Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Editorial ------------------------------------------------------------- p. 05
Daniel Rodas (Traduções de Alejandra Pizarnik) ---------- p. 10
Claudia Baeta Leal ------------------------------------------------ p. 20
Blenda Santos ------------------------------------------------------ p. 27
Larissa C. G. Oliveira -------------------------------------------- p. 35
Anna Apolinário --------------------------------------------------- p. 38
Felipe Braga -------------------------------------------------------- p. 42
Isabela Lemos ------------------------------------------------------ p. 47
Hugo Bessa --------------------------------------------------------- p. 50
Leandro Almeida -------------------------------------------------- p. 53
Marcela Alves ------------------------------------------------------ p. 57
Géssica Menino ---------------------------------------------------- p. 61
Isabel Furini -------------------------------------------------------- p. 63
Terezinha Malaquias --------------------------------------------- p. 69
Nalberty Medeiros Santos --------------------------------------- p. 76
Amanda Parente --------------------------------------------------- p. 85
Agradecimentos e Contatos ------------------------------------- p. 91
Editorial
Tu
Que te escreve aqui
Tu
Que reescreve lá
Tu
Que se inscreve ali
Tu
Que escreve cá
Tu
Que escrevendo aqui
Tu
Reescreve lá
Tu
Reescrito aqui
Tu
Te escreves cá
Tu: reescrito em si
Eu: reescrito lá
Tu que te escreve em ti
Eu reescreve em Ká
Há cinco mil anos. Em Kemet ou na Suméria. Num bloco de tempo. Ou num fio de
miséria. Se fez: um rabisco em pedra. Se faz: um fiapo em terra. E de um traço teceu. O
que tudo nasceu. Dali: a ideia encerra.
Será? Só que nada fecha. Escrito: não. Se abre: < Palavra regurgita o dito. Remói o que
recôndito dito. Indito: não. Revivo: palavra aberta em frase. Em boca. Em risco.
Palavra impressa. Palavra-Nilo. Eufrates Ganges ou São Francisco. Palavra gravada num
cisco. Palavra: assumir o risco.
De criar. De tecer. De fiar retecendo o traço. De tecer desfiando o laço. Refazendo o aço.
Do verbo em vidro e em fogo. Do ato: palavra-fogo. O ato de escrever com fogo. O tato:
de tocar o jogo.
Hieróglifos: riscos e traços. Cordas – bambos e bambus. De onde tiram os talos: papiro.
De onde cosem o couro: escrito.
Toth: íbis ou pato. Ave avoante zabelê. Pardal papa-capim ou bacurau. Deus da palavra
e do tempo. Deus da garganta e da escrita. Deus: da sabedoria (ina)ú(dita). Poeta. Poema
e urubu. O deus que escrito na pedra. Karnak Uruk ou Ingá:
SUCURU!
Equipe Sucuru
*
* *
5 POEMAS DE ALEJANDRA PIZARNIK – TRADUZIDOS
POR DANIEL RODAS
Iniciando sua vida literária ainda na primeira metade da década de 1950, com a publicação
de seu livro de estreia, La tierra más ajena (1955), Pizarnik passou por uma considerável
guinada estética após uma temporada em Paris, de 1960 a 1964, na qual travou contato
com artistas do calibre de Octávio Paz, Julio Cortázar e Rosa Chacel, ao mesmo tempo
em que se deixou influenciar pelos surrealistas. Após o seu retorno à Argentina, publicou
as coletâneas Árbol de Diana (1962), Los trabajos e las noches (1965) e Extracción de la
piedra de locura (1968), onde mescla um estilo concentrado, conciso, a uma profusão de
figuras e referências simbólicas que giram em torno do mesmo conjunto de imagens-
temas: a noite, a morte, a aurora, o anjo, etc.
Após a sua morte prematura, aos 36 anos, decorrente de suicídio (1972), seu trabalho
ganhou destaque cada vez maior, impulsionado pelo reconhecimento de sua maestria
poética, assim como pela releitura de sua obra à luz das teorias feministas. No Brasil, a
editora Relicário tem realizado nos últimos anos um projeto de tradução da poesia da
autora – inédita no país durante anos, a exceção da obra em prosa A condessa sangrenta
(1971). A despeito desse esforço editorial, que publicou no Brasil, até o momento, quatro
obras da autora – Árvore de Diana, Os trabalhos e as noites, Extração da pedra da
loucura e Inferno musical – Pizarnik continua sendo inexplicavelmente pouco lida no
país, enquanto boa parte de sua produção poética ainda aguarda tradução.
A NOITE
LA NOCHE
Poco sé de la noche
pero la noche parece saber de mí,
y más aún, me asiste como si me quisiera,
me cubre la conciencia con sus estrellas.
***
A JAULA
Lá fora há sol.
Não é mais que um sol
Porém os homens o fitam
e depois cantam.
1
Do original espanhol, clavos, cujo significado pode remeter tanto a “pregos”, quanto a “unhas”. Aqui,
optamos pela primeira solução.
Lá fora há sol.
Eu me visto de cinzas.
LA JAULA
Yo no sé del sol.
Yo sé la melodía del ángel
y el sermón caliente
del último viento.
Sé gritar hasta el alba
cuando la muerte se posa desnuda
en mi sombra.
***
FESTA NO VAZIO
FIESTA EN EL VACÍO
***
TEMPO
A Olga Orozco
TIEMPO
A Olga Orozco
Yo no sé de la infancia
más que un miedo luminoso
y una mano que me arrastra
a mi otra orilla.
Mi infancia y su perfume
a pájaro acariciado.
***
FILHA DO VENTO
Vieram.
Invadem o sangue.
Cheiram a plumas,
a carência,
a pranto.
Mas tu alimentas ao medo
e à solidão
como a dois animais pequenos
perdidos no deserto.
2
Um sentido literal, a partir do original “su perfume / a pájaro acariciado”, seria “seu perfume / de pássaro
acariciado”. Entretanto, “em carícia de pássaro” parece manter a ambiguidade de sentido do poema, uma
vez que reforça o “medo luminoso” a partir da lembrança da infância: a “carícia de um pássaro” pode tanto
ser a de pássaro que acarinha – ou que é acarinhado –, quanto o arranhão de uma garra.
Vieram
a incendiar a idade do sonho.
Um adeus é tua vida.
Porém tu te abraças
como a serpente louca de movimento
que só se encontra a si mesma
porque não há ninguém.
Han venido.
Invaden la sangre.
Huelen a plumas,
a carencia,
a llanto.
Pero tú alimentas al miedo
y a la soledad
como a dos animales pequeños
perdidos en el desierto.
Han venido
a incendiar la edad del sueño.
Un adiós es tu vida.
Pero tú te abrazas
como la serpiente loca de movimiento
que sólo se halla a sí misma
porque no hay nadie.
*
O TRADUTOR
DESVIO
QUARENTENA
Encharquei
de água quente
tristezas novas em folha.
Já não suporto álcool nessa quarentena,
preciso de chá
e novos vícios.
Vou beber a infusão
de aborrecimento morno
enquanto penduro
roupas
e
pernas
na janela
por um pouco de sol.
Olhar a rua
[por frestas]
me aborrece
e perdi a curiosidade pelas janelas.
Também cansei de lavar louça,
varrer a casa,
limpar o chão,
arrumar bem as palavras.
Agora vai
bagun
çado
mes
mo.
NUM FORRÓ
BOCA A BOCA
boca
e voz
som alto e claro
em demasia
vontade de um lado só
que não cala na boca
boca boca boca
pronúncia em batom vermelho
berro
discusão e exagero
bate-boca
boca boca boca
pedra atirada na vidraça
mancha na toalha limpa
grito no ouvido
canção fora de hora
e sem graça
boca boca boca
também delicadeza
arrepio
sussurro e um beijo
murmúrio, leveza, psiu!
ágil movimento de boca
boca a boca
pergunta e mais pergunta
persistência
insistência sem proposta
sem silêncio
ou não como resposta
boca boca boca
quando transborda
apressa
atropela
nem bem começou
boca boca boca
*
PELE E TATO
poema de arrepio
na espera e presença
quando é quente e é frio
quando é quase surpresa
desvio
bar, ato e hotel
quando é palavra
e é história
vento forte, fogo, lava
explosão e arrepio
conto oculto, acaso
e memória
poema de vontade
de você,
de um beijo, de seu rosto
*
POESIA DE RUA
uma mulher carregando no ventre um caixão de uma tonelada levantou voo nesta
madrugada
um menino correndo na rua atrás de uma bola também desafiou as leis da física
e eu sou poeta
crio tecnologias com a boca, pois preciso lembrar de cada animal em extinção nesse
país, em que todo mundo sonha em ter um pai
um movimento contínuo para queimada de sutiãs nunca me disse tantas coisas assim
os reconheço pelo cheiro de quem desde o primeiro banho, nunca mais parou de feder
faz questão de manter o seu avô vivo e por isso, todas as vezes não mente
daqueles que reprovam em cada matéria e ainda assim conseguem levantar uma casa
com as próprias mãos
se contenta com fios de roupas amarrados em seu copo para assim guardar lembranças
Isidório escreve sempre com letras bonitas e enfileiradas, sem caderno de caligrafias ou
réguas
se na mercearia falta uma moeda, logo volta para nada mais faltar
Isidório sempre esquece de tirar o ferro que liga a articulação de um dos seus ombros
o equilíbrio entre os motivos pelo qual acumula diversas histórias marcadas no corpo
Isidório ama como quem se ama o reino dos bichos e dos animais
odeia que roubem suas ideias, mesmo as mais óbvias como a cor de nossa pele
Quando não se provoca barulho algum
dia desses dei de chorar como tem sido desde o primeiro contra-ataque
inoperante
ninguém manda aceitar porque dói menos mas no final de até agora
falar sobre tangerinas ao invés da história que todos esperam que eu conte
falar de novo, repetir até me sentir calma demais e exatamente por isso cansar
pois foi o que não falou aquele professor que nos pedia silêncio o tempo inteiro
eu odeio a calma, o silêncio e o capítulo do livro que traz um texto sobre o exílio no
beleléu daquele
aprendi a lamber os seus dentes e depositar o seu gosto em minha gengiva durante exata
uma semana
aprendi a confeccionar cotonetes com o laço de minha calcinha
dessa vez
isso não é
sobre a quantidade de tempo que leva para uma carne ficar cor verde
ou sobre como dipironas são o suficiente para curar o estrago da cor verde de uma carne
muito menos sobre como vai de mal a pior um congresso defendendo projetos de leis
que consideram o nosso amor, regalia
e nós
Meu amor, não esqueça de não acordar com uma bala perdida nas costas
Mas ter medo de acordar, nunca foi uma opção para olhos como os nossos
É reparação histórica
Como o amor para quem teve seus filhos arrancados dos braços
Origens
HOLOGRAMA XAMÂNICO
BÓREAS
O brilho hipnótico dos versos se expande ao espanhol pela tradução do poeta, ensaísta,
tradutor e editor Floriano Martins. O livro será publicado pela Editora Triluna, a arte de
capa é de autoria de Aline Cardoso, poeta, editora idealizadora e responsável pela Triluna.
Os versos trovejam nas mãos da poeta, rutilam o tempo inteiro em seus lábios, alterando
o ritmo da respiração, erguendo fogueiras nos olhos, numa potência energética
indescritível. Um redemoinho vertiginoso, voltagem de uma voz que levita
freneticamente e arquiteta a revolução dos sentidos, criação inaudita de reinos
desvairadamente sensíveis.
SOBRE A CAMPANHA:
LAMBES – R$10,00
Anna Apolinário (João Pessoa - PB, 1986) Escritora e poeta, pedagoga, Mestranda em
Letras (PPGL/UFPB), produtora cultural independente, organizadora do Sarau
Selváticas, fundadora da Cia Quimera – Teatro e Poesia, publicou os livros Solfejo de
Eros (CBJE, 2010), Mistrais (Prêmio Literário Augusto dos Anjos, Funesc 2014),
Zarabatana (Patuá, 2016), A chave selvagem do sonho (Triluna, 2020).
1789 DUTY FREE
b) uma guilhotina;
c) um convite irrecusável:
II. 2018 mostrou até onde a Faria Lima é capaz de ir: 1964,
[quiçá 1933]
today t amo
tomorrow tchau
testoste-trip, te app:
t’áfim?
POEMA SUJO
Seus quereres a movem num mundo moldado para dilacerar desejos. Não compreende
bem a realidade. Se pergunta se, em algum momento, vai se sentir um pouco mais
adaptada. Às vezes desejava que a estrada fosse um pouco menos tortuosa.
Olha desatenta pela janela do ônibus, as folhas das árvores secas no inverno. Na parada
em um posto de gasolina, pegou a mochila e saiu andando. O motorista gritou, vamo ficar
aqui só quinze minutos, tá, moça? Ela se virou, mas não soube como responder. Seguiu
pela rodovia, conhecia bem todo aquele trecho. Avistou a estrada de terra, e virou à
direita, na direção de um córrego que sabia encontrar pelo caminho.
Depois de duas horas de caminhada no sol da tarde, chegou ao poço. Cansada, atordoada
na melancolia, sentou na terra e começou a descascar a mexerica que tinha mochila. Não
tá fácil, dizia pra si mesma.
Sabia que se fechava em um casulo, e ali dentro não cabia mais ninguém. Não que ouvisse
muitos sons de batidas na porta. Andando em círculos, tentando se manter no bando. Mas
sempre acabava se desviando.
Sugava com vitalidade tudo o que podia, e ainda assim sentia sede. Sede do frio na
espinha, do arrepio na nuca, do inédito apaixonar. Feita de amor, mesmo que não tenha
experimentado certas variantes dele. Criou com régua e compasso os espaços para
compartilhar esse afeto. Folha quase transparente, rabiscos desencontrados. Porém, nunca
ouviu um eu te amo de quem havia deitado ao seu lado na cama.
Tira toda a roupa, se joga na água gelada, que vai se aderindo ao corpo nu, e se mantém
ali, inerte, admitindo as leves ondas que parecem estar ali só para confirmar o desígnio
de Heráclito.
Nesse modificar do rio, ela também se sentia atravessada, a água parece expandi-la, como
toques suaves que a abrem para um inacabamento, fronteiras não delineadas.
Olhando de fora, quase não se percebe esse movimento, a não ser dentro de si. O casulo
vai aos poucos sendo rompido, perplexo com a claridade do mundo, excitado com os tons
do desabrochar mundano.
Noite de lua cheia, corpo tá mais vivo. Música adentra como cheiro de terra molhada.
Anda pela rua balançando os braços como quem dança, conhece os contornos de sua
liberdade, vento no rosto. Quase sempre distraída, mas aberta pro encanto.
A mão que toca o cabelo cria aconchego cúmplice. A risada que corta o ar, caminho
interrompido. Não ensaiou pra essa cena, saberá se comportar? Vai no improviso, volta
outra, em si mesma.
Ele fechou os olhos e focou nos sons. E o que sentiu mesmo foi o cheiro. Não de mato.
O cheiro da memória. Ali, o de maconha. Durante muitas tardes, ainda adolescente, subiu
a serra para fumar acompanhado de amigos com os quais perdeu o contato. Foi ali também
que mencionou pela primeira vez com Ivana sobre se casarem. Nada planejado. Apenas
saiu. E teve a certeza de que era um caminho sem volta, estariam para sempre
interlaçados.
Sentia saudades da pessoa que fora um dia, porém não se lamentaria, não naquele
momento. Impediria que a melancolia borrasse suas lembranças. Não era mais o cara
amargurado de ontem. Agora, podia pegar seu carro e subir a serra com uma desconhecida
apenas para sentir a brisa, olhar a paisagem e comer algo gostoso durante a semana. Tinha,
depois de anos, a possibilidade de se reinventar.
Parou um pouco com seus devaneios e olhou para o lado. Joana estava de olhos fechados,
de certo sentindo a brisa trazer alguma lembrança, igual aconteceu com ele. Queria que
ela também pudesse se reinventar, deixando de ser a mulher sem graça e medrosa que
demonstrava. Todo mundo deveria ter esse direito. Apostava que por trás do rabo de
cavalo frouxo dela havia uma mulher solta e firme.
Hugo Bessa (@hugobessaescritor) nasceu em Volta Redonda (RJ), mas foi em Cruzeiro
(SP), onde cresceu e vive hoje, que descobriu sua paixão pelas histórias. É jornalista,
especialista em Língua Portuguesa, e atua na produção de conteúdo para comunicação
empresarial. Como escritor, já publicou os livros “Em Um Lugar Melhor” e “Todas as
Cores da Vida” e recentemente lançou “Por um momento, um dia, uma vida ou sei lá o
quê…” pela editora Penalux.
VERSEJADOR
A vida
é muito curta
Para não vivê-la
intensamente
Para estar
como quem mente
E ser
uma pessoa fajuta
quando nasci
o amor garantiu
que fôssemos eu e a realidade
uma coisa só
permitiu
que criasse o mundo
abrigasse tudo
a sorte de pedir e ter
(...)
o espaço e nos conduzimos ao abismo da matéria que se esvai e do planeta que sofre
[e
desintegra
EGO&MANIA
o som de um tambor
quebra a monotonia da manhã
o ego
assustado
precisa de um afago
BELEZA OCULTA
SEM ARMADURAS
o mundo precisa
de inofensividade e de cordura
o mundo precisa
de gente que caminhe pela rua
com a alma nua
a mente é a criadora
da ilusão do movimento
É noite na alma
e Sarah navega sobre o mar profundo
de dúvidas e culpas
MAGNUM OPUS
todos os poetas
(admirados – portentosos – ignorados ou desprezados)
todos os poetas fazem parte de uma espécie de seres muito estranhos
poetas sãos seres mutilados
pois para realizar a Magna Obra
não é suficiente poetizar oceanos
nem perseguir os voos dos urubus
nem misturar o sal o mercúrio e o enxofre
nem dançar entre as plantas de bambu
é necessário devastar o próprio coração desamparado
com o poder do veneno da cobra real
reerguer-se das sombras do mundo astral
e nutrir-se do coração do nada
Isabel Furini é escritora, poeta e palestrante. Autora de 35 livros, entre eles, Os corvos
de Van Gogh (poemas). É criadora do Projeto Poetizar o Mundo; recebeu Comenda
Ordem de Figueiró, no Rio de Janeiro; foi nomeada Embaixadora da Palavra pela
Fundação César Egido Serrano (Espanha, 2017); Seus poemas foram premiados no
Brasil, Espanha e Portugal, Palestrou sobre a arte de escrever em diversas Férias do Livro.
SELEÇÃO DE TEXTOS DE "BANZO E AFETOS", DE TEREZINHA
MALAQUIAS
Amor
Coração
Não
Dói.
Sangra
Quando
Não
Ama.
Quando
O
Amor
Chega
Ele
Atravessa
Sem
Sangrar
Ar
II
III
E ao fugir me encontravas,
Mas asinha logo singravas
Para tão longe de mim.
IV
VI
VII
VIII
Mas só há saudades
E quantas saudades
Volvem estas ravinas,
IX
XI
XII
XIII
XIV
A primeira vez que a vi, ela ainda estava inteira. É verdade que cobria ao máximo a sua
pele; usava uma blusa de mangas compridas e gola alta que não combinava nem um pouco
com o calor de Teresina. Os seus cabelos escondiam boa parte da sua face. Ela abraçava
a si mesma, os braços pressionados contra o peito, a postura acanhada, os olhos
semicerrados. Os lábios eram uma linha reta. Mas ela estava ali. Completa. O ônibus
parou e ela desceu, tão discreta, que acreditei ser a única passageira que notou sua
presença. Assombração que era.
Demorou algumas semanas para que a visse novamente. Dessa vez, um susto: havia
perdido uma de suas mãos. Não quero que me mal interpretem, sua mão não havia sido
amputada ou algo do tipo, ela apenas havia perdido a sua solidez, como se estivesse se
integrado ao ar — aterrorizante sublimação. Ocasionalmente seus olhos aflitos voltavam-
se para a mão ausente e eu me perguntava: “pode só ela vê-la e angustia-se porque
ninguém mais o faça?”
Depois, passou a andar por aí sem pernas. Era uma visão quase engraçada, um tronco
flutuante, como uma árvore mágica. Ela continuava cabisbaixa, nunca olhava para
ninguém e ninguém além de mim olhava para ela. Uma curiosidade tomou conta de mim.
Quem era ela? Para onde ela ia todos os dias? O que fazia da vida? Notei que nunca havia
ouvido ela falar uma coisa sequer. Me perguntei se sua voz também havia sido tirada dela.
Considerei dizer-lhe ‘olá’ só para vê se ela responderia.
Eu não lhe disse ‘olá’ e ela perdeu a cabeça. Seu pescoço era um pilar sem razão para
existir — arquitetura feita supérflua. E quanto mais ela desaparecia mais ela florescia em
mim. Queria segui-la, queria entendê-la, queria consumir o que restava dela. Não
importava por onde ela andava, eu estava sempre por perto. Mas nunca lhe dirigi uma
palavra. Não tinha coragem. Parecia que existíamos em dois mundos diferentes e eu tinha
medo de abrir a porta que me levaria ao dela. De ser trancada para sempre em seu mundo
insólito.
Um dia, ela sumiu completamente. Nunca soube seu nome, endereço, se tinha alguém em
sua vida. Acredito que não, ou ela estaria aqui, para ser vista. Mas do jeito que as coisas
aconteceram, jamais saberei se desistiu de sair de casa devido ao seu estado ou se vaga
por aí completamente invisível. Em momentos de dor, me perguntei se poderia tê-la
salvado do seu destino. Mas logo me convenci de que não havia nada que eu pudesse ter
feito. Afinal, a ciência é bem clara: não há tratamento para a invisibilidade. Agora, só sei
o que sinto: esse vazio no coração como se ele também estivesse me deixando, virando
um órgão translúcido, rarefeito dentro de mim.
* *
Agradecemos:
A Eva Wilma Rodas Ramalho e Fernando Antônio Ramalho de Amorim – pelo apoio de
sempre;
Contatos
---------------------------------------------------------------------------------------------------
Envie seu texto em formato word (letra Times 12), juntamente com sua minibio (num
mesmo arquivo word) para o nosso e-mail: revistasucuru@gmail.com. Responderemos o
mais breve possível.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
VIVA A SUCURU!
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
SSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
CCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCCC
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU
RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR
UUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU