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MICROBIOLOGIA ORAL – AVA1

1 Introdução ao estudo da microbiota bucal


Durante e imediatamente após o nascimento, o recém-nascido entra em contato
com os microrganismos presentes no ambiente próximo. Contudo, a cavidade oral é
considerada estéril ao nascimento. A quantidade de organismos detectáveis na
cavidade oral aumenta rapidamente, começando mais ou menos 8 horas após
nascimento. A microbiota precoce varia e é relativamente simples, mas inclui
estreptococos, lactobacilos, estafilococos, Veillonella, Neisseria e coliformes.
Os estreptococos são formas dominantes (denotadamente acima de 80% das formas
recuperáveis) em recém-nascidos. Estes, particularmente incluem S. salivarius, S.
oralis e S. mitis, e os estreptococos do grupo B. As leveduras também estão presentes
logo após o nascimento e são encontradas em mais de 44% dos lactentes, em mais ou
menos 6 meses depois do nascimento. Candida albicans e C. parapsilosis parecem ser
as espécies dominantes. Os streptococos sanguis têm uma idade média de colonização
de cerca de 9 meses. Isto se correlaciona com o tempo de erupção dos dentes.
As bactérias anaeróbias também se estabelecem precocemente. Perto de 2
meses de idade, Veillonella spp., Actinomyces spp. e Prevotellla melaninogenica estão
presentes em mais de 10% da população e, por volta dos 6 meses de idade,
a Fusobacterium nucleatum, a Prevotella spp. não-pigmentada, a Porphyromonas
catoniae e a Leptotrichia spp. estão presentes. Perto dos 12 meses de idade,
a Capnocytophaga spp., outras fusobacterias e bastonetes oxidantes estão presentes.
A Prevotella intermedia e a Clostridium, a Eubacterium, e a Selenomonas spp. também
se apresentam por volta dos 12 meses de idade, embora com menor frequência. Em
crianças novas com dentição decídua, uma variedade de microrganismos pode ser
encontrada, incluindo espécies de Streptococcus, Peptostreptococcus, Bacteroides,
Prevotella, Porphyromonas, Selenomonas, Capnocytophaga, Campylobacter,
Fusobacterium e Gemella.
Os tipos predominantes variam com a localização. As amostras em crianças com
dentição mista são similares àquelas associadas à dentição decídua, mas uma
variedade de espécies representando os vários gêneros está presente. As alterações na
microbiota estão associadas a vários estados de doenças, incluindo cárie e
periodontite.
Conforme os dentes são esfoliados, as espiroquetas, algumas cepas
estreptocócicas e os lactobacilos são reduzidos, frequentemente em níveis
indetectáveis, como são os patógenos periodontais, tais como Actinobacillus
astinomycetemcomitans e Porphyromonas gingivalis. Em indivíduos edêntulos sem
próteses, algumas espécies de estreptococos, espiroquetas e leveduras são reduzidas
ou virtualmente eliminadas, embora elas retornem aos níveis próximos da pré-extração
após a colocação de próteses.
Em geral, os fatores que influenciam o desenvolvimento da flora incluem a frequência
de introdução, as condições nutricionais e físico-químicas na hora da introdução e a
natureza de qualquer microbiota existente. O ambiente do recém-nascido tende
a favorecer microrganismos tolerantes ao oxigênio, mas conforme aparecem locais com
condições mais anaeróbias, o número de anaeróbicos aumenta. Além disso, os aeróbios
podem se alimentar do oxigênio, facilitando o crescimento de anaeróbicos.
Similarmente, os microrganismos que se aderem aos tecidos duros se tornam
estabelecidos depois daqueles que favorecem os tecidos moles.

Observação: Todos os vários fatores relatados e as interações microbianas são


importantes no desenvolvimento e na regulação da flora durante toda a vida.
2 Microbiota bucal
Uma vez estabelecida, a microbiota oral continua relativamente constante. Como
indicado, com a erupção ou perda dos dentes, os microambientes associados a estas
estruturas aparecem ou desaparecem e os organismos associados a eles mudam, tanto
em número como em proporção. Similarmente, como as doenças aparecem e
desaparecem, as floras associadas mudam. Com o aparecimento da cárie e da doença
periodontal, os microrganismos associados a elas mudam o número e a proporção da
flora. As alterações na flora também podem ocorrer com alterações fisiológicas, tal
como gravidez. As alterações hormonais associadas à gravidez podem afetar não só as
citocinas teciduais, mas também o crescimento de certas espécies microbianas. Várias
condições de doenças, drogas e até o envelhecimento podem mudar a flora, alternando
o ritmo do fluxo, a composição da saliva e os níveis e a atividade dos componentes de
defesa, tal como as imunoglobulinas.

2.1 Saliva
A saliva é provavelmente um dos reguladores mais importantes da microbiota
bucal. Não somente varia com a idade e o estado da doença, mas o ritmo do fluxo e a
composição demonstram variações diurnas, que por sua vez afetam os números e
a composição da flora. O fluxo salivar é maior quando o indivíduo acorda, devido a
estímulos repetidos, e a composição varia com a secreção. A osmolaridade aumenta
com a secreção, assim como os níveis de bicarbonato e do pH, uma vez que a amônia,
a ureia e a concentração de tiocianato antimicrobiano variam inversamente com o
ritmo do fluxo. Outros componentes dependentes do fluxo, componentes que
continuam constantes, e fatores dietéticos afetam o número e a proporção dos
organismos presentes. A xerostomia causada por drogas; condições locais, tais
como doença de glândula salivar e irradiação; e doenças sistêmicas, tal como infecção
pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) podem afetar profundamente a flora e as
doenças que resultam da flora oral.
Composição
A saliva, com sua complexa composição, serve como um meio para os
microrganismos orais; assim suas variações ajudam a regular a microbiota. Os
conteúdos minerais e iônicos afetam a capacidade tampão, o pH, e o Eh e regulam a
atividade das enzimas. Os meios gasosos regulam a sobrevida e o crescimento de
vários microrganismos. O Eh determina se predominam os organismos anaeróbicos, os
aeróbios ou os facultativos.
Fator Chave
O pH é um fator chave no estabelecimento e na manutenção da flora, e até
mudanças transitórias podem afetar a presença de um organismo. A placa, com pH
geralmente ácido, pode ser um depósito natural de Helicobacter pylori, servindo como
fonte para a reinfecção do intestino. Todavia, a H. pylori pode ser transitória e
associada ao refluxo gástrico.
Componentes orgânicos
Os componentes orgânicos incluem proteínas, aminoácidos, vitaminas e
carboidratos derivados do plasma, secreções das glândulas salivares, produtos
metabólicos ou de degradação bacteriana e a dieta do hospedeiro. Eles servem
diretamente como nutrientes microbianos, facilitando o crescimento de alguns
organismos, enquanto inibem outros. Os conteúdos aminoácidos livres variam em
quantidade e composição. A alanina, a serina e a glicina estão regularmente presentes,
uma vez que outras podem ou não estar presentes.
Aminoácidos
Os aminoácidos servem como nutrientes para as bactérias, e aqueles na saliva
podem proporcionar nutrição adequada para o crescimento de alguns microrganismos.
Algumas proteínas têm atividade enzimática, proporcionando nutrientes, tais como
açucares para os microrganismos, ou inibindo os microrganismos (p.ex.,
lactoperoxidase).
Glicoproteínas
As glicoproteínas são os principais componentes da saliva. Elas dão viscosidade e
influenciam a aderência e a agregação dos organismos. Outras influenciam a
capacidade dos organismos de se aderirem a superfícies ou a outras bactérias. As
imunoglobulinas (Igs) são um grupo importante de glicoproteínas que cumprem uma
função defensiva. Estudos têm mostrado que, em humanos saudáveis, o ritmo de fluxo
salivar, conteúdo de proteína e níveis de Ig não muda com a idade, mas a atividade
opsônica diminui significativamente, possivelmente afetando a capacidade dos
indivíduos de lidar com bactérias anormais.
Os carboidratos salivares que produzem um grande efeito na microbiota oral são
aqueles derivados da dieta do hospedeiro, porque as quantidades secretadas na saliva
são baixas e provavelmente insuficientes para sustentar crescimento microbiano ótimo.

2.2 Dieta do hospedeiro


Os microrganismos requerem um suprimento de nutrientes adequado para o
crescimento e a sobrevida, e a disponibilidade deste suprimento ajuda a determinar
seu nicho ecológico. Embora muitos organismos usem os produtos do metabolismo de
outros organismos, muita nutrição é derivada da dieta do hospedeiro.
Um número significante de microrganismos orais usa carboidratos ingeridos,
como a principal fonte de energia. Assim, grandes quantidades de açúcar refinado
favorecem os microrganismos que fermentam os carboidratos. O exemplo mais
conhecido é o maior aumento dos estreptococos orais quando a dieta do hospedeiro é
alta em sacarose. Muitas espécies orais são capazes de persistir, porque elas podem
converter o carboidrato derivado do hospedeiro em formas de armazenagem para
serem usadas quando os carboidratos ingeridos não estão disponíveis.
Os efeitos das proteínas dietéticas na flora oral são amplamente desconhecidos.
O baixo ritmo de decomposição de proteína, especialmente como resultado de pequena
exposição a enzimas salivares proteolíticas diluídas, sugere que proteínas ingeridas não
proporcionam uma fonte significante de aminoácidos para os microrganismos.

Observação: A consistência física da dieta afeta a retenção de microrganismos em


alguns locais, particularmente nas áreas supragengivais. Contudo, a retenção de
alimentos em vários locais pode influenciar o crescimento microbiano local. A
consistência também pode afetar a saliva. As dietas líquidas podem causar uma
redução significante no volume e no conteúdo total da proteína das secreções da
parótida, a qual, por sua vez, pode afetar o principal sistema de tampão salivar de
bicarbonato.

2.3 Retenção da microbiota


Para se tornar ou continuar um membro da microbiota oral, o organismo deve
ter um mecanismo para se fixar e continuar no local. Como com outros locais, os
microrganismos específicos e não-específicos para fixação ou continuação num
ambiente favorável. A retenção inespecífica envolve a retenção física, geralmente num
local favorável, tal como ocorre com as bactérias não aderentes que residem em
cavidades, fissuras ou lesões cariosas dos dentes, locais de tecido mole como os sulcos
gengivais, ou rupturas nos tecidos.
As interações específicas e a aderência seletiva também ocorrem. Estas podem
ser metabólicas, como quando o crescimento de cepas de Veillonella é facilitado na
presença de estreptococos. A aderência seletiva entre os microrganismos e entre os
grupos de microrganismos provavelmente resultam em mais retenção de organismos
normais e patógenos do que as retenções físicas. Os organismos têm diferentes
capacidades de ligações e a resistência varia, com o resultado que alguns organismos
podem deslocar outros, ou em outras circunstâncias, os sucessores não
podem deslocar os predecessores, mas prontamente ocupam um nicho quando se
tornam livres. Estes vários fenômenos podem resultar na co-agregação de pares ou
mesmo agregações multigenéricas que produzem uma flora resistente num local
particular. Frequentemente, estas interações envolvem fímbrias. Tais padrões de
ligação podem afetar a produção de doenças pelos microrganismos.
Assim, a união seletiva do patógeno periodontal P. gingivalis para várias
proteínas do hospedeiro ocorre enquanto o organismo estimula a produção de citocina;
o antagonismo S. Sanguis e a união retardada do S. mutans também ocorre além da
localização de Actinobacillus actinomycetemcomitans, em locais periodontais através
da ligação às células teciduais. As fímbrias da P. intermedia induzem reações
hemaglutinantes, uma vez que aquelas da Prevotella loescheii têm sido encontradas
por causar a co-agregação com outras bactérias. Similarmente, a co-agregação
mediada por fímbrias ocorre entre os anaeróbicos orais Treponema médium e P.
gingivalis, algumas aderências relacionadas à presença de receptores de células
teciduais específicas (p. ex., a ligação, através do ácido lipoteicóico, do grupo A de
estreptococos para as células epiteliais da mucosa) e a afinidade das C. albicans para
populações distintas das células epiteliais orais. Estes mecanismos ajudam a
estabelecer as amostras de retenção e, assim, a flora residente num local, bem como
facilitam a persistência de patógenos, se for somente por pouco tempo. A importância
das interações organismo-tecido na patogênese pode ser ilustrada pelo fenômeno
frequentemente visto de crescimento excessivo pela Candida spp. oral, quando um
indivíduo é tratado com certos antibióticos. Quando os agentes reduzem o número de
bactérias, as leveduras invadem o local pobremente povoado e produzem uma infecção
por cândida. Quando o uso do antibiótico é descontinuado, a flora bacteriana residente
se reafirma. Uma situação similar ocorre quando os agentes antibióticos reduzem
seletivamente a população bacteriana Gram-positiva, resultando num crescimento
excessivo de bactérias Gram-negativas.

3 Microrganismos no ambiente bucal


Como notado, a microbiota oral é complexa e, embora relativamente estável,
oscila com a idade, condições da doença e local preferido de resistência. Assim, a
presença de um organismo particular no local da infecção deve ser vista no contexto
das condições previamente mencionadas. Por exemplo, em pacientes debilitados ou
comprometidos, a flora varia, e organismos não-usais podem estar presentes, tais
como patógenos ou membros da flora. O exemplo mais bem estudado deste fenômeno
é a alteração na flora periodontal associada ao desenvolvimento da síndrome da
imunodeficiência adquirida.
A classificação e a nomenclatura da microbiota oral estão mudando
continuamente, em especial, pela perspectiva de relações baseadas na informação
genética, o que é um método prático. Embora os organismos sejam
geralmente agrupados como aeróbios, facultativos, micro aerófilos e anaeróbicos
estritos, existe um espectro para ótimas condições de vida. Por exemplo: os
microrganismos podem crescer na presença de pequenas quantidades de oxigênio,
sobreviver, mas não crescer nestes baixos níveis, ou de fato serem destruídos nestes
níveis. Assim, os grupamentos baseados no meio ambiente são um tanto arbitrários. A
classificação por outros esquemas, além dos genéticos, mostra problemas similares. As
seções seguintes discutem os principais grupos de microrganismos da cavidade oral.
Alguns organismos foram cultivados ou caracterizados. Os principais gêneros estão
incluídos, e quando apropriado, as espécies específicas estão descritas.

3.1 Estreptococos
Os estreptococos facultativos formam o mais numeroso grupo de organismos da
cavidade oral. Embora as porcentagens atuais variem entre os locais, os estreptococos
representam cerca de metade da contagem viável da saliva e do dorso da língua, e um
quarto da contagem da placa bacteriana e do sulco gengival. Os estreptococos orais
mais abundantes são membros do grupo viridans, o qual tem sido classificado por
muitos métodos. Os estreptococos viridans carecem de muitas características que
distinguem outros patógenos estreptocócicos importantes. As caraterísticas hemolíticas
são parâmetros importantes para a classificação dos estreptococos. Realmente, as
bases originais para a categoria dos estreptococos viridans foram suas alfa-hemólises.
Entretanto, de acordo com os métodos recentes, alguns estreptococos, que são alfa,
beta, ou gama-hemolíticos, algumas vezes, podem estar incluídos com os
estreptococos viridans.
Os estreptococos viridans previnem a colonização da cavidade oral por
serem mais agressivos do que os outros organismos. Eles competem por locais de
união na mucosa e produzem as bacteriocinas, que exercem um efeito bactericida em
alguns competidores. Os estreptococos viridans são geralmente de baixa virulência,
mas causam sérias infecções quando a mucosa oral é rompida, os mecanismos de
defesa do hospedeiro estão comprometidos ou ocorre uma combinação destas
condições. Pouco é conhecido sobre os mecanismos patogênicos dos
estreptococos viridans. Eles podem produzir algumas exotoxinas e enzimas líticas,
ativar complemento, induzir a produção de citocinas ou executar várias destas ações.
Os estreptococos orais podem explicar a maior proporção de microrganismos
associados à endocardite bacteriana, especialmente em indivíduos com próteses
valvares. Os mais comuns isolados são S. mitis, S.oralis, S. sanguis e S. gordonii.
Frequentemente, os S. anginosus, S. constellatus e S. intermedius são isolados de
infecções purulentas, especialmente em abscessos localizados profundamente. Os
estreptococos do grupo mutans tendem a se colonizar em dentes e estão associados à
cárie dentária.
Além da sua participação em abscessos e na endocardite em pessoas
primariamente saudáveis, os estreptococos orais são importantes nas infecções de
indivíduos imunocomprometidos e neutropênicos. A mucosite oral, frequentemente
relatada à quimioterapia para câncer, pode predispor pacientes a tais infecções. A
característica inicial da septicemia por S. viridans é a febre, que pode persistir por
muitos dias, mesmo depois que os organismos cultiváveis sejam esclarecidos no
sangue. A maioria dos pacientes se recupera, embora o choque séptico
fulminante possa ocorrer.

3.2 Outros cocos Gram-positivos


Os enterococos podem frequentemente ser encontrados na cavidade oral,
embora eles não componham uma ampla porcentagem da microbiota. Entretanto,
quando presentes em infecções, eles podem ser persistentes e difíceis de eliminar. O
gênero Peptostreptococcus contêm obrigatoriamente anaeróbicos, os cocos Gram-
positivos encontrados em alterações, mas em baixas porcentagens, em diferentes
locais na cavidade oral, embora eles possam representar uma proporção significante da
microbiota subgengival na doença periodontal avançada. Eles também têm sido
encontrados em abscessos odontogênicos e de tecidos moles. Este gênero é
insatisfatoriamente classificado, mas inclui muitas das espécies previamente
classificadas no gênero Peptococcus.
Os microrganismos facultativos, catalase-positivos, Gram-positivos classificados
como estafilococos, estão presentes em quase todas as bocas, embora não em grande
número. Os S. aureus estão presentes dentro da cavidade bucal em mais ou menos
metade da população, incluído na saliva, embora o número de microrganismos não
seja grande. Há maior possibilidade de estarem presentes em grande número no nariz
e na garganta, e frequentemente são componentes de infecções mistas da região
orofacial.

3.3 Bastonetes e filamentos Gram-positivos


As bactérias em formato de bastonetes e filamentosas Gram-positivas estão
presentes na cavidade oral. Embora os organismos tipicamente tenham este padrão
morfológico característico, eles podem ser um tanto pleomórficos, com vários
comprimentos e larguras. Os Actinomyces spp. são algumas das bactérias Gram-
positivas filamentosas e em formato de bastonetes mais comuns na cavidade oral. Este
gênero também inclui alguns dos patógenos mais comuns e persistentes da região de
cabeça e pescoço. Eles são fundamentalmente anaeróbicos, embora alguns sejam
facultativos. As espécies orais mais frequentemente encontradas incluem A. israelii, A.
viscocus, A. naeslundii e A. odontolyticus. O último organismo pode ser isolado
de cáries dentinárias profundas, assim como em outros lugares da cavidade oral. O
habitat normal do A. naeslundii inclui as criptas tonsilares e os cálculos dentários.
Infecções humanas com este organismo têm sido relatadas, mas sua exata função não
está provada.
O A. viscosus, isolada da cavidade oral de humanos e roedores, produz um
sedimento viscoso em cultura. Isto produz doença periodontal transmissível em
hamsters, é encontrada nos cálculos dentários e em cáries de superfície radicular em
humanos, e têm sido isoladas de abscessos de humanos. As espécies A. israelii são
geralmente isoladas de casos de actinomicose em humanos. Tais infecções são
geralmente de origem endógena, uma vez que os cálculos dentários e criptas tonsilares
sejam seu habitat normal.
O gênero Rothia contém uma espécie, a R. dentocariosa. Ele tem uma
ramificação, as formas filamentosas, mas também podem aparecer como formas
cocóides, bacilares e difteróides. Poucas infecções naturais têm sido relatadas em
humanos.
As bactérias Eurobacterium spp. são anaeróbicas, pleomórficas, Gram-positivas, em
formato de bastonetes ou filamentosas encontradas em vários locais da cavidade oral.
Elas foram encontradas na placa (E. saburreum), nos cálculos, nas cáries dentinárias e
na polpa necrótica. A E. lentum (Eggerthella lenta), em particular, tem sido relacionada
à dor para a percussão em infecções endodônticas.
A microbiota da cavidade oral inclui muitos bastonetes e filamentos Gram-
positivos pleomórficos agrupados sob o termo geral difteróide. Esta categorização é
baseada em características morfológicas, e as classificações de microrganismos
verdadeiros não são conhecidas.
Os microrganismos podem ser isolados no dorso da língua, no sulco gengival e
na placa. Algumas cepas são aeróbias, algumas facultativas e outras,
obrigatoriamente, anaeróbias. Elas parecem em forma de bastão e em disposições
angulares em formas de feixes e ramificadas. Algumas pertencem ao
gênero Corynebacterium e outras ao gênero Propionibacterium, embora não sejam
designadas para qualquer espécie. Os difteróide são abundantes na cavidade oral, mas
suas funções na doença não são conhecidas.
Os lactobacilos são característicos da boca. Eles estão presentes provavelmente
logo após o nascimento. A contagem de lactobacilos nos adultos varia enormemente,
mas constituem somente uma proporção pequena da contagem total viável de
microrganismos bucais. Eles são, em geral, não-patogênicos, embora exista correlação
suficiente entre a sua presença e a atividade cariogênica.

3.4 Cocos Gram-negativos


As veilonelas são cocos anaeróbios, Gram-negativos que estão entre as mais
numerosas das bactérias orais, compondo 5 a 10% dos organismos da língua e da
saliva. Elas estão entre os primeiros colonizadores da cavidade oral. Das sete espécies
conhecidas, a V.parcula, a V. atypica e a V. dispar são encontradas na cavidade oral e
nos tratos respiratório e intestinal. Elas contêm endotoxina, que é pirogênica. Elas
também podem participar como componentes de infecções polimicrobianas,
frequentemente em indivíduos debilitados.
Cocos Gram-negativos facultativos, designados como Neisseria, têm sido
encontrados na cavidade oral e na nasofaringe de humanos. A N. sicca é a principal
espécie, embora isto possa ser um tipo de N. subclava. Este organismo pode produzir
inflamação da mucosa oral e produzir lesões semelhantes à gonorreia oral.

3.5 Bastonetes e filamentos Gram-negativos


Muitos bastonetes e filamentos Gram-negativos, anaeróbicos, microaerófilos ou
facultativos estão localizados na cavidade oral. Em bocas saudáveis, podem constituir
cerca de 25% da microbiota, mas as proporções dobram com o desenvolvimento
de gengivites e periodontites. Os microrganismos mais comuns incluem espécies
de Prevotella, Porphyromonas, Selenomonas, Bacteroides, Fusobacterium,
Campylobacter, Actinobacillus e Capnocytophaga. Similarmente, alguns dos mesmos
organismos e diferentes espécies do mesmo gênero estão associados a infecções
endodônticas. Entretanto, elas e espécies similares causam doenças infecciosas ou
dano tecidual em outros locais.
Fusobactérias têm sido isoladas em infecções do trato respiratório, da cavidade
pleural, da cavidade oral (além de locais de periodontites) e em locais de trauma, tal
como em mordidas. A Eikenella corrodens tem sido encontrada em infecções humanas
nos tratos respiratório e intestinal, em abscessos cerebrais e em infecções da cavidade
oral, e associada à endocardite infecciosa.
As Porphyromonas e Prevotella spp. têm sido isoladas em abscessos, infecções
pulmonares e do ouvido, infecções de feridas, peritonite e sinusite. A maioria das
infecções é polimicrobiana, envolvendo várias combinações de cocos Gram-negativos,
Gram-positivos e bastonetes Gram-negativos. Os patógenos isolados de tais infecções
ou as proporções de tais patógenos podem variar, dependendo do estágio de infecção.
Como as condições dentro das lesões mudam por causa do meio ambiente, do
metabolismo microbiano (p.ex., oxigênio purificado por aeróbios), ou do tratamento, os
organismos presentes ou dominantes em um estágio podem diminuir, ou mesmo
desaparecer em um último estágio, enquanto outros se tornavam dominantes.

3.6 Espiroquetas
A estrutura básica da espiroqueta é um cilindro helicoidal, consistindo em
citoplasma anexado a uma membrana e circundado por uma fina camada de
peptideoglicanas, que permite que o microrganismo se dobre. As espiroquetas também
têm uma ou mais fibrilas provavelmente associadas à motilidade. As espiroquetas
variam em comprimento, espessura, número e amplitude dos helicoides.
Dos quatro gêneros da família Spirochaetaceae, somente dois, o Treponema e
o Borrelia, parecem ser patogênicos para os humanos. Os membros dos
gêneros Treponema geralmente produzem lesões teciduais locais. Estão incluídos
os agentes que causam a sífilis, a franbósia, a pinta e as espiroquetas orais. Os
organismos do gênero Borrelia incluem os agentes causadores da doença de Lyme e a
febre recidivante em humanos.
Habitat
As espiroquetas comumente habitam a cavidade bucal e podem invadir o tecido
conjuntivo ou o epitélio intacto em locais doentes. A maioria das espiroquetas
pertencem ao gênero Treponema. Sete espécies de Treponema têm sido
cultivadas: denticola, pectinovorum, socranskii, vicentii, maltophilum, medium,
amylovorum. Algumas outras têm sido cultivadas, mas não nomeadas e existem
numerosas espécies não cultivadas.
Microscopia
Os treponemas são observados melhor com microscopia de campo escuro ou em
fase de contraste por causa do seu tamanho e resistência à coloração. Onde
cultiváveis, eles são de crescimento lento e requerem condições anaeróbias e o meio
geralmente requer enriquecimento com sangue, soro ou líquido ascético. As
espiroquetas quase sempre estão presentes na cavidade oral de adultos saudáveis e
acham condições bastante favoráveis nas bolsas periodontais.
Patogenicidade
A patogenicidade das espiroquetas bucais não é clara, porque a separação de
seus efeitos daqueles de outras bactérias com as quais elas são frequentemente
encontradas, em especial as fusiformes, é difícil; os dois tipos frequentemente são
encontrados juntos nas lesões. Uma variedade de fatores de virulência potenciais tem
sido identificada, incluindo fatores citotóxicos, proteases, hemolisina e mecanismos
imunorreguladores. As culturas puras de espiroquetas orais não causam infecções
transmissíveis características, como ocorre quando populações mistas de espiroquetas
e outras bactérias orais são inoculadas.
As lesões observadas incluem gengivite ulcerativa necrosante aguda, lesões do
trato respiratório superior e noma, uma estomatite gangrenosa difusa que pode se
desenvolver em crianças com desnutrição ou doença debilitante.

3.7 Micoplasma
Os micoplasmas são pequenas bactérias que não têm uma parede celular rígida,
causando-lhes o aparecimento, principalmente, de todos ou formas cocóides. A maioria
é de anaeróbicos facultativos, embora tendam a crescer sob condições aeróbias.
Embora a infecção mais comum em humanos seja a pneumonia causada
pelo Mycoplasma pneumoniae, outras espécies são encontradas na cavidade oral,
incluindo M. salivarium e M. penetrans. Os M. penetrans são de particular interesse,
por ter sido demonstrado que aumentam a citotoxicidade do HIV.

3.8 Fungos e leveduras


A C. albicans é a levedura bucal mais comum. Sua incidência relatada
na cavidade oral de indivíduos saudáveis varia de 10 a 80%. Além de C. albicans,
outras espécies de Candida têm sido isoladas de um número significante de indivíduos,
incluindo C. dubliniensis, parapsilosis, krusei, famata, guillermondii e zeylanoides. A
espécie e cepa predominante parece variar em função da idade do hospedeiro. Não
surpreendentemente, uma incidência maior de infecções fúngicas com Candida
spp. tem sido notada em pacientes imunocomprometidos. A taxa de
colonização aumenta com a gravidade da doença e, em tais indivíduos, as infecções
sistêmicas têm se tornado muito importantes quanto à morbidade e mortalidade.
Algumas espécies têm muita resistência aos agentes antifúngicos, especialmente os
antifúngicos pirrólicos.
As espécies de Penicillium, Geotrichum, Hormodentrum, Aspergillus,
Hemispora e Scopulariopsis também têm sido isoladas no meio oral, incluindo em
indivíduos normais. Estes grupos podem ser considerados habitantes normais.
A Candida spp. pode exercer uma função simbiótica ou oportunista com as
bactérias na ecologia bucal. Por exemplo, a Candida spp. pode causar lesões orais em
adultos e crianças, particularmente se a microbiota está perturbada, como mostra a
figura “Saúde bucal infantil”.
Por sua vez, as bactérias orais podem inibir ou limitar a inserção ou o
crescimento das leveduras orais.

3.9 Vírus
Com a exceção do vírus do herpes simples e do citomegalovírus, vírus parecem
ser transitórios no meio oral. A infecção pelo vírus do herpes simples está presente
numa grande proporção da população, frequentemente em forma latente. Sua
característica recorrente e a persistência de anticorpos significante de título indicam
que ele persiste durante toda vida, mesmo na forma latente no gânglio trigeminal ou
no estágio infeccioso na cavidade oral durante episódios agudos. Os vírus podem ser
isolados da saliva de indivíduos até 2 meses após a melhora da exacerbação aguda da
doença e de uma pequena porcentagem em adultos que não manifestam sintomas.
O citomegalovírus infecta vários tecidos, incluindo as glândulas salivares. Eles
também foram detectados em bolsas periodontais profundas de adultos e crianças,
sugerindo a capacidade de se reproduzir nos tecidos periodontais. As infecções em
crianças podem ser assintomáticas ou produzir icterícia, enterite e distúrbios do
sistema nervoso central. Se a mãe de uma criança foi infectada durante a gravidez,
esta pode ser manifestada como um defeito congênito. Em adultos, a infecção pode
ser assintomática ou produzir uma doença similar à mononucleose. Porque o vírus tem
sido isolado dos tecidos, tal como adenoide de pessoas aparentemente saudáveis, é
provável que esteja presente na saliva de portadores saudáveis assintomáticos.

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