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19/09/23, 15:19 jurisprudência.

pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa

jurisprudência.pt

Tribunal da
Relação de
Guimarães
Processo
6689/18.7T8GMR.G1
Relator
MARIA JOÃO MATOS
Sessão
19 Junho 2019
Votação
UNANIMIDADE
Meio Processual
APELAÇÃO
Decisão
PROCEDENTE

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ALIMENTOS A FILHOS MAIORES

PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE

Sumário

Sumário (da relatora):


I. A obrigação de prover ao sustento dos filhos e de
assegurar as despesas relativas à sua segurança,
saúde e educação, mantem-se para além do
momento em que os mesmos atinjam a maioridade
ou forem emancipados e até aos 25 anos, desde
que aqueles não tenham ainda completado a
respectiva formação profissional, e na medida em
que seja razoável exigir aos pais o seu
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cumprimento, se bem que apenas pelo tempo


normalmente requerido para que aquela se
complete (arts. 1879º e 1880º do CC).
II. O princípio da razoabilidade (arts. 1880º e 1905º,
n.º 2, do C. Civil) deverá ser aferido em cada caso,
nomeadamente pela ponderação de condições
subjectivas pertinentes ao filho maior (como a
capacidade intelectual actual, o rendimento
escolar passado, e capacidade de trabalhar
durante a frequência escolar/académica), e de
condições objectivas pertinentes ao mesmo e
pertinentes aos seus progenitores (como
património próprio, rendimentos do mesmo e/ou
de trabalho remunerado, ou outros).
III. A natureza da obrigação de alimentos, enquanto
responsabilidade parental, impõe que se considere
que as necessidades dos filhos sobrelevam as
dificuldades económicas dos pais, cabendo a estes
assegurar as necessidades daqueles de forma
prioritária relativamente às suas (art. 36º, nº 5 da
CRP, e arts. 1874.º, 1878.º, n.º 1, 1879.º e 1880.º,
todos do CC).
IV. A real possibilidade de trabalhar do filho maior
não deve ser tomada em conta enquanto
pressuposto e medida dos alimentos a favor dele,
se e quando possa comprometer o sucesso dos
estudos (art. 2004.º, n.º 2 do CC).
V. No liminar mínimo dos alimentos de que
progenitor e o filho carecem, e na impossibilidade
de simultaneamente os assegurar (já contando
para o efeito com o desproporcional - e continuado
continua
- sacrifício imposto ao outro progenitor), a especial
natureza das responsabilidades parentais
justificam que se imponha àquele primeiro um
maior esforço para obter os ditos alimentos, e um
maior sacrifício para suportar a sua carência.

Texto Integral

Acordam, em conferência (após corridos os vistos


legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da
Relação de ...,
*
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I – RELATÓRIO

1.1. Decisão impugnada

1.1.1. (…) (aqui Recorrente), residente na Rua D.(…),


em ..., propôs a presente acção especial de
alimentos a filhos maiores, contra (…) (aqui
Recorrido), residente na Rua (…) pedindo que:

· o Requerido fosse condenado a pagar-lhe uma


prestação de alimentos, em valor mensal nunca
inferior a € 100,00, e a actualizar anualmente de
acordo com o IAS.

Alegou para o efeito, em síntese, ter nascido a (..)


ser filha do Requerido (…), encontrarem-se os
respectivos progenitores divorciados desde
Setembro de 2017, e ser exclusivamente a sua
progenitora quem, desde então, tem suportado
todos os encargos devidos pela sua sobrevivência.

Mais alegou encontrar-se a frequentar o 2.º ano do


Mestrado integrado em (…), pagar uma propina
mensal de € 127,00, despender cerca de € 150,00
por mês com a sua alimentação, e não possuir
quaisquer bens ou rendimentos que lhe permitam
fazer face a tais despesas, e às demais exigidas
pelo seu sustento e pela conclusão dos seus
estudos.

Por fim, alegou que o Requerido (…) trabalha, e


teria possibilidade de lhe prestar alimentos, em
valor mensal não inferior a € 100,00.

1.1.2. Realizada uma conferência, nos termos do


art. 46.º do RJPTC, não foi possível obter a
conciliação entre Requerente (…) e Requerido (…).

1.1.3. Regularmente notificado para o efeito, o


Requerido (…) contestou, pedindo que a acção
fosse julgada improcedente.

Alegou para o efeito, em síntese, não ter condições


para pagar a prestação de alimentos impetrada,
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uma vez que estaria desempregado, auferiria


mensalmente a esse título € 429,00, suportaria a
amortização mensal do empréstimo contraído para
aquisição da que foi casa de morada de família
(onde ainda viveria), no valor de € 225,00, teria
gastos mensais com condomínio, água, luz e gás de
€ 60,00, e disporia apena de € 145,00 por mês para
assegurar o seu sustento, o que só era possível
mercê de irregulares biscates e do apoio de outros
dois filhos seus e de uma irmã.
Mais alegou trabalhar a Requerente (…) ao fim-de-
semana, num bar em ....

1.1.4. Realizada audiência de julgamento, foi


proferida sentença, julgando a acção
improcedente, lendo-se nomeadamente na
mesma:

«(…)
IV. Nestes termos, decide-se julgar a presente
acção improcedente e, em consequência, absolver
o requerido … do pedido formulado pela requerente
….
Custas pela requerente, sem prejuízo do benefício
do apoio judiciário de que
beneficia.
Registe e notifique.
(…)»
*
1.2. Recurso

1.2.1. Fundamentos

Inconformada com esta decisão, a Requerente (…)


interpôs o presente recurso de apelação, pedindo
que se revogasse a decisão recorrida, e se
determinasse o montante da prestação de
alimentos que se mostrasse mais adequado e
proporcional às suas necessidades.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui


se reproduzindo ipsis verbis as respectivas
conclusões):

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I. A fundamentação da sentença considera-se


insuficiente e errónea.

II. In casu, o Mmo. Juiz a quo limitou-se a julgar


improcedente o pedido de alimentos a maiores
formulado pela Recorrente, sem que, para tanto,
face à matéria de facto que considerou relevante,
tenha efectuado a apreciação crítica da prova
produzida que alicerçou a sua convicção.

III. Atento o disposto nos artigos 1880º e 1905º nº 2


do C.C., a argumentação que sustenta a decisão é
insuficiente para determinar a improcedência do
pedido.

IV. De facto, ao contrário do concluído pelo Mmo.


Juiz a quo, face ao quadro jurídico vigente e à
prova produzida nos autos, deveria o Recorrido ter
sido condenado a prestar alimentos à sua filha
maior, ora Recorrente.

V. A circunstância de o Tribunal a quo ter concluído


que a Recorrente tem capacidade para prosseguir
com estudos a nível superior, destinados a
completar a sua formação, e que assim o vem
fazendo com aproveitamento, pois tendo-se
provado que a Recorrente não tem qualquer fonte
de rendimento relevante, dependendo da
progenitora, que aufere um vencimento mensal
exiguo para fazer face a todas as despesas (ponto
2.2), é de concluir que a mesmo não possui
possibilidades de prover ao seu próprio sustento.

VI. Por outro lado, errou o Tribunal a quo ao avaliar


as condições económicas do Recorrido, na medida
em que os factos considerados relevantes para
alicerçar a sentença recorrida impunham decisão
diversa.

VII. Desde logo, os trabalhos agrícolas ocasionais


realizados pelo Recorrido.

VIII. O Recorrido vive sozinho e além de receber €


429 de subsídio de desemprego, ainda realiza
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trabalhos agrícolas, donde aufere rendimento não


apurado (facto ponto 19).

IX. O Tribunal a quo errou ao não ter apresentado


qualquer consideração relativamente ao montante
auferido pelos trabalhos agrícolas e daí não ter
avaliado as verdadeiras condições económicas do
recorrido.

X. Para se avaliar as possibilidades económicas do


obrigado a alimentos, este tem de abranger o
acervo de todos os rendimentos, não abrangendo
apenas o rendimento do subsídio de desemprego
do recorrido mas também todos os rendimentos,
fixos ou variáveis e até os de caracter eventual,
como os trabalhos agrícolas que o recorrido faz.

XI. O recorrido, relativamente a estes trabalhos,


ocultou ao tribunal a quo, o montante que aufere
mas, entende a recorrente, que deveria também
entrar no cálculo da obrigação de alimentos.

XII. Como impõe a lei, no que se refere aos


elementos objectivos, no disposto no artigo 2003.º
e seguintes do Código Civil.

XIII. O Tribunal a quo, deveria ter apurado qual o


valor que o recorrido aufere com os trabalhos
agrícolas que faz ocasionalmente, bem como
averiguar qual o património do recorrido,
nomeadamente bens imóveis, contas bancárias e
bens móveis.

XIV. Ou, de acordo com as regras da experiência,


apontar para um valor dos rendimentos obtidos
pelos trabalhos agrícolas e adicioná-lo ao
rendimento do recorrido.

XV. De forma, a apurar a verdadeira condição


económica e a situação patrimonial do recorrido.

XVI. O tribunal a quo ao ter concluído no ponto 2.4.


que «Não está demonstrada factualidade que
permita a imputação culposa de tal situação ao
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progenitor, aqui requerido.


Neste contexto – e enquanto ele se mantiver –, por
muito que custe aceitar (por se reconhecer um
pendor pessoal, corresponsabilizador e
comprometedor da pessoa que presta alimentos
para com quem os recebe) entende-se que não é
razoável exigir que o requerido contribua para a
educação e instrução da requerente, o que vale por
dizer que a questão enunciada deve ter uma
resposta negativa».

XVII. Olvidou o Mmo. Juiz a quo que o recorrido


deve cooperar no sustento da filha.

XVIII. E entendeu que é razoável continua


continuar a exigir
apenas à progenitora, que contribua sem ajudo do
recorrido, para o sustento, educação e instrução
da recorrente, quando a filha e a progenitora vivem
numa situação patrimonial inferior à do recorrido:
«É, também, manifesto que a requerente não tem
qualquer fonte de rendimento relevante,
dependendo da progenitor, que aufere um
vencimento mensal exíguo para fazer face a toas as
despesas», conforme parágrafo 2.2 da sentença
recorrida.

XIX. Na perspectiva constitucional, a educação e a


manutenção dos filhos constitui, não apenas um
dever, mas também um direito dos pais, em
igualdade de circunstâncias, conforme artigo 36.º
n.º 3 e 5 da CRP.

XX. Pelo que, deveria o Mmo Juiz a quo ter fixado


uma prestação de alimentos, nem que fosse
inferior ao peticionado, de modo a conseguir que o
recorrido se sinta “implicado” e “responsável” pela
educação e sustento da recorrente.

XXI. O tribunal a quo não ponderou que as


necessidades dos filhos sobrelevam a
disponibilidade económica do progenitor devedor
de alimentos, devendo estes em momentos menos
propícios adequar as suas despesas aos seus
rendimentos e impondo que as necessidades dos
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filhos tenham uma importância prioritária.

XXII. Tendo concluído pela irrazoabilidade de exigir


que o recorrido contribua para a educação e
instrução da recorrente, sem ter ponderado os
critérios subjectivos e objectivos legalmente
exigidos.

XXIII. Pelo que, ao decidir como decidiu, o Mmo.


Juiz a quo violou, por errada interpretação e
aplicação, o disposto nos artigos 36.º, n.º 3 e 5 da
Constituição da República Portuguesa e 1880º e
1905º n.º2 do Código Civil.
*
1.2.2. Contra-alegações

O Requerido (…) contra-alegou, pedindo que se


negasse provimento ao recurso.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui


se reproduzindo ipsis verbis as respectivas
conclusões):

1.ª - Quando um sujeito processual se refere a um


determinado facto, como o de fazer alguns
“biscates”, não pode considerar-se que o próprio o
ocultou ou ocultou o rendimento desses “biscates”,
pois que isso pode significar, entre o mais, que o
rendimento desses trabalhos agrícolas não tem
relevo;

2.ª - Apesar do princípio da investigação,


constando dos autos que um sujeito processual faz
trabalhos agrícolas ocasionais, deve a parte
interessada na prova dos rendimentos daí obtidos
fazer algum esforço para os demonstrar, não sendo
admissível que, sem ter feito esforço nenhum na
primeira instância, venha, em recurso, sustentar
que o tribunal não investigou, sugerindo, só agora,
que o tribunal devia ter consultado o património e
contas bancárias do visado;

3.ª - Estando no âmbito de um processo de


alimentos a filho maior, e, por isso, dentro das
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relações familiares, em que os filhos bem


conhecem o património e trabalho dos pais, não
indicando o requerente filho, perante a primeira
instância, qualquer suspeita de património ou
rendimento, nada requerendo a respeito disso, não
pode exigir-se que o faça o tribunal, pois que,
nesse caso, o que é evidente é que nada existe de
relevante;

4.ª - Tendo o progenitor da filha maior um custo


com habitação inferior ao custo com habitação da
requerente e progenitora com quem esta vive,
tendo o progenitor uma despesa em alimentação,
vestuário e calçado, semelhante à despesa da
requerente em alimentação; é de concluir que
nenhuma adaptação as despesas pode o
progenitor fazer, por forma a poder pagar uma
prestação de alimentos a uma filha maior, com
quase vinte e dois anos de idade, a frequentar o
ensino superior.
*
II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões


da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º,
n.ºs 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este
Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas,
a não ser que as mesmas sejam de conhecimento
oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do
art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de


questões novas (que não tenham sido objecto de
apreciação na decisão recorrida), uma vez que os
recursos são meros meios de impugnação de
prévias decisões judiciais (destinando-se, por
natureza, à sua reapreciação e consequente
alteração e/ou revogação).
*
2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar

Mercê do exposto, 01 única questão foi submetida à


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apreciação deste Tribunal:

· Questão Única - Fez o Tribunal a quo uma errada


interpretação e aplicação da lei, já que se mostram
reunidos os fundamentos (de facto e de direito)
que permitiriam condenar o Requerido (…) no
pagamento, à Requerente (…), de uma pensão de
alimentos mensal ?
*
Precisa-se, a propósito, que não obstante das
alegações de recurso da Requerente (…) se
pudesse, pontualmente, ficar com dúvidas sobre
se a mesma não teria pretendido impugnar a
matéria de facto assente pelo Tribunal a quo, certo
é que não o chegou a fazer, nomeadamente pelo
necessário cumprimento do ónus de impugnação
enunciado no art. 640.º, n.º 1 e n.º 2, al. a), do CPC.
Com efeito, lê-se no art. 640.º, n.º 1 do CPC que,
quando «seja impugnada a decisão sobre a matéria
de facto, deve o recorrente obrigatoriamente
especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos
pontos de facto que considera incorrectamente
julgados; b) Os concretos meios probatórios,
constantes do processo ou de registo ou gravação
nele realizada, que impunham decisão sobre os
pontos da matéria de facto impugnada diversa da
recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve
ser proferida sobre as questões de facto
impugnadas».

Precisa-se ainda, no seu n.º 2, al. a), que, quando


«os meios probatórios invocados como
fundamento do erro na apreciação das provas
tenham sido gravados», acresce àquele ónus do
recorrente, «sob pena de imediata rejeição do
recurso na respectiva parte, indicar com exactidão
as passagens da gravação em que se funda o seu
recurso, sem prejuízo de poder proceder à
transcrição dos excertos que considere
relevantes».

Ora, nada disto foi feito pela Requerente (…), nem


no corpo das suas alegações de recurso, nem nas
respectivas conclusões. Logo, ficou este Tribunal
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ad quem impedido de sindicar a matéria de facto


fixada com base na livre apreciação do Tribunal a
quo (art. 607.º, n.º 5, I parte, do CPC).

Acresce que, não tendo ainda sido denunciada


qualquer violação das regras de direito probatório
material, nem a descortinando este Tribunal ad
quem, não tem o mesmo fundamento para
proceder a qualquer alteração oficiosa da dita
matéria de facto (II parte, do n.º 5, do art. 607.º, n.º
5, II parte, e art. 662.º, n.º 1, ambos do CPC).

Justifica-se, assim, a restrição do objecto do


recurso de apelação que se aprecia à sindicância
da matéria de direito nele apreciada (face à
incontroversa e inalterada matéria de facto por ele
considerada para aquele efeito, isto é, para
subsunção da mesma ao direito tido como
aplicável, e na interpretação que dele fez).
*
III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

3.1. Factos provados

Com interesse para a apreciação da questão única


enunciada, o Tribunal a quo julgou como provados
os seguintes factos:

1 – (…) (aqui Requerente) nasceu no dia (…)


(conforme certidão do assento de nascimento que
é fls. 7 e 8 dos autos, e que aqui se dá por
integralmente reproduzida).

2 - A Requerente (…) é filha de (…) (aqui Requerido)


e de (…) (conforme certidão do assento de
nascimento que é fls. 7 e 8 dos autos, e que aqui se
dá por integralmente reproduzida).

3 - A Requerente (…) reside com a mãe, em casa


desta, situada em ....

4 - A Requerente (…) frequenta o 2º ano do


Mestrado Integrado em …, na Universidade do ...,
sendo as aulas ministradas no Polo de ....
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5 - A Requerente (…) desloca-se a pé para as


instalações referidas no ponto anterior.

6 - No ano lectivo anterior, a Requerente (…) esteve


matriculada no 1º ano do mestrado referido no
ponto anterior e obteve aproveitamento.

7 - A Requerente (…) paga propina pela frequência


do mestrado acima mencionado, no valor mensal
de € 127,00 (cento e vinte e sete euros, e zero
cêntimos).

8 - A Requerente (…) despende, por mês, € 150,00


(cento e cinquenta euros, e zero cêntimos) em
alimentação para si.

9 - A Requerente (…) trabalha ocasionalmente aos


sábados num estabelecimento de diversão, donde
obtém rendimento não apurado para fazer face às
suas despesas.

10 - A Progenitora (…) da Requerente suporta o


pagamento de todas despesas desta,
designadamente, as acima referidas, com
excepção das que são pagas pela filha com o
rendimento mencionado no ponto anterior.

11 - O Requerido (…) encontra-se desempregado


desde 01 de Junho de 2017.

12 - O Requerido (…) aufere subsídio de


desemprego desde 01 de Julho de 2017, com o valor
diário de € 14,04 (catorze euros, e quatro cêntimos)
até 31 de Dezembro de 2017; e, a partir de 01 de
Janeiro de 2018, com o valor diário de € 14,30
(catorze euros, e trinta cêntimos) e mensal de €
429,00 (quatrocentos e vinte e nove euros, e zero
cêntimos).

13 - O Requerido (…) reside em habitação própria.

14 - O Requerido (…) paga, por mês, para


amortização de empréstimo contraído para
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aquisição da aludida habitação (no período em que


residia com a Requerente e mãe desta) a quantia
de € 225,00 (duzentos e vinte e cinco euros, e zero
cêntimos).

15 - O Requerido (…) paga, por mês, € 15,00 (quinze


euros, e zero cêntimos) a título de mensalidade a
favor do condomínio onde a habitação acima
referida se insere.

16 - O Requerido (…) paga, por mês, em média, €


13,00 (treze euros, e zero cêntimos) pelo
abastecimento de água na habitação acima
referida.

17 - O Requerido (…) paga, por mês, em média, €


23,00 (vinte e três euros, e zero cêntimos) pelo
abastecimento de electricidade na habitação
acima referida.

18 - O Requerido (…) despende, por mês, € 153,00


(cento e cinquenta e três euros, e zero cêntimos)
com a sua alimentação e o seu vestuário e calçado.

19 - O Requerido (…) realiza trabalhos agrícolas


ocasionais, donde aufere rendimento não apurado.

20 - A Progenitora (…) da Requerente trabalha


como doméstica, e aufere o salário líquido mensal
de € 534,00 (quinhentos e trinta e quatro euros, e
zero cêntimos).

21 - A Progenitora (…) da Requerente, além das


despesas (próprias e da Requerente) de
alimentação, vestuário e saúde, e de educação da
Requerente, e dos gastos com a manutenção da
habitação, paga de renda mensal a quantia de €
350,00 (trezentos e cinquenta euros, e zero
cêntimos).

22 - Para suportar as despesas com a Requerente,


a Progenitora (…) realiza trabalhos suplementares
de limpeza, donde aufere, por mês, € 200,00
(duzentos euros, e zero cêntimos).
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*
3.2. Factos não provados

Com interesse para a apreciação da questão única


enunciada, o Tribunal a quo considerou ainda que
não se provou:

a) O Requerido (…) é auxiliado na sua alimentação


por dois filhos e uma irmã, em cuja residência toma
algumas refeições.
*
IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1. Obrigação parental de alimentos

4.1.1.1. Em geral

Sendo a família «um elemento fundamental da


sociedade», espaço privilegiado de «realização
pessoal dos seus membros» (art. 67.º da CRP), e
reconhecendo-se aos pais uma «insubstituível
ação em relação aos filhos» (art. 68.º, n.º 1, da CRP),
compreende-se que se leia no art. 36º, n.º 5 da CRP,
que «os pais têm o direito e o dever de educação e
manutenção dos filhos».

Precisa-se, no art. 1877.º do CC, que os «filhos


estão sujeitos às responsabilidades parentais até à
maioridade ou emancipação»; e esclarece-se, no
art. 1878.º do CC, o que sejam estas
«responsabilidades parentais», lendo-se no
mesmo que «compete aos pais, no interesse dos
filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover
ao seu sustento, dirigir a sua educação,
representá-los, ainda que nascituros, e administrar
os seus bens».

Particularizando agora esta obrigação parental de


«prover ao seu sustento», lê-se no art. 1874.º do CC
que pais «e filhos devem-se mutuamente respeito,
auxílio e assistência» (n.º 1), sendo que o «dever de
assistência compreende a obrigação de prestar
alimentos e a de contribuir, durante a vida em
comum, de acordo com os recursos próprios, para
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os encargos da vida familiar» (n.º 2).

«Isto significa, em primeiro lugar, que a obrigação


de alimentos a favor dos filhos deriva diretamente
da relação de filiação (de tal forma que continua a
ser exigível ainda que os pais estejam inibidos do
exercício das responsabilidades parentais – cf. art.
1917º, C. Civil).

Em segundo lugar, que a prestação alimentícia a


favor dos filhos menores se insere num conjunto
mais amplo de poderes-deveres (irrenunciáveis) (7),
que os progenitores exercem no interesse dos
filhos, designadamente um dever geral de
assistência e sustento. (8)
Em terceiro lugar, que a obrigação de alimentos –
quando se trata de filhos menores – não se
configura como uma obrigação de alimentos
stricto sensu nem como um dever autónomo e
independente das outras prestações a que os
progenitores se encontram vinculados. (9)» (Ac. da
RG, de 02.11.2017, António Barroca Penha - aqui 2ª
Adjunto - , Processo n.º 1676/16.2T8VCT.G1, in
www.dgsi.pt, como todos os demais citados em
indicação de origem).

Ora, e de acordo com o art. 2003.º, n.º 1, do CC,


entende-se por «alimentos» «tudo o que é
indispensável ao sustento, habitação e vestuário».
Logo, em tal conceito contem-se «tudo o que é
indispensável à satisfação das necessidades da
vida segundo a situação social do alimentado» (Vaz
Serra, RLJ, Ano 102, p. 262. No mesmo sentido, Ac.
da RL, de 18.06.1669, J.R., 15º, p. 583, que reporta a
palavra sustento «não apenas à alimentação, mas
também a tudo o que é preciso para viver, sem
excluir as despesas inerentes a tratamentos
clínicos e medicamentos»).

O conceito de sustento ultrapassa, assim, a


simples necessidade de alimentação, abrangendo
a satisfação de todas as necessidades vitais de
quem carece de alimentos, nomeadamente as
relacionadas com a saúde, os transportes, a
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segurança, a educação e a instrução.


Atenta a sua particular natureza e finalidade,
compreende-se que o direito a alimentos goze de
uma fortíssima protecção legal, sendo
nomeadamente: irrenunciável (art. 2008.º, n.º 1 do
CC); indisponível, isto é, insusceptível de cedência
(art. 2008.º, n.º 1 do CC); imprescritível (art. 298.º,
n.º 1 do CC); não compensável com eventual crédito
de devedor (art. 2008.º, n.º 2 do CC); impenhorável
(art. 2008.º, n.º 2 do C.C.); e intuito personae, isto é,
insusceptível de transmissão (art. 2013.º, n.º 1, al. a)
do CC). Beneficia ainda de tutela civil (v.g. arts. 41.º
e 48.º do RGPTC) e penal (art. 250.º do CP).

Contudo, a obrigação de prover ao sustento dos


filhos e de assegurar as despesas relativas à sua
segurança, saúde e educação cessa logo que
aqueles estejam em condições de suportar, pelo
produto do seu trabalho ou outros rendimentos,
aqueles encargos (art. 1879.º do CC); ou mantêm-se
para além do momento em que os mesmos atinjam
a maioridade ou forem emancipados, desde que
não tenham ainda completado a respectiva
formação profissional, e na medida em que seja
razoável exigir aos pais o seu cumprimento, se bem
que apenas pelo tempo normalmente requerido
para que aquela se complete (art. 1880º do CC, na
redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 496/77,
de 25 de Novembro).

Por outras palavras, em vez de o direito a alimentos


(advindo da condição familiar de menor) se
extinguir com o advento da maioridade, prolonga-
se para além desta, muito embora se exija para o
efeito a verificação do condicionalismo previsto no
art. 1880.º do CC.
*
4.1.1.2. Em especial - Obrigação de alimentos a
filho maior

Com efeito, reconheceu-se no art. 1880.º do CC


que, mercê da evolução social, é cada vez mais
frequente que, ao atingir a maioridade, o filho não
esteja em condições de garantir a sua
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independência financeira, permanecendo a cargo


dos progenitores. Logo, a extensão da obrigação
dos pais para além da maioridade dos filhos é o que
mais se coaduna com a sociedade portuguesa, em
que os filhos maiores vivem com os pais e
geralmente não trabalham enquanto prosseguem
estudos (Rita Lobo Xavier, «Falta de autonomia de
vida e dependência económica dos jovens: uma
carga para as mães separadas ou divorciadas ?»,
Lex Familiae, Ano 6.º, n.º 1 - 2, Julho/Dezembro
2009, p. 19).

Fala-se, então, de uma «segunda adolescência»:


ao «completarem 18 anos, os filhos adquirem plena
capacidade de exercício, mas normalmente não
têm recursos económicos para ter uma vida
autónoma nem a formação necessária para os
angariar. Por isso, continuam
continua a viver com os pais e
a ser sustentados por estes, iniciando» o dito
período da «segunda adolescência» (Jorge Duarte
Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo,
Almedina, 2016, p. 299, nota 496).

Contudo, exige-se, para a manutenção da


obrigação de alimentos dos progenitores a filho
maior, que o mesmo não haja completado a sua
formação profissional; e que a sua não
profissionalização não resulte de culpa grave sua
(Maria de Nazareth Lobato ..., citada por Abílio Neto
e Herlander Martins, Código Civil Anotado, 7ª ed.,
Livraria Petrony, Lisboa, 1990, p. 1372).

Precisa-se, porém, que o art. 1880º do CC deverá


ser lido no sentido de que a formação profissional
que ainda não se encontre completada é, tanto a
que se encontra em curso, como aquela que se
deveria encontrar, não fora precisamente a
incapacidade económica do filho maior para a
assegurar por si próprio. De outro modo, em todas
as situações em que um filho maior se visse
confrontado com o incumprimento das obrigações
parentais dos seus progenitores, ver-se-ia
duplamente penalizado pela respectiva
incapacidade económica: primeiro, porque esta o
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impedia de continua
continuar a estudar; e depois, por essa
paragem forçada - ainda que imputada ao
incumprimento dos obrigados a alimentos -
acabaria por os beneficiar, tornando
definitivamente impossível de obter deles a
prestação em falta.

Será ainda necessário que seja razoável exigir aos


pais o cumprimento da mesma obrigação,
nomeadamente porque ainda não se mostra
excedido o tempo normalmente requerido para que
aquela formação se complete.

Veio mais recentemente o legislador, pela Lei nº


122/2015, de 1 de Setembro, alterar a redacção do
art. 1905.º do CC, acrescentando-lhe um novo n.º 2,
onde se lê: «Para efeitos do art. 1880º, entende-se
que se mantém para depois da maioridade, e até
que o filho complete 25 anos de idade, a pensão
fixada em seu benefício durante a menoridade,
salvo se o respectivo processo de educação ou
formação profissional estiver concluído antes
daquela data, se tiver sido livremente interrompido
ou ainda, se em qualquer caso, o obrigado à
prestação de alimentos fizer prova da
irrazoabilidade da sua exigência».

Pretendeu-se deste modo, e primordialmente (face


à anterior divisão da jurisprudência, conforme
detalhado no Ac. da RG, de 02.11.2017, António
Barroca Penha - aqui 2ª Adjunto -, Processo n.º
1676/16.2T8VCT.G1), esclarecer que a prestação de
alimentos fixada durante a menoridade, no âmbito
de um processo de regulação do exercício das
responsabilidades parentais, se manterá
automaticamente a favor de quem tiver menos de
25 anos de idade; e que passará a caber ao
progenitor vinculado à mesma requerer a sua
cessação, com o ónus de alegar e provar que o
processo de educação ou formação profissional do
filho foi concluído antes de este perfazer os 25
anos, ou foi voluntariamente interrompido por ele,
ou - ainda - a irrazoabilidade da exigência da
prestação alimentícia.
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Contudo, tornou-se do mesmo passo mais claro o


já antes exigível critério da razoabilidade (da
exigência aos pais o cumprimento desta
obrigação), a apreciar no caso concreto, por forma
a determinar se é justo e sensato continuar
continua a exigir
ao progenitor o pagamento da referida pensão
alimentar.

Como elementos necessariamente a ponderar para


este efeito estará o comportamento do filho
perante o progenitor (contra quem dirige a sua
pretensão): perante a violação reiterada e/ou grave
dos deveres paterno-filiais (mútuo respeito, auxílio
e assistência, conforme art. 1874.º, n.º 1 do CC),
poderá tornar-se irrazoável obrigar o progenitor a
continuar a prestar alimentos ao filho que assim se
continua
comporta.

(Com utilidade para a densificação da referida


cláusula de (ir)razoabilidade, veja-se: Diana Gomes
Rodrigues Mano, A Obrigação de Alimentos a Filhos
Maiores e o Princípio da Razoabilidade, Dissertação
de mestrado em Direito das Crianças, da Família e
das Sucessões, apresentada na Universidade do ...
- Escola de Direito, para obtenção do grau de
Mestre, sob orientação da Professora Anabela
Susana Sousa Gonçalves, disponível na internet,
em
https://repositorium.sdum.u....pt/bitstream/1822/52022/1/Diana%20Gomes%20Rodrigues%20Mano.pdf;
ou Maria Inês Pereira da Costa, Obrigação de
Alimentos Devida a Filhos/as Maiores que Ainda
Não Completaram a Sua Formação - Uma Visão
Comparada de Crítica ao Critério da Razoabilidade,
Dissertação de Mestrado em Direito com
especialização em Direito Privado, apresentada na
Universidade Católica Portuguesa - Centro
Regional do Porto, para obtenção do grau de
Mestre, sob orientação da Professora Doutora Rita
Lobo Xavier, disponível em
https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/13754/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Final%20-
%20In%C3%AAs%20Costa%20Junho.pdf.)

Fala-se, então, de alimentos educacionais (na feliz


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expressão de J.P. Remédio Marques,


nomeadamente in Notas sobre Alimentos (Devidos
a menores), 2ª edição, Coimbra Editora, pp.135 a
137), de natureza excepcional e carácter
temporário (até que a formação se complete); e
cujos «critérios de atribuição assentam na
normalidade e razoabilidade, aferidas
nomeadamente em função de condições
subjectivas do filho maior, e objectivas deste e dos
seus pais.

Com efeito, as condições subjectivas respeitam às


circunstâncias relacionadas com o beneficiário em
termos pessoais (como a capacidade intelectual
actual, o rendimento escolar passado, e a
capacidade de trabalhar durante a frequência
escolar/académica), enquanto as condições
objectivas referem-se aos possíveis recursos
económicos do filho (como património próprio,
rendimentos de bens próprios ou do trabalho
remunerado, ou outros) e aos recursos por parte
dos progenitores (J.P. Remédio Marques, obra
citada, pp. 291 e seguintes).

Precisa-se, porém, que a possibilidade do filho


trabalhar, enquanto prossegue os seus estudos,
não deve constituir um facto impeditivo da
manutenção (rectius, da renovação) da obrigação
de alimentos, pois de outro modo, e em muitos
casos, essa ponderação comprometeria o sucesso
dos estudos superiores.

(Neste sentido, J.P. Remédio Marques, obra citada,


p. 306, onde se lê que a «real possibilidade de
trabalhar do filho maior não deve ser tomada em
conta enquanto pressuposto e medida destes
alimentos, se e quando possa comprometer o
sucesso dos estudos, para mais na medida em que
os progenitores disponham, em concreto, de
recursos económicos bastantes». Na
jurisprudência, Ac. da RL, 27.04.1995, CJ, Ano XX,
Tomo 3, pp. 125 e ss., ou Ac. da RE, de 18.10.2007,
Mário Serrano, Processo n.º 2022/07-3.)
*
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4.1.2. Caso concreto (subsunção ao Direito


aplicável)

Concretizando, verifica-se que a Requerente (…),


sendo filha do Requerido (…), tem hoje 21 anos de
idade, e ainda não completou a sua formação
escolar e profissional: frequenta o 2.º ano do
mestrado integrado em …, na Universidade do ...,
polo de ....
Verifica-se ainda que, pressupondo actualmente
qualquer prévia licenciatura um período mínimo de
três anos, e só após a mesma se iniciando o
mestrado integrado, a Requerente (…) tem obtido
indesmentível aproveitamento escolar/académico.
Considera-se, por isso, que se mantém a obrigação
de alimentos do Requerido (…) face à mesma.

Ao exposto, e naturalmente não obsta o facto da


Requerente (…) trabalhar ocasionalmente, aos
sábados, num estabelecimento de diversão, de
onde obtém um rendimento não apurado para fazer
face às suas despesas.
É que resulta das regras da experiência (face à
expectável natureza indiferenciada do trabalho
desempenhado, ao seu carácter ocasional, e ao
período limitado em que é exercido) que o
rendimento assim obtido não seja de tal monta
que, segundo o critério de razoabilidade e o
princípio da proporcionalidade, afaste a obrigação,
ou o sacrifício a impor, ao devedor dos alimentos.

Reitera-se, assim, o juízo de que é razoável exigir


ao Requerido (…) o cumprimento da obrigação de
alimentos educacionais reclamados pela
Requerente (…).
Importa, então, apurar a efectiva possibilidade do
Requerido (…) de os prestar; e, na afirmativa, em
que medida.
*
4.2. Determinação do seu montante

4.2.1.1. Em geral

«O instituto jurídico dos Alimentos radica num


https://jurisprudencia.pt/acordao/190067/ 21/32
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princípio de solidariedade familiar, de exigência de


ajuda, socorro e conforto que recai sobre todos os
membros da família e destina-se a titular o direito à
dignidade humana, constitucionalmente protegido
(cfr. art. 1.º da Constituição da República
Portuguesa» (Daniela Pinheiro da Silva, Alimentos a
Filho Maior. Natureza, Âmbito e Extensão das
Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3 e 4 do Código
de Processo Civil, Almedina, Junho de 2019, p. 17).

Compreende-se assim, e no que concerne à


determinação do montante de alimentos, que se
leia no art. 2004.º do CC que «serão
proporcionados aos meios daquele que houver de
prestá-los e à necessidade daquele que houver de
recebê-los» (n.º 1), uns e outras actuais, ou seja,
existentes no momento da prestação de alimentos;
e «atender-se-á, outrossim, à possibilidade de o
alimentando prover à sua subsistência» (n.º 2).

Importa, pois, ter em conta todas as possibilidades


e disponibilidades de quem presta e de quem
recebe, atendendo o juiz, nomeadamente, «à sua
idade, ao seu sexo, ao seu estado de saúde, à sua
situação social, ao ter ou não filhos a sustentar, ao
poder ou não trabalhar, ao ter ou não um lucro que
lhe permita ganhar a vida, aos rendimentos dos
seus bens e a quaisquer outros proventos» (Abel
Pereira Delgado, Do Divórcio, 1971, p. 200 a 202.
Defendendo a mesma natureza eclética de
factores, Pereira Coelho, Curso de Direito da
Família, 1969, p. 300, e Vaz Serra, RLJ, Ano 96, p.
538).

Por outras palavras, e tentando concretizar os


indeterminados critérios legais referidos
(conforme Clara Sottomayor, Regulação do
exercício das responsabilidades parentais nos
casos de divórcio, 6ª edição, Almedina, Coimbra,
2016, pp. 334 e ss.), haverá que atender:

. às possibilidades do alimentante - os rendimentos


de trabalho, isto é, salários (a parte disponível do
seu rendimento normal, certo, regular e actual); os
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rendimentos de carácter eventual, como


gratificações, emolumentos e os subsídios de
Natal e de férias; os rendimentos de capital; as
poupanças; as rendas provenientes de imóveis
arrendados; os valores dos seus bens. Em qualquer
caso, o Tribunal deverá recorrer a critérios
resultantes da experiência comum, nomeadamente
quando, pese embora os valores apurados de
rendimentos sejam de valor fixo ou certo, o
alimentante apresenta um nível de vida superior.
Assim, a capacidade económica dos pais, para
efeitos do cumprimento da obrigação de alimentos
a prestar aos filhos menores, não se avaliará
apenas pelos rendimentos que declarem ao Fisco
ou à Segurança Social, avaliando-se também pela
sua idade, pela actividade profissional que em
concreto desenvolvem e pela capacidade de gerar
proventos que essa actividade permite;

. as necessidades do alimentando - o custo de vida


em geral; a idade do(a)(s) filho(a)(s) (quanto mais
velha é a criança mais avultados são os encargos
com a sua educação, vestuário, alimentação, vida
social, actividades extracurriculares); a sua saúde;
a sua situação social; o nível de vida anterior à
ruptura de convivência entre os pais.

. a possibilidade de o alimentando proceder à sua


subsistência.
*
4.2.1.2. Em particular - Alimentos devidos a filhos

4.2.1.2.1. Alimentos mais amplos

Precisa-se, porém, que no âmbito da natureza


especialíssima do vínculo parental, a prestação de
alimentos devida pelos pais aos filhos menores ou
emancipados não tem o mesmo objecto que a
obrigação alimentar comum, já que se trata de um
«regime especial (...) que afasta as regras gerais
dos arts. 2003º e segs» (Heinrich E. Horster, citado
por Abílio Neto e Herlander Martins, Código Civil
Anotado, 7ª ed., Livraria Petrony, Lisboa, 1990, p.
1372).
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Com efeito, trata-se aqui de uma obrigação de


sustento mais vasta do que a existente nos
restantes casos (cfr. art. 2009.º do CC), já que «a
medida dos alimentos não se afere estritamente
aqui por aquilo que é "indispensável" à satisfação
das necessidades básicas e educativas» dos filhos,
«mas pelo que é necessário à promoção adequada
do desenvolvimento físico, intelectual e moral»
destes, «de acordo, porém, com as possibilidades
dos pais», conforme aliás resulta do art. 1885.º do
CC (Rui M. L. Epifânio e António H. L. Farinha,
Organização Tutelar de Menores. Contributo para
uma visão interdisciplinar do Direito de Menores e
Família, 2ª edição actualizada, Livraria Almedina,
Coimbra, 1992, p. 407.

No mesmo sentido, Rute Teixeira Pedro, Código


Civil Anotado, Coordenação de Ana Prata, Vol. II, p.
903, onde se lê que, neste caso, «o objecto da
prestação debitória é mais amplo do que o que
resulta do nº 1, em geral, para as prestações de
alimentos, devendo contabilizar-se, para além das
despesas abrangidas pelo nº 1, aquelas que
respeitem à instrução e educação da criança ou do
jovem alimentando (art. 1885º do CC) e todas as que
concernem ao que é devido à luz do cumprimento
dos deveres integrados nas responsabilidades
parentais (art. 1878º do CC)»).

O art. 2003.º do CC (que resulta da transposição do


art. 171.º do Código de Seabra, adaptado ao século
XIX, onde não era frequente os filhos prosseguirem
estudos) está assim - e no que ora nos ocupa -
desactualizado, atendendo à massificação da
educação na nossa época. A manutenção do
carácter limitativo do seu nº 2 («Os alimentos
compreendem também a instrução e educação do
alimentado no caso de este ser menor»), na
Reforma de 1977, só se poderá ter ficado a dever a
um lapso do legislador, que se terá esquecido de
adequar esta norma ao disposto no art. 1880.º do
CC (que define a noção de alimentos devidos a
maiores por remissão para o art. 1879.º, o qual se
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19/09/23, 15:19 jurisprudência.pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa

refere às despesas relativas à sua segurança,


saúde e educação).
*
4.2.1.2.2. Obrigação mais intensa

Por outro lado, e atento novamente o


especialíssimo vínculo aqui em causa, dir-se-á
ainda que «o conteúdo da obrigação de alimentos a
prestar pelos pais não se restringe à prestação
mínima e residual de dar aos filhos um pouco do
que lhes sobra» (Ac. da RP, de 14.06.2010, Guerra
Banha, Processo n.º 148/09.6TBPFR.P1, com bold
apócrifo). Afirma-se aqui inequivocamente que «a
natureza da obrigação, enquanto responsabilidade
parental, impõe que se considere que as
necessidades dos filhos sobrelevam as
dificuldades económicas dos pais. Trata-se de uma
responsabilidade que impõe ao progenitor
assegurar as necessidades do filho de forma
prioritária relativamente às suas, designadamente
relativamente àquelas que não sejam inerentes ao
estritamente necessário para uma digna existência
humana» (Ac. da RP, de 28.09.2010, Ramos Lopes,
Processo n.º 3234/08.6TBVCD.P1, com bold
apócrifo. No mesmo sentido, Rute Teixeira Pedro,
Código Civil Anotado, Coordenação de Ana Prata,
Vol. II, p. 905, sindicando a relevância das despesas
dos progenitores relacionadas com actos de
consumo, uma vez que obrigação de alimentos em
relação a filhos menores, «reveste prioridade
(também em consonância com o disposto no nº 2
do art. 2016-A do CC)»).

Compreende-se, por isso, que se afirme que «o


dever de proteção do filho (…) é de tal intensidade
que nem os escassos recursos dos progenitores
podem desonerá-los do seu cumprimento», pelo
que «o dever de assistência e sustento obrigue os
pais a compartilhar com o filho os seus
rendimentos até ao limite da sua própria
subsistência» (Ac. da RG, de 02.11.2017, António
Barroca Penha - aqui 2ª Adjunto -, Processo n.º
1676/16.2T8VCT.G1).
*
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4.2.1.2.3. Outro progenitor (princípio da igualdade)

Precisa-se ainda que importa atender igualmente,


nesta matéria dos alimentos (e como em todas as
demais pertinentes às outras responsabilidades
parentais), ao princípio constitucional da igualdade
de direito e deveres de ambos os progenitores,
quanto à manutenção e educação dos filhos
(conforme art. 36.º n.º 3 da CRP).

Este princípio (da titularidade das


responsabilidades parentais, como o respectivo
exercício, caber, em princípio, a ambos os
progenitores, em condições de plena igualdade) é
reafirmado no CC, no art. 1901.º (para a constância
do matrimónio), no art. 1911.º (para a constância de
relação análoga à dos cônjuges), e no art. 1912.º
(para as demais situações, isto é, quando os
progenitores não vivem naqueles termos).

Contudo, não se pode proceder aqui a uma partilha


de responsabilidades puramente matemática, isto
é, de modo a que cada um dos progenitores
assegure necessariamente metade das despesas
dos filhos.

Com efeito, sempre se terá que ter em


consideração os respectivos recursos, por forma a
alcançar-se uma justa composição de quotas-
partes contributivas.

(Neste sentido, Moitinho de Almeida, citado por Rui


M. L. Epifânio e António H. L. Farinha, op. cit., p.
387, onde se lê que «a obrigação de prestar
alimentos que a lei impõe aos parentes, é uma
obrigação conjunta e não uma obrigação indivisível
e solidária, porque o devedor só responde na
medida das suas possibilidades». No mesmo
sentido - de aplicação de um critério de
proporcionalidade -, Daniela Pinheiro da Silva,
Alimentos a Filho Maior. Natureza, Âmbito e
Extensão das Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3
e 4 do Código de Processo Civil, Almedina, Junho
de 2019, p. 94).
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Por outras palavras, vigorando no que concerne à


obrigação de alimentos o princípio de igualdade de
deveres de ambos os progenitores na manutenção
do(a)(s) filho(a)(s), o mesmo não significa que a lei
pretenda que cada um deles contribua com metade
do necessário à dita manutenção. Visa-se, sim, que
sobre cada um deles impenda a responsabilidade
de assegurar, na medida das suas possibilidades, o
que for necessário ao sustento, habitação e
vestuário (alimentos naturais), bem como à
instrução e educação do menor (alimentos civis).
*
4.2.1.2.4. Menor relevância da possibilidade de
prover à subsistência própria

Por fim, dir-se-á que o n.º 2 do art. 2004.º do CC (na


«fixação dos alimentos atender-se-á, outrossim, à
possibilidade de o alimentando prover à sua
subsistência») terá «pouca relevância prática
actualmente», uma vez que representa «um
resquício do carácter institucional da família típico
das sociedades agrárias anteriores à revolução
industrial».

Com efeito, a «maior parte das crianças não tem


bens próprios nem trabalha, devido aos requisitos
legais do contrato de trabalho, à escolaridade
obrigatória e ao melhor nível de vida das famílias.
Mesmo nos casos em que efectivamente trabalhem
ou tenham bens, essas nomas não podem ser
interpretadas à letra, o que levaria a pensar que,
independentemente das condições económicas
dos pais, estes ficaram desobrigados totalmente
de prestar alimentos ao/às/filhos/as, que pelos seu
rendimento de capital ou de trabalho pudessem
satisfazer as suas necessidades», com evidente
postergação daquelas que são as suas
constitucionalmente reconhecidas
responsabilidades (Clara Sottomayor, Regulação do
exercício das responsabilidades parentais nos
casos de divórcio, 6ª edição, Almedina, Coimbra,
2016, pp. 340-341).

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Assim, o património dos pais e dos filhos não


estará em pé de plena igualdade na afectação às
necessidades destes últimos, impondo-se uma
maior exigência na interpretação e aplicação da lei.

Acresce que, na «atual conjuntura do mercado de


trabalho, a competitividade reclama normalmente
um esforço e empenho por parte dos jovens que
dificilmente se compagina com a manutenção de
um emprego destinado a sustentar os estudos
académicos. Os pais devem, pois, dentro dos
limites das suas possibilidades económicas,
proporcionar aos filhos uma formação profissional
que lhes permita responder às exigências
acrescidas do mercado de trabalho e à oferta
limitada de emprego» (Daniela Pinheiro da Silva,
Alimentos a Filho Maior. Natureza, Âmbito e
Extensão das Normas Previstas no Art. 989.º, N.º 3
e 4 do Código de Processo Civil, Almedina, Junho
de 2019, p. 20).
*
4.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito
aplicável)

Concretizando, e relativamente às necessidades de


alimentos da Requerente (…), verifica-se que,
mensalmente, a mesma despende € 127,00 com a
propina do curso superior que frequente, e €
150,00 com a respectiva alimentação (num valor
global de € 277,00, que, porém, deixa de fora todas
as suas outras necessidades).

Mais se verifica que reside com a mãe, que é quem


suporta todas as suas demais despesas, à
excepção daquelas que ela própria consegue
assegurar, com o trabalho ocasional que presta aos
sábados, num estabelecimento de diversão.

Já relativamente às possibilidades do Requerido


(…), verifica-se que o mesmo se encontra
desempregado desde 1 de Junho de 2017, e aufere
mensalmente um subsídio a esse título de €
429,00, a que soma rendimento não apurado de
trabalhos agrícolas ocasionais.
https://jurisprudencia.pt/acordao/190067/ 28/32
19/09/23, 15:19 jurisprudência.pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa

Mais se verifica que vive em casa própria, pagando


mensalmente € 225,00 para amortização do
empréstimo contraído para a sua aquisição; e, no
mesmo período de tempo, paga, € 15,00 a título de
contribuição de condomínio, € 13,00 pelo
abastecimento de água, € 23,00 pelo
abastecimento de electricidade, e € 153,00 pelos
seus alimentação, vestuário e calçado.

Logo, o montante dos gastos apurados com o seu


sustento perfaz o exacto montante do subsídio de
desemprego que aufere, isto é, € 429,00.

Quanto às possibilidades da Progenitora (…) da


Requerente, verifica-se que trabalha como
empregada doméstica, auferindo um salário
mensal de € 534,00, a que soma um outro
rendimento laboral de € 200,00, por trabalhos
suplementares de limpezas, que precisamente
realiza para suportar as despesas com a filha
(tendo, por isso, um rendimento global de €
734,00).

Verifica-se ainda que paga de renda de casa €


350,00; e que, presumivelmente, não gastará
menos com a sua alimentação do que a Requerente
e o Requerido (isto é, € 150,00); e nem terá
despesas inferiores a este último com consumos
de água e de electricidade (isto é, € 36,00), ainda
que considerados em singelo (isto é, sem o
acréscimo justificado pela vivência em comum
com a filha).

Logo, e seguindo o mesmo raciocínio do Requerido


(…) nos autos, a Progenitora (…) da Requerente,
uma vez satisfeitas, prévia e prioritariamente as
suas próprias necessidades, ficará com um
remanescente líquido para assegurar o sustento da
filha de € 198,00; e o mesmo é insuficiente para o
efeito (face aos € 277,00 de que a mesma
necessita), ficando em falta € 79,00.

Ora, e relativamente a parte significativa deste


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19/09/23, 15:19 jurisprudência.pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa

montante, que se fixa em € 70,00, considera-se


que o mesmo deverá ser imposto, como prestação
de alimentos a favor da sua filha, ao Requerido (…),
uma vez que, tendo o mesmo assegurado - com o
subsídio de desemprego que aufere - o seu próprio
sustento, o mesmo não sucede com aquela.

Pondera-se, ainda, que a quantia de € 70,00 se


afigura perfeitamente subsumível àquela outra,
não concretamente apurada, resultante dos
ocasionais trabalhos agrícolas que realiza, e que
poderá incrementar em frequência, ou substituir
por outros, melhor remunerados. Fazendo-o, agirá
tão só e apenas à semelhança do que vem fazendo
a Progenitora (…) da Requerente, onerada com
regulares trabalhos suplementares de limpezas,
correspondentes sensivelmente a metade
daqueles outros que já realiza em horário laboral
completo (por só este justificar o salário liquido
mensal de € 534,00 que aufere).

Acresce que, como proprietário da casa que


habita, poderá ainda o Requerido (…) rentabilizá-la,
por meio da cedência, parcial e onerosa, do seu
gozo a terceiro (v.g. arrendando um quarto a quem
dele necessite), ao contrário do que sucede com a
Progenitora (…) da Requerente, que habita casa
arrendada.

Reiteram-se, aqui, as considerações tecidas supra:


a especial obrigação alimentar que impende sobre
o Requerido (…), e o encontrar-se em risco a
satisfação das necessidades da sua filha (ao
contrário do que sucede com as dele próprio),
obriga este Tribunal ad quem a uma maior
exigência na aferição dos esforços e sacrifício que
lhe sejam impostos para assegurar a dita
comprometida satisfação (à semelhança do que,
isolada e continua
continuamente, a Progenitora da
Requerente vem fazendo, muito para além do que
seria a proporcional e aritmética divisão dos
encargos entre ambos com a filha).

A ponderação que aqui se faz é, então, entre o


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19/09/23, 15:19 jurisprudência.pt - Pesquisa de jurisprudência Portuguesa

liminar mínimo dos alimentos de que o Requerido


(…) e a Requerente (…), sua filha, carecem; e, na
impossibilidade de simultaneamente os assegurar
(já contando para o efeito com o desproporcional -
e continua
continuado - sacrifício imposto à Progenitora da
Requerente), no maior esforço para os obter, e no
maior sacrifício para suportar a sua carência, que
deverá (pela primeira vez, desde a maioridade da
filha) ser imposto ao Requerido (…).

Por fim, dir-se-á que, ainda que o Requerido (…)


venha a incumprir a prestação de alimentos agora
determinada, só a sua prévia fixação judicial
poderá permitir a intervenção do Fundo de
Garantia de Alimentos Devidos a Menores (em sua
substituição, nos termos previstos na Lei n.º 75/98,
de 19 de Novembro, e no Decreto-Lei n.º 164/99, de
13 de Maio), face ao Acórdão do Supremo Tribunal
de Justiça nº 12/2009, Uniformizador de
Jurisprudência, de 07 de Julho de 2009 (D.R., nº
150/2009, Série I, de 05 de Agosto de 2009).

Com efeito, nele se decidiu que a «obrigação de


prestação de alimentos a menor, assegurada pelo
Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a
Menores, em substituição do devedor, nos termos
previstos nos artigos 1.º da Lei n.º 75/98, de 19 de
Novembro, e 2.º e 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º
164/99, de 13 de Maio, só nasce com a decisão que
julgue o incidente de incumprimento do devedor
originário e a respectiva exigibilidade só ocorre no
mês seguinte ao da notificação da decisão do
tribunal, não abrangendo quaisquer prestações
anteriores» (com bold apócrifo).

Deverá, assim, decidir-se em conformidade, pela


total procedência do recurso de apelação
interposto pela Requerente (…), revogando-se a
sentença recorrida, e condenando o Requerido (…)
no pagamento de uma pensão de alimentos, a favor
dela, de € 70,00 mensais.
*
V - DECISÃO

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Pelo exposto, e nos termos das disposições legais


citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da
Relação em julgar totalmente procedente o recurso
de apelação interposto pela Requerente (…) e, em
consequência, em

· revogar a sentença recorrida, substituindo-a por


decisão a condenar o Requerido (…) numa pensão
de alimentos mensal, a favor da filha (aqui
Requerente) de € 70,00 (setenta euros, e zero
cêntimos), actualizável de acordo com o índice de
inflação publicado pelo INE para o ano civil
anterior.
*
Custas da acção e da apelação pelo Requerido (art.
527º do CPC).
*
Guimarães, 19 de Junho de 2019.

O presente acórdão é assinado eletronicamente


pelos respectivos

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;


1º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.

https://jurisprudencia.pt/acordao/190067/ 32/32

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