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Resumo
1. Introdução
As relações trabalhistas consistem em uma permanente tensão de poder, tendo de
um lado o empregador, com seus interesses corporativos, e do outro o trabalhador,
que deseja obter a melhor remuneração possível pelo seu trabalho e o maior volume
de benefícios trabalhistas. Em alguns casos, os trabalhadores contentam-se com os
salários e os benefícios garantidos em lei. Mas quando percebem que estão em
posição de exigir a ampliação dos benefícios, costumam exercer pressão sobre o
empregador, por meio de ameaça de greves e outras forças de pressão. Para
solucionar esses atritos, entre em cena a negociação de conflitos trabalhistas.
Como negociar com trabalhadores insurgentes de modo que seja resolvido o conflito
sem danos para a empresa e sem gerar a sensação de insatisfação por parte dos
trabalhadores? Para responder ao questionamento, o objetivo geral é identificar as
características de um processo de negociação eficaz, justo e ético. Também
pretende-se descrever as características de um bom negociador; analisar as
diferenças entre negociador da empresa e a parte opositora que representa os
empregados e indicar a importância do planejamento da negociação, principalmente
em empresas sensíveis a conflitos (ACUFF, 2004).
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que será negociado, com quem, que concessões podem ser realizadas e sob quais
condições, os índices máximos de concessões e as propostas alternativas. Deve-se
pensar em qual é o melhor lugar, data e hora para a rodada de negociações. Nada
pode ocorrer por acaso em uma negociação (FERREIRA, 2005).
No processo de negociação com os colaboradores que ameaçam uma greve e
apresentam reivindicações trabalhistas, é preciso ter clara visão do jogo de poderes
que cada lado tem no processo. A relação de trabalho envolve um natural embate de
poderes, e tanto a empresa quanto os trabalhadores sabem disso. O opositor
conhece as fragilidades da empresa, e da mesma forma, a empresa precisa
conhecer os pontos sensíveis dos trabalhadores (VALLE, 2013).
Os trabalhadores sabem que se fizerem uma greve levarão a empresa ao
descumprimento do prazo de entrega das obras. Por isso, seu principal poder está
na possibilidade de fazer greve, que é um direito garantido em lei. Devido a isso,
estão em posição de vantagem diante da empresa. O negociador precisa conhecer
esse poder dos trabalhadores e pensar em estratégias para reduzir esse poder
(FONTANA, 2014).
Os clientes possuem o poder econômico, pois estão pagando pelos projetos. A
opinião deles sobre a idoneidade da empresa e sua capacidade de negociar
conflitos e cumprir prazos é essencial para a manutenção da empresa no mercado.
Além disso, possuem contratos com pesadas multas caso os prazos sejam
quebrados. Por isso, um dos papéis do negociador é não decepcionar os clientes, e
garantir que os prazos sejam cumpridos. Aliás, além de negociar com os
trabalhadores, é necessário também negociar com os clientes (VALLE, 2013).
A empresa, por outro lado, é a contratadora dos trabalhadores e sua eficiência
representa o sucesso dos trabalhadores, da própria e empresa e dos investidores.
Em relação aos trabalhadores, a empresa tem o poder de conceder ou não os
benefícios requeridos. Se for habilidosa, pode definir de que forma e em que
condições concederá o aumento de salário, a participação nos lucros e os planos de
saúde. Também tem poder em relação aos investidores, pois o sucesso da empresa
também representa o sucesso dos investidores, e por isso, surge a oportunidade de
negociar e promover o equilíbrio de poderes(FONTANA, 2014).
Diante disso, conclui-se que a melhor forma de conduzir as negociações é conceder
os benefícios requeridos pelos trabalhadores de forma estratégica, não cedendo às
pressões e pensando calmamente sobre que concessões serão realizadas. Os
limites das concessões precisam estar previstos no plano de negociação previsto na
própria estrutura do negócio. Quando uma empresa possui elevado risco de
conflitos, parte do custo dos serviços é destinado à cobertura dos riscos. Quanto
mais eficiente na gestão dos riscos, maiores são seus lucros (CHIAVENATO, 2009).
O primeiro passo nessa negociação é identificar metodicamente o cenário. Sabe-se
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que as margens de lucro da empresa não são muito grandes, o que limita o valor a
ser negociado com os trabalhadores. Além disso, os salários devem ser pagos em
conformidade com a média salarial praticada no mercado. Não se pode pagar muito
acima do mercado, pois isso gera um desequilíbrio financeiro para todo o setor.
Também não se pode conceder participação nos lucros de forma indiscriminada.
Essa concessão precisa estar atrelada a objetivos estratégicos, com condições para
que os trabalhadores tenham acesso ao benefício. Isso exige um estudo à parte
(FONTANA, 2014).
Os investidores, por sua vez, não estão dispostos a negociar atrasos. A multa que
estipularam deixa isso claro, exatamente porque sabem que uma construtora
enfrenta muitos problemas para entregar a obra. Se os investidores ficarem
insatisfeitos com o trabalho da construtora, farão propaganda negativa, o que
dificultaria futuros contratos (BARBOSA, 2017).
Por isso, o primeiro ponto é encontrar uma margem de aumento salarial justa e
factível. Para chegar a um índice, é importante observar o preço médio praticado no
mercado e as condições de trabalho na empresa, como pontualidade, benefícios,
dentre outras questões. É preciso iniciar um prono de estudo capaz de mostrar
como, quando, de que forma e em que condições pode ser proposta uma
participação nos lucros (BARBOSA, 2017).
Quanto ao plano médico e odontológico, a empresa não precisa custear todo o
plano, nem precisa conceder o plano completo. Deve propor um plano popular, com
participação financeira dos trabalhadores, inicialmente só com atendimento médico.
Essa forma de plano pode ser encontrada no mercado com valores bem
interessantes para grupos maiores de trabalhadores.
A negociação deve acontecer no escritório da empresa, onde o equilíbrio de poder
pende para o lado do empregador. A empresa deve escolher uma data estratégica,
preparar o ambiente, recepcionar bem os representantes dos trabalhadores e do
sindicato e mostrar logo de início que pretende buscar uma solução que seja
vantajosa para os trabalhadores e para a empresa. É importante que os
trabalhadores estejam cientes de que a margem de negociação da empresa é baixa,
e que tentar obter vantagens muito onerosas pode comprometer a saúde financeira
da empresa, com prejuízos para todos (BARBOSA, 2017).
Ética é o comportamento socialmente esperado, que tem como finalidade preservar
a segurança das pessoas no convívio em sociedade. Por isso, os princípios éticos
são defendidos pelas religiões e transformados em leis e normas, que devem ser
seguidos palas pessoas em um grupo. Uma negociação deve ser realizada dentro
de limites éticos. Isso inclui respeito pela parte oponente, disposição para ouvir
atentamente as propostas e respeito às exigências e limites da parte oposta, mesmo
que sejam indesejadas para quem está negociando (SOBRAL, 2009).
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Negociar a partir de uma postura ética é ter respeito pelos direitos das pessoas,
anda que elas estejam se posicionando contra a ética. Deve-se, por exemplo,
preservar a vida e a segurança de um trabalhador, mesmo que ele esteja se
colocando em risco de propósito. Da mesma forma, deve-se respeitar a pessoa do
opositor, mesmo que suas atitudes sejam reprováveis (SOBRAL, 2009).
Alyrio (2007) apresenta uma ampla conceituação de ética, citando diversos autores
que tratam do tema. Para ele, a discussão sobre ética remonta às origens da
sociedade humana, desde o tempo das cavernas. Sempre as pessoas
desenvolveram comportamentos aceitáveis pelo grupo, que seriam condições para
aceitação ou exclusão do indivíduo. Mesmo hoje, a pessoas que agem contra os
princípios éticos são condenadas socialmente, respondendo por seus atos ou caindo
em descrédito.
Bergson (2001) afirma que ética é derivada do instinto, na preservação das
sociedades em que se agrupam os seres. Portanto, existe um posicionamento
universal em favor da ética. Apesar disso, cada sociedade tem seu próprio código de
ética. O que é socialmente aceito em um grupo pode ser um problema ético para
outro. Por isso, é importante conhecer a pessoa ou grupo com o qual se está
negociando. Negociações interculturais costumam ser mais complexas por esse
motivo.
Um exemplo desse conflito ético entre os grupos humanos pode ser exemplificado
pelo hábito de usar roupas ou não. Em algumas comunidades, como uma colônia de
naturistas, andar sem roupas pelas ruas é completamente normal. Anormal seria
alguém ficar escandalizado e se concentrar excessivamente no corpo do outro. Tal
hábito seria considerado altamente ultrajante se praticado na Praça de São Pedro,
no Vaticano. Mesmo em grandes cidades como São Paulo, alguém transitando pelas
ruas sem roupas seria visto como uma ameaça e poderia ser preso (SOBRAL,
2009).
Portanto, a ética é uma construção cultural. Para agir com ética em um processo de
negociação, o primeiro passo é compreender a cultura do outro, com seus valores,
princípios e crenças. Nesse sentido, o negociador não deve se espantar se receber
uma proposta que considera antiética no processo de negociação. Apesar disso,
deve manter sua postura ética, ainda que a outra parte se apresente antiética
(LEÃO, 2018).
Esse princípio vale principalmente nas negociações onde a parte oponente
apresenta fragilidades diante do negociador. Nas negociações salariais, é comum
que os trabalhadores, quando estão sem a representação dos sindicatos, se
apresentem frágeis, defendendo questões importantes com base em pontos
insignificantes. Se o negociador não tiver ética, pode se aproveitar disso para
explorar a parte mais frágil (GAIA, 2017).
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Um exemplo desse tipo de conflito ético nas negociações foi cometido durante a
colonização do Brasil pelos portugueses. Os indígenas, encantados com o povo
branco que viajava em grandes navios, aceitavam trocar bens valiosos por coisas
como espelhos ou fitas coloridas. Consequentemente, a atitude dos navegadores é
criticada como invasão e exploração cultural até a atualidade (SOBRAL, 2009).
Muitas vezes, por falta de conhecimento jurídico, trabalhadores ou clientes podem
propor saídas ilegais para a negociação. Para eles, não há conflito ético em eliminar
a nota fiscal, mentir sobre o real valor das negociações, omitir informações. Mas
para o negociador de uma empresa, manter sua postura em relação a esses pontos
é fundamental para garantir a credibilidade da empresa (GAIA, 2017).
Outro ponto que entra em questionamento é o perfil psicológico do negociador,
principalmente da parte opositora. O negociador de uma empresa, apoiado pelo
conhecimento técnico e extenso treinamento, está preparado para lidar de forma
objetiva em uma mesa de negociação. No entanto, a parte opositora pode não estar.
Dessa forma, aproveitar-se da fragilidade do negociador oposto para tirar vantagens
indevidas fere a ética do negociador (MARQUES, 2002).
Os principais perfis de negociadores são os controladores, que tentam manipular
todo o processo a seu favor, sem se importar com a parte oposta. Nesse sentido, é
importante dar a esse opositor a sensação de que ele está realmente controlando,
mas ficar atento e aproveitar as oportunidades que surgirão ao longo do processo.
No momento adequado, aplicar a estratégia que já estava definida no plano de
negociação (MARQUES, 2002).
O negociador analítico é aquele que observa todos os detalhes do opositor, do
ambiente e da comunicação, tentando ler nas entrelinhas. Muitas vezes o
negociador analítico acaba tirando conclusões infundadas e desviando o foco da
negociação. Nesse caso, o negociador da empresa deve reconduzir a negociação
ao foco, de forma inteligente e estratégica (CHIAVENATO, 2009).
O negociador de estilo apoiador complica o processo de negociação porque quando
lhe convém, apoia-se em outros para se esquivar dos compromissos. Está sempre
dizendo que os outros não aceitarão, que seu patrão não concorda, que a categoria
não aceita isso ou aquilo. Nesse caso, o negociador da empresa pode propor que
esses outros que não concordam sejam consultados ou inseridos na mesa de
negociação (FIALHO, 2012).
O negociador visionário é aquele que tem muitos planos para o futuro, que sonha
alto. Nem sempre consegue se focar no tema que está sendo discutido porque está
olhando muito para frente. Nesse caso, é preciso ficar atento para perceber quando
o tema em discussão está saindo de pauta. Cabe ao negociador da empresa
respeitar a visão utópica do opositor, mas sempre lembrar o que pode ser discutido
naquele momento, com propostas imediatas (FIALHO, 2012).
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Conclusão
Observa-se que a negociação é ao mesmo tempo uma arte, por ter elementos
inatos, e uma técnica, por ser passível de desenvolvimento. Por meio de estudos
adequados, é possível desenvolver as boas práticas de negociação, que envolvem
conhecimento da outra parte, observação minuciosa, capacidade de comunicação,
assertividade, eficácia e profundo senso de ética.
A ética na negociação não é apenas uma questão de princípios, é também parte de
técnica. Respeitar a outra parte, principalmente em suas fragilidades, abre caminho
para futuras negociações em terreno mais harmonioso. Quando uma das partes sai
da negociação com a sensação de derrota, o conflito permanece instalado, e levará
a transtornos no futuro.
A melhor negociação é aquela onda ambas as partes saem com a sensação de
terem alcançado benefícios. A empresa, por ter agregado a seu patrimônio
institucional e experiência de sucesso na solução de um conflito que poderiam ter
comprometido sua imagem e resultados. Os trabalhadores por terem conquistado
benefícios importantes, fazendo deles trabalhadores que acreditam na empresa e
sentem-se orgulhosos por estarem sendo tratados com respeito e justiça.
A pesquisa apontou ainda que negociar é uma função complexa, que exige
planejamento, estratégia, habilidades e capacidade técnica do negociador ou da
equipe envolvida. Assim, toda empresa que lida com riscos de conflitos deve se
preparar para essa função. As estratégias de negociação e os limites do jogo de
poder devem estar previstos em um plano estratégico macro e em planos
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específicos em cada setor da empresa que lida com negociação, inclusive o setor de
gestão de pessoas.
Referências
CLAVELL, James. Sun Tzu: A Arte da Guerra. São Paulo: Best Bolso, 2011.
VALLE, Maria Luiza Rodrigues Ferreira do. Como conduzir negociações eficazes:
Manual do participante. Brasília: SEBRAE, 2013.