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Hermenêutica Bíblica

Material Teórico
Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Paulo Roberto Pedrozo Rocha

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin
Crítica à Teoria do Múltiplo
Sentido da Bíblia

• Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia.

OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Discutir a crítica à teoria dos múltiplos sentidos da Bíblia.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos
e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua
interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de
aprendizagem.
UNIDADE Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia


Para esta Unidade, deixamos uma questão consequente ao trabalho hermenêu-
tico e que aparece claramente em nossos estudos, mesmo que até agora não tenha
sido formalizada em pergunta: São possíveis várias interpretações da Bíblia, tanto
hermenêuticas quanto lidar com os múltiplos sentidos da Bíblia, para que ela não
perca seu sentido original e essencial?
Para responder devemos considerar, embora não dicotomicamente, que há duas
vertentes possíveis basicamente: a católica e a protestante, embora, mais recen-
temente, possamos expandir este universo interpretativo em várias tendências a
partir do Catolicismo e outras tantas a partir dos Reformadores protestantes.
As coisas se passam assim: por um lado, para os Reformadores, somente a Es-
critura é a suprema autoridade em matéria de vida e doutrina.

São princípios da Reforma: sola gratia, sola fides, solus Christus, sacerdócio universal dos fiéis,
Explor

sola Scriptura. Para saber mais, acesse: http://bit.ly/2KJ8wAQ

Como entendemos esses princípios afirmados acima?


Que apenas as Escrituras são o árbitro de todas as controvérsias, dando a supre-
macia da autoridade para as Escrituras. Ela é a norma determinante e não a norma
determinada para todas as decisões de fé e vida, de modo que a autoridade da Escri-
tura fica superior à da Igreja e à da tradição. Por outro lado, a afirmação católica é
a de que “a Igreja ensina” ou “a tradição ensina”. Assim, temos que os reformadores
afirmavam: a Escritura ensina, enquanto o Catolicismo diz: a Igreja ensina.
Veja só o que diz Lutero aos 20 anos sobre sua experiência pessoal, que passa
a ser exemplo para os reformadores, obtida com as Escrituras e com o Cristo reve-
lado nas Escrituras.
Ele diz o que está exposto a seguir.
Quando eu estava com 20 anos de idade, eu ainda não havia visto uma
Bíblia. Eu achava que não existiam Evangelhos ou Epístolas exceto as
que estavam escritas nas liturgias dominicais. Finalmente, encontrei uma
Bíblia na biblioteca e levei-a comigo para o mosteiro. Eu comecei a ler,
reler e ler tudo novamente, para grande surpresa do Dr. Staupitz.

Martinho Lutero

Fica fácil perceber, então, que a exemplo de Lutero, para os reformadores, a


Bíblia não era um livro de doutrinas e proposições a serem aceitas intelectualmente
ou mediante a autoridade da Igreja, mas uma revelação direta, viva e pessoal de
Deus, acessível a qualquer pessoa contrariando o dito católico.
Daí vem a preocupação de colocar as Escrituras nas línguas comuns, tanto
que Lutero faz sua tradução dela e Calvino faz sua tradução introdução ao Novo

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Testamento francês. Assim, a autoridade das Escrituras, para os reformadores da-
quela época, como agora, é intrínseca, e a Igreja não confere autoridade às Escri-
turas, mas apenas a reconhece, pois não poderia ser diferente.

Seria possível que esta autoridade emanasse da divindade delas?

Para eles, os reformadores, existem evidências internas e externas da inspira-


ção e da divina autoridade das Escrituras, mas esses atributos não são passíveis
de “prova”.

A única evidência que importa é o “testemunho interno do Espírito” no coração


do leitor como enfatiza Calvino quando diz que “a menos que haja essa certeza
[pelo testemunho do Espírito], que é maior e mais forte que qualquer juízo humano,
será fútil defender a autoridade da Escritura através de argumentos, ou apoiá-la com
o consenso da Igreja (...)”

Assim, a Igreja não pode se colocar acima da Escritura pelo fato de ter definido
o seu cânon (Novo Testamento). Ela pode apenas reconhecer o que já era aceito há
muito tempo pelos cristãos, de modo que não foi a Igreja que formou a Escritura,
mas vice-versa.

Lutero afirmou com veemência durante toda sua vida que a Igreja, longe de ter
prioridade sobre a Escritura, é na realidade uma criação da Escritura, nascida do
ventre da Escritura.

A mensagem central da Bíblia, o Evangelho, é a única chave para a interpreta-


ção bíblica. Essa ênfase cristocêntrica levou ao estabelecimento de distinções entre
os livros da Bíblia, de modo que nem todos revelam a Cristo com igual clareza. Por
exemplo, os Evangelhos e Paulo o fazem de maneira profunda. Já a carta de Tiago
tem uma limitada ênfase cristológica.

A interpretação alegórica é outro exemplo, vez que são os múltiplos sentidos


atribuídos à Escritura que obscurecem a sua mensagem segundo os reformado-
res protestantes.

Eles deram ênfase ao sentido comum, histórico-gramatical. Afinal, se o Espírito


Santo é o autor último das Escrituras, o inspirador dos profetas e apóstolos, ele não
pode se contradizer, não é mesmo?

De qualquer modo, o princípio do livre exame não significa, por isso, interpretar
as Escrituras de modo subjetivo e exclusivista. É preciso levar em conta a história e
o testemunho da Igreja.

Os protestantes não sentiram necessidade de abandonar os credos do Cristia-


nismo antigo e o testemunho dos Pais da Igreja apenas acreditam que todos eles,
porém, devem ser julgados e avaliados pela Escritura.

Lutero nada sabia de um conhecimento puramente objetivo, desinteressado ou


erudito da Bíblia, ao contrário, para ele a Palavra de Deus é viva significando que
ela vivifica aqueles que nela creem.

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UNIDADE Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

A experiência é necessária para o entendimento da Palavra: esta não deve ser


simplesmente repetida ou conhecida, mas vivida e sentida. Na Escritura, o Deus
vivo e verdadeiro sempre confronta o leitor em julgamento e graça.

São leituras interessantes nesse sentido: Sl 19:7-11; Sl 119; Jo 5:39; Rm 15:4; 2 Tm 3:16-17,
Explor

como encontramos disponíveis em:


• Dei Verbum, sobre a Revelação Divina – Parte 2, disponível em: http://bit.ly/2KNqT7I
• Confissão de Fé Batista de 1689 (parte 01), disponível em: http://bit.ly/2KJXiMn
• Somente a Bíblia? - Razões para rejeitar a Sola Scriptura, disponível em: http://bit.ly/2Mi7wa2

Olhando na perspectiva do Catolicismo, a partir dos doutores medievais da Igreja


e da noção de inspiração divina, a pluralidade de sentidos advém da inspiração para
manifestar a pluralidade da revelação divina.

Tanto que a Comissão Teológica Internacional do Vaticano (2012), afirma que:


Em certa medida, a Igreja necessita claramente de um discurso comum se
quiser comunicar a mensagem única de Cristo ao mundo, tanto teológica
quanto pastoral. Por essa razão, pode-se falar legitimamente da necessi-
dade de certa unidade da teologia. Todavia, aqui a unidade necessita ser
bem compreendida, a fim de que não seja confundida com uniformidade
ou com um único estilo. A unidade da teologia, como a da Igreja, assim
como é professada no Creio, deve ser estreitamente correlacionada com
a ideia de catolicidade e também com a de santidade e apostolicidade.
A catolicidade da Igreja deriva de Cristo mesmo, que é o Salvador de
mundo inteiro e de toda humanidade (cf. Ef 1,3-10; 1Tm 2,3-6). A Igreja,
por essa razão, sente-se em casa em cada nação e cultura, e procura
“reunir tudo para a salvação e santificação”. O fato que há um único
Salvador mostra a existência de uma ligação necessária entre catolicidade
e unidade. No explorar o inesgotável mistério de Deus e os inumeráveis
caminhos pelos quais a graça de Deus opera a salvação em contextos
diversos, a teologia correta e necessariamente assume uma infinidade de
formas, e, ainda, no indagar a única verdade de Deus uno e trino e o uno
plano de salvação centrado no único Senhor Jesus Cristo, essa pluralida-
de deve manifestar traços familiares distintos.

Dessa pluralidade, deve sair uma voz única na medida em que “no princípio era
o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus” (Jo 1,1).

Ver a íntegra do documento do Vaticano, disponível em: http://bit.ly/2MgUeKX


Explor

A Teologia Liberal, disponível em: http://bit.ly/2MjO2BM

O Evangelho de João começa com um “prólogo”. Esse hino destaca o alcance


cósmico da revelação e o ponto culminante da revelação na encarnação da Palavra
de Deus: “O que foi feito nele era a vida, e a vida era a luz dos homens” (Jo 1,3-4).

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Criação e história constituem o espaço e o tempo em que Deus revela a si mesmo. O
mundo, criado por Deus, por meio de sua Palavra (cf. Gn 1), é também, no entanto,
o cenário para a rejeição de Deus pelos seres humanos. Todavia, o amor de Deus
para com eles é sempre infinitamente maior; “e a luz brilha nas trevas, mas as trevas
não a apreenderam” (Jo 1,5). A encarnação do Filho é a culminância de seu imutável
amor: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós; e nós vimos a sua glória, glória
que ele tem junto ao Pai como Filho único, cheio de graça e de verdade” (Jo 1,14).
Explor

Dei Verbum, sobre a Revelação Divina – Parte 2, disponível em: http://bit.ly/2KNqT7I

A revelação de Deus como Pai, que ama o mundo (cf. Jo 3,16; 35), realiza-se na
revelação de Jesus Cristo, crucificado e ressuscitado, o Filho de Deus, o “Salvador
do mundo” (Jo 4,42).

“Muitas vezes e de modos diversos”, Deus falou através dos profetas dos tempos
antigos, mas na plenitude dos tempos, ele nos falou “por meio de seu Filho, a quem
constituiu herdeiro de todas as coisas, e pelo qual fez os séculos” (Hb 1,1-2).

“Ninguém jamais viu a Deus: o Filho único, que estava voltado para o seio do
Pai, este o deu a conhecer” (Jo 1,18).

Bíblia e Ellen White: Duas Autoridades Doutrinárias dentro do Adventismo?


Explor

disponível em: http://bit.ly/2KTXf0S


Somente a Bíblia? - Razões para rejeitar a Sola Scriptura, disponível em: http://bit.ly/2Mi7wa2

E esta voz única deve sim, e por isso mesmo, vir dessa palavra que se fez ver-
bo, porém:
A Igreja venera extremamente as Escrituras, mas é importante reconhecer
que a fé cristã não é uma “religião do livro”; cristianismo é a “religião da
Palavra de Deus”, não de “uma palavra escrita e muda, mas do Verbo en-
carnado e vivo”. O evangelho de Deus é fundamentalmente testemunhado
pela Sagrada Escritura do Antigo e Novo Testamento. As Escrituras são
“inspiradas por Deus e consignadas por escrito de uma vez para sempre”;
portanto, “comunicam imutavelmente a palavra do próprio Deus e fazem
ressoar através das palavras dos Profetas e Apóstolos a voz do Espírito
Santo”. A Tradição é a transmissão fiel da Palavra de Deus, testemunhada
no cânon das Escrituras por meio dos profetas e apóstolos e na leiturgia
(liturgia), martyria (testemunho) e diakonia (serviço) da Igreja.

Dei Verbum, sobre a Revelação Divina – Parte 2, disponível em: http://bit.ly/2KNqT7I


Explor

Aqui também você encontra o mesmo tema em discussão: Comissão teológica interna-
cional – Teologia hoje: perspectivas, princípios e critérios, 2012.
Disponível em: http://bit.ly/2MgUeKX

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UNIDADE Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

Uma vez que Agostinho de Hipona afirma que “a Palavra de Deus foi ouvida por
autores inspirados e transmitida por suas palavras: “Deus fala através de um ser
humano em forma humana; e, falando assim, ele nos procura”, podemos dizer que
o Espírito Santo não só inspirou os autores bíblicos para encontrarem as palavras
certas de testemunho, mas também assiste os leitores da Bíblia em cada época para
entender a Palavra de Deus nas palavras humanas das Sagradas Escrituras.

Assim, segundo esse documento do Vaticano, a relação entre a Escritura e a Tra-


dição está enraizada na verdade que Deus revela na sua Palavra para nossa salva-
ção: “Os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro, a verdade
que Deus, para nossa salvação, quis confiar nas Sagradas Escrituras” e, através dos
tempos, o Espírito Santo “induz os fiéis a toda verdade e faz habitar neles abundan-
temente a palavra de Cristo em toda a sua riqueza (cf. Cl 3,16)”. “A Palavra de Deus
dá-se a nós na Sagrada Escritura, enquanto testemunho inspirado da revelação,
que, juntamente com a Tradição viva da Igreja, constitui a regra suprema da fé”.
A crítica à essa posição pode ser exemplificada pela hermenêutica de Westminster.
De acordo com a hermenêutica neoliberal, é impossível alcançar-se o sentido
original do texto bíblico. É possível explorar uma pretensa “reserva de sentidos”
que há no texto da Bíblia, extraindo “sentidos” que dependerão das circunstâncias
em que estivermos.

Consequentemente, a hermenêutica neoliberal coloca a verdade apenas como


um ideal a ser perseguido, ideal esse que jamais será alcançado com segurança aqui
nessa vida.

Como resultado, jamais poderemos ter certeza absoluta de que conhecemos a


verdade. O máximo que poderemos fazer é afirmar com convicção um dos muitos
sentidos que poderíamos encontrar no texto.

O rótulo “neoliberalismo” tem sido aplicado a esse movimento teológico-hermenêutico


Explor

que preserva alguns dos pressupostos racionalistas do antigo liberalismo e que utiliza con-
ceitos da Filosofia, Hermenêutica, Linguística e Teologia pós-modernas. É particularmente
o sistema de interpretação das Escrituras do neoliberalismo que se constitui um desafio
urgente à doutrina reformada. Convém considerar também que Teologia liberal (ou libe-
ralismo teológico) foi um movimento teológico cuja produção se deu entre o final do século
XVIII e o início do século XX. Relativizando a autoridade da Bíblia, o liberalismo teológico
estabeleceu uma mescla da doutrina bíblica com a Filosofia e as Ciências da Religião. Ainda
hoje, um autor que não reconhece a autoridade final da Bíblia em termos de fé e doutrina
é denominado, pelo protestantismo ortodoxo, “teólogo liberal”. Leia mais sobre Teologia
Liberal, disponível em: http://bit.ly/2Mjsk14
Leia na íntegra o documento “Inspiração Divina e Autoridade da Bíblia – Francisco Barbosa”,
disponível em: http://bit.ly/2KLlVsd

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Partindo de algumas teorias modernas de Linguística, essa hermenêutica sugere
que os autores bíblicos poderiam ter escrito algo que não correspondia à sua inten-
ção original.

Exagera a distância entre o autor e o texto a ponto de não podermos mais en-
contrar a intenção do autor nos textos. Ainda postulam que a Bíblia nada mais é
que uma interpretação da vida e do mundo feita por seus autores, uma maneira de
interpretar a realidade.

O texto bíblico é reduzido ao resultado da busca feita pelos seus autores de sen-
tido na realidade e na história. Esse ensino fere frontalmente o conceito reformado
de que a Bíblia, mesmo tendo sido escrita por homens situados no tempo e no
espaço, é a revelação autorizativa de Deus, e a transforma numa tentativa humana
de compreender a realidade.

Também afirma que é impossível termos conhecimento do sentido pleno e


verdadeiro das Escrituras, já que o texto não tem um único sentido, pleno e ver-
dadeiro, mas múltiplos sentidos. Seguindo o pluralismo religioso do Pós-moder-
nismo, rejeita o conceito de verdade proposicional (de que uma ideia possa ser
verdadeira) e, assim, a possibilidade de alcançarmos a interpretação correta de
uma passagem bíblica.

Essa abordagem interpretativa tem servido de ferramenta para o surgimento das


Teologias ideológicas, Teologias feministas, de libertação e outras, já que transfere
o sentido do autor e do texto para o leitor.

Tradicionalmente, a hermenêutica reformada reconhece a necessidade de apli-


carmos o texto bíblico às diversas situações em que nos encontramos, mas vê essas
aplicações não como “sentidos” novos e múltiplos de um mesmo texto, mas como
a significação do sentido único de um texto para as diversas situações da vida.

As implicações da Hermenêutica neoliberal acabam por tornar a mensagem das


Escrituras inacessível à Igreja. De acordo com eles, acabamos sem Escritura, sem
revelação, sem verdade e sem pregação, podendo, no máximo, pregar apenas uma
interpretação nossa do texto, mas jamais a verdade divina.

Se não podemos alcançar o sentido das Escrituras não nos resta qualquer base
para a doutrina e a prática da Igreja, para decisões teológicas, para o ensino dou-
trinário, para a ordem eclesiástica. Instala-se o caos onde cada um pode interpretar
como queira as Escrituras, as decisões da Igreja e seus símbolos de fé.

Lembremo-nos do que os puritanos escreveram sobre esse assunto na Con-


fissão de Fé de Westminster: o capítulo I da Confissão trata das Escrituras, e
nele os puritanos expressaram suas convicções quanto à correta interpretação
das Escrituras.

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UNIDADE Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

Explor
Você encontrará, entre outras coisas que não estamos estudando aqui, algo mais sobre essa
Confissão, que está resumida a seguir:
• A inspiração e autoridade das Escrituras: uma perspectiva missiológica,
disponível em: http://bit.ly/2KGOjLS
• Escritura da Palavra de Deus, disponível em: http://bit.ly/2KQmsca
• Introdução à Cosmovisão Reformada: Anotações quase aleatórias,
disponível em: http://bit.ly/2KMOGVp
• Confissão de fé de Westminster na íntegra, disponível em: http://bit.ly/2MjkSD1

Esse pequeno resumo dos princípios de interpretação bíblica que se encontram


na Confissão de Fé de Westminster serve para mostrar que os puritanos, seguin-
do a linha de interpretação dos reformadores, entenderam que a única maneira
de interpretar as Escrituras sem violar a sua integridade, propósito e escopo, era
procurar entender o sentido que os autores humanos haviam pretendido transmitir.

Reconheciam que essa nem sempre era uma tarefa fácil, mas confiavam que,
com a ajuda da ação iluminadora do Espírito, do conhecimento das línguas originais
e do contexto histórico, poderiam alcançar esse sentido.

A Teologia que temos na Confissão de Fé de Westminster é o resultado do em-


prego sistemático dessa hermenêutica.

Poderíamos dizer que é uma crítica conciliatória. O que fazer, então, se Tomás
de Aquino afirma na Suma de Teologia que:
Pois a multiplicidade dos sentidos, num escrito, gera a confusão e o engano
e obsta à segurança da arguição. Donde, não resulta nenhuma argumenta-
ção da multiplicidade de proposições, causa esta, antes, de sofismas. Ora,
a Escritura Sagrada deve ser eficaz para mostrar a verdade, sem nenhuma
falácia. Logo, nela não deve haver, numa mesma letra, vários sentidos.

Fonte: http://bit.ly/2MlK7Vg

Para a nota 5, confira:


Explor

Art. 10 — Se na Sagrada Escritura uma mesma letra tem vários sentidos: o histórico ou lite-
ral, o alegório, o tropológico ou moral e o anagógico, disponível em: http://bit.ly/2Mk9qH7

Será uma longa citação, mas que vale a pena para ajudar a refletir: De acordo
com Keith Mathison, há opiniões lá e cá. Uma delas está extensamente expressa
na Confissão de Fé de Westminster que estudamos anteriormente contém uma
declaração sobre a autoridade da Escritura:
A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obe-
decida, não depende do testemunho de qualquer homem ou Igreja, mas
depende somente de Deus (que é a própria verdade), o seu autor; e, por-
tanto, deve ser recebida, porque é a Palavra de Deus. Nós podemos ser
movidos e compelidos, pelo testemunho da Igreja, a um alto e reverente

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apreço pela Escritura Sagrada; e a sublimidade do assunto, a eficácia da
sua doutrina, a majestade do estilo, a concordância de todas as partes, o
escopo do seu todo (que é dar toda a glória a Deus), a plena revelação que
faz do único caminho da salvação do homem, as suas muitas outras ex-
celências incomparáveis e sua completa perfeição, são argumentos pelos
quais abundantemente se evidencia ser a Palavra de Deus; ainda assim,
não obstante, a nossa plena persuasão e certeza de sua verdade infalível
e autoridade divina provêm da operação interna do Espírito Santo, tes-
temunhando por meio da Palavra e com a Palavra em nossos corações
(CFW 1.4-5). (MATHISON, 2017)
Explor

Leia o artigo acima na íntegra, disponível em: http://bit.ly/2L0Wy5Z

Essas palavras refletem o consenso do pensamento das Igrejas Reformadas so-


bre como devemos entender a autoridade da Escritura.

Em suma, a autoridade da Escritura não depende da decisão ou de decreto de


qualquer Igreja ou qualquer homem. Pelo contrário, a Escritura é autorizativa por-
que é a Palavra do Deus vivo.
Explor

Vale muito pensar a respeito e pesquisar como essa discussão se dá hoje!

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UNIDADE Crítica à Teoria do Múltiplo Sentido da Bíblia

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Vídeos
Confissão de Fé de Westminster (1647) - Capítulo 1 - parte 1
https://youtu.be/RuTZ2l5lHGc
Hermenêutica e Exegese Bíblica
https://youtu.be/UqQut2se7BU
Hermenêutica Bíblica II, Videoaula 1
https://youtu.be/mz8PZcMVVtY
5 Regras da hermenêutica para iniciantes / 5 Rules of hermeneutics for initiating
https://youtu.be/yT5ltGQrYlw
Hermenêutica Biblica e Exegese qual a Diferença ?
https://youtu.be/jnZFanBheVQ

Leitura
A leitura, a produção de sentidos e o processo inferencial.
http://bit.ly/2KQqBNg
Método de interpretação bíblica protestante
http://bit.ly/2KPns0i
Historia da Interpretação Cristã da Bíblia – da Idade Média ao Pós-modernismo
http://bit.ly/2KQrdT4
Confissão de Westminster
http://bit.ly/2KGSmYA
A inspiração e autoridade das Escrituras: uma perspectiva missiológica
http://bit.ly/2KGOjLS
Estudo da Palavra de Deus
http://bit.ly/2KQmsca
Introdução à Cosmovisão Reformada: Anotações quase aleatórias
http://bit.ly/2KMOGVp
Hermenêutica
http://bit.ly/2KsvUmc

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Referências
AGOSTINHO DE HIPONA. A doutrina cristã. São Paulo: Paulus, 2002.

ARISTÓTELES. Retórica. Livro II. Tradução de Isis Borges B. da Fonseca com


Retórica das paixões. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

BUZZETTI, C. 4 x 1 um único trecho bíblico e vários “ fazeres”: guia prático


de hermenêutica e pastoral bíblica. São Paulo: Paulinas, 1998.

FEE, G. D.; STUART, D. Entendes o que lês? Apêndices Ênio Mueller. Sem indi-
cação de tradutor. 2.ed.reimp. São Paulo: Vida Nova, 2008.

FERRO, M.; TAVARES, M. Análise das Obras Górgias e Fédon de Platão. 3.ed.
Lisboa: Editorial Presença, 1995.

GADAMER, H. G. Verdade e Método – Traços fundamentais de uma hermenêu-


tica filosófica. São Paulo: Vozes, 2003.

GEFFRÉ, C. Crer e Interpretar – A virada hermenêutica da Teologia. São Paulo:


Vozes, 2004.

GIACÓIA JR, O. Pequeno dicionário de Filosofia contemporânea. São Paulo:


Publifolha, 2006.

GIBELLINI, R. A teologia do século XX. Tradução de João Paixão Netto. São


Paulo: Loyola, 2002.

KORTNER, U. H. J. Introdução à Hermenêutica teológica. São Leopoldo:


Sinodal, 2009.

MORA, J. F. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

PALMER, R. Hermenêutica. Lisboa: 70, 2006.

PETRARCA, F. Lettres familières = Rerum familiarium. Introdução Ugo Dotti.


Tradução de André Longpré. Paris: Les Belles Lettres, 2002.

RICOEUR, P. O Conflito das Interpretações: Ensaios de Hermenêutica. Rio de


Janeiro: Imago, 1969.

SCHLEIERMACHER, F. Hermenêutica – Arte e Técnica da interpretação. São


Paulo: Vozes, 2004.

VATTIMO, G. Para além da Interpretação. O significado da hermenêutica para a


Filosofia. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1999.

Sites visitados
<https://www.bibliaonline.com.br/acf>.

<Bíblia Sagrada on-line. Disponível em: https://www.bibliaon.com/>.

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Você também pode gostar