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Gestão de Recursos Humanos: ontem, hoje e amanhã

Book · January 2020


DOI: 10.31789/aapv2020.v1-0068

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10 authors, including:

Allan Claudius Queiroz Barbosa André Mascarenhas


Federal University of Minas Gerais University Center of FEI
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Daniel Paulino Teixeira Lopes Douglas W. S. Renwick


Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais Nottingham Trent University
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1a Edição

Allan Claudius Queiroz Barbosa


André Ofenhejm Mascarenhas
Copyright © 2020 de Allan Claudius Queiroz Barbosa e André Ofenhejm Mascarenhas.
Todos os direitos reservados à Allan Claudius Queiroz Barbosa e
André Ofenhejm Mascarenhas.

Capa: João Zanusso Minetto


Pintura Capa: Adriana Coppio, Sem Título, 2019. Acrílica sobre tela.
Projeto Gráfico e Diagramação: João Zanusso Minetto e Pedro Okabayashi
Revisão: Roberto Alves

A reprodução não-autorizada desta publicação, por qualquer meio, seja total ou parcial,
constitui violação da Lei no 9.610/98.

B238g Barbosa, Allan Claudius Queiroz.


2020 Gestão de recursos humanos: ontem, hoje e amanhã /Allan Claudius Queiroz Barbosa,
André Ofenhejm Mascarenhas. – Belo Horizonte: FACE - UFMG, 2020.
304p.: il.

ISBN: 978-65-88208-00-7
Inclui bibliografia.

1. Recursos humanos – Administração. 2. Recursos humanos – Avaliação. 3. Administração.


I. Mascarenhas, André Ofenhejm. II. Título.

CDD: 658.3

Elaborada por Leonardo Vasconcelos Renault CRB-6/2211


Biblioteca da FACE/UFMG. – LVR/111/2019

Conheça em www.grhontemhojeeamanha.com.br
Participe do Fórum de Leitores em: https://zetesis.net/gestaoderecursoshumanos
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01
Recursos Humanos
Estratégicos: Primeiras
Abordagens

Para marcar as primeiras abordagens da GRH Estratégica, elegemos o corte evo-


lutivo como uma forma de abordar e entender a discussão sobre GRH5. Gestão
Estratégica de Recursos Humanos nomeia o debate que foi além das discussões
técnicas, marcantes em períodos passados, e expandiu o campo aos temas da es-
tratégia, cultura da qualidade, busca de excelência, desempenho e valorização dos
empregados, entre outros temas pioneiros. Questionada por gerar custos, e não se
constituir em fonte de lucro, a legitimidade do RH foi posta em debate nos tempos
da reengenharia, terceirização e cortes de custos na década de 1990. Em suma, na
visão de Beer et al. (1984), uma organização deve ter uma estratégia externa, para
competir no mercado, mas precisa de uma estratégia interna (de GRH) para definir
como seus recursos humanos serão admitidos, desenvolvidos e motivados. Essas
estratégias devem estar relacionadas. As abordagens propunham que modelos de
GRH provessem os comportamentos adequados às empresas, em distintos cenários
de competição.

11
Capítulo 1

Abordagem contingencial

A Era I da Gestão Estratégica de Pessoas surge ao se constatar que a GRH até


então pouco contribuía para as estratégias corporativas. Para Lengnick-Hall et al.
(2009), que traçam a evolução mainstream6 do campo, duas linhas de pesquisa di-
taram a agenda e são particularmente importantes por continuar a influenciá-la
desde os anos 1980. Na primeira linha estão os estudos pelas perspectivas contin-
gencial (contingency perspectives) e de alinhamento (fit), que tem a finalidade de vincular
políticas e práticas de RH a diversos contextos e elementos estratégicos - diferentes
parâmetros para acessar fit - como fatores contingentes. O alinhamento da GRH
é analisado como (1) externo (vertical) e (2) interno (horizontal). O alinhamento
externo é a adaptação da GRH às contingências externas, como a estratégia que
adota. O alinhamento interno se refere ao fato de as práticas de RH se reforça-
rem mutuamente, ou seja, ao fato de as estratégias serem apoiadas por políticas e
processos de RH consistentes7. Para Baird e Meshoulam (1988), o alinhamento da
GRH muda à medida que a organização avança estágios no seu ciclo de vida.

Primeiras noções de Recursos Humanos Estratégicos tinham referência em estudos


clássicos, como por exemplo, Strategy and structure: chapters in the history of industrial
enterprise, em que Chandler (1962) sugere a importante idéia, muito citada, de que a
estrutura de uma organização deriva de sua estratégia. Outros autores elaboraram
as relações entre aspectos organizacionais e as condições ambientais como Burns e
Stalker (1961), Lawrence e Lorsch (1967), Perrow (1967) e Thompson (1967), que
desenvolveram parâmetros ou critérios para as escolhas de estruturas e de processos
organizacionais, consideradas a natureza do ambiente e as opções da administração
(Vasconcelos, 2007). Entre os autores que ampliaram a análise à GRH, Galbraith e
Nathanson (1978) enfatizaram o alinhamento entre estrutura, estratégia e práticas
de GRH como medidas de desempenho, sistemas de remuneração e carreiras.

Os teóricos desenvolveram a influente perspectiva que considera comportamentos


como mediadores entre a estratégia e o desempenho da empresa e sugeriram que,
dependendo das contingências, padrões distintos são requeridos nas organizações

PARTE 01 - Recursos Humanos Estratégicos: Primeiras Abordagens 13


Capítulo 4

Visão baseada em recursos


(Resourse Based View - RBV)

As origens da teoria dos recursos são encontradas em idéias de autores que, nas
décadas de 1960 e 1970, discutiam as empresas como conjuntos únicos de recursos
produtivos integrados ao longo da sua histórica (Penrose, 1995) e detentoras de
competências distintivas exploradas para gerar vantagem competitiva (Andrews,
1971). Pelo menos no curto prazo, as decisões estratégicas são dependentes dos re-
cursos e das competências atuais (path dependency), o que pode também dificultar ou
mesmo impedir mudanças (core rigidities, Leonard-Barton, 1992). Para a gestão de
recursos humanos, a teoria dos recursos proveu um arcabouço teórico mais sólido
às pesquisas e alegações do campo.

Esta corrente de pensamento torna-se central no campo da Estratégia Empresarial.


A teoria dos recursos busca entender as diferenças de desempenho entre as firmas.
Se a consideração quanto ao setor das empresas fosse determinante primordial do
desempenho e suas diferenças internas fossem irrelevantes, as empresas tenderiam
a apresentar desempenho econômico similar. Mas firmas apresentam desempenhos
distintos e isto ocorre porque detêm e exploram recursos em capacidades hetero-
gêneas. A teoria dos recursos sugere que a fonte da vantagem competitiva encon-
tra-se, primariamente, no conjunto de recursos e competências controlados pela
empresa e, secundariamente, na estrutura dos setores nos quais elas se posicionam
(Wernerfelt e Montgomery, 1986; Rumelt, 1991). A teoria desenvolveu-se em duas
direções, uma centrada nos recursos propriamente ditos e outra nos conceitos de
competências e capacidades dinâmicas12 da empresa. As empresas são feixes de
recursos ou conjuntos de competências e capacidades (Wernerfelt, 1984; Prahalad
e Hamel, 1997).

Recursos são ativos tangíveis ou intangíveis constituídos por uma ampla variedade
de atributos atrelados à organização e que lhe permitem conceber e implantar
estratégias de negócios. Conforme Barney (1986), os recursos da firma são: finan-

PARTE 01 - Recursos Humanos Estratégicos: Primeiras Abordagens 29


02
Recursos Humanos
Estratégicos: Abordagens
Contemporâneas

A GRH estratégica desenvolveu-se a partir das abordagens contingencial, univer-


salista e cultural. Verificou-se que cada orientação estratégica (entre outros aspectos
contingentes) demanda certa configuração organizacional e práticas de recursos
humanos ou, ainda, uma cultura que reforce papéis organizacionais e comporta-
mentos coerentes. Pressupõe-se que as contingências do negócio determinam as
estratégias de GRH. Para os contingencialistas, o papel principal da administração
é identificar as contingências da organização e adaptar modelos de gestão. Porém,
o subsequente debate fez críticas a este foco estreito, que ignora a potencialidade
da GRH para transformar os ambientes de competição (Hendry e Pettigrew, 1990).
Abordagens contemporâneas superam essas limitações ao pressupor organizações
construindo seus ambientes competitivos por meio dos recursos humanos. Segundo
Snell, Shadur e Wright (2005), este é um movimento de busca por convergência
entre as literaturas de GRH e Estratégia. Os modelos baseiam-se na psicologia e
evoluiram para integrar a teoria das organizações a perspectivas econômicas e à
compreensão da estratégia de RH.

33
Capítulo 5

A vantagem competitiva
pela GRH

A influência das teorias em Estratégia Empresarial na GRH evoluiu associada à


tradição importante de estudos que explora as origens da vantagem competitiva.
Dizemos que uma empresa detém vantagem competitiva sustentável quando apre-
senta, consistentemente, resultados acima da média de seu setor. Esta tradição trata
das explicações que podem dar conta do sucesso ou fracasso da empresa, daí sua
popularidade, consolidada em diversos quadros teóricos (Vasconcelos e Cyrino,
2000). Entre eles, visões clássicas da origem da vantagem competitiva dão destaque
a recursos e dinâmicas internas das organizações, em que a GRH, de coadjuvante e
operacional, torna-se essencial à compreensão e à geração de resultados superiores.

Entre as reformulações em GRH, destacamos o novo status a ser atribuído às pes-


soas nas organizações. As primeiras abordagens haviam elevado a importância das
pessoas nas organizações, já que as consideravam aptas a implementar estratégias
e gerar resultados superiores. Porém, críticas denunciavam o status ainda reduzido
da GRH, principalmente na vertente hard. Com base na teoria dos recursos, Lado
e Wilson (1994) e Wright, McMahan e McWilliams (1994) observaram que a GRH
Estratégica havia adotado uma perspectiva comportamental, em que as práticas de
GRH devem originar comportamentos consistentes com os conteúdos das decisões
da alta direção.

No entanto, a perspectiva comportamental é orientada externamente:

(...) de acordo com a visão, os resultados e o comportamento organizacional


e individual são, em grande extensão, determinados por condições (ou estí-
mulos) ambientais externos; a volição e os processos cognitivos internos, não
seriam necessários à compreensão de como resultados organizacionais são
gerados. (Lado, Wilson, 1994, p. 701).

PARTE 02 - Recursos Humanos Estratégicos: Abordagens Contemporâneas 35


Capítulo 6

Competências

A noção de competência permite uma enorme variedade de entendimentos e não


existe consenso sobre sua definição. Suleman (2003) considera sua definição “uma
tarefa difícil, senão mesmo complexa, e não reúne um consenso entre os autores e
os ‘actores’ envolvidos” (p. 29). Repleta de nuances, trata-se de noção amplamente
utilizada nos campos da educação, formação profissional, economia e gestão, o que
confere ao termo uma grande plasticidade. As tendências no plano organizacional
enfatizam a necessidade de maximização do resultado e aumento de capacidade
competitiva pelas pessoas na economia orientada a serviços e conhecimento (Qua-
dro 6.2). As pessoas geram vantagem competitiva por meio de: (1) suas qualidades
distintivas, incluindo seus estoques de conhecimentos e habilidades e (2) seus enga-
jamentos efetivos. As organizações obtêm resultados superiores por meio das com-
petências que detêm, individuais e organizacionais. Desenvolvê-las é estratégico
para as organizações. Por outro lado, há uma evidente pressão sobre o trabalho e,
conseqüentemente, sobre o empregado. Alguns analistas consideram competência
uma noção imprecisa, com fortes marcas políticas e ideológicas e carente da idéia
de relação social (Hirata, 1994). Outros, na mesma linha, a veem como um parado-
xo: embora sua determinação seja legítima e necessária, sua definição constitui-se
como uma questão insolúvel (Schwartz, 1995).

São identificados três grandes eixos quanto à noção de competência:

1. O primeiro eixo concebe a competência como uma “característica profunda


de um indivíduo em relação a um desempenho eficaz e/ou superior em um
posto ou situação dada” (Spencer e Spencer, 1993).

2. Um segundo eixo está associado ao projeto Management Charter Iniati-


ve (M.C.I.), empreendimento do National Council for Vocational Qualifications
(N.V.Q.) e do Scottish Council for Vocational Qualifications (S.C.O.T.V.E.C.), enti-
dades que implementaram uma iniciativa governamental com o propósito
de estabelecer padrões mínimos de desempenho em nível nacional. A abor-

PARTE 02 - Recursos Humanos Estratégicos: Abordagens Contemporâneas 41


Capítulo 7

Competências, conhecimento e
aprendizagem organizacional

Associada ao debate sobre a definição das competências, consolidou-se a pesquisa


que relaciona competências e capacidades organizacionais. Competência organi-
zacional são configurações de recursos específicos da firma, agregados e integra-
dos em clusters, inclusive indivíduos, conhecimentos e tecnologias (Teece, Pisano
e Shuen, 1997). Competências e capacidades distintivas são valiosas e de difícil
imitação, não são constituídas por recursos isolados, mas por múltiplos recursos
integrados ao longo da história da organização. No curto prazo, as organizações
se mostram dependentes de seus recursos e competências atuais porque têm ca-
pacidade limitada para desenvolver novos recursos estratégicos rapidamente (tais
como conhecimentos tácitos valiosos na engenharia de produção e reputação da
marca). Os trabalhos falam em desenvolver competências integrando recursos de
conhecimento às instâncias da organização, e destacam a gestão em contextos de
aprendizagem.

Estes estudos alinham-se à visão da firma baseada em conhecimentos (knowledge-


-based view of the firm), que seriam seus recursos mais importantes. De acordo com
Easterby-Smith e Prieto (2008), esta visão enfatiza o estoque de conhecimentos na
empresa, busca compreender o que é o conhecimento, suas tipologias e melhores
formas de gerenciá-lo. O principal desafio está em compreender a natureza e os
processos do conhecimento tácito, que é pessoal, contextual, ambiguo, intimamen-
te ligado aos significados construídos pelo sujeito. O conhecimento pode ser en-
tendido como estando “situado” na prática do trabalho, em vez de ser um atributo
de indivíduos; ele é, por isso, difícil de ser comunicado ou gerenciado (Alvesson
e Kärreman, 2001). Outra visão entende que o conhecimento na organização é
sustentado em processos sociais, em “comunidades de prática”, ao invés de ser

PARTE 02 - Recursos Humanos Estratégicos: Abordagens Contemporâneas 49


03
Contrapontos às
Abordagens em Recursos
Humanos Estratégicos

Tanto as primeiras abordagens quanto diversas abordagens contemporâneas apre-


sentam limitações que permitiram aprofundar o debate sobre possíveis caminhos
e alternativas de reflexão. Ao trazerem aportes de referenciais teóricos de outras
áreas do conhecimento, reforçam a relevância de integrá-los à pesquisa em Recur-
sos Humanos de forma propositiva e rigorosa, sendo este um dos desafios atuais do
campo. Isso sem esquecer os riscos de que os esforços podem gerar fragmentação
e, eventualmente, expressem sua natureza afeita à padronização e prescrição de
soluções modelares.

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 57


Capítulo 8

Contraponto conceitual

O contraponto conceitual ressalta complexidades das inter-relações entre conceitos


de gestão estratégica e GRH (Schuler e Jackson, 2001). De acordo com Lengnick-
-Hall e Lengnick-Hall (1988), as primeiras visões destas inter-relações adotavam
três pressupostos. Primeiro, o fato de os rumos estratégicos da empresa serem defi-
nidos antes das estratégias de GRH, que são desdobramentos das decisões da alta
diretoria. Segundo, a suposição de que o processo de implantação da estratégia
implica somente em identificar e utilizar meios para se atingir objetivos e não tem
qualquer papel na formulação da estratégia, pois estes processos são independen-
tes. Terceiro, as responsabilidades pelos processos: a formulação das estratégias é
competência da alta direção. Enfim, fazer gestão estratégica de recursos humanos
seria somente um meio para implantar as estratégias. Entende-se aí a noção de
alinhamento estratégico da GRH.

Os pressupostos são coerentes com o caráter deliberado, intencional, racional e


centralizador da visão clássica de planejamento estratégico. Por exemplo, segundo
Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000), as escolas clássicas de Estratégia adotam
pressupostos econômicos de decisão racional, segundo uma concepção absoluta
de racionalidade (os estrategistas têm acesso às informações necessárias, conhecem
todas as decisões possíveis e as consequências), são influenciadas pelo pensamento
militar, e pela idéia do mercado como sistema auto-regulado de alocação de recur-
sos escassos (Vasconcelos, 2007). Estas escolas17 são prescritivas, ou seja, propõem
métodos para formular estratégias: o planejador acessa informações, analisa-as
e define a estratégia a ser, então, implementada. Ao final, analisa os resultados
para incorporá-los a uma nova etapa de formulação. Segundo Crubellate, Grave
e Mendes (2004), tais pressupostos remetem a gestão estratégica a um modelo de
escolha racional segundo um processo que é lógico e linear, numa perspectiva em
que estratégia e planejamento podem ser considerados sinônimos, e cujo objetivo
é acessar o ambiente da empresa, projetar seu futuro e ajustar estruturas e recursos
em conformidade, inclusive recursos humanos.

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 59


Capítulo 9

Contraponto institucional

Segundo Lewis, Cardy e Huang (2019), o campo da GRH tem sido criticado pela
ausência de teoria, ou teorização débil. Um aspecto que requer maior fudamenta-
ção é o contexto das decisões e práticas de GRH. Ao enfatizar a escolha racional, o
conceito de alinhamento da GRH reproduz visões mitificadas de como são tomadas
decisões nas organizações. Conforme Crubellate, Grave e Mendes (2004) explicam,
frente ao pressuposto de escolha racional, a perspectiva institucional incorpora ele-
mentos ambientais, culturais, cognitivos e sistêmicos à compreensão da formação
estratégica como processo socialmente construído. A perspectiva institucional per-
mite superar um mito que imperou na literatura administrativa, segundo o qual o
estrategista é alguém capaz de observar a realidade e suas inter-relações, e planejar
ações autonomamente para corrigi-las. A abordagem contingencial já olhava para
o contexto das decisões em GRH, mas na medida em que certas contingências dita-
vam as necessidades de tomada de decisão, entendida como um processo racional.
Na verdade, é um mito a visão do estrategista como absolutamente independente,
racional e onipotente frente à realidade acessível, organizada e coerente.

A teoria institucional vem sendo utilizada para entender a natureza e a eficácia de


sistemas de GRH, atentando aos processos simbólicos e políticos subjacentes, em
vez de aderir a uma racionalidade simples. O contraponto institucional propõe
entender a Gestão de Recursos Humanos não somente como atividades voltadas
à eficiência, mas também, e principalmente, como atividades moldadas pelas di-
mensões cultural e política (seu ambiente institucional) que são inerentes à vida
organizacional e a posicionam no ambiente externo (Meyer e Rowan, 1977). Mui-
tos fatores externos à organização moldam as estruturas e práticas de GRH, de
maneira que a teorização em nível macro é necessária para se entender como e por
que estas respondem a pressões, restrições e prescrições externas. Ou seja, não se
trata de analisar somente as dinâmicas internas das organizações, como é clássico
em GRH18, mas verificar como estas dinâmicas são moldadas e podem moldar o
ambiente institucional.

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 63


Capítulo 10

Contraponto
histórico-contextual

Entre as implicações da teoria, o contraponto revela diferenças entre organizações


operando em ambientes institucionais distintos. Apesar das forças homogeneizan-
tes da globalização, o debate sobre GRH não tem uma coerência universal. Estu-
dos comparativos mostram que a localização tem efeito importante sobre como a
Gestão de Recursos Humanos é entendida, quais stakeholders são privilegiados, quais
práticas têm legitimidade e quais são os prováveis efeitos dessas práticas (Brewster
e Mayrhofer, 2012). Bondarouk e Brewster (2016), por exemplo, destacam que os
países têm sistemas diferentes de GRH pois são contextos diferentes: “A GRH será
diferente entre países pequenos e grandes, entre países ricos e pobres, entre países
estabelecidos há tempo e aqueles que estão buscando se estabelecer, entre países
mono e multilíngues e assim por diante. Estas situações têm ramificações substan-
ciais que afetam o modo como as organizações gerenciam pessoas” (p. 2656). Para
Brewster (1995), a incorporação da GRH em países da Comunidade Européia foi
problemática devido a ambientes institucionais e histórias distintas: Na Europa o
bem-estar social é um valor mais prevalente que a primazia da empresa. No Brasil,
a evolução da GRH foi descrita por Wood, Tonelli e Cooke (2011) como permeada
por movimentos de colonização oriundos do estrangeiro, assimetrias de poder, in-
terdependências e recriações de práticas e de modismos gerenciais, aspectos que são
estudados também pela perspectiva pós-colonialista (Alcadipani e Caldas, 2012).

O contraponto histórico-contextual também chama a atenção ao encaixe sociocul-


tural da GRH. Por exemplo, sujeitos e organizações no setor público têm histórias
e propósitos, além de estarem sujeitos a normas diferentes das do setor privado, o
que faz com que seu ambiente institucional guarde características que devam ser
reconhecidas ao se gerenciar pessoas. Para qualificar o debate sobre gestão pública,
estudos apregoam que se reconheçam as dinâmicas motivacionais e institucionais
das organizações e das carreiras no setor e seus aspectos histórico-culturais, que pe-

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 67


Capítulo 11

Contraponto empírico

Lengnick-Hall et al. (2009) identificam as principais temáticas na literatura em


GRH Estratégica: (1) perspectivas contingentes e de alinhamento (fit); (2) foco nas
contribuições estratégicas de RH; (3) design da estrutura de sistemas de RH; (4)
ampliação do escopo do RH; (5) implementação e execução em RH; (6) mensura-
ção dos resultados em GRH e (7) questões metodológicas. Apesar desta variedade,
para a direção, prioridades como aumentar produtividade, rentabilidade e eficiên-
cia impõem desafios para legitimar temas que não são facilmente compatibilizados
(Kamoche, 1998). A agenda empresarial dominante desvaloriza atividades cuja
contribuição é considerada tênue ou indeterminada, de modo que o RH continua
pressionado para reduzir custos e enxugar suas estruturas. O descolamento entre
a prática das empresas e a pesquisa acadêmica é significativo, e deve ser discutido.

Para o RH, suas funções poderiam alcançar status na organização ao serem reco-
nhecidas como estratégicas. Contudo, para muitos autores, a GRH Estratégica é a
reformulação e a sofisticação dos mecanismos de controle gerencial, coordenados
“estrategicamente” pelo RH na nova situação de financeirização das economias
no contexto do neoliberalismo. Nessa linha, a agenda do RH busca demonstrar
seu valor funcional às empresas e, por isso, perpetua prioridades da gestão, replica
técnicas e instrumentos usados com outros recursos, adotando pressupostos do tipo
“individualismo extremo” (hyper-individualism), incorporando a retórica pró-merca-
do20 à medida que o sistema de produção-consumo promove o individualismo nas
noções de identidade do consumidor, que também se encaixa nas relações de traba-
lho e emprego (Dundon e Rafferty, 2018). A consequência é o não reconhecimento
da natureza complexa do ser humano, ocasionando problemas de credibilidade
e legitimidade da área. Abordagens dominantes em GRH são simplistas pois en-
fatizam a motivação essencialmente econômica do sujeito, pressupõem alienação
nas relações de trabalho21, além da fantasiosa sobreposição da identidade orga-
nizacional à individual (o sujeito se identifica tanto que passa a “ser a empresa”).
Estes pressupostos revelam incompreensão da natureza das relações de trabalho e

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 71


Capítulo 12

Contraponto racional
econômico

Um aspecto fundamental do debate passa por reconhecer que, entre as diversas


críticas feitas à teoria dos recursos, esta teria forte componente estático, enfatizando
o equilíbrio. A firma só consegue sustentar a vantagem competitiva se mantiver
sua estratégia isolada de cópia por parte de outras empresas. Mas, o que hoje é
uma fonte de vantagem competitiva pode, com a mudança do ambiente, tornar-se
a fraqueza da empresa para enfrentar nova concorrência e, assim, a competência
essencial pode tornar-se rigidez essencial da organização (Leonard-Barton, 1992).
Como mostram Teece, Pisano e Shuen (1997), empresas de tecnologia vêm acumu-
lando recursos valiosos, protegidos por patentes, sem que isso se mostre suficiente
para sustentar suas vantagens no médio e longo prazos. Assim, a teoria dos recursos
explica bem a vantagem competitiva em mercados relativamente estáveis. Porém,
um recurso estratégico pode perder este status, por exemplo, no caso de inovações
disruptivas nas tecnologias ou nas dinâmicas de mercado. Estas críticas encontram
paralelo no modo como a teoria dos recursos foi incorporada aos estudos em GRH.

Para a abordagem configuracionista, a visão baseada em recursos (RBV) forneceu


princípios teóricos a estudos empíricos sobre como certas configurações (bundles)
de práticas de GRH (variáveis independentes) afetam o desempenho organizacio-
nal (variáveis dependentes). A arquitetura de RH é o locus de criação de valor da
GRH e compreende sistemas, práticas e competências dos empregados, ou seja, o
modo como é gerido o capital humano da empresa (Becker e Huselid, 2006). No
entanto, a crítica a essas pesquisas sugere impacto limitado do trabalho teórico
da RBV sobre a literatura empírica em GRH, uma vez que a literatura da RBV
fornece simplesmente um contexto teórico para examinar as implicações da GRH
no desempenho da empresa (Barney, 2001; Becker e Huselid, 2006). De acordo
com Dunford, Wright e Snell (2001), em vez de alegar a relação entre GRH e
desempenho, é fundamental reconhecer que os sistemas de GRH podem afetar o

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 75


Capítulo 13

Contraponto cultural

Apesar de inúmeros relatos de mudanças culturais bem sucedidas, a suposição de


que as culturas organizacionais são gerenciáveis é problemática. Numa linha so-
cioantropológica, muitos trabalhos apontam à inadequação da visão que pressupõe
conformidade acrítica dos sujeitos à retórica e ao simbolismo intensivo nas orga-
nizações (Kunda, 1992; Wood, 2000). Os supostos níveis de consenso ignoram a
fragmentação de interesses e de interpretações (Martin, 2002), bem como os modos
criativos como sujeitos atuam no universo corporativo, produzindo consequências
inesperadas (Benson, 1977). Estudos contemporâneos consideram as organizações
como fluxos de interações entre indivíduos dotados de interesses que lutam por
recursos e transformam estruturas sociais (Mascarenhas e Vasconcelos, 2009). Es-
tudos problematizam o próprio conceito de organização; é mais adequado o uso do
verbo organizar, por trazer a ideia de processo (Langley et al., 2013). Nesta perspec-
tiva, a dimensão cultural é histórica, e pode ser contestada, pois as estruturas sociais
abrangem relações de poder e de conflito (Sahlins, 2013). Em posições distintas nas
estruturas, os sujeitos não compartilham, necessariamente, os sentidos e as inten-
ções da administração, e o consenso cultural torna-se um mito.

Numa linha psicossociológica, Lhuilier (2014) fala do indivíduo engajado não so-
mente na intersubjetividade, ou seja, ligado aos outros pelo imaginário e pelo sim-
bólico, mas também em relações de confrontação e transformação da realidade.
Perspectivas transformacionais da gestão consideram a ação do sujeito sob pontos
de vista menos racionalizados e salientam a ambivalência e a singularidade do indi-
víduo: seus aspectos afetivos, culturais, políticos e psíquicos (Dejours, 1987; Vince,
Broussine, 1996; Antonacopoulou e Gabriel, 2001; Carr, 2001; Carr e Gabriel,
2001; Laine, 2007; Liu e Perrewé, 2005; Vince, 2006), a complexidade dos proces-
sos relacionais, de representação, comunicação e socialização -- fenômenos sim-
bólicos e inconscientes nas organizações --, denunciando o mito do alinhamento a
mudanças top-down e a simplicidade do conceito de “resistência à mudança” (Dent
e Goldberg, 1999; Diamond, 1986; Oreg, 2006; Piderit, 2000; Silva e Vergara,
2003). Nesta linha, segundo Lhuilier (2014, p. 16), “nunca é demais dizer: o sentido

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 77


Capítulo 14

Contraponto gerencialista

O contraponto gerencialista observa que a ideia de alinhamento da GRH não con-


segue traduzir a complexidade dos ambientes de negócios, com atenção às cres-
centes demandas por transparência e engajamento com stakeholders. O modelo de
gestão de pessoas deve ser entendido de forma mais ampla, como um conjunto
de recursos, práticas e políticas que suportam a implantação das estratégias com
responsabilidade socioambiental, o que eleva o status do RH e lhe exige posturas
proativas frente às novas questões do campo. Na esfera da gestão, questiona-se a
adaptação, ou seja, a noção de que as estratégias da empresa já estão decididas
antes da estratégia de RH. Ao desconsiderar que os processos de gestão estratégica
e de GRH são interdependentes, ignora-se não só as pessoas mas também a quali-
dade da GRH em contribuir à definição dos rumos da organização, no curto e no
longo prazo.

Trata-se de considerar o potencial da GRH para a mudança e a dinamização da


organização e do próprio ambiente competitivo. Por exemplo, a escola processual
da Estratégia salienta a interdependência dos sujeitos nos vários níveis da organi-
zação, em que os processos de formular e de implantar as estratégias são indisso-
ciáveis. Fazer gestão estratégica requer fazer GRH, algo visto holisticamente como
um esforço coletivo no qual padrões de ação emergem ao longo de processos de
aprendizagem envolvendo sujeitos interagentes cujas iniciativas, eventualmente, se
tornam estratégicas. Pensar estrategicamente envolve análise, intuição e criativida-
de para chegar a sínteses ou perspectivas integradas dos negócios que transcendam
categorias e conceitos tradicionais no mercado e na organização. Também abarca
uma visão de futuro não tão precisamente articulada para dar espaço a uma varie-
dade de iniciativas potencialmente estratégicas.

Estratégias emergentes são linhas de ação reconhecidas somente na medida em


que são desenvolvidas, ou até mesmo somente depois de totalmente implantadas.
Assim, a estratégia global da organização é influenciada por cada decisão tomada,
cada projeto levado adiante (Mariotto, 2003). A clássica seqüência “formulação >

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 79


Capítulo 15

Contraponto crítico

Perspectivas críticas em administração vêm trabalhando a desconstrução de dis-


cursos e ideologias, desnaturalizando processos que são socialmente construídos,
buscando explicar a atual globalização dos interesses gerenciais e a primazia da
racionalidade instrumental sobre as necessidades sociais e humanas (Alvesson,
Deetz, 1999). O contraponto crítico direciona o olhar da GRH aos atuais proces-
sos políticos, econômicos e demográficos que impactam o emprego e a qualidade
de vida26. De acordo com Dundon e Rafferty (2018), para entender a GRH atual,
é fundamental verificar o afastamento do gerencialismo pós-guerra em direção à
crescente financeirização da economia mundial e ampliação do papel dos merca-
dos financeiros, com mudança do eixo do poder dos gerentes aos investidores27, e
novas pressões sobre a GRH.

Segundo Dundon e Rafferty (2018), a atual financeirização das economias pode


ser contextualizada no neoliberalismo, cujas perspectivas cultural e política mar-
cam a ideologia gerencial e a GRH. De uma perspectiva ampla, o neo-liberalismo
é a doutrina da economia política segundo a qual o bem-estar avança quando se
estimula o empreendedorismo em mercados livres. O neoliberalismo fornece essa
base ideológica (maior individualismo voltado ao mercado livre) a diferentes áreas
de negócios, incluindo a GRH, de maneira que, “hoje, tudo na sociedade e nas
organizações seja construído a fazer o sujeito crer na sua vocação de homem li-
vre e criador” (Enriquez, 1997, p. 18). Ainda de acordo com Dundon e Rafferty
(2018), o neoliberalismo minimiza a importância de agentes sociais e institucionais
na crescente desregulamentação dos sistemas de emprego segundo interesses do ca-
pital e através de suposições ideológicas que não são, em si, corretas ou incorretas,
até porque requerem validação analítica ou empírica e ética no contexto onde se
verificarem.

O ressurgimento do individualismo nas relações de trabalho é um desafio a mode-


los social-democratas. A paranoia da guerra fria e o apoio do capital a governos
de centro-direita (começando nas crises econômicas dos anos 1970) culminou em

PARTE 03 - Contrapontos às Abordagens em Recursos Humanos Estratégicos 83


04
O Futuro da Gestão de
Recursos Humanos ou
a Gestão de Recursos
Humanos do Futuro?

Na visão de Boltanski e Chiapello (1999), o capitalismo assimila as críticas que


lhe são feitas. A crítica é a própria força motriz da sua evolução, e isto acontece
porque o sistema revelou-se capaz de formular, em diferentes contextos, esquemas
de justificação que, ao responder a reivindicações da sociedade, garantem a sua
legitimidade. O “novo espírito do capitalismo” nasce da coexistência de um capita-
lismo regenerado e da degradação da situação econômica e social que afeta mais e
mais pessoas. Atualmente, as garantias conferidas pelos diplomas superiores dimi-
nuíram, as aposentadorias estão ameaçadas e desastres ambientais são frequentes,
enquanto as carreiras não são mais asseguradas. Por um lado, o capital vai bem,
mas a sociedade vai mal. Por outro, as procedentes e indignadas críticas ainda não
se fazem acompanhar, paralelamente, de alternativas viáveis e em grande escala.

A lógica de Recursos Humanos se submete a exigências de lucratividade, mas, ago-


ra, liga-se à idéia de que o indivíduo deve ser capaz de ser o diferencial competitivo,
e o paradoxo ganha contornos de realidade. Na busca por melhores posições com-
petitivas, as empresas exigem que o sujeito comprove sua indispensabilidade me-

89
Capítulo 16

Educação e desenvolvimento
de competências no mundo
hiperconectado
André Ofenhejm Mascarenhas
Gabriela Victorelli
Dalila Alves Correa

Uma vasta literatura surgiu recentemente sobre o futuro do trabalho e sobre como
podemos moldá-lo (Balliester e Elsheikhi, 2018). Há incertezas em relação ao que
direciona as mudanças e o que se pode esperar do futuro: os críticos alternam-se
ao apresentarem tanto surtos otimistas quanto pessimistas sobre o tema. Muitos
estudos abordam os impactos da chamada Quarta Revolução Industrial. Porém,
deve-se considerar que, paralelamente à revolução tecnológica, observam-se outros
fatores socioeconômicos amplos, impulsionadores geopolíticos e demográficos que
geram mudanças cujos impactos podem ser ainda mais significativos e duradou-
ros no mundo do trabalho. Este capítulo aborda o cenário da Quarta Revolução
Industrial reconhecendo impactos incertos sobre a evolução da educação para o
trabalho, com especial atenção ao papel do professor e das instituições de ensino
superior. Adotamos como pressuposto a necessidade do diálogo entre o campo da
GRH e os agentes de inovação nos sistemas educacionais atuais.

A denominação Quarta Revolução Industrial refere-se ao conjunto de tendências


na economia, na produção e na sociedade cujos impactos começamos a sentir no
modo como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Para Schwab (2016) as
transformações são em escala, escopo e complexidade nunca antes vistos, evoluem
em ritmo exponencial e trazem mudanças em nível profundo. As novas tecnologias
geram muitas outras e provocam alterações sem precedentes na sociedade, nos ne-
gócios e na vida dos indivíduos, modificando sistemas inteiros; ou seja, não mudam

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 91


Capítulo 17

Breve introdução à inovação


em Gestão de Recursos
Humanos
André Ofenhejm Mascarenhas
Allan Claudius Queiroz Barbosa
Daniel Paulino Teixeira Lopes

Apesar de o discurso da inovação já ter se consolidado em Administração, posi-


cionarmos uma introdução ao tema na seção sobre o futuro da GHR. Trata-se
aqui de chamar a atenção dos leitores para a prática da inovação em GRH, dando
primeiros passos na fundamentação teórica e experimentação. Barreto et al. (2010)
observam, por exemplo, que as políticas e as práticas de recursos humanos, ao
procurar responder questões complexas como integração geracional nas empresas,
baixa qualificação da força de trabalho, baixo comprometimento e engajamen-
to das pessoas, flexibilização do trabalho, equilíbrio entre vida pessoal e trabalho
e reconhecimento do profissional como parceiro estratégico, passam a permitir a
construção de indicadores voltados à mensuração da inovação.

Numa outra via, avançar requer pensar em diferentes approaches que proporcionem
contrutos organizacionais dinâmicos, inovativos e responsivos. Isso porque a área
de RH, nas últimas décadas, está associada a padrões de competitividade e traz à
tona suas recentes e candentes interfaces, muitas vezes inovativas. A dimensão dos
Recursos Humanos, apesar de difícil mensuração, é tida como a principal fonte
de potencial competitivo sustentável (Becker, Huselid, Ulrich, 2001). As práticas
de GRH (recrutamento, seleção, desenvolvimento, gestão de desempenho, remu-
neração etc) impactam decisivamente na dinâmica do comportamento organiza-
cional (liderança, comprometimento, clima e outras) e são consideradas críticas na
criação, implantação e manutenção de capacidades organizacionais, bem como

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 101
Capítulo 18

Gestão de Recursos
Humanos nas organizações
em aprendizagem

Quanto às capacidades dinâmicas, é preciso que as organizações acumulem e re-


combinem recursos em novas configurações capazes de sustentar sua vantagem
competitiva. Proposições teóricas e aplicadas destacam aspectos organizacionais,
gerenciais e de GRH, ao enfatizar a necessidade de construir a organização capaz
de aprender e inovar. Abordam mecanismos e processos que provocam mudanças
organizacionais e se referem a questões de importância para os gerentes: gestão das
mudanças, renovação, adaptação e crescimento (Easterby‐Smith, Lyles e Peteraf,
2009). As linhas teóricas reconhecem também dinâmicas temporais, como ciclos
de vida das capacidades e caminhos evolutivos das empresas e setores, e se ligam
à aprendizagem organizacional, à visão da firma baseada no conhecimento e à
gestão do conhecimento (Fiol e Lyles, 1985; Kogut e Zander, 1992; Easterby-Smith
e Prieto, 2008; Teece, 2018). Podemos associá-las à organização em aprendizagem.
Garvin (2001) fala da organização que dispõe de capacidades para criar, adquirir
e transferir novos conhecimentos, além de modificar seus comportamentos a partir
de novos entendimentos. Este capítulo aborda de forma introdutória aspectos que
caracterizam a Gestão de Recursos Humanos nestas organizações.

Para entender a aprendizagem organizacional, a abordagem interpretativa de Daft


e Weick (1984) é um marco teórico que concebe as organizações como sistemas de
interpretação socialmente construídos na interação dos sujeitos, dotados de seus es-
quemas cognitivos, que comunicam significados e negociam decisões por meio dos
símbolos e da linguagem, em busca de esquemas cognitivos compartilhados (Lyles
e Schwenk, 1992; Prahalad Bettis, 1986). No âmbito dos sujeitos, esquemas cog-
nitivos são conjuntos de conhecimentos (ou cognições), percepções e informações
inter-relacionadas e relativas aos atributos ou à natureza de certa entidade e às suas

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 115
Capítulo 19

Startups e a Gestão de
Recursos Humanos Ágil
André Ofenhejm Mascarenhas

O movimento atual das startups nos ecossistemas de empreendedorismo coloca à


GRH novas oportunidades ao evidenciar aspectos cruciais sobre como as pessoas se
organizam para perseguir o sucesso em situações de alto risco e imprevisibilidade.
O estudo da GRH em startups tem o potencial de revelar como o(s) fundador57(es)
(geralmente, quem toma decisões estratégicas em GRH) assume(m) um papel no
processo de inovação em que suas decisões estão mais diretamente ligadas à orques-
tração de recursos e afetam decisivamente o sucesso ou fracasso da empresa (Pen-
nings, Lee e van Witteloostuijn, 1998; Teece, 2012). Este capítulo trata das oportu-
nidades que o ecossistema de empreendedorismo coloca atualmente à GRH.

Startups e a inovação em Gestão de Recursos Humanos


Startups são empreendimentos nascentes em formatos dinâmicos e temporários,
em rápida aprendizagem e em busca de modelos de negócios rentáveis e escalá-
veis. É comum associar o conceito às empresas baseadas em tecnologia. Segundo
Stinchcombe (1965), empresas jovens enfrentam um conjunto distinto de desafios,
incluindo a obtenção de legitimidade social, estabilidade de recursos e eficiência
operacional. Empresas recém-fundadas enfrentam restrições severas de recursos e
precisam fazer concessões sobre como organizam o trabalho, em que pese o fato
de que poucas terão investido no desenvolvimento de sistemas formais de gestão de
recursos humanos (Cassell et al., 2002).

O ecossistema de empreendedorismo é o ambiente de inovação, em rede e em dis-


tintos graus de maturidade, que acolhe startups de forma a facilitar-lhes o sucesso.
O ecossistema abrange stakeholders: investidores-anjo (pessoas físicas), universidades,

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 125
Capítulo 20

Novas tecnologias e a
Gestão de Recursos
Humanos do futuro
Allan Claudius Queiroz Barbosa
André Ofenhejm Mascarenhas
Thiago Augusto Hernandes Rocha

A GRH vivencia rearranjos em decorrência de novas tecnologias. Desde a década


de 1980 a função de recursos humanos utiliza soluções de tecnologia de informação
(TI) para processar folhas de pagamento e fazer a gestão de benefícios (Desanctis,
1986). Decorridos 40 anos, a TI perpassa de modo muito significativo todos os
processos de RH e tem provocado modificações profundas na forma como seus
serviços são entregues (Bondarouk e Ruël, 2009). Os investimentos em sistemas
capazes de manejar funções de RH estão consolidados, com soluções incorporadas
aos ERP (Enterprise Resource Planning) e, mais recentemente, o boom das HR Techs,
startups no segmento de soluções inovadoras para GRH. Estas evoluções levaram
ao surgimento de uma nova leitura sobre RH. O uso em larga escala de sistemas
dedicados ao manejo de aspectos ligados à GRH cunhou uma área denominada
e-HRM (eletronic human resources management ou gestão de recursos humanos eletrôni-
ca64), que, mais recentemente, abriu caminho ao Human Resource Analytics a partir da
geração de big data. Este capítulo busca compreender como as soluções de analytics
são constituídas e de que forma podem contribuir para configurar a função de RH
como fonte de vantagem competitiva a partir de projetos de e-HRM.

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 133
Capítulo 21

Sustentabilidade e
responsabilidade
socioambiental em GRH
André Ofenhejm Mascarenhas
Allan Claudius Queiroz Barbosa
Charbel José Chiappetta Jabbour
Douglas William Scott Renwick

Sustentabilidade é um conceito de larga multiplicidade semântica frequentemente


referido à manutenção de sistemas no longo prazo, levando-se em conta aspectos
econômicos, sociais e ambientais. O desenvolvimento sustentável (DS) caracteriza o
ambiente histórico e sociopolítico contemporâneo de inserção da GRH como cam-
po especializado relevante (Crane e Matten, 2010; Dyllick e Muff, 2016; Chams
e García-Blandón, 2019). Este capítulo reconhece que, enquanto a maioria das
pesquisas sobre o nexo entre responsabilidade social empresarial (RSE) e sustenta-
bilidade enfoca o nível macro, a GRH pode fornecer referenciais promissores para
apoiar a tradução de estratégias de RSE em ações, práticas e resultados (Jamali,
El Dirani, Harwood, 2015; Järlström, Saru e Vanhala, 2018). Nesta linha, deve-se
expandir a definição do campo às “instituições, discursos e práticas de GRH em
relações de emprego, constituídas por redes de atores das esferas pública e privada”
(Voegtlin e Greenwood, 2016, p. 182) e essa definição deve incluir a responsabilida-
de social empresarial (RSE) e suas relações com as “práticas e estratégias de GRH
contestadas politicamente entre empresa, governo e sociedade civil em torno dos
interesses dos stakeholders em vários contextos institucionais, socioambientais e de
negócios em mudanças” (Voegtlin e Greenwood, 2016, p. 182). O debate contem-
porâneo sobre o nexo entre GRH e RSE abrange sustentabilidade e DS e avança

PARTE 04 - O Futuro da Gestão de Recursos Humanos ou a Gestão de Recursos Humanos do Futuro? 149
05
Gestão de Recursos
Humanos Ontem,
Hoje e Amanhã

Ao chegarmos à parte final, constatamos que a Gestão de Recursos Humanos é


uma das áreas mais dinâmicas da administração e incorpora vertentes conceituais
de várias matizes teóricas ou ideológicas, oriundas de áreas do conhecimento dís-
pares e de campos vizinhos da administração, como a Estratégia e os Estudos Or-
ganizacionais e de Relações de Trabalho. O campo da GRH é crivado de interdis-
ciplinaridade desde sua definição mais elementar, o que se pode verificar por cada
“lente” usada para analisar os comprometimentos teóricos e temáticos nas linhas de
pesquisa e fluxos discursivos em GRH abordados neste livro. Porém, como campo
especializado, sua abordagem contemporânea não pode mais estar atrelada apenas
ao domínio técnico dos processos tradicionais de RH, e sim, abranger as reflexões
e ações que levem em conta as inúmeras questões humanas e sociais implicadas
em organizar as atividades produtivas e perseguir o desenvolvimento sustentável.
Ao seguir estes caminhos somos capazes de construir uma GRH não apenas ciente
dos contextos com os quais o campo dialoga, mas, principalmente, mais atenta e
responsiva frente aos desafios contemporâneos que impactam decisivamente seus
stakeholders.

193
Capítulo 23

Da gestão estratégica à
Gestão Sustentável de
Recursos Humanos

Ao percorrer os tópicos do livro é possível entender que incorporar novas aborda-


gens não descarta sua articulação àquelas práticas usuais, e sim que essa atitude, de
fato, reforça sua relevância, mostrando que novos conceitos incorporados à gestão
estratégica colocam em destaque temáticas e referências teóricas inter-relaciona-
das, mencionadas na obra (ver Quadro 23.1).

QUADRO 23.1
VERTENTES CONCEITUAIS, TEÓRICAS OU IDEOLÓGICAS EM GRH
E COMO APARECEM NESTA OBRA

Vertentes conceituais, Visão de GRH Conceitos prevalentes Seu desenvolvimento


teóricas ou e areas de nesta obra
ideológicas em GRH conhecimento
(sequência na obra)

1 - Administração de Administração de Direito/Legislação Perspectivas


Recursos Humanos recursos humanos é a Processos de RH clássicas,
função administrativa contemporâneas e
que garante a Índices de RH futuras da GRH
dotação da mão de
obra necessária à
empresa.

PARTE 05 - Gestão de Recursos Humanos Ontem, Hoje e Amanhã 195


Capítulo 24

Uma agenda propositiva para


o Futuro do RH

Com o intuito de marcar o debate, apontamos seis possíveis proposições a uma


agenda cujo desafio é reinterpretar papéis da Gestão de Recursos Humanos na
contemporaneidade. Repactuar a agenda é importante porque a GRH ainda não
consolidou a reflexão sobre seu papel na gestão sustentável para além dos limites
organizacionais e de questões ambientais, estando à margem das estratégias de
RSE. O debate segue autores em busca de sínteses para uma abordagem de GRH
que vá além de como as organizações reproduzem mazelas no mundo do trabalho
e na sociedade95.

Superar incoerências em GRH.


Na era da “razão tecnologia”, o diferencial humano nas organizações torna-se mais
evidente, constituindo o desafio em conseguir revelar todo o potencial da visão e da
atuação das pessoas em torno do empreedimento. O gestor se faz pela sua capaci-
dade de entender os negócios - tanto da perspectiva prática quanto de uma mais
abstrata - e desenvolver a natureza social e auto-organizadora das pessoas (Davel e
Vergara, 2005). Nesta linha, pode-se dizer que a função de RH nunca foi tão im-
portante, pois as perspectivas aplicadas da Estratégia e da GRH se fundem no dia
a dia da empresa. O gestor cercado por pessoas deve conseguir entender de modo
significativo seus motivos e seus vínculos sociais no trabalho. Implantar estratégias
torna-se fazer a gestão das relações entre as pessoas que cooperam e cocriam valor.
Propomos que uma perspectiva teórica e aplicada em Gestão Estratégica de Re-
cursos Humanos municie as pessoas tanto a uma visão arguta de como perpetuar
uma organização, como quanto à visão humanista de se construir algo que faça
mais sentido para todos. O pensamento pró-negócios é um dos pilares da GRH

PARTE 05 - Gestão de Recursos Humanos Ontem, Hoje e Amanhã 201

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