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CASO
Em uma das cidades mais populosas do Brasil, uma escola da
periferia atendia em média 700 estudantes do 1º ao 9º ano em turnos
parciais. A partir das 7 horas, o movimento aumentava e logo se
escutava o sinal. A inspetora abria o portão e aos poucos o pátio ficava
repleto de crianças e adolescentes. O segundo sinal soava e cada
professor organizava seus alunos em fila para se encaminharem para
as salas.
Na classe do 8º ano, o professor Paulo entrou largando sobre a
mesa sua pasta preta, que bem poderia ser usada em um consultório.
Alto, loiro e muito elegante, tinha 30 anos. Seu sonho era ser médico,
mas as circunstâncias o levaram a escolher o curso de biologia.
Esperou um minuto até todos se organizarem e perguntou:
– Lembraram que hoje é a data final para a entrega da pesquisa? Alguns
olhos se arregalaram; outros se voltaram para o chão.
Por um momento, pareceu que o tempo tinha parado.
– Como eu já disse – continuou o professor –, a nota máxima para esse
trabalho é 8.
– Então, sentou-se à mesa para realizar a chamada.
Apreensivos, os estudantes sentiram o coração acelerar. Um dos
garotos, indignado, pensou: “É injusto! É injusto! Não posso nem reivindicar
meus direitos!”. Uma das meninas abaixou a cabeça e sussurrou à colega
mais próxima:
– Isso é bom para eu aprender; deveria ter ficado calada.
A CRISE
A RECLAMAÇÃO
– Essa foi para perder a fome! – Assim Paulo entrou na sala, e todos se
voltaram para ele.
– O que houve? – questionou o professor Jackson, em tom des
contraído.
– Acabei de ouvir uns absurdos na sala da direção. Uma aluna,
acompanhada da mãe, reclamou que não gosto dela e desatou a chorar,
fazendo cena. Falei que não gosto dela mesmo… Garota inconveniente!
Agora as notas baixas são culpa do professor!
Paulo estava transtornado com a situação, e em segundos a sala foi
tomada por grande alvoroço.
– Isso é ridículo! – exclamou a professora de geografia. – Onde já se viu
vir com a mãe para dizer que o professor não gosta dela?
A aluna que estude!
– E que dê graças a Deus por ter professor para dar aula – completou a
professora de língua portuguesa –, porque, do jeito como as coisas
andam, daqui a um tempo ninguém mais vai querer sa ber de
Educação.
– É bem assim: quando chamamos os pais para falar de seus filhos,
eles não aparecem porque trabalham; agora, para vir reclamar do
professor, têm tempo de sobra – argumentou a professora de
matemática.
– Gente, a coisa está feia mesmo – manifestou-se o professor de
ensino religioso, para surpresa dos colegas, pois era muito reservado. –
Hoje também discuti com uns garotos do 7º ano. E o que mais me
chateia é nada ser feito. A coordenação vive tentando entender os alunos.
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Paulo, agora em tom mais brando, relatava para os presentes detalhes
do que aconteceu, quando uma professora dos anos ini ciais o
interrompeu:
– Paulo, quem é a garota?
– Carla – respondeu ele, em tom irônico.
– Carla?! Não é possível… Ela foi minha aluna no 2º ano, era excelente…
– Sabe o que acontece? Eles crescem e mudam – argumentou a
professora de matemática. – Essa menina já foi ótima aluna, mas anda
bem desinteressada. Soube que os pais dela se separaram e o irmão,
que também estudou aqui, está envolvido com drogas!
– Ah... e a culpa é da escola? – exclamou Paulo, com voz grave.
– Gente, está tudo errado! Temos de valorizar os bons alunos.
Soou o sinal. Todos deveriam retornar às salas para ministrar as duas
últimas aulas daquela sexta-feira. No entanto, o clima estava tenso, e
muitos continuaram a debater. Diante da colocação de Paulo, uma
professora sentiu o coração doer e murmurou para as colegas próximas,
que permaneciam caladas:
– Nosso papel é promover a igualdade, acolher os menos favorecidos.
Conhecimento se encontra em qualquer lugar, mas não amor e carinho.
A escola deve ter esse olhar, sim!
Paulo, ao ouvir o comentário, interveio:
– Faça isso, então! Quero ver você achar tempo para ensinar.
Amar e dar carinho é papel de pai e mãe. Se não fazem isso em
casa, o problema não é meu!
Outra professora continuou:
– Concordo em parte. Se continuar assim, daqui a alguns anos a
escola assumirá todo o papel da família. E onde ficará a função de
ensinar?
Inconformado, Paulo rebateu:
– Até os professores acreditam nisso, e o resultado é termos tantas
famílias que pensam assim. Esse tipo de professor fortalece o
pensamento equivocado das famílias de que temos que gostar de seus
filhos.
Toda aquela conversa gerou um turbilhão de pensamentos. Os
professores caminharam até as salas de aula a passos lentos,
questionando-se: “O que está acontecendo?”, “A cada ano o perfil dos
alunos muda, e as famílias?”, “Será que devo trocar de profissão?”.
O DILEMA DA DIRETORA
QUESTÕES