel pela elucidação da estrutura da vitamina B12 mediante cristalografia de
raios X.

Figura 25. Estruturas da vitamina B12 e da coenzima B12

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A estrutura da vitamina B12 lembra a da porfirina, com 4 núcleos pirrólicos unidos entre si
com átomos de N em cada núcleo coordenados a um átomo de Co (Figura 25). A estrutura básica
tetrapirrólica aqui recebe o nome de núcleo de corrina, acoplada em baixo com um nucleotídeo e
em cima com um cianeto (CN), o que lhe dá o nome de cianocobalamina. A forma ativa da vitamina
B12 é a coenzima B12, que pode estar em duas formas: a cobamamida ou adenosilcobalamina, na
qual o CN é substituído pela 5’-desoxiadenosina e a metilcobalamina, na qual o CN é substituído
por um grupo metila.
A vitamina B12 precisa de compostos que se unem a ela para poder ser absorvida no intestino.
Inicialmente, no estômago, por efeito do baixo pH e as peptidases, a B12 é liberada e posteriormente
ligada a um fator não intrínseco, secretado pela saliva, conhecido como cobalofilina. Dessa forma
ingressa no intestino, onde o meio alcalino e as proteases pancreáticas liberam a B12 da cobalofilina
para se unir a um fator intrínseco. Insuficiência pancreática pode causar baixa absorção e
deficiência de B12. O fator intrínseco é uma glicoproteína secretada pelas células parietais do
estômago e a ligação da vitamina B12 a este fator é indispensável para a sua absorção no íleo. Depois
de absorvida, a vitamina B12 é transportada pelo sistema portal por outras proteínas conhecidas
como transcobalaminas, das quais foram identificados os tipos I, II e III. De forma sucinta, para a
correta absorção de vitamina B12 são necessários os seguintes requisitos: adequada quantidade de
vitamina B12 na dieta, normal função gástrica para liberar a vitamina B12 das proteínas da dieta,
normal produção de cobalofilina na saliva, normal produção de fator intrínseco no estômago,
normal função pancreática para liberar a vitamina B12 do fator intrínseco e normal função absortiva
do íleo (receptores). Nos ruminantes, a produção de vitamina B12 é garantida pelas bactérias
ruminais, desde que tenham fonte de Co. Apenas 3% do Co da dieta é convertido em vitamina B12
no rúmen, e do total desta vitamina produzida, apenas 1 a 3% é absorvida no íleo, mas é quantidade
suficiente para as necessidades do animal. O principal órgão de armazenamento da vitamina B12 é
o fígado, onde também é realizada a transformação para as formas ativas coenzimáticas.
Os requerimentos da vitamina B12 são muito baixos (da ordem de ppb na dieta), o que a faz
a mais potente vitamina. Em geral, os requerimentos em animais monogástricos rondam os 9 a 26
ppb na dieta (MS), sendo maiores em cão e gato e menores nas aves. Nos ruminantes, é essencial a
disponibilidade de Co no alimento. Concentrações de Co no solo menores de 2 ppm são
consideradas deficitárias para ruminantes. Devem-se considerar situações de alta pluviosidade e
rápido crescimento das plantas como fatores que podem diluir a quantidade de Co nas plantas e
chegar a ser deficitário para os animais. Sabe-se também que o Co é necessário para as bactérias
fixadoras de N nas raízes das leguminosas.

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Funções da vitamina B12

A vitamina B12 atua, na sua forma coenzimática, no metabolismo de aminoácidos, proteínas,


ácidos nucleicos, ácidos graxos e glicídeos. Nos animais, a coenzima B12 é necessária para a
atividade de três enzimas: metilmalonil-CoA mutase e leucina mutase (na forma de
adenosilcobalamina) e metionina sintetase (na forma de metilcobalamina). Nos animais
ruminantes, a reação da metilmalonil-CoA mutase é indispensável para a conversão do propionato
(proveniente da fermentação de glicídeos no rúmen) até succinil-CoA, como fonte de glicose (rota
de gliconeogênese, Figura 26).

Figura 26. Via de utilização do propionato para dar succinil-CoA


A reação 4 corresponde à metilmalonil-CoA mutase, enzima que
requer a coenzima B12

Animais ruminantes com deficiência de Co e, portanto, de vitamina B12, sofrem de


hipoglicemia e desencadeiam sinais de anorexia, enfraquecimento e baixo desempenho. Nesses
casos, a aplicação parenteral de vitamina B12 melhora o apetite em poucas horas e o fornecimento
de Co via oral leva a melhora em 7 a 10 dias. Esta reação também cobra importância na degradação
de alguns aminoácidos e na utilização de ácidos graxos com número ímpar de átomos de carbono.
Na deficiência de vitamina B12, ácidos graxos anormais acumulam-se e são incorporados nas

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membranas celulares, incluindo as do sistema nervoso. Isso pode contribuir para algumas
manifestações neurológicas da deficiência da vitamina B12. Os efeitos da deficiência de cobalamina
são mais pronunciados em células que se dividem rapidamente, tais como o tecido eritropoiético
da medula óssea e as células da mucosa intestinal. Esses tecidos necessitam das formas N5-N10-
metileno e N10-formil do tetra-hidrofolato (THF) para a síntese de nucleotídeos, necessários para a
replicação do DNA. Na deficiência da vitamina B12, a forma N5-metil-THF não é usada
eficientemente. Uma vez que a forma metilada não pode ser convertida diretamente em outras
formas de THF, a forma N5-metil acumula, enquanto os níveis das demais formas diminuem.
Assim, pode ocorrer uma deficiência de formas de THF necessárias para a síntese de purinas e de
timina, resultando em sinais de anemia megaloblástica (anemia perniciosa), sinal característico em
humanos, mas não em animais. O derivado metil da coenzima B12 é requerido na conversão de
homocisteína em metionina. Outra função importante da vitamina B12 é na manutenção dos grupos
sulfidrilo (-SH) do glutation na forma reduzida.

Deficiência da vitamina B12

Nos animais, diferentes dos humanos, não são encontrados os sinais mais importantes da
deficiência de vitamina B12 como são anemia megaloblástica (anemia perniciosa) e lesões
neurológicas, muito embora possa ser observada uma anemia moderada em suínos e ruminantes.
Os sinais neurológicos na deficiência de B12 ocorrem por deficiência de derivados de H4folato,
necessários para a síntese de purinas e dTMP (e, portanto, DNA). A deterioração neurológica deve-
se à desmielinização progressiva do tecido nervoso. Na deficiência de B12 ocorre interferência com
a formação da mielina devido ao acúmulo de metil-malonil, o qual é inibidor competitivo do
malonil-CoA, interferindo, portanto, na síntese de esfingomielina. Em humanos, a deficiência de
vitamina B12 está relacionada à deficiência de fator intrínseco ou a dietas estritamente vegetarianas.
Nos ruminantes, a deficiência de Co é determinante em casos de deficiência de vitamina B12,
situação conhecida como marasmo enzoótico, caracterizado por anorexia, pelo áspero,
engrossamento da pele, anemia, emaciação e, eventualmente, morte, caso não haja tratamento ou
mudança de alimentação. A deficiência de Co tem sido associada a fotossensibilização em
cordeiros, situação caracterizada por cabeça inchada, que responde a tratamento parenteral com
vitamina B12. Em ocasiões, a deficiência de Co pode levar a cetose e fígado gorduroso por causa da
extrema deficiência de energia, uma vez que está bloqueada a via gliconeogênica a partir de
propionato ruminal. Em suínos, a deficiência de vitamina B12 leva a anorexia, perda dramática do
crescimento e anemia tipicamente microcítica embora moderada. Também pode aparecer pelo

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áspero, vômito e diarreia, bem como sinais neurológicos, como excitabilidade, incoordenação e
vocalização. Em fêmeas, a deficiência se manifesta por reprodução alterada, principalmente falhas
no estro, aborto, diminuição de leitegadas e mortalidade neonatal. Em aves, a deficiência de B12
reduz crescimento e consumo de alimento e piora a conversão alimentar. Também pode haver sinais
nervosos e plumagem defeituosa. Perose pode ocorrer de forma secundária devido à falta de colina
ou metionina como fontes de grupos metila. Outros sinais encontrados incluem anemia, erosão de
moela e infiltração de gordura no coração, fígado e rins. Em poedeiras, a eclodibilidade se vê
seriamente reduzida. Em cães e gatos, a deficiência de B12 se manifesta principalmente por anemia
não regenerativa, baixo crescimento, emaciação, letargia, reprodução comprometida e, em gatos,
também se observa alta excreção de ácido metilmalónico. Em cavalos não se relata deficiência de
vitamina B12 devido a sua síntese pelas bactérias intestinais e sua posterior absorção.

Toxicidade

A suplementação de vitamina B12 não representa risco, mesmo em quantidades elevadas. Em


ruminantes, a necessidade é de Co mais do que vitamina B12, devido ao processo de síntese desta
vitamina pelas bactérias do rúmen. Nesses animais pode existir necessidade de suplementação com
Co, o qual não pode exceder 5 ppm na dieta. A toxicose de Co produz policitemia moderada,
respiração dificultosa e excessiva defecação, micção e salivação.

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Colina

Embora a colina não preencha as condições totais de uma vitamina (nutriente essencial
requerido em pequenas quantidades que deve ser obtido na dieta) tem sido classificada como
vitamina do complexo B. Pode ser sintetizada pelo fígado e é requerida em grandes quantidades,
uma vez que faz parte da estrutura da maior parte dos fosfolipídeos (> 50%) das membranas animais
e do neurotransmissor acetilcolina. Não é requerida como coenzima. A colina foi isolada por
Streker, em 1849, na bile de porcos a partir da lecitina (fosfatidil-colina). Mais tarde, em 1867, foi
estabelecida a sua estrutura química por Bayer e em 1929 foi determinado o seu papel essencial na
formação da acetilcolina. Na década de 1920 foi observado o potencial da colina na prevenção de
lipidose hepática em cães, com privação de insulina, atribuindo desde então sua característica como
“fator lipotrópico”. A colina é uma amônia ligada a 3 grupos metila que lhe conferem sua
capacidade como doadora de grupos metila, além de estar unida a um grupo hidroxietila. A
acetilcolina é um ácido acético com ligação éster de colina e a lecitina é um fosfoglicerídeo com
uma colina ligada no C3 (Figura 27).

Figura 27. Estruturas da colina, acetilcolina e lecitina


(fosfatidilcolina). R1 e R2 representam ácidos graxos

Embora a colina possa ser sintetizada nos tecidos animais, principalmente no fígado, pode
não haver quantidades suficientes às necessidades do organismo quando seus precursores e/ou
mediadores (metionina, vitamina B12 e folacina) estão deficitários. A colina é sintetizada como

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lecitina nos tecidos pela metilação sequencial da fosfatidil-etanolamina, com participação de uma
N-metiltransferase e com S-adenosilmetionina como doador de grupos metila. A colina pode ser
obtida na dieta a partir do consumo de fosfolipídeos que a contenham. Os requerimentos são bem
maiores do que a maioria das vitaminas, estando em torno de 2.000 ppm na dieta. A colina está
presente em todos os tecidos como componente dos fosfolipídeos de membrana e sua liberação nas
células ocorre por ação da fosfolipase C, que quebra a lecitina para render diacilglicerol e
fosfocolina. Apenas uma pequena quantidade da colina é acetilada com acetil-CoA para produzir
acetilcolina, por ação da enzima colina-acetiltransferase, presente em terminações nervosas
colinérgicas. A acetilcolina deve ser hidrolizada de novo, após o estímulo nervoso, mediante a
enzima acetilcolinesterase.

Funções da colina

A colina participa das seguintes funções: (1) na forma de lecitina faz parte da estrutura das
membranas celulares e das lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL), que transportam
triglicerídeos no sangue, além de ser fator essencial no amadurecimento da cartilagem óssea; (2) é
um “fator lipotrópico” evitando a esteatose hepática mediante a promoção do transporte de ácidos
graxos na forma de lecitina ou a utilização dos ácidos graxos no próprio fígado; (3) é precursora da
acetilcolina, neurotransmissor do sistema nervoso parassimpático; e (4) é fonte de grupos metila
participando da síntese de metionina e creatina. O envolvimento das vitaminas folacina e B12, bem
como da metionina, no metabolismo dos grupos metila, faz com que estas substâncias possam
substituir parcialmente as necessidades de colina. Esta última função (doador de grupos metila)
constitui o principal fator que determina a patologia em casos de deficiência de colina. Para ser
fonte de grupos metila, a colina é convertida em betaína (composto produzido por oxidação da
colina).

Deficiência de colina

Os principais sinais de deficiência de colina incluem baixo crescimento, lipidose hepática,


perose em aves, hemorragia no rim e nas articulações e hipertensão. A severidade dos sinais clínicos
está influenciada por outros nutrientes como metionina, vitamina B12, folacina e gordura. Os
ruminantes obtêm grande parte das necessidades de colina a partir da sua síntese pelas bactérias
ruminais, mas em ocasiões de alta exigência metabólica (altas taxas de crescimento em gado de
corte, alta produção em vacas leiteiras) a quantidade de colina pode não ser suficiente, sendo

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recomendado suplementar com até 750 ppm de colina na dieta. Em vacas leiteiras de alta produção
é comum a suplementação de colina como preventivo de lipidose hepática, embora tenha pouco ou
nenhum efeito sobre a produção ou sobre o percentual de gordura no leite. Em suínos, a deficiência
de colina produz leitões de conformação alterada (pernas curtas e barrigudos), incoordenação de
movimentos, lipidose hepática, oclusão renal e, em recém-nascidos, uma condição de pernas
estendidas que pode ser prevenida com suplementação de colina nas fêmeas gestantes. Esta última
condição aumenta quando é reduzida a quantidade de alimento fornecido às porcas gestantes (de
3,2 a 1,5 kg/dia), o que resulta em menor consumo de colina e metionina. A deficiência de colina
também se manifesta nas porcas por baixa taxa de concepção e diminuição da leitegada. Em aves
jovens (frangos e perus), a deficiência de colina causa retardo no crescimento e perose,
provavelmente em função do papel da colina no processo de maturação da cartilagem óssea. Em
galinhas poedeiras, a suplementação de colina previne a esteatose hepática. Em cavalos não se
conhecem evidências de deficiência de colina.

Toxicidade

Intoxicação experimental com colina pode resultar em sinais clínicos como salivação,
tremores, puxadas musculares, cianose, convulsões e paralise respiratória. Fornecimento de colina
em quantidades que dobrem os requerimentos diários (2.000 ppm) não tem maiores efeitos em
suínos, porém pode causar efeitos em frangos, tais como menor crescimento e piora na eficiência
alimentar.

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Ácido ascórbico (vitamina C)

A história da vitamina C se confunde com a história do escorbuto, uma doença em humanos


caracterizada por sinais clínicos de gengivite hemorrágica e perda de dentes, sendo potencialmente
fatal por causa de múltiplas hemorragias. O escorbuto foi descrito desde tempos ancestrais, sendo
relatadas epidemias quando havia carência de frutas frescas, principalmente de frutas cítricas. Em
1747, James Lind, médico da Marinha Britânica relacionou o escorbuto, que acometia os
marinheiros em viagens prolongadas, com a deficiência de frutas frescas e estabeleceu a rotina de
fornecer limões aos soldados. Em 1907, Holst e Frolich descobriram que o porquinho-da-índia
(cobaia) podia sofrer de escorbuto, proporcionando assim um animal experimental para o estudo
da deficiência de vitamina C. Em 1928, Szent-Györgyi isolou um fator antiescorbuto em várias
frutas, denominando-o ácido hexurônico, um derivado da glicose. Inicialmente, devido aos altos
requerimentos comparado com outras vitaminas, o ácido ascórbico não foi considerado como
vitamina, mas em 1933, o ácido hexurônico foi sintetizado por Richstein e estabelecida sua
atividade como fator antiescorbuto, designado-o como vitamina C.
A vitamina C é um composto hidrossolúvel e termolábil, que pode ser sintetizado pelas
plantas e pelos tecidos da maioria das espécies animais, com exceção de primatas, cobaia, peixes,
morcegos frutívoros, insetos e algumas aves. Essas espécies têm deficiência da enzima
gulonolactona oxidase, que converte L-gulonolactona em 2-ceto-gulonato, composto que se
transforma por isomerização espontânea em ácido L-ascórbico. A forma ativa da vitamina C é o
ácido ascórbico (Figura 28) que pode estar na forma reduzida ou oxidada (ácido dehidroascórbico).

Figura 28. Estrutura do ácido ascórbico (formas oxidada e reduzida)

A forma oxidada pode sofrer outra oxidação, se convertendo na forma inativa, denominada
ácido dicetogulônico, evento que pode ser acelerado pela luz e calor. Este fato faz da vitamina C a

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mais instável das vitaminas. Os animais domésticos não têm requerimentos nutricionais de vitamina
C, pois podem sintetizar as quantidades necessárias, existindo requerimentos apenas naquelas
espécies com deficiência da enzima gulonolactona oxidase.

Funções da vitamina C

Apesar de a vitamina C não ter forma coenzimática conhecida, ela participa em diversas
reações. Um papel muito bem documentado é seu envolvimento na síntese de colágeno, proteína
fibrosa componente da pele e do tecido conectivo. A vitamina C participa das reações de
hidroxilação da lisina e da prolina, para produzir hidroxi-lisina e hidroxi-prolina, as quais são
necessárias na síntese do colágeno, sendo essencial tanto para a manutenção normal do tecido
conectivo, como para recompor tecidos danificados. Dessa forma, a vitamina C participa na
cicatrização de feridas e fraturas e no controle de sangramentos gengivais. O requerimento da
vitamina C nesses processos tem a ver com um efeito protetor da hidroxilase, através da oxido-
redução de núcleos de Fe e grupos tiol presentes na enzima. A vitamina C mantém o estado ferroso
(Fe2+) do Fe ligado à enzima, e mantém os grupos tiol no seu estado reduzido (-SH).
Adicionalmente, a vitamina C facilita a absorção do Fe da dieta no intestino.
O ácido ascórbico tem a capacidade de ceder e receber elétrons, o que lhe confere um papel
essencial como antioxidante, estabilizando as células mediante a proteção dos lipídeos das
membranas, evitando sua peroxidação pelos radicais livres. Assim, o ácido ascórbico torna-se
essencial na resposta imune do organismo. Os principais mecanismos contra o dano dos radicais
livres envolvem, além da vitamina C, o β-caroteno (vitamina A) e a vitamina E, como as principais
vitaminas antioxidantes, além das metaloenzimas glutation peroxidase (Se), catalase (Fe) e
superóxido dismutase (Cu, Zn, Mn). A vitamina C também tem efeito estimulador da atividade
fagocítica dos leucócitos, da função do sistema retículo-endotelial, da formação de anticorpos e da
produção de interferon, contribuindo assim na defesa contra as infecções. Por outra parte, a
vitamina C reduz a quantidade de glicocorticoides circulantes, os quais têm efeito supressor sobre
a função dos neutrófilos, e tem efeito poupador da vitamina E mediante a regeneração da forma
reduzida do α-tocoferol.

Deficiência de vitamina C

Em termos práticos, os animais domésticos não sofrem de deficiência de vitamina C, uma


vez que a sintetizam a partir da glicose no fígado e no rim. Entretanto, em situações de dietas

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desbalanceadas, transtornos metabólicos, ou em deficiência de vitaminas A e/ou E, pode haver
sinais de deficiência de vitamina C, que incluem escorbuto, principalmente em ruminantes jovens
sob condições estressantes (frio, umidade, baixo consumo de colostro). Nestes animais, a síntese
de vitamina C começa a funcionar a partir das 2 a 3 semanas de vida, tendo os níveis adultos até os
3 meses de idade. Os ruminantes são a espécie que mais poderia sofrer de deficiência de vitamina
C, em comparação com os monogástricos, porque não tem acesso a fonte exógena, uma vez que o
ácido ascórbico da dieta é destruído pela flora ruminal. Em suínos recém-desmamados, sob
condições ambientais adversas, pode ocorrer deficiência de vitamina C, principalmente se existe
um balanço energético negativo. Nesses casos, podem se observar sinais como fraqueza, dor óssea
e hemorragias cutânea e muscular. Situação similar pode ser observada em pintinhos recém-
nascidos, principalmente se há condições de manejo estressantes, tais como frio ou calor excessivo,
subnutrição, vacinações e presença de doenças como a coccidiose. Nessas condições, a
suplementação de vitamina C (150 ppm na dieta) melhora o desempenho dos frangos. Em galinhas
poedeiras, recebendo 100 ppm de vitamina C pode haver melhoria na vida de postura, na qualidade
da casca e na produção de ovos. Suplementos de 200 ppm de vitamina C em frangos sob condições
de estresse por calor podem melhorar as respostas de ganho de peso e conversão alimentar.
O porquinho-da-índia, espécie que não pode sintetizar vitamina C, pode manifestar a
deficiência em anorexia, perda de peso, anemia e hemorragias dispersas. A típica deficiência de
vitamina C resulta em humanos no escorbuto, uma doença caracterizada por gengivas doloridas e
esponjosas, dentes frouxos, fragilidade dos vasos sanguíneos, edemas nas articulações e anemia. A
maioria dos sinais pode ser explicada por uma deficiência na síntese do colágeno, resultando em
tecido conectivo defeituoso.

Toxicidade

Em geral, altas doses de vitamina C são bem toleradas, tendo se relatado efeitos tóxicos em
megadoses, que incluem acidose, problemas gastrointestinais e glicosúria. Como a vitamina C
melhora a absorção intestinal de Fe, pode ocorrer acúmulo de Fe (hemocromatose), que afeta a
função hepática.

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Carnitina

Para a maioria das espécies animais, a carnitina não é considerada uma vitamina, uma vez
que pode ser sintetizada pelo próprio organismo. Porém, em circunstâncias em que a síntese está
diminuída devido à falta dos seus aminoácidos precursores (metionina e lisina) pode haver
situações deficitárias. A carnitina é essencial em alguns insetos, como o bicho-da-farinha (Tenebrio
molitor) e a mosca das frutas (Drosophila melanogaster), nas quais constitui uma verdadeira
vitamina. A carnitina foi isolada de extratos de carne e identificada em 1905. Fraenkel estudou os
requerimentos nutricionais do bicho-da-farinha, o qual é utilizado em alimentação animal, e propôs
o reconhecimento de uma vitamina do complexo B, a qual foi identificada como carnitina em 1932.
A carnitina é uma amina quaternária (β-hidroxi-γ-trimetilaminobutirato), similar à colina, bastante
solúvel em água, que pode estar na forma livre (Figura 29) ou como éster.

Figura 29. Estrutura da carnitina


(β-hidroxi-γ-trimetilaminobutirato)

A carnitina é sintetizada no fígado e no rim a partir de dois aminoácidos precursores,


metionina e lisina, tendo ainda como cofatores o ácido ascórbico, a nicotinamida, a piridoxina e o
Fe. É armazenada no tecido muscular e excretada pelo rim, o qual reabsorve quase 90% do total
excretado, tendo, portanto, um alto grau de conservação. Não existem requerimentos nutricionais
da carnitina nos animais, uma vez que quantidades adequadas são sintetizadas pelo organismo em
situação normal.

Funções da carnitina

A carnitina participa do transporte dos ácidos graxos de cadeia longa desde o citoplasma até
o interior da mitocôndria, onde sofrem β-oxidação. Os ácidos graxos esterificados com a coenzima
A (grupos acil-CoA) não podem atravessar a membrana da mitocôndria e devem ser transferidos à

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carnitina, no citoplasma, por ação da enzima carnitina-acil transferase I, transformando-os em
grupos acil-carnitina, que entram na matriz mitocondrial, onde são retransferidos à coenzima A
mediante a enzima carnitina-acil transferase II. Dessa forma, os ácidos graxos (como grupos acil-
CoA) são oxidados dentro da mitocôndria para a geração de ATP. Portanto, o papel da carnitina é
considerado essencial para a utilização desses substratos energéticos. A carnitina também serve de
agente protetor das células contra o efeito tóxico de um possível acúmulo de compostos acil-CoA,
captando os grupos acila como ésteres de carnitina, os quais são depois transportados ao fígado
para serem catabolizados ou ao rim para serem excretados. Também são atribuídas funções à
carnitina em processos como lipólise, cetogênese e detoxificação de amônio.

Deficiência de carnitina

O principal evento que ocorre na deficiência de carnitina é a falha na oxidação dos ácidos
graxos, o que ocasiona um desvio desses compostos para a síntese de triglicerídeos, particularmente
no fígado, podendo levar a uma esteatose hepática. Além do balanço negativo de energia que a falta
de utilização de ácidos graxos pode ocasionar, quantidades acumuladas de grupos acil-CoA afetam
o ciclo de Krebs, a gliconeogênese e o ciclo da ureia, incrementado o déficit de energia e levando
a sinais clínicos que incluem encefalopatia e icterícia. Em ruminantes e outros animais, o uso de
carnitina é recomendado em casos de intoxicação por amônia por estimular a síntese de ureia e
consequentemente a incorporação de amônia. Estudos na patogenia da cetose das vacas e da
toxemia da gestação de ovelhas e cabras, têm levado à hipótese de uma desrepressão que sofreria a
enzima carnitina-acil transferase I, o que permitiria a entrada descontrolada de ácidos graxos ao
interior da mitocôndria e a geração excessiva de corpos cetônicos. Em outras espécies, como suínos,
a suplementação de carnitina produziu melhora no ganho de peso e diminuição de gordura na
carcaça. Em certas famílias de cães com cardiomiopatia dilatada têm sido encontrados baixos
valores de carnitina no miocárdio.

Toxicidade

Em animais não existem estudos que mostrem a tolerância máxima de carnitina. Apenas em
humanos foi relatada diarreia em casos de suplementação bem acima das quantidades consumidas
na dieta normal. O isômero D-carnitina interfere com a função normal do isômero L-carnitina, que
é o composto natural.

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