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O papel da colaboração família-escola no

desenvolvimento da aprendizagem de
crianças com transtorno de déficit de
atenção e hiperatividade

Todos nós já tivemos uma dessas experiências. Talvez tenha sido no


supermercado, vendo pais frustrados xingarem os filhos repetidamente e
implorar para "largar isso". Talvez fosse uma situação na escola, com uma
criança que parecia não conseguir ficar parada e estava sempre em movimento.
Talvez tenhamos notado uma criança que parece estar sempre sonhando
acordada na aula – o aluno que não se concentra em uma atividade por tempo
suficiente para terminá-la. Possivelmente a criança está entediada com uma
tarefa, aparentemente assim que ela começou, e deseja passar para outra coisa.
Todos nós ficamos confusos com esses comportamentos desafiadores.

O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) tem muitas faces e


continua sendo um dos assuntos mais comentados e polêmicos na educação.
Na balança de debates acalorados sobre medicamentos, métodos de
diagnóstico e opções de tratamento estão crianças, adolescentes e adultos que
devem controlar a doença e levar uma vida produtiva diariamente.

O TDAH é uma condição neurológica que envolve problemas de desatenção e


hiperatividade-impulsividade que são inconsistentes em termos de
desenvolvimento com a idade da criança. Agora estamos aprendendo que o
TDAH não é um distúrbio da atenção, como há muito se supunha. Em vez disso,
é função da falha de desenvolvimento nos circuitos do cérebro que monitoram
a inibição e o autocontrole. Essa perda de autorregulação prejudica outras
funções cerebrais importantes, cruciais para manter a atenção, incluindo a
capacidade de adiar recompensas imediatas para ganhos posteriores.

O comportamento de crianças com TDAH também pode incluir atividade


motora excessiva. O alto nível de energia e o comportamento subsequente são
frequentemente interpretados erroneamente como descumprimento proposital,
quando na verdade podem ser uma manifestação do transtorno e requerem
intervenções específicas. Crianças com TDAH apresentam uma variedade de
sintomas e níveis de gravidade. Além disso, muitas crianças com TDAH
geralmente têm inteligência pelo menos mediana e muitas características de
personalidade e pontos fortes individuais.
Crianças com TDAH geralmente apresentam comportamento classificado em
duas categorias principais: atenção insuficiente e hiperatividade-impulsividade.
Como resultado, três subtipos do transtorno foram propostos pela American
Psychiatric Association na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais (DSM-IV): predominantemente desatento,
predominantemente hiperativo-impulsivo e tipos combinados. Uma criança que
expressa hiperatividade geralmente parece irrequieta, tem dificuldade de
permanecer sentada ou brincar silenciosamente e age como se fosse
impulsionada por um motor.

As crianças que exibem impulsividade geralmente têm dificuldade para


participar de tarefas que exigem revezamento. Outros comportamentos comuns
podem incluir deixar escapar respostas a perguntas em vez de esperar para ser
chamado e pular de uma tarefa para outra sem terminar. O componente de
desatenção do TDAH afeta a experiência educacional dessas crianças porque o
TDAH faz com que elas tenham dificuldade em prestar atenção aos detalhes nas
direções, mantendo a atenção durante a tarefa e perdendo os itens necessários.
Essas crianças muitas vezes deixam de dar atenção aos detalhes, cometem erros
descuidados e evitam ou não gostam de tarefas que exigem esforço mental
constante.

Como o TDAH afeta o desempenho escolar?


A experiência escolar pode ser desafiadora para alunos com TDAH. Eles
geralmente são identificados apenas depois de demonstrar consistentemente
uma falha em compreender, seguir as regras ou concluir as tarefas exigidas.
Outros motivos comuns de encaminhamento incluem interrupções frequentes
na sala de aula e baixo desempenho acadêmico.

Estudos de Teixeira (2013) descobriram que alunos com TDAH, em comparação


com alunos sem TDAH, tinham dificuldades acadêmicas persistentes que
resultaram no seguinte: notas médias mais baixas, mais reprovações, mais
expulsões, maiores taxas de evasão e taxa mais baixa de conclusão de
graduação. O comportamento perturbador às vezes associado ao transtorno
pode tornar os alunos com TDAH mais suscetíveis a suspensões e expulsões.
Um estudo de Barkley (2002) descobriu que 46% do grupo de estudo de seus
alunos com TDAH foram suspensos e 11% foram expulsos.

Os principais sintomas do TDAH – desatenção, hiperatividade e impulsividade –


tornam desafiador enfrentar os rigores diários da escola. A dificuldade em
manter a atenção em uma tarefa pode contribuir para a perda de detalhes
importantes nas atribuições, sonhar acordado durante palestras e outras
atividades e dificuldade em organizar as atribuições. A hiperatividade pode ser
expressa em interrupções verbais ou físicas na aula. A impulsividade pode levar
a erros descuidados, respondendo a perguntas sem formular totalmente as
melhores respostas e apenas atendendo a atividades que são divertidas ou
novas. No geral, alunos com TDAH podem ter mais problemas com o
desempenho escolar do que seus colegas sem deficiência.

Numerosos estudos descobriram que resultados positivos ocorrem quando as


principais partes interessadas na educação de um aluno colaboram para lidar
com o TDAH de uma criança. A colaboração e a comunicação eficazes entre a
casa e a escola fornecem estrutura nos dois ambientes principais da vida da
criança. Recompensas comuns, estratégias de reforço e linguagem ajudam a
promover a consistência entre os ambientes (Silva, 2021).

Barros, Costa e Gomes (2021) relataram que as parcerias colaborativas entre a


casa e a escola foram especialmente importantes durante a avaliação inicial da
deficiência da criança e das necessidades educacionais, o desenvolvimento de
planos de modificação de comportamento, as avaliações de medicamentos e a
coordenação de atribuições. Pais e professores podem compartilhar
informações se trabalharem juntos para planejar estratégias comportamentais e
acadêmicas para o aluno.

Os pais podem oferecer informações sobre a criança – incluindo o histórico


médico da criança, hobbies e interesses, reforçadores eficazes de
comportamento em outros ambientes – que podem informar as decisões
tomadas pelo professor e outros membros da equipe pedagógica. O professor
pode manter os pais informados sobre o progresso, desempenho e
comportamento de seus filhos na escola. Para Rodrigues, Sousa e Carmo (2010),
se a criança está tomando medicamentos, o professor pode
oferecer feedback aos pais sobre como o medicamento afeta o desempenho e a
duração da eficácia do medicamento. Essas informações também podem ser
usadas para ajudar os profissionais médicos a tomar decisões mais informadas
sobre a criança com TDAH.

Se uma criança exibe comportamento perturbador ou agressivo, a pesquisa de


melhores práticas indica que a criança pode se beneficiar de um plano de
intervenção comportamental positivo que delineia claramente as expectativas e
inclui apoios positivos. O processo para desenvolver um plano eficaz deve ser
colaborativo e envolver os pais e outras pessoas que estão mais familiarizadas
com a criança.

Os alunos também podem assumir parte da responsabilidade por suas


adaptações educacionais e comportamentais. Condemarín, Gorostegui e Milicic
(2006) relataram que alunos a partir dos cinco anos de idade podem comunicar
maneiras de tornar sua experiência escolar mais prazerosa e o aprendizado mais
fácil. A contribuição do aluno também ajuda a promover senso de propriedade
e responsabilidade pelas novas estratégias e adaptações.

Colaboração família-escola
O estudo de Luizão e Scicchitano (2014) sobre o envolvimento dos pais na
educação dos filhos define essa colaboração com base em vários indicadores,
que vão desde as expectativas dos pais pelo sucesso da criança até a
participação deles nas atividades escolares, incluindo seus valores educacionais.
Os pais podem se envolver na educação de seus filhos de várias maneiras, o que
torna o envolvimento dos pais com a escola um conceito multidimensional.
Conforme Florêncio (2020), esse envolvimento contribui para o sucesso
acadêmico da criança. Por exemplo, crianças com as quais os pais estão mais
engajados têm melhor desempenho acadêmico, têm atitude mais positiva em
relação à escola, melhores habilidades de autorregulação e exibem menos
problemas de disciplina.

Teixeira (2013) examina um componente específico do envolvimento dos pais


na escola: a colaboração família-escola. Isso envolve trocas e compartilhamento
de responsabilidades com o objetivo de vincular os contextos de aprendizagem
da criança a fim de facilitar sua aprendizagem e seu desenvolvimento geral.
Essencialmente, a colaboração família-escola é definida e operacionalizada pela
frequência e qualidade do contato entre família e escola. De acordo com
Barkley (2002), ela é medida pela frequência de contato dos pais com a escola e
pelo sentimento que os pais e a professora têm em colaboração. Pais e
professores têm percepções diferentes sobre o envolvimento dos pais na escola,
mas ambos dizem que sua colaboração é essencial para o sucesso acadêmico
da criança.

Silva (2021) mostra que a colaboração família-escola contribui para o sucesso


acadêmico das crianças. Ele, ao acompanhar crianças da Educação Infantil ao 3º
ano do Ensino Fundamental, observou que a frequência e a qualidade do
contato entre a escola e os pais, as atividades de aprendizagem em casa sob
orientação dos pais e o envolvimento dos pais nas atividades escolares são
positivamente associados ao desempenho escolar das crianças. A colaboração
família-escola no 1º e 2º anos também é um preditor de resultados acadêmicos
no 3º ano, além dos resultados no 1º ano.

Barros, Costa e Gomes (2021) confirmam que, quanto mais o pai participa das
atividades escolares, melhor é o desempenho da criança na leitura, menos ela
repete o ano escolar ou frequenta programas especiais (entre 6 e 14 anos, de
acordo com os termos da pesquisa), além do efeito da idade e sexo da criança,
renda familiar, escolaridade dos pais e participação em programa de pré-escola.
Rodrigues, Sousa e Carmo (2010) observam, no entanto, que a frequência das
comunicações entre professores e pais é maior para as crianças que apresentam
mais dificuldades. Em seu estudo, eles indicam que as expectativas dos pais em
relação à educação de seus filhos são um preditor do sucesso de seus filhos e
que o contato entre os pais e a escola contribui para isso. Concluem que é
fundamental definir operacionalmente as dimensões do envolvimento dos pais
na escola estudadas e, dado o seu papel distinto no sucesso, essas dimensões
devem ser consideradas individualmente nos estudos.

Embora saibamos que a colaboração família-escola conduz ao sucesso


acadêmico e que algumas crianças têm mais dificuldade na escola, não sabemos
se a colaboração família-escola traz os mesmos benefícios para todos. Segundo
Condemarín, Gorostegui e Milicic (2006), constituiria um fator de proteção para
as crianças em maior risco, ou seja, teria influência positiva mais forte para as
crianças desfavorecidas social e economicamente. Eles mostram a presença da
interação entre a colaboração família-escola (ou seja, participação em reuniões
ou atividades na escola e aprendizagem em casa, comunicação com a escola e
com outros pais) e a educação da mãe, indicando que a colaboração tem
vínculo positivo mais forte com a alfabetização de crianças com mães menos
escolarizadas da Educação Infantil ao 5º ano do Ensino Fundamental.

No entanto, Luizão e Scicchitano (2014) observam que as dificuldades da


criança constituem uma barreira para a colaboração família-escola. De fato, o
aumento da frequência de contato em tempos de crise e a tradição de
culpabilização que prevalece em algumas escolas interferem negativamente no
estabelecimento da colaboração família-escola. Para Florêncio (2020), estudos
têm mostrado que os pais participam de mais atividades na escola quando as
coisas estão indo bem, enquanto o professor busca contato com os pais
quando as coisas não estão bem. Outros estudos indicam que os funcionários
da escola tendem a responsabilizar os pais pelos problemas apresentados pelas
crianças na escola, que eles chamam de tradição da culpa.

Consequentemente, pais e professores de uma criança em dificuldade relatam


sentir-se desconfortáveis um com o outro, não tendo a mesma percepção dos
problemas da criança e ambos percebendo que o outro é responsável por “agir
para resolver o problema”. Finalmente, a baixa frequência dos pais na escola é
vista como apatia e desinteresse. Tudo isso explicaria que os pais de crianças
em risco antecipam uma interação negativa quando contatados pela escola e
relatam um sentimento de isolamento social e frustração devido à falta de
apoio recebido da escola e de profissionais de saúde.
Considerações
A colaboração família-escola é representada pela frequência de contato entre
esses parceiros, bem como pelo sentimento de que podem colaborar juntos.
Essa abordagem responde à recomendação de certos autores para
complementar a medição da frequência de contatos com uma medição da
qualidade do relacionamento. Em primeiro lugar, as análises descrevem a
colaboração entre escola e família. Embora pais e professores geralmente
tenham uma visão positiva de sua colaboração, eles raramente entram em
contato – menos de uma vez por mês, em média.

No acompanhamento de crianças com TDAH, a colaboração família-escola está


correlacionada ao desempenho acadêmico do aluno. Quanto mais o professor
sente que os pais desejam colaborar com ele, ou seja, que tem interesse em
conhecê-lo e que compartilhem seus valores e objetivos, mais o aluno realiza
um trabalho de qualidade e produz grande volume de trabalho. Além disso,
quanto mais os pais estão presentes na escola, mais a criança tende a oferecer
um trabalho de qualidade. Por outro lado, quanto mais o professor tenta se
comunicar com os pais do aluno, menos o aluno realiza um trabalho de
qualidade.

A literatura revisada também mostra que a relação positiva entre (1) o contato
pais-escola e a produtividade acadêmica e (2) o sentimento do professor de
poder colaborar com os pais e a qualidade do trabalho realizado tende a ser
mais fortemente positiva para as crianças que apresentam manifestações de
hiperatividade-impulsividade do que aquelas com apenas manifestações de
desatenção, ou seja, para crianças que apresentam dificuldades mais manifestas
e externalizadas.

A percepção dos pais de poder colaborar com o professor não está associada
ao desempenho escolar da criança. Esse entendimento não significa que não
seja importante, embora não preveja o desempenho escolar da criança. De fato,
a percepção dos pais é importante por várias razões, a montante do sucesso
acadêmico. Por exemplo, um pai que se sente considerado pelos funcionários
da escola, que é convidado a compartilhar seu ponto de vista e a participar de
diferentes atividades tenderá a se envolver mais na educação da criança. Ele
pode fazer isso em casa ou na escola, por exemplo, acompanhando os
resultados e fazendo o dever de casa. Além disso, se sentir que sua presença é
valorizada e se sentir respeitado e bem-vindo na escola, vai querer estar
presente nesse ambiente e colaborar com sua equipe.

Referências
BARKLEY, Russell A. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Porto
Alegre: Artmed, 2002.

BARROS, Claudia Araújo Urbano; COSTA, Elizete Brito da Silva; GOMES, Vanessa
Souza do Sacramento. Dificuldades de aprendizagem de crianças com TDAH
nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Revista Educação Pública, v. 21, nº 8, 9
de março de 2021. Disponível em:
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/3/dificuldades-de-
aprendizagem-de-criancas-com-tdah-nas-series-iniciais-do-ensino-
fundamental. Acesso em: 05 jan. 2021.

CONDEMARÍN, Mabel. GOROSTEGUI, Maíra Helena. MILICIC, Neva. Transtorno


do déficit de atenção: estratégias para o diagnóstico a intervenção
psicoeducativa. São Paulo: Planeta do Brasil, 2006.

FLORÊNCIO, Israelly Barbosa. Educação Infantil e dificuldades de aprendizagem:


a hiperatividade trabalhada por meio de estratégias de ensino. Revista Educação
Pública, v. 20, nº 25, 7 de julho de 2020. Disponível em:
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/25/educacao-infantil-e-
dificuldades-de-aprendizagem-a-hiperatividade-trabalhada-por-meio-de-
estrategias-de-ensino. Acesso em: 07 jan. 2021.

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