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1 DESCRIÇÃO DO CASE
O Projeto de Lei nº 1363 de 2023 proibiu a pesca com fins comerciais no Estado
do Mato Grosso, desse modo, o cerne do debate incide sobre a possibilidade de ser conciliado
a proteção socioambiental e o modo de vida dos pescadores artesanais da região, além do
estudo acerca da legitimidade dos legisladores do Mato Grosso para propor o projeto de lei.
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Case apresentado à disciplina de Direito Ambiental do Centro Universitário Dom Bosco - UNDB.
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Aluna do 6° período da disciplina de Direito Ambiental.
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Professora, orientadora.
União caberá estabelecer normas gerais e, aos estados e municípios, a suplementação
(REYMAO; AGRASSAR; KOURY, 2020). Exposto isso e diante da previsão constitucional
para que estados possam legislar sobre a matéria pesca, é defendido que o PL n°1363/2023
observa a repartição de competências ambientais.
Diante dessa interpretação, Farias (2006) afirma que após o contexto da Segunda
Guerra Mundial o meio ambiente se tornou uma preocupação, porque surgiu a necessidade de
encontrar meios que tornassem compatíveis o desenvolvimento e a proteção ambiental. Além
disso, é também afirmado por Farias no que tange ao Princípio da Prevenção que
A recuperação de uma lesão ambiental é quando possível muito demorada e onerosa,
de forma que na maior parte das vezes somente a atuação preventiva pode ter
efetividade. São inúmeros os casos em que as catástrofes ambientais não têm
reparação e seus efeitos acabam sendo sentidos apenas pelas gerações futuras, o que
ressalta o dever de prevenção. De fato, é melhor para o meio ambiente que o dano
ambiental nunca ocorra do que ele ocorrer e ser recuperado depois.(2006, p. 135)
2.1.2 O projeto de lei não compatibiliza a proteção dos rios e a preservação de estoques
pesqueiros e o modo de vida tradicional e cultural de pescadores artesanais, além disso, os
legisladores do Mato Grosso não possuem competência legislativa ambiental para dispor
sobre a matéria.
Em que pese a competência para legislar sobre matéria ambiental seja
concorrente, ou seja, à União cabe estabelecer normas gerais e aos demais entes federativos a
suplementação, é defendido que o PL n° 1363/2023 não é constitucional, pois está em
desconformidade com a repartição de competências. Essa afirmação tem por base a Lei n° 11.
959 (BRASIL, 2009, online), que estabelece não somente a proteção ambiental com relação à
pesca e à agricultura, como também o objetivo de promover no Art. 1°, IV, “o
desenvolvimento socioeconômico, cultural e profissional dos que exercem a atividade
pesqueira, bem como de suas comunidades”.
Desse modo, através desse dispositivo legal, diante da contradição entre a norma
suplementar e a norma da União, é verificado o desrespeito à limitação estabelecida pela
competência concorrente, além de se constatar que a edição do projeto de lei não
compatibiliza o modo de vida dos pescadores artesanais, como busca promover na Lei n° 11.
959.
Além disso, ainda no que se refere à competência para legislar sobre pesca,
novamente se ressalta que não está no âmbito de abrangência da Assembleia Legislativa do
Mato Grosso, pois se trata de competência da União. Nesse sentido, a Lei 14.600 (BRASIL,
2023) traz que se trata de competência do Ministério da Pesca e da Agricultura, com relação à
pesca comercial, artesanal e industrial, o ato de conceder licenças, permissões e autorizações.
Dessa forma, é compreendido que o PL 1363/2023 não está conforme a Lei da União e, por
consequência, não sendo possível falar em competência concorrente.
Desse modo, a Lei n° 6938 (BRASIL, 1981) dispõe no Art. 4°, VII, a noção do
Princípio do Poluidor-Pagador, como sendo a ideia daquele que causar algum dano ambiental,
será responsabilizado por suas ações. Diante desse raciocínio, se o objetivo do PL 1363/2023
é estabelecer a prevenção de danos ambientais, esse ônus não pode recair sobre os pescadores
artesanais e as comunidades tradicionais da região, se não sobre os grandes empreendimentos
que são, em sua maioria, responsáveis por causar impactos significativos no meio ambiente.
É, assim, reiterado que o projeto de lei não concilia a proteção ambiental com os moradores
da região que dependem da pesca.
Nesse mesmo raciocínio, Farias (2006, p. 37) afirma: “o objetivo do princípio
do poluidor-pagador é forçar a iniciativa privada a internalizar os custos ambientais
gerados pela produção e pelo consumo na forma de degradação e de
escasseamento dos recursos ambientais”.
Nesse sentido, em que pese seja feita a previsão pelo projeto de lei do pagamento
de um salário-mínimo durante três anos, cabe ressaltar que a atividade pesqueira para as
comunidades da região não se trata somente da busca por um retorno financeiro, mas também
de um exercício de cultura pelas comunidades que ali habitam. Dessa forma, independente do
tipo de atividade pesqueira exercida, o conjunto de saberes compartilhados entre gerações é
um elemento que, além de ser responsável pela garantia de sobrevivência, é também cultural
(WAGNER; SILVA, 2021).
Sendo assim, diante do exposto, o PL não compatibiliza o modo de vida e
promoção da cultura local ao proibir a pesca comercial, por impedir o exercício da atividade
pesqueira e, por consequência, da cultura, afrontando, inclusive, o Art. 215 da Constituição
Federal (BRASIL, 1988, online) que coloca como dever do Estado garantir: “[...] a todos o
pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e
incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”. Diante disso, nota-se que
além de não ter competência para legislar sobre matéria de pesca, o estado do Mato Grosso
não compatibiliza o modo de vida e cultura dos pescadores artesanais e demais moradores da
região.
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