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A significação oculta das visões dos sonhos raramente levanta dúvidas. Até os filósofos
estóicos da antiguidade recorreram a compilar evidência de casos de sonhos que se
realizaram – notavelmente a coleção de Posidonius usada por Cícero no seu tratado Sobre
Divinação – como meio de estabelecer uma fundação empírica para sua doutrina sobre o
destino.
Para os gregos antigos, os daemons eram "almas imortais" – entidades desimpedidas por
amarras do mundo material e, como tal, capazes de transcender o tempo. Eles acreditavam
que sempre quando um homem perdia consciência da realidade desperta, sua mente estava
alinhada com a de um daemon e partes da memória daemonica eram comunicadas ao
adormecido: passado, presente e futuro – ramos completos da árvore universal eram
reveladas como sonho.
Essa ekstasis – ou saída de si próprio – constitui a primeira metade do meu talento de duas
faces. Minhas experiências pessoais me forçam a concordar com o poeta grego antigo
Hesíodo quando ele escolhe associar sonhos a ameaças ("E a Noite despia Ruína odiosa e
Destino negro e Morte, e ela despia Sono e a Tribo dos Sonhos") e descartava sonhos
agradáveis como algo inválido de menção em toda Teogonia. O ar sombrio das minhas visões
é persistente, e eu honestamente não me lembro de um único sonho genuinamente contente.
Essa observação puramente subjetiva nos traz à segunda parte do talento: aquela de um
mante, o intérprete de visões.
Oneiromancia (do grego oneiros, "sonho", e manteia, "poder profético ou dom") é uma forma
de divinação que usa o simbolismo como um método de interpretação. Um oráculo
habilidoso é essencialmente um psicólogo que interpretaria símbolos através do prisma da
personalidade, profissão, saúdes física e mental, gostos, relatos de sonhos prévios e
recorrentes, etc. de um sonhador. Eu imagino que em nosso caso – meu e de Hesíodo – os
sobretons sinistros são postos por várias experiências traumáticas, pois relatos de outras
pessoas produzem ampla prova de que há prospectos muito mais alegres por aí.
É importante capturar memórias de sonhos logo após despertar, já que elas são rapidamente
substituídas por memórias de segunda mão e daí tornam as interpretações dramaticamente
menos precisas. Ademais, aqui e ali eu testemunho cenas tão alheias que não posso senão
concordar com os sacerdotes egípcios que acreditavam que a alma ganhava acesso a um
universo diferente enquanto o corpo estava adormecido. Então eu mantenho um caderno de
cabeceira sempre ao meu alcance para notas rápidas e esboços, como deve fazer qualquer
explorador diligente. O caderno e a caneta podem lhe ajudar a capturar seus próprios
sonhos ao despertar.