Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
e tratamento
UNIDADE 2 TRATAMENTO DA SÍFILIS
Por mais de quatro séculos, várias medidas e drogas foram utilizadas para o tratamento
da sífilis até o descobrimento daquela que mudou o destino dessa enfermidade: a penici-
lina. Dentre os tratamentos utilizados anteriormente, mesmo sem segurança de resposta
clínica e apesar dos muitos efeitos colaterais, destacaram-se o mercúrio, o guayaco, os
iodetos e o bismuto. Em 1910, com a descoberta do salvarsan, as pessoas passaram a
dispor de um medicamento de elevada atividade sobre o Treponema pallidum. Em 1943,
a penicilina passou a ocupar a primeira opção terapêutica e assim se mantém até a atu-
alidade. A utilização de antibióticos alternativos deve ser considerada apenas quando o
tratamento com penicilina não é possível ou é absolutamente contraindicado.
• Situação 2: pacientes com 1 teste para sífilis positivo (teste treponêmico ou teste não
treponêmico), independentemente de apresentar ou não sintomatologia sugestiva
e que se apresentem numa das situações listadas a seguir:
• Gestantes
Muitas pessoas com infecções sexualmente transmissíveis (IST) não buscam tratamento
porque são assintomáticas (a maioria) ou têm sinais e sintomas leves e não percebem
as alterações. As pessoas sintomáticas podem preferir tratar-se por conta própria ou
procurar tratamento em farmácias ou outras alternativas. Mesmo aqueles que buscam
atendimento na unidade de saúde podem não ter uma IST corretamente diagnosticada
ou tratada. No final, apenas uma pequena proporção de pessoas com IST pode chegar
à cura e evitar a infecção de suas parceiras sexuais.
Para que se interrompa a cadeia de transmissão das IST, é fundamental que os conta-
tos sexuais das pessoas infectadas sejam tratados. Portanto, essa informação deve ser
repassada à pessoa com IST ao mesmo tempo que se fornecem instrumentos para comu-
nicação e todo apoio até o final do processo. Como vimos na história do Freddy, ele tra-
balha como vendedor em um shopping center, porém, ocasionalmente, atua como traba-
lhador do sexo, e às vezes não usa preservativo durante a prática sexual. Vamos conferir
no infográfico interativo “Siga o LUES” como ocorre esse acordo consensual entre Freddy
e o seu cliente?
Como vimos no infográfico interativo “Siga o LUES”, Freddy referiu-se à prática de rela-
ções sexuais sem preservativos, e isso impacta diretamente na cadeia de transmissão da
sífilis. Mais adiante, durante uma consulta na USF Novo Mundo, Freddy será orientado
quanto ao cuidado necessário com relação às suas parcerias sexuais.
Figura 1 - “Old Photograph Sir Alexander Fleming Scotland” by Tour Scotland Photographs is
licensed under CC BY-NC-ND 2.0
Em 1943, Mahoney mostrou que a penicilina agia em todos os estágios da sífilis. A sen-
sibilidade do Treponema pallidum à droga e a rapidez da resposta com regressão das
lesões primárias e secundárias com apenas uma dose são vantagens que permane-
cem até hoje. A concentração sanguínea eficaz deverá ser mantida por maior tempo
que o da divisão do treponema.
a) Reações às penicilinas
• Reação de Jarisch-Herxheimer
É importante informar sobre esse evento para as pessoas que receberem prescrições de
penicilina, diante da possibilidade diagnóstica de sífilis, para que seja estabelecida a dife-
renciação com quadros de alergia à penicilina, que se caracterizam por urticária e exante-
ma pruriginoso. Nas gestantes, essa reação, mesmo que pouco frequente, pode precipitar
a ocorrência de parto prematuro ou sofrimento fetal em consequência da alta liberação de
prostaglandinas, e isso deve ser informado também a essa parcela da população.
• Reação alérgica
http://www.cofen.gov.br/decisao-cofen-
-no-00942015_32935.html
http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2017/06/
NOTA-T%C3%89CNICA-COFEN-CTLN-N%C2%B0-03-2017.pdf.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/acolhimento_
demanda_espontanea_queixas_comuns_cab28v2.pdf
http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2015/
Relatorio_Penicilina_SifilisCongenita_CP.pdf
Após vinte anos da descoberta da penicilina, surgiu a doxiciclina, que foi incorporada aos
esquemas de tratamento da sífilis, especialmente para os pacientes com impossibilidade
de utilizar a penicilina. No entanto, é contraindicada para uso em gestantes. O uso de
silicone (prótese ou silicone líquido industrial) em região de glúteos e membros inferiores
é uma das causas de impedimento da aplicação intramuscular de Penicilina G Benzatina,
sendo, assim, recomendado o uso da doxiciclina como medicação alternativa por via oral.
No início da década de 1980, foi apresentada a ceftriaxona como droga de eficácia simi-
lar à penicilina e como tratamento alternativo. A ceftriaxona demonstrou eficácia seme-
lhante à da penicilina em todas as etapas de apresentação da doença, embora os dados
sejam restritos a estudos observacionais. Apresenta boa penetração no SNC e é uma
opção para o tratamento da neurossífilis em adultos não gestantes com alergia à penici-
lina, nos quais a dessensibilização não é possível.
Caro(a) cursista, na versão do PCDT-IST 2020, foi definida uma mudança na classificação
clínica da sífilis. Em PCDT-IST 2019, o Ministério da Saúde seguia a classificação da OMS
(Organização Mundial da Saúde), que considerava a evolução de 2 anos para sífilis recen-
te. A partir dessa nova revisão do PCDT-IST, passa a seguir classificação adotada pelo CDC
(Centers for Disease Control and Prevention) e outros protocolos internacionais, em que o
período de evolução para sífilis recente fica restrito a um ano de evolução.
No momento, iremos focar no tratamento da sífilis recente, isto é, com até 1 ano de evo-
lução, e iremos contemplar as formas primária, secundária e latente recente.
Músculo da face
Músculo Dorso-glúteo ântero-lateral da coxa Músculo ventro-glútuca
Voltando ao caso do Freddy, após muito pensar, ele resolveu buscar atendimento na USF
Novo Mundo. O Dr. Ivan e a residente médica, Roberta, realizaram o seu acolhimento, e,
com o Freddy, foi decidida a intervenção.
Após conversar com o Freddy e ele concordar, foi decidido que o tratamento, após o
diagnóstico de sífilis recente, seria realizado com Benzilpenicilina benzatina na dose de
2,4 milhões UI, via intramuscular, dose única, a ser administrado 1,2 milhão UI em cada
glúteo. Confira, na tabela a seguir, de forma resumida, o tratamento para sífilis recente.
Alternativa
Estadiamento Esquema terapêutico
(exceto para gestantes)
Benzilpenicilina benzatina
Sífilis recente: sífilis primária,
2,4 milhões Doxiciclina 100mg, de 12/12h,
secundária e latente recente
UI, IM, dose única VO, por 15 dias
(com até um ano de evolução)
(1,2 milhão UI em cada glúteo)
No tratamento da sífilis tardia, isto é, com mais de um 1 ano de evolução, serão contem-
pladas as formas latente tardia, latente com duração ignorada e sífilis terciária. Como a
infecção pelo Treponema pallidum pode não apresentar qualquer sinal ou sintoma, ou o
paciente pode não perceber os sinais e sintomas, é muito provável que um exame posi-
tivo (reagente) para sífilis em pessoa assintomática seja um caso de sífilis tardia (latente
tardia, latente com duração ignorada ou sífilis terciária) e assim deve ser tratada como
tal. No entanto, caso a pessoa tenha um exame negativo (não reagente) há um ano ou
menos, deve-se considerar como caso de sífilis recente.
O intervalo recomendado entre as doses é de 7 dias (uma semana), com uma margem
de até 7 dias de atraso. Assim, caso esse intervalo ultrapasse 14 dias, o esquema deve
ser reiniciado por completo. Para possibilitar mais chance de realização do tratamento
completo, é muito importante que seja explicado ao paciente a importância da realização
das 3 doses de penicilina. Ademais, esse tratamento deve ser acompanhado de perto
pela equipe de atenção primária. Caso o paciente não compareça à unidade de saú-
de para tratamento das doses subsequentes, cabe realizar busca ativa para que
essa pessoa não perca a chance de completar esse tratamento e assim haja cura
da infecção e quebra da cadeia de transmissão da sífilis. Isso é especialmente impor-
tante no caso de gestantes e parcerias sexuais das gestantes para diminuir o risco de
transmissão vertical da sífilis.
Pois bem, caro(a) cursista, vamos pensar sifiliticamente também no século XXI?? Acompa-
nhe, a seguir, o manejo de um caso bem interessante.
Após busca ativa, pelo agente comunitário de saúde, o paciente retornou no dia 10 de
setembro, sendo realizada a segunda dose nesse dia, ou seja, com 2 dias de atraso. A ter-
ceira dose foi reagendada para o dia 17 de setembro, com possibilidade de ser aplicada até
dia 24 de setembro. Mas, caso o paciente não tivesse sido localizado, e não tivesse vindo
no dia 10 de setembro, e só comparecesse à unidade de saúde no dia 16 de setembro com
desejo de aplicar a segunda dose de penicilina, qual a conduta a ser adotada? O que fazer?
Pois bem, caro(a) cursista, esse caso seria considerado como perda do tratamento, sendo
necessário reiniciar o esquema, com 3 doses, com primeira dose prevista para o dia 16 de
setembro; segunda dose, dia 23 de setembro; e terceira dose, dia 30 de setembro.
Vejamos, na tabela a seguir, como proceder no tratamento da sífilis tardia (latente tar-
dia, latente com duração ignorada e sífilis terciária), observando o estadiamento da
doença e o esquema terapêutico a ser adotado. Você pode compartilhar esse conheci-
mento com sua equipe e também discutir as melhores opções a serem adotadas nos
casos mais complexos.
Alternativa
Estadiamento Esquema terapêutico
(exceto para gestantes)
Benzilpenicilina benzatina
2,4 milhões
Sífilis recente: sífilis primária, UI, IM, 1x/semana
(1,2 milhão UI em cada glúteo) Doxiciclina 100mg, de 12/12h,
secundária e latente recente
por 3 semanas. VO, por 30 dias
(com até um ano de evolução)
Tratamento da neurossífilis
O tratamento de neurossífilis contempla os quadros de sífilis que apresentam compro-
metimento do sistema nervoso central (SNC) pelo Treponema pallidum. Nesse caso, tam-
bém se enquadra a sífilis com comprometimento ocular.
O envolvimento do SNC pode ocorrer em qualquer estágio da sífilis, isso inclui o acome-
timento ocular. O comprometimento do SNC acompanhado de manifestações clínicas
eram comuns, na sífilis terciária, antes do uso de antibióticos. Entretanto, com a era anti-
biótica, a apresentação clínica sofreu alterações, com predominância de quadros oligos-
sintomáticos e atípicos. O diagnóstico de neurossífilis é um desafio e necessita de corre-
lação com achados clínicos, alterações de líquido cefalorraquidiano (LCR) e o resultado
de VDRL no LCR.
O(A) profissional de saúde deve ficar atento(a) para possíveis sinais e sintomas oculares e
neurológicos, principalmente em pessoas vivendo com HIV (PVHIV). Caso um(a) profissio-
nal da atenção primária identifique um paciente com suspeita de neurossífilis, a punção
lombar para investigação não deve ser postergada e, se necessário, deve-se realizar o
encaminhamento para o especialista.
Casos que apresentem VDRL não reagentes no LCR, com alterações bioquímicas no LCR
E
desde que os achados não possam ser explicados por outra doença
Quanto ao curso clínico de sífilis, ele pode ser um pouco diferente em casos de coinfecção
com HIV, com manifestações atípicas ou mais severas, em especial, com uma predispo-
sição para o desenvolvimento de lesões oftálmicas e neurológicas. Então, as PVHIV com
diagnóstico de sífilis devem passar por um exame neurológico minucioso, e, em suspeita
de algum comprometimento ocular ou SNC, devem ser encaminhadas, sem demora, para
investigação com punção lombar e encaminhamento para especialista.
Mesmo com esse cuidado para neurossífilis, não foi verificado benefício da realização
rotineira de punção lombar em casos de sífilis em PVHIV assintomáticas. O tratamento da
sífilis em PVHIV deve ser realizado de acordo com a fase clínica da sífilis.
COHEN, M. S. When people with HIV get syphilis: triple jeopardy. Sex. Transm. Dis., [S.
l.], v. 33, n. 3, p. 149-150, 2006.
JARNIER, M.; HEGYI, V.; DUPIN, N.; UNEMO, M.; TIPLICA, G. S.; POTOČNIK, M.; FRENCH,
P.; PATEL, R. European guideline on the management of syphilis. J Eur Acad Dermatol
Venereol, [S. l.], vol. 28, n. 12, p. 1581-1593, dez. 2014. DOI: 10.1111/jdv.12734.
KINGSTON, M.; FRENCH, P.; HIGGINS, S.; MCQUILLAN, O.; SUKTHANKAR, A.; STOTT, C.;
MCBRIEN, B.; TIPPLE, C.; TURNER, A.; SULLIVAN, A. K. UK national guidelines on the
management of syphilis 2015. Int J STD AIDS, [S. l.], vol. 27, n. 6, p. 421-426, maio 2016.
PEELING, R. W. et al. Syphilis. Nat. Em. Dis. Primers., [S. l.], v. 3, n. 17073, 12 out. 2017.
WORKOWSKI, K. A.; BOLAN, G. A. Centers for Disease Control and Prevention. Sexually
transmitted diseases treatment guidelines, 2015. MMWR Recomm Rep, [S. l.], vol. 64, n.
03, p. 1-137, jun. 2015.