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DECISÃO

O Ministério Público do Estado da Paraíba ofereceu denúncia em face de


HENRIQUE MACIEL DA SILVA, pela prática, em tese, da conduta prevista no
artigo 12 da Lei 10.826/2003.

Para esse fim, alega que o acusado sem autorização, ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, possuía munição, de uso permitido, no interior
da sua residência, constando, para tanto, no inquérito polícial que instrui a presente
denúncia que em 23/03/2021, após minuciosa busca, os policiais encontraram 03
munições do calibre .38 no domicilio do acusado, desacompanhadas da arma.

Verifica-se que o parquet cumpriu com os requisitos dos artigos 24 e 41 do Código de


Processo Penal, uma vez que narrou de forma narrando de forma peremptória o fato
criminoso, indicando a tipicidade legal dos delitos, individualizando o acusado, e
arrolando testemunhas.

Todavia, apesar da conduta do acusado mostrar-se formalmente típica, nos termos do


artigo 12 da Lei 10.826/2003, não se mostra típica em sua dimensão material. Isto
porque não se faz possível vislumbrar, ante as circunstâncias constantes na denúncia,
condição que exponha o corpo social a perigo, em razão de as 03 munições
apreendidas, na situação em exame, sendo mister frisar novamente, que estas
encontravam-se na residência do acusado e desacompanhada de arma de fogo, que
por si só, é incapaz de provocar qualquer lesão ao bem jurídico tutelado no tipo (a
incolumidade pública).

Faz-se oportuno citar que o Supremo Tribunal Federal passou a admitir a aplicação
do princípio da insignificância em hipóteses excepcionalíssimas, quando apreendidas
pequenas quantidades de munições e desde que desacompanhadas da arma de fogo
(RHC n. 143.449/MS, Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe
9/10/2017).

No mesmo sentido: AgRg no HC n. 439.593/MG, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta


Turma, DJe 1º/2/2019.
Na mesma linha da jurisprudência do STF, a Quinta Turma do Superior Tribunal de
Justiça tem entendido que o simples fato de os cartuchos apreendidos estarem
desacompanhados da respectiva arma de fogo não implica, por si só, a atipicidade da
conduta, de maneira que as peculiaridades do caso concreto devem ser analisadas a
fim de se aferir: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a ausência de
periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento; e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada. Nesse sentido:

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.


POSSE DE MUNIÇÕES. ART. 12 DA LEI N. 10.826/2003.
AUSÊNCIA DE ARMA. IRRELEVÂNCIA. CRIME DE PERIGO
ABSTRATO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. POSSIBILIDADE. PEQUENA
QUANTIDADE DE MUNIÇÃO. AUSÊNCIA DE ARTEFATO.
PRECEDENTES DO STF E DO STJ. POSSE DE PEQUENA
QUANTIDADE DE MUNIÇÃO DESACOMPANHADA DE ARMA.
INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça firmou-se
no sentido de que o crime de posse ou porte irregular de munição de uso
permitido, independentemente da quantidade, e ainda que
desacompanhada da respectiva arma de fogo, é delito de perigo abstrato,
sendo punido antes mesmo que represente qualquer lesão ou perigo
concreto de lesão, não havendo que se falar em atipicidade material da
conduta (AgRg no RHC n. 86.862/SP, Relator Ministro FELIX
FISCHER, Quinta Turma, julgado em 20/2/2018, DJe 28/2/2018). 2.
Contudo, o Supremo Tribunal Federal, analisando as circunstâncias do
caso concreto, reconheceu ser possível aplicar o princípio da
insignificância na hipótese de apreensão de quantidade pequena de
munição de uso permitido desacompanhada de arma de fogo, tendo
concluído pela total inexistência de perigo à incolumidade pública (RHC
n. 143.449/MS, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda
Turma, DJe 9/10/2017; HC n. 154390, Rel. Min. DIAS TOFFOLI,
Segunda Turma, julgado em 17/4/2018, DJe 7/5/2018). Nesse mesmo
sentido, ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte
Superior passaram a reconhecer a atipicidade da conduta perpetrada por
agente, pela incidência do princípio da insignificância, diante da ausência
de afetação do bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. 3.
No presente caso, foram apreendidas 1 munição tipo cartucho, já
deflagrado e vazio, marca CBC, modelo auto, calibre 380, bem como 2
munições tipo cartuchos intactos, marca CBC, modelo s.p.l., calibre .38,
desacompanhadas de dispositivo que possibilitasse o disparo do projétil.
Assim, reconhecida a inocorrência de ofensa à incolumidade pública, deve
ser afastada a tipicidade material do fato, conquanto seja a conduta
formalmente típica. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp
1.839.290/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA,
QUINTA TURMA, DJe 19/12/2019).

Na hipótese da denúncia, entendo que a conduta do acusado não resultou em dano


ou perigo concreto relevante para a sociedade, de modo a lesionar ou colocar em
perigo bem jurídico na intensidade reclamada pelo princípio da ofensividade.

Outrossim, não se há subestimar a natureza subsidiária, fragmentária do direito penal,


que somente deve ser acionado quando outros ramos do direito não forem suficientes
para proteção dos bens jurídicos envolvidos.

Deste modo, inexistindo, no caso concreto, ofensividade da conduta ao bem jurídico


tutelado pelo tipo penal constante na denúncia, não há que se falar em fato típico, e,
por conseguinte, em crime.

Isto posto e considerando o mais que dos autos consta, com fundamento no art. 395,
II, do Código de Processo Penal, aplicando-se o princípio da insignificância, nos
termos da jurisprudência dos Tribunais Superiores, não constituindo o fato descrito
qualquer ilícito penal, rejeito a denúncia ora ofertada pelo Ministério Público do
Estado da Paraíba.

Fazendo-se as comunicações de praxe, intime-se o DD. Promotor de Justiça e dê-se


ciência, em razão do interesse processual, ao autor do fato.

Preclusa a Decisão, oportunamente, arquive-se.

Campina Grande, 18 de Junho de 2023.

Juiz de Direito

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