BOAHEN, A. A. e GUEYE, M. Iniciativas e resistência africanas na Africa ocidental, 1880-1914.
HGA, v. 7, Cap. 6. pp. 129-166.
Processo de colonização em duas partes.
A forma das resistencia se dava tanto pelas atividades europeias, que se alteram durante o tempo e local, tanto pelas condições locais (natureza da sociedade [centralizada? Autônoma? Dependente de outra economia Africana? Estagnada ou em declínio?]; natureza da autoridade e os “grau de penetração da influência política, religiosa e econômica dos europeus na década de 1870 e as lições que ela daí retirou.”;
1) 1880 até os primeiros anos do séc. XX:
Diplomacia e/ou invasão militar;
Corrida dos tratados (Africa ocidental) seguido por invasões e ocupações de exércitos; Ex.: “campanhas francesas no Sudão ocidental, na Costa do Marfim e no Daomé (atual Benin), entre 1880 e 1898, bem como as dos britânicos no Ashanti (atual Gana), na região do delta do Níger (Nigéria) e no norte da Nigéria, entre 1895 e 1903;” Objetivo dos Africanos: “salvaguardar a independência e seu estilo tradicional de vida [...] três soluções: o confronto, a aliança ou a aceitação e a submissão.” Interesse Frances (1880 ~): Senegal, Níger, Chade; Conquista militar (marinha, posteriormente administradores do Senegal [1881]); Resistencia: “dirigentes preferiram a estrategia da resistencia ativa a submissao e a aliança”. A islamização da região foi fator de maior resistência violenta da região; o Lat-dior (Damel): inicialmente tinha relações diplomáticas com a administração francesa (1871). Contudo, em 1881, com a construção de uma estrada ferroviária, Lat Dior se coloca contra, lançando de alianças com Ely, emir de Trarza, a Abdul Bokar Kan, de Futa Toro, e a Albury Ndiaye, de Jolof. Era uma “santa aliança” para expulsar os Franceses. Posteriormene com a insistência do governador, proibiu o cultivo do amendoim. Foi deposto e posteriormente, com o fim do Damel e divisão do Cayor, Lat-Dior juntou alguns poucos fieis a ele a atacou os Franceses. Após sua morte na batalha (1886), Cayor perdeu sua independência; o Imperio Tukulor: Ahmadu, filho e sucessor de Al Hadj Umar, fundador do imperio Tukulor, estava decidido a defender a soberania através de alianças e confronto militar. Contudo, apoiava-se mais na aliança do que na resistência. Teve que lutar contra seus irmãos (resolvido com acordos), seus súditos (acabou com as rebeliões) e os Franceses durante o seu reinado. Sem a força de seu pai, priorizou a estabilização de sua posição. Por precisar de armas, mantinha acordos amigáveis com os Franceses. “deles. Em face destes problemas de politica interna, ainda surpreende que ele tenha aceito, pouco após a sua elevacao ao poder, negociar com os franceses? Essas negociacoes decorreram entre Ahmadu e o tenente Mage, representante da Franca. Convencionou- se que, em troca do fornecimento de canhoes e do reconhecimento da sua autoridade, Ahmadu autorizaria os comerciantes franceses a operar no seu império. Embora este tratado nao tenha sido ratificado pelo governo frances, Ahmadu nao tenha recebido nenhum canhao e os franceses nao tenham cessado de ajudar os rebeldes (chegando ate a atacar Sabusire, fortaleza tukulor de Kuasso, em 1878), Ahmadu nao deixou de manter uma atitude amistosa com os franceses. Isso lhe foi muito util, pois assim conseguiu sufocar as tentativas de rebeliao dos irmãos em 1874, bem como as dos territorios de Segu e Kaarta no final da decada de 1870. Por isso, concordou prontamente quando os franceses, que precisavam da sua cooperacao para preparar a conquista da regiao situada entre o Senegal e o Niger, solicitaram a reabertura de negociacoes, em 1880. Essas negociacoes,conduzidas pelo capitao Gallieni, redundaram no tratado de Mango, pelo qualAhmadu se comprometia a autorizar os franceses a construir e a manter vias comerciais no seu imperio e lhes deferia o privilegio de construir e fazer circular embarcacoes a vapor no Niger. Em troca, os franceses reconheciam a existência do seu imperio como Estado soberano, concediam-lhe liberdade de acesso aFuta, comprometiam-se a nao invadir o seu territorio nem a levantar qualquer fortificacao. Acima de tudo, os franceses concordavam em pagar um tributo de quatro peças de artilharia de campanha e de mil fuzis, mais uma renda anual de 200 fuzis, 200 barris de polvora, 200 obuses de artilharia e 50 mil espoletas; Contudo não foi ratificado e os Franceses não o respeitaram e, em 1881, começaram a invadir. Ahmadu não ofereceu resistência, demonstrando a instabilidade dentro do seu império. Posteriormente, quando os franceses não mais precisavam dele, aumentou as hostilidades e ele partiu para a abordagem militar em 1890; o Samouri Touré: Optou, em sua maioria, pelo conflito armado invés da diplomacia. O imperio Mandinga ainda estava em Ascenção em 1882, o que lhe permitia um exercito bem equipado (equipamento europeus [1876] pela via da Serra leoa, mas sem peças de artilharia). Em 1885, sabendo da ameaça Francesa, que ocupara o Bure, ele resolve retira-los a força. Com auxilio de outros dois exércitos (brema, Masari Mamadi) ele conseguiu. Tentou uma abordagem diplomática pelos britânicos (transformar o pais em protetorado), com o intuito de forçar os franceses a respeitar sua soberania (falhou na manobra). Posteriormente, em 1886, assina com os franceses aceitando um protetorado, mas mantendo controle sobre seu pais. O autor acredita que pode ser que ele acreditava que os Franceses o ajudariam enfrentar Tieba, rei (faama) de Sikasso (1887). Em 1890, compra mais armas com os britânicos, modernizando seu exercito aos modelos europeus. De 1890 Archinard (frança) ataca Samouri Touré, o relembrando e incitando a contra atacar, o que se intensifica em 1892. A massiva derrota do confronto, neste ano, contra coronel Humbert, o fez perceber que não conseguiria enfrentar os europeus diretamente, por isso movimentou seu imperio para outro território, aplicando a extrategia de “terra arrasada” pelo caminho. Frustado nos anos seguintes, voltou para Libéria em 1898, do qual foi surpreendido e capturado. “Ao contrario dos franceses, cuja ocupacao na Africa ocidental, entre 1880 e 1900, foi resultado principalmente da forca, os britanicos nao hesitaram em recorrer igualmente a negociacao pacifica, concluindo tratados de protecao com os Estados africanos, por exemplo, no norte de Serra Leoa e da Costa do Ouro (atual Gana), bem como em diversos pontos do país Ioruba. Em outras areas, como no pais Ashanti, no territorio dos Ijebu na Iorubalandia, no delta do Niger e, particularmente, no norte da Nigeria, empregaram sobretudo a forca.”
2) Até a Primeira Guerra mundial (1914):
“diversos sistemas e métodos seriam empregados para administrar e sobretudo explorar as novas possessões [...]nomeados administradores de distrito e administradores itinerantes, promulgados novos códigos e novas leis, chefes confirmados ou depostos e outros designados, baixados impostos diretos e indiretos e exigido o trabalho forçado para a abertura de estradas e vias férreas.” Objetivo das resistências era o mesmo: “recuperar a independência e a soberania perdidas, o que implicava a plena rejeição da dominação colonial; procurar corrigir ou retificar certos abusos ou certos aspectos opressivos do colonialismo; procurar acomodar-se.” Formas de resistência: revoltas e rebeliões (método mais comum na África ocidental e redobradas de constância durante a primeira guerra), migrações, greves, boicotes, petições, envio de delegações e, finalmente, contestação ideológica; o Revoltas e rebeliões: Mamadou Lamine (alto Senegal), pelo viés da rebelião, e pela impossibilidade de confronto direto, empregou a estratégia de guerrilha; “A rebelião provocada pelo imposto de palhota, em 1898, foi uma reação dos Temne e dos Mende de Serra Leoa, diante do reforço do domínio britânico pela nomeação de administradores de distrito, pelo desenvolvimento da força armada, pela abolição do tráfico e da escravidão, pela promulgação da lei do protetorado de 1896, que habilitava as autoridades a dispor dos terrenos baldios e, finalmente, pela imposição no protetorado de uma taxa anual de cinco xelins sobra as habitações de duas peças e de 10 xelins sobre as de maiores dimensões [...] Qual era a exata natureza dessa revolta? O governador britânico de Serra Leoa, que foi inteiramente colhido de surpresa, atribuía a revolta – assim como a resistência geral ao colonialismo, então em plena expansão – “à crescente consciência política do africano, à confiança cada vez maior no seu valor e na sua autonomia”. o Migrações: “Um dos métodos mais generalizados consistia em emigrar em massa, em protesto contra a dureza do regime colonial; foi empregado principalmente nas colônias francesas, onde, incapazes de se sublevar, dada a presença de unidades militares aquarteladas nas partes controladas, os africanos preferiam fugir a sofrer medidas que eles julgavam opressivas e humilhantes. Foi assim que, entre 1882 e 1889, grande parte da população Peul dos subúrbios de Saint-Louis emigrou para o império de Ahmadu. Dos 30 mil Peul que a cidade contava em 1882, não restavam mais que 10 mil em 1889. Em 1916 e 1917, mais de 12 mil pessoas deixaram a Costa do Marfim pela Costa do Ouro. No decurso do mesmo período, também se deu importante emigração do Senegal para a Gâmbia, do Alto Volta para a Costa do Ouro e do Daomé para a Nigéria.” “Nas regiões costeiras e nos novos centros urbanos, onde vivia a elite instruída e onde começava a surgir uma classe operária, as reações pareciam menos violentas. Tratava-se de greves, boicotes, protestos ideológicos, artigos nos jornais e, sobretudo, envio de petições e de delegações aos administradores coloniais da localidade e do governo central, por diversos grupos e movimentos.” o Greves: “essencialmente utilizada após a Primeira Guerra Mundial, mas o período anterior já registra diversas.” o Protesto ideológico: “contestação ideológica surgiu neste período, principalmente no plano religioso: entre os cristãos, os muçulmanos e os adeptos da religião tradicional [...] os adeptos da religião tradicional, entre os Mossi do Alto Volta, os Lobi e os Bambara do Sudão francês, uniram-se para combater quer as religiões cristã e muçulmana quer a difusão da cultura francesa [...] Os cristãos africanos, principalmente os das colônias britânicas da África ocidental, também se revoltaram contra a dominação dos europeus nas igrejas e contra a imposição da cultura e da liturgia europeias. Daí resultaram cisões que trouxeram consigo a criação de igrejas messiânicas, milenaristas ou etíopes, dotadas de liturgias próprias e de dogmas de caráter nitidamente africano.” o Associações de elite: “Um pouco por toda parte, os africanos instruídos fundaram, sobretudo nos centros urbanos, numerosos clubes e associações, que lhes serviam de plataforma para protestar contra os abusos e as injustiças do colonialismo durante este período. Tais associações recorriam principalmente a meios como jornais, peças de teatro, folhetos e panfletos71. A título de exemplo de grupos que agiam como “comissões de vigilância do colonialismo”, citaremos a Aborigines Rights Protection Society (ARPS), formada na Costa do Ouro em 1897, o Clube dos Jovens Senegaleses, fundado em 1910, a Peoples Union e a Anti-Slavery and Aborigines Protection Society, criadas na Nigéria em 1908 e 1912, respectivamente. A mais ativa foi, de longe, a ARPS. Tinha sido criada para protestar contra o projeto de lei fundiária de 1896, que visava permitir o domínio da administração colonial sobre todas as terras pretensamente baldias ou desocupadas. Depois de enviar uma delegação a Londres, em 1898, à presença do secretário de Estado das Colônias, esse projeto de lei celerada foi retirado.” “Fica evidente, a partir do que vimos, que os povos da África ocidental mobilizaram todo um arsenal de estratégias e de táticas para combater, primeiro a instauração do regime colonial, depois – ante o malogro das primeiras tentativas – certas medidas ou instituições do sistema. Em conjunto, as diversas estratégias e medidas se revelaram inoperantes e, no final do período estudado, o colonialismo estava solidamente implantado em toda a África ocidental.“ As tentativas fracassaram se considerar os resultados imediatos. “Pouco importa, com efeito, que os exercitos africanos tenham sucumbido diante de inimigos mais bem equipados, se a causa pela qual os resistentes se imolaram resta viva no espirito de seus descendentes.” “os Estados da Africa ocidental nunca chegaram a estabelecer uma alianca organica, que obrigasse os inimigos a combater em várias frentes ao mesmo tempo.” Aula 10/04 – anotações Sei que os brancos querem me matar para tomar o meu país, e, ainda assim, você insiste em que eles me ajudarão a organizá-lo. Por mim, acho que meu país está muito bem como está. Não preciso deles. Sei o que falta e o que desejo: tenho meus próprios mercadores; considere-se feliz por não mandar cortar-lhe a cabeça. Parta agora mesmo e, principalmente, não volte nunca mais. (Declaração de Wogobo, o Moro Naba [rei dos Mossi] ao capitão Destenave, em 1895.)
Diferentes momentos de resistência: primaria (1800-1900); primaria retardada;
intermediaria (1920-1940); nacionalismos; 1800-1900 (paradoxo): Apesar da conquista ser irreversível, era altamente resistível. O que foi o caso. Mesmo derrotada é importante para entender o processo; Todo mundo resistiu, não somente os estados centradizados; “nem sempre os governantes eram defensores da soberania”: A uma defesa da soberania, resistências vindas de locais e grupos diferentes. Nem sempre quem resistiu era os dirigentes, ou quando era os dirigentes/chefes, nem sempre defenderam a soberania. Por vezes, eram tiranos que lutaram contra os europeus”; o “Os dirigentes nem sempre foram, de forma patente, “guardiães da soberania do povo”. Na África do século XIX – a oeste, a leste e no sul – haviam surgido novos Estados “baseados na tecnologia militar europeia”15. Esses Estados resistiram amiúde à extensão direta da potência invasora, mas a resistência era sabotada pela desafeição de boa parte dos súditos.” Resistências religiosas: está associada a uma lógica política, uma forma de legitimação religiosa. Quando a legitimação está em crise, é natural a religião entrar em cena para tentar redefinir a soberania, ao mesmo tempo que tentar explicar o que está acontecendo. Dai nasce um movimento profético e messiânico. Vira forma de argumentação que mobiliza a população em direção a uma resistência, mas em frente a uma derrota, o profetismo pode deu inicio também a uma acomodação controlada. Colonialismo é uma dominação global. Deseja dominar tudo, e é sustentado por uma desigualdade fundamental. Qualquer movimento de contestação a essa desigualdade, é por essência anticolonial e um movimento de resistência contra os europeus; Teoria da “solução final” (alemão); RANGER, T. O. Iniciativas e resistência africanas em face da partilha e da conquista. HGA, v. 7, Cap. 3. pp. 51-72. “Ocupação pelos europeus era claramente irreversível, também era altamente resistível. Irreversível por causa da revolução tecnológica – pela primeira vez, os brancos tinham uma vantagem decisiva nas armas, e, também pela primeira vez, as ferrovias, a telegrafia e o navio a vapor permitiam-lhes oferecer resposta ao problema das comunicações no interior da África e entre a África e a Europa. Resistível devido à força das populações africanas e porque na ocasião a Europa não empregou na batalha recursos muito abundantes nem em homens nem em tecnologia. De fato, os brancos compensavam a escassez de homens recrutando auxiliares africanos. Mas eles não eram manipuladores diabolicamente inteligentes de negros divididos e atrasados. Os europeus estavam apenas retomando o repertório das estratégias dos antigos impérios. Quanto a detalhes, muitas vezes sabiam menos das coisas que os dirigentes africanos. A implementação da estratégia de penetração foi muito desordenada e inábil. Os europeus enfrentaram uma enormidade de movimentos de resistência que provocaram e até inventaram por ignorância e medo. Tinham de “obter a vitória final”, e, uma vez obtida, trataram de pôr em ordem o conturbado processo [...] a vitória dos europeus não significa que a resistência africana não tenha tido importância no seu tempo ou que não mereça ser estudada agora [...] afirmou-se que a resistência africana era importante, já que provava que os africanos nunca se haviam resignado à “pacificação” europeia [...] sugeriu-se que, longe de ser desesperada ou ilógica, essa resistência era muitas vezes movida por ideologias racionais e inovadoras [...] argumentou-se que os movimentos de resistência não eram insignificantes; pelo contrário, tiveram consequências importantes em seu tempo, e têm, ainda hoje, notável ressonância [...]”; Foram fenômenos organizados; “povos politicamente não centralizados eram tão capazes como os politicamente centralizados de travar combate com determinação contra o avanço dos brancos [...]”; “o aspecto mais importante do impacto europeu foi a alienação da soberania [...] “[...] tática dupla: por um lado, atribuíram à revolta ideologias estritamente profanas; por outro, “sanearam” as ideologias religiosas [...] Quando um povo perde sua soberania, ficando submetido a outra cultura, perde pelo menos um pouco de sua autoconfiança e dignidade; perde o direito de se autogovernar, a liberdade de escolher o que mudar em sua própria cultura ou o que adotar ou rejeitar da outra cultura.” Não recusam as inovações, mas a submissão: “Estou vendo como os brancos penetram cada vez mais na África; em todas as partes do meu país as companhias estão em ação [...] É preciso que meu país também adote estas reformas, e estou plenamente disposto a propiciá-las [...] Também gostaria de ver boas estradas e boas ferrovias [...] Mas meus antepassados eram makombe e makombe quero continuar a ser.” (Hanga, Makombe Barué, Moçambique central em 1895)
“A ideia de soberania proporcionou evidentemente a base da ideologia da
resistência.”; “De fato, muitos historiadores têm salientado a importância de distinguir entre movimentos de resistência provocados pelo desejo de um grupo dirigente de conservar seu poder de exploração e movimentos de muito maior escala, frequentemente dirigidos contra o autoritarismo dos dirigentes africanos e contra a opressão colonial.” Papel das ideologias religiosas: “Descobriram que as doutrinas e os símbolos religiosos, regra geral, apoiavam-se diretamente nas questões da soberania e da legitimidade. A legitimidade dos dirigentes era consagrada por uma investidura ritual e, quando um dirigente e seu povo decidiam defender sua soberania, apoiavam-se muito naturalmente nos símbolos e conceitos religiosos.” A crise da soberania é também uma crise espiritual: Foi amiúde dessas crises de legitimidade que nasceram os grandes movimentos para tentar redefinir a soberania. De modo quase invariável, tais movimentos tinham, a seu favor, chefes espirituais para exprimir a mensagem de uma unidade mais ampla. Esse fenômeno ora se verificava no contexto do Islã – as ideologias islâmicas do milenarismo e da resistência espalharam-se pelo cinturão sudanês de leste a oeste –, ora derivava da influência das ideias cristãs [...] muitas e muitas vezes, o fenômeno se dava no contexto da religião africana.” “Inovações como a de Makana em matéria de conceitos e de símbolos sobreviveram por muito tempo ao respectivo movimento de resistência a que estavam associadas na origem. Longe de serem extravagâncias do desespero, esse gênero de mensagens proféticas constituía um esforço sistemático para ampliar e redefinir a ideia de deidade e sua relação com a ordem moral, implicando grandes alterações nos conceitos e nas relações internas dos Xhosa e oferecendo, ao mesmo tempo, “alicerce à ideologia da resistência” [...] inspiração profética, bem como chefes proféticos capazes de criar novas sínteses que revalidavam o antigo ao mesmo tempo que abriam caminho ao novo” [...] Tudo isso conta a favor da tese segundo a qual a oposição estava no centro dos movimentos proféticos. Um profeta emerge quando a opinião pública sente necessidade de uma ação radical e inovadora, mas não são apenas as ameaças externas que despertam esse sentimento popular. Um profeta pode surgir em razão de profundas angústias causadas por tensões ou transformações internas, ou pelo desejo geral de acelerar o ritmo da mudança e de aproveitar novas oportunidades.”; “Na perspectiva da história da religião africana, esses movimentos apresentam interesse justamente na medida em que oferecem resposta às angústias íntimas das sociedades africanas”; “Do ponto de vista da soberania, pode-se afirmar que eles anteciparam sua reconquista e o triunfo do nacionalismo africano. Na medida em que são depositários de ideologias proféticas, pode-se considerar que tenham contribuído para novos grupamentos em torno de ideias. Alguns trouxeram consigo a melhora da situação dos povos revoltados. Outros instituíram lideranças alternativas às oficialmente reconhecidas.” “Acadêmicos, estéreis ou não, contestaram, no entanto, a postulada conexão entre os movimentos de resistência e a subsequente luta em prol da liberdade. As refutações provêm tanto da “direita” como da “esquerda”.” o Direita: “houve durante séculos na África um conflito entre adaptação e resistência às ideias transmitidas do exterior. Os partidários da adaptação criaram os grandes impérios sudaneses, e os da resistência procuraram repudiá-los. Os primeiros aplicavam os princípios liberais do Islã e do cristianismo, os segundos apoiavam-se no que Brunschwig chama de “animismo” e “etnicidade”. [...] manifestações da tendência ao centralismo da inovação e à adoção de grandes projetos, o que significa que pertencem a uma tradição diametralmente oposta à da resistência.” o Esquerda: “Em vez de examinar a resistência ao colonialismo pelo prisma deformante da mitologia nacionalista, devemos criar um ‘mito’ melhor, que explique melhor a realidade da oposição africana [...] O ‘mito’ da insurreição revolucionária pode nos proporcionar um conhecimento mais vasto e mais profundo dos movimentos de oposição e de libertação do século XX do que o depauperante ‘mito do nacionalismo’”; “Em 1917, como na luta travada pela Frelimo, “era a opressão que estava em causa e não a raça”. Mais ainda, “as conexões com a Frelimo superam o engajamento ideológico comum”, pois a tradição de resistência “serviu ao mesmo tempo de motivo de orgulho e de modelo para a ação futura”;