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O que é estado de natureza?

Entenda a
gênese do pensamento político
moderno
Redação Brasil Paralelo

“O homem é lobo do homem”, Thomas Hobbes. Muitas pessoas já ouviram essa


frase, bem como já ouviram as máximas de Rousseau e de Locke, mesmo
desconhecendo os autores a fundo. Os contratualistas elaboraram as teorias
políticas mais difundidas do mundo moderno, sendo ensinados em todas
instituições de ensino formal do Ocidente. A base de todas essas teorias está na
ideia de estado de natureza (ou estado natural).

O que você vai encontrar neste artigo?


1. O que é estado de natureza?
2. Thomas Hobbes
3. Jean-Jacques Rousseau
4. John Locke
5. Críticas a teoria do estado de natureza
6. Críticas a moral subjetiva presente na teoria contratualista

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O que é estado de natureza?
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Estado de natureza é uma teoria sobre a condição de vida do homem antes de as


pessoas se organizarem em sociedade. Seus autores afirmam que, em um dado
período de tempo, os homens viviam sozinhos seguindo apenas as leis da
natureza, em igualdade e liberdade.
O princípio apresentado é o mesmo para todos os principais contratualistas:
Thomas Hobbes, Jean-Jacques Rousseau e John Locke.

De acordo com eles, os homens eram livres — podiam fazer o que quisessem —
e eram iguais, possuíam as mesmas possibilidades e as mesmas limitações.

Viviam em harmonia com a fauna e a flora.

Contudo, o modo e a razão de os seres humanos saírem do estado de natureza e


firmarem o pacto social, varia segundo cada pensador contratualista.

Thomas Hobbes

Thomas Hobbes afirmou que o homem podia tudo no estado de natureza. Por
ser plenamente livre, se quisesse algo, empreenderia todos os meios necessários
para alcançá-lo.

Na visão de Hobbes, o ser humano é mau por natureza. Seus desejos e prazeres
buscam realizar o mal sem se importar com as consequências.

As ações inconsequentes, baseadas apenas na vontade e no prazer, podem levar ao


vício. Entenda o que é um vício e como se livrar dele.

Hobbes conjecturou que, no estado de natureza, os homens utilizavam ampla


violência para tomar do outro o que lhes interessava, ou apenas fazer o mal por
prazer.

Por não haver regras, nem autoridades para impor a ordem, o mais forte
subjugava o mais fraco, que se via de todo impotente perante a injustiça. Se os
desejos humanos se cruzassem, a barbárie imperaria.

Foi nesse contexto que Hobbes proclamou sua famosa frase: “O homem é o lobo
do homem”.

Assim, pela necessidade de segurança, por receio de injustiças, os homens


decidiram abrir mão de sua liberdade e igualdade entregues pela natureza e
firmarem o pacto social.

O pacto social criou uma sociedade organizada na qual o governo é a autoridade


soberana.

Para conservar a ordem, os homens transferem o poder de punir para a


autoridade imparcial do Estado. Sua função é refrear as paixões humanas
negativas e garantir que os homens não se prejudiquem uns aos outros.

Por ter tamanho poder sobre todos os homens, Hobbes chamou o Estado de
grande Leviatã (nome dado na Antiguidade a um monstro gigantesco, com
aparência de crocodilo).

Seu principal livro, onde desenvolve as ideias aqui resumidas, chama-se Leviatã.

Jean-Jacques Rousseau

A ideia de estado de natureza de Rousseau diverge de Thomas Hobbes, seu


antecessor.

Para Rousseau, o homem nasce bom e a sociedade o corrompe.

Em sua teoria, Rousseau afirma que a vida no estado natural era boa, sem
conflitos, que o homem vivia sozinho e realizado.

Na “Carta a Beaumont”, ao Arcebispo de Paris, o contratualista escreveu: “Não há


perversidade original no coração humano”.

Mesmo assim, os homens realizaram um pacto social visando salvaguardar suas


propriedades.

Entenda o que é a propriedade privada e porque precisamos dela.

Rousseau não sabe como nem por que os homens realizaram o contrato social,
ele não consegue demonstrar como era a vida no estado de natureza.
Em seu principal livro, Do Contrato Social, Rousseau escreve:

“O homem nasceu livre, e em toda parte se encontra


sob ferros. De tal modo acredita-se o senhor dos
outros, que não deixa de ser mais escravo que eles.
Como é feita essa mudança? Ignoro-o. Que é que a
torna legítima? Creio poder resolver esta questão”.

Na obra Discurso sobre a Origem das Desigualdades, o autor contratualista tratou a


propriedade privada como causadora do fim da liberdade humana. Foi vista
como um ato puramente egoísta e de rompimento com o mundo natural.

O iluminista afirma que, para conservar a propriedade privada, os homens


passaram a formar famílias e criar normas sociais. Essas instituições visavam
apenas excluir os demais que não fossem do grupo dos proprietários.

Assim, para solucionar esse problema, Rousseau propõe que as sociedades


sigam a vontade da maioria, vivendo em uma sociedade igualitária sem
propriedade privada nem hierarquia.

John Locke

Locke é considerado o pai do liberalismo. Sua tese a respeito da propriedade


privada como um direito natural influenciou profundamente o movimento
liberal.

Sua posição pode ser vista como um meio termo entre Rousseau e Hobbes.

Para Locke, o homem em estado de natureza não vivia em guerra constante.


Como todos desejam viver uma boa vida e autopreservar-se, Locke encara a
vida em estado natural como uma busca de paz e harmonia, que nem sempre
era alcançada.

Todavia, diferentemente da visão de Rousseau, Locke enxerga que o homem


precisou fazer o contrato social para salvaguardar sua propriedade.

Locke não encara a propriedade como algo maléfico, mas benéfico.


O artigo sobre propriedade privada explicita a natureza e a necessidade deste
instituto.

Para Locke, existem 3 direitos dados pela natureza que nenhum homem pode
modificar:

Vida;
Liberdade;
Propriedade.

Esses 3 direitos precisam do Estado para serem exercidos, do contrário, no


estado natural, eles serão feridos e não haverá quem os possa proteger.

Para que o homem não viva em constantes conflitos, onde o mais forte sai
vencedor independente de estar certo ou não, o ser humano constitui o governo
para alcançar a justiça.

Entenda como surgiu o Direito e a ideia de justiça a partir do Império Romano,


formando a cultura ocidental em união com a Filosofia Grega e a Igreja Católica.
Confira aqui.

Segundo Locke:

"Ser livre é ter a liberdade para ditar suas ações e


dispor de seus bens, e de todas as suas propriedades,
de acordo com as leis regentes. Dessa forma, não ser
sujeito à vontade arbitrária de outros, podendo
seguir livremente a sua própria vontade".

Para Locke, o Estado deve interferir o mínimo possível na vida das pessoas,
apenas para garantir que os 3 direitos básicos sejam respeitados.

Críticas a teoria do estado de natureza


As ideias de autores consagrados, como Aristóteles, Santo Tomás de Aquino e
Cícero, vão contra a teoria de contrato social e a existência de um estado de
natureza anterior à vida em sociedade.

Suas teorias são baseadas na adequação do intelecto à realidade. Essa visão de


mundo leva a perceber realidades contrárias às expostas por Hobbes, Rousseau
e Locke.

As críticas são direcionadas a diversas bases e consequências dessa teoria, sendo


as principais:

Crítica ao método
Rousseau, no início de sua principal obra, Do Contrato Social, afirma o seguinte:

“O homem nasceu livre, e em toda parte se encontra


sob ferros. De tal modo acredita-se o senhor dos
outros, que não deixa de ser mais escravo que eles.
Como é feita essa mudança? Ignoro-o. Que é que a
torna legítima? Creio poder resolver esta questão”.

Ele tratou a base de todas as suas teorias apenas com esse parágrafo.

Neste parágrafo, porém, ele admite ignorar como aconteceu o contrato social.

Os demais contratualistas também tratam dessa maneira a base de suas teorias.

Este é o ponto mais importante do pensamento destes autores, uma vez que tal
pacto é o que impediu os homens de serem felizes e trouxe o mal ao mundo,
segundo Rousseau. Segundo Hobbes e Locke, o pacto é o que legitima o poder e
as ações do Estado da forma que eles pregam.

O pacto social, que supostamente ocorre durante o estado de natureza, é o


acontecimento que explica a base de todo o contrato social. Se o contrato social
não tiver ocorrido da maneira e nas circunstâncias que eles afirmaram, suas
teorias não se sustentam.

O contrato social foi apresentado sem argumentação racional, lógica.

Rousseau não comprovou a tese histórica de que o homem vivia livre e feliz
antes da vida em sociedade, havendo perdido tudo isso por causa da
propriedade privada.

Os demais contratualistas não comprovaram a existência de um período no


qual os homens não viviam em sociedade, realizando o pacto posteriormente.

Em Lógica, estuda-se que se a premissa estiver errada, tudo que dela se segue
também está errado.
Para os críticos, se a proposição de que o contrato social acabou com a felicidade
do homem primitivo não for verdadeira, todas as soluções e argumentos de
Rousseau em todas as suas obras estão erradas. O que falta ao argumento é uma
base que seja real.

Se a proposição de que o contrato social legitima a formação do Estado, com as


prerrogativas e as consequências morais dessa decisão, for falsa, as propostas de
Hobbes e Locke também caem por terra.

Sem a base histórica, resta aos contratualistas apenas sua opinião, sua
suposição ou ideia.

Crítica a existência da vida no estado de natureza


Os bebês já nascem fruto da união do homem e da mulher, eles precisam de
cuidados por muitos anos. A proteção vinda da família e da organização social
são necessárias.

Ademais, o ser humano não adquire qualquer tipo de conhecimento que não seja
passado por outra pessoa que antes já o possuía.

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Se um ser humano fosse abandonado para viver sozinho em busca de uma


liberdade teórica, não sobreviveria no início da vida, não haveria transmissão de
cultura nem de conhecimento.

Muitos críticos dos contratualistas afirmam que a vida em sociedade é natural


ao homem, principalmente em família, e isso é um bem para a vida humana.

A própria família não consegue sobreviver sem outras famílias, devido a


necessidade de proteção dos diversos perigos do mundo selvagem e da
produção de alimentos.

A realidade demonstra que existe uma necessidade de interdependência


humana.

O que é uma família? Surpreenda-se com a explicação filosófica!

As tribos indígenas e os esquimós comprovam isso.

Estes, que vivem no estado mais natural que se pode encontrar no mundo
moderno, em conjunto com o que a historiografia demonstra acerca dos mais
antigos homens, possuem:

Hierarquia — existe um líder da tribo e líderes de outras funções menores e


necessárias para a sobrevivência da comunidade. Isso vai contra a ideia de igualdade
presente nas teorias de todos os contratualistas;

Família — tradicionalmente, o homem protege as mulheres e os filhos dos animais


selvagens e de outras tribos e assegura o alimento. Enquanto isso, é comum as
mulheres cuidarem das crianças e das necessidades do lar.

As crianças aprendem como viver com os pais e adquirem conhecimento


intelectual (visão de mundo) e prático (lidar com a natureza e seus itens) com os
mais velhos e sábios da tribo. Além disso, verifica-se:

Conflitos — aqueles que vivem no estado natural, não são bons selvagens como
Rousseau afirmou. De acordo com os registros históricos, os índios e os esquimós e
as sociedades mais antigas também tiveram sérios conflitos.

No Brasil pré-descobrimento, as grandes tribos dos Aimorés e dos Botocudos


eram conhecidas pela violência e instinto guerreiro.

Conheça como foram os primeiros contatos entre portugueses e indígenas.


Curiosamente, as escolas não ensinam assim.

Essas realidades demonstram o contrário do que foi visto nas principais ideias
dos contratualistas.

Os povos de continentes diversos não tinham contato entre si na Antiguidade,


mas em todos os continentes, a grande maioria vivia de forma contrária às
principais ideias de Hobbes, Locke e Rousseau.

Outras considerações possíveis são as de que o ser humano também vive em


sociedade por necessidade psicológica e não apenas por sobrevivência.

Em uma pesquisa feita pela Universidade de Harvard, o estudo mais longo já


feito sobre a felicidade, foi demonstrado que a maior influência na conquista de
uma vida boa são os relacionamentos humanos de boa qualidade.
Robert Waldinger: What makes a good life? Lessons from the longest study on …

Críticas a moral subjetiva presente na teoria


contratualista
A ideia contratualista leva a tese de que as regras morais existem apenas por
uma convenção humana. Assim, a moral é subjetiva.

Na perspectiva de Rousseau, as regras baseadas em uma moral objetiva são


vistas como maléficas, atrapalhando a realização da vida humana.

Entenda o que é o relativismo moral defendido por Rousseau e suas contradições de


forma mais aprofundada.

Para Hobbes e Locke, as exigências morais são necessárias apenas para


preservar a vida (e, para Locke, os outros dois direitos fundamentais, a saber, a
liberdade e a propriedade). Contudo, esse pensamento permite ao governo e ao
povo mudarem as leis e a moral como bem entenderem para conservar a vida.

Para ilustrar a diferença entre uma moral subjetiva (baseada na vontade da


maioria) e uma moral objetiva (regida pelas leis da realidade, leis anteriores e
superiores ao homem), pode-se fazer uma comparação com a moral clássica,
que busca as leis naturais que levam o homem à perfeição.

Uma discussão na sala de aula do professor Peter Kreeft demonstra essa questão
(retirado do livro É razoável crer?, de Alfonso Aguiló. Ed. Quadrante, SP, 2007.):
Conta Peter Kreeft, um grande escritor e professor
americano, que, um dia, ao dar uma das suas aulas
de ética, um aluno lhe disse que a Moral era uma
coisa relativa e que ele, como professor, não tinha o
direito de ‘impor-lhe os seus valores.

“Bem — respondeu Kreeft, para iniciar um debate


sobre a questão — vou aplicar à classe os seus
valores e não os meus. Você diz que não há valores
absolutos, e que os valores morais são subjetivos e
relativos.

Como acontece que as minhas ideias pessoais são


um tanto singulares sob alguns aspectos, a partir
deste momento vou aplicar esta: todas as alunas
estão reprovadas”.

O rapaz mostrou-se surpreendido e protestou


dizendo que aquilo não era justo. Kreeft
argumentou-lhe:

“Que significa para você ser justo? Porque, se a


justiça é apenas o ‘meu’ valor ou o ‘seu’ valor, então
não há nenhuma autoridade comum a nós dois. Eu
não tenho o direito de impor-lhe o meu sentido de
justiça, mas você também não pode impor-me o seu.
“Portanto, só se existir um valor universal chamado
justiça, que prevaleça sobre nós, que você poderá
invocá-lo para considerar injusto que eu reprove
todas as alunas.

“Mas, se não há valores absolutos nem objetivos fora


de nós, você só pode dizer que os seus valores
subjetivos são diferentes dos meus, e nada mais.

[E, mesmo se houvesse um acordo entre ambos, o


acordo poderia ser quebrado posteriormente por não
haver nada que o reja que seja superior a vontade
pessoal]

“No entanto, você não diz que não gosta do que eu


faço, mas que é injusto. Ou seja, quando desce à
prática, acredita sem a menor dúvida nos valores
absolutos”.

Para grande parte dos que se opõem a um relaxamento moral, ao não aceitar os
limites impostos pela natureza das coisas e pelos valores transcendentais, as
tragédias podem se tornar justificáveis.

Sem um padrão moral que rege a humanidade, para além da vontade da


maioria, como condenar Hitler pelo genocídio que promoveu? Eis um exemplo
de questão levantada para contestar a moral subjetiva.

A solução política contratualista justificaria o assassinato de Sócrates, por


exemplo, já que a soberania popular foi aplicada quando os representantes do
povo decidiram que ele devia morrer, mesmo havendo o filósofo comprovado
sua inocência.

Mesmo a visão de Direito Natural de Locke é diferente do Direito Natural


Clássico defendido por Aristóteles, São Tomás de Aquino, Cícero e muitos outros.
Dessa maneira, os críticos dos contratualistas afirmam que suas ideias levam à
destruição do homem e do Estado.

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natureza?

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