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Diário de Bordo

Matheus Pereira de Freitas

21 e 22 de outubro de 2019

As minhas expectativas para as disciplinas de estágio são enormes, desde o


início do curso dediquei-me mais à pesquisa e negligenciei a pratica em sala de aula.
Com os estágios, espero superar essa limitação, para que me aproxime mais da
efetividade de ser um profissional da educação. Quando comecei a procurar as escolas,
logo pensei em facilitar o processo de locomoção, visto que a pesquisa toma a maior
parte da minha dinâmica acadêmica, aproveitar o máximo de meus horários seria
crucial. Na primeira aula de estágio, ambas as professoras, Daniela e Josete, enfatizaram
que a experiência de procura deveria privilegiar as condições estruturais e as boas
relações entre os profissionais da instituição. Contudo, decidi privilegiar a proximidade
da escola com a minha casa, sabia da existência de duas escolas municipais próximas e
optei por aquela que a distância seria menor. Trabalho em um Grupo de Pesquisa, além
da Graduação, meu tempo acaba sendo reduzido e prefiro utiliza-lo da melhor forma,
nessa logística, a locomoção é crucial.
No dia 21/10/19, fui para a escola Escola Municipal de Ensino Infantil
Fundamental Gal Ângelo Francisco Notare, localizada no treze de maio. Fui direto a
diretoria fazer-me à parte da dinâmica escolar. A professora Solange, diretora da escola,
atendeu-me muito bem. Pediu para eu buscar o requerimento na prefeitura antes de
iniciarmos a conversa com os professores que, provavelmente, orientar-me-iam.
Todavia, já determinou que havia vaga e que estaria esperando por mim. Hoje, no dia
22/11/19 consegui ir para a prefeitura e emitir o requerimento para começar o estágio,
estou apenas aguardando o processo para retornar à escola.
04 a 11 de novembro
Após o fim dos tramites burocráticos, no que diz respeito à prefeitura, deu-se
início a minha jornada como estagiário da Escola Municipal de Ensino Infantil
Fundamental Gal Ângelo Francisco Notare. A professora Maria José Félix que exerce a
função de orientadora deu-me assistência total no que diz respeito ao conhecimento do
espaço escolar, que dispõe de uma infraestrutura pequena e, talvez por isso, acolhedora.
Contudo, há uma clara consequência entre o acolhimento de um espaço limitado e a
falta de estrutura para os alunos (pouca quantidade de salas e banheiros), afora o acesso
limitado da biblioteca, que por motivos logísticos que desconheço passa a maior parte
do tempo fechado à chave. Com isso, há apenas uma turma de cada série e, o sexto e o
sétimo ano são as que eu exerço o acompanhamento junto da professora.
Logo que se deu início a aula, no dia 04 de novembro, fiquei assombrado com a
bagunça dos alunos, são cerca de 25 alunos no sexto ano e 32 no sétimo. Alguns deles,
os que mais perturbavam os outros e badernavam na sala, teriam a justificativa do
“laudo” médico (segundo a própria professora) e por isso, ela os deixava mais à
vontade, simplesmente não chamava a atenção deles. Isso torna a situação um espiral de
reclamações mínimas por parte da professora e uma falta de controle em sala de aula,
não haveria outra forma de lidar com a situação? Penso que a simples mudança de lugar,
para mais perto do quadro e mais distante dos alunos que conversam entre si, faria
alguma diferença.
De todo modo, a uma clara falta de interesse nos alunos. Com relação ao método
de ensino, a professora atua de forma estruturalista, guiando-se pelo livro didático (série
viver juntos/ SM editora) que cópia no quadro e depois (caso tenha tempo) dá uma
explicação baseada no mesmo material. Em seguida, ela pede para os alunos copiarem o
conteúdo que já possuem no livro (tendo como justificativa a de alguns alunos não
dispõem dos livros). Logo depois, dar-se o “visto” na cópia e em atividades anteriores,
como tarefa de casa, costuma passar os exercícios do livro que valerá um outro visto
que complementará a última nota, uma espécie de compensação pelas recorrentes nota
baixa na prova. Esse modo de conduzir a aula, como bem sabemos, torna-se monótono e
limitado, não há um trabalho com o texto, mas sim, com o conceito, o texto de Lívia
Suassuna “As práticas de Linguagem como objeto de ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa”, aponta-nos para essa cristalização retrógrada do ensino, recorrente desde
os tempos nebulosos da Ditadura Militar. Contudo, estou ciente das limitações dos
professores que ensinam na rede pública, a falta de incentivo e a acomodação que anos
de trabalho proporcionam, não é de se esperar que a maioria das escolas continuam a
insistir nesse método tedioso e repetitivo que: “quando se trata da gramatica, as
atividades desenvolvidas demonstram, inequivocadamente, o predomínio da vertente
normativa e prescritiva dessa dimensão da língua, que se traduz em tarefas de
reconhecimento e nomeação de estruturas” (SUASSUNA, 2014, p.70)
Sabemos da eficácia de outros métodos de ensino da língua portuguesa, como a
proposta defendida primeiramente pelo linguista Geraldi (1984), de se pensar o ensino
da língua portuguesa como uma análise linguística. Por essa perspectiva privilegia-se o
texto e o aluno, o professor seria nada mais que o mediador, ou seja, aquele que se
adequar a realidade do sociocultural do aluno, afim de que o texto dialogue diretamente
com os referidos leitores. Com isso em mente, procurarei, em meu tempo de estágio,
trabalhar com essa perspectiva metodológica em mente. Contudo, sei que devo me
adequar a metodologia ortodoxa da minha professora. Com relação aos conteúdos
ministrados em sala, a professora revisara os adjetivos na turma do sexto ano e no
sétimo ano, ela explicara a diferença entre “mal” e “mau”. Seguindo o método que já
comentei.
Dia: 07/11/19
Neste dia, a professora dedicara para a correção das atividades passadas para a
casa, tanto no sétimo quanto no sexto ano. A professora corrigira os cadernos dos
alunos, contudo, muitos não haviam feito a atividade. Então a professora permitiu que
eles finalizassem na sala. Passaram-se assim, todo o período de duas aulas para cada
turma, os alunos fazendo a atividade, a professora, corrigindo o caderno daqueles que
tinham feito e eu observando-os em suas cadeiras.
Por fim, a professora colocou o assunto da próxima aula no quadro para os
alunos do sexto ano, seria os numerais. Nesse interim, os estudantes conversavam e
permaneceram inquietos até a aula acabar.
Dia: 11/11/19
Neste dia, a professora trabalhara com os alunos do sexto ano a acentuação de
ditongos e acentuação de hiatos. Novamente, o método continuara o mesmo, cópia do
enunciado do livro no quadro, os alunos copiam e só na outra aula há uma discussão
acerca do tema. Os alunos não se concentram em nenhuma das etapas desse processo,
há uma clara falta de interesse, a situação não poderia se reverter sem que a professora
mudasse de postura. Infelizmente, percebo que no ensino fundamental do colégio em
que atuo, o ensino de português não consegue contemplar a primeira das competências
específicas de língua portuguesa presente na BNCC (2017): “Compreender a língua
como fenômeno cultural, histórico, social, variável, heterogêneo e sensível aos
contextos de uso, reconhecendo-a como meio de construção de identidades de seus
usuários e da comunidade a que pertencem” (2017, p.85). O ensino de português é
completamente retirado de seu contexto de uso.
Com relação ao sétimo ano, a professora debruçou-se nos dois tipos de sujeito,
enquanto eu realizava a chamada, ela copiava o assunto no quadro. Os alunos falaram
do assunto apenas na segunda aula, quando terminaram de copiar todo o conteúdo,
enquanto eles copiavam na primeira aula, pedi a professora para passar em cada um
deles e perguntar se eles tinham contato com a literatura e, se não tivessem, qual tipo de
música eles gostavam ou tinham contato. Mais uma vez, tentava me aproximar da
BNCC e de meus próprios princípios como pesquisador e estudioso da literatura:
“Envolver-se em práticas de leitura literária que possibilitem o desenvolvimento do
senso estético para fruição, valorizando a literatura e outras manifestações artístico-
culturais como formas de acesso às dimensões lúdicas, de imaginário e encantamento,
reconhecendo o potencial transformador e humanizador da experiência com a literatura”
(2017, p.85). Alguns alunos sinalizaram que gostavam de Harry Potter (1997), Diário
de um banana (2007), O pequeno príncipe (1943) e da série “fala sério” (2004), o
restante apresentava estilos alternados de música, funk, sertanejo, pop e mpb. Pretendo
me utilizar do material para realizar uma oficina com base nos alunos.

Dia: 13/11/19
Não fui para a aula na escola, já que, hoje seria o dia de dividirmos nossas
experiências iniciais com a professora Daniela Segabinazi. Foram boas as explanações
dos meus colegas, saber que eles já estavam atuando e desenvolvendo uma boa
interação com seus alunos, foi reconfortante. Por outro lado, alguns relataram a falta de
interesse e o desencorajamento dos professores, na minha escola, os professores
também comentam sobre a desvalorização da área e como escolher qualquer outro
caminho valeria mais a pena. Apesar de não ser uma energia positiva, compreendo suas
frustrações e não me abalo com esses comentários.
Por fim, a professora Segabinazi, orientou-me no trato com os alunos, ter o
devido cuidado em não me envolver com as intrigas dos alunos e me resguarda em
apenas observar. Não poderia fazer frente a alguns absurdos que presenciara nesse
tempo de estagio, xingamentos e agressões entre os alunos, afora a grande conversa e
falta de comprometimento nas aulas.
Dias: 18/11/19 e 20/11/19
Seguindo com as atividades na escola, o acompanhamento ao lado da professora
se deu de maneira satisfatório, apesar das minhas reticências com seu método,
majoritariamente, estruturalista. A professora, de forma, alguma desqualifica ou nega a
realidade ou a condição de seus alunos, há interações extraclasse e, uma clara relação de
afeto entre ela e seus alunos. Contudo, essa aproximação não consegue diluir-se com
sua abordagem em sala de aula. Algo que Bordini (1991) nos aponta com clareza:
O outro é a medida: é para o outro que se produz o texto. E o
outro não se inscreve no texto apenas no seu processo de
produção de sentidos na leitura. O outro insere-se já na
produção, como condição necessária para que o texto exista. É
porque se sabe do outro que um texto acabado não é fechado em
si mesmo. Seu sentido, por maior precisão que lhe queira dar seu
autor, e ele o sabe, é já na produção um sentido construído a
dois (GERALDI apud SUASSUNA, 2014, p.74)

Amiúdes, minhas interações em sala permanecem sendo as mais básicas.


Realizar a chamada, escrever no quadro o assunto ou as questões do livro didático e
verificar as lições dos alunos. Os alunos do sexto anos parecem compartilhar uma
relação mínima de amizade comigo, gostam de puxar assunto antes de iniciar a aula,
perguntando-me se gosto do curso ou desde quando moro no bairro. Contudo, com os
alunos do sétimo ano eu não tenho muita abertura de fala, eles sentem mais temor das
possíveis reclamações, que eu não poderia lhes dar, ou mesmo desconforto em serem
observados por mim durante a aula da professora.
Ambas as turmas, sexto e sétimo, continuam com seu comportamento inquieto e,
por muitas vezes, agressivo. Apesar do desconforto da professora e de suas
reclamações, os alunos ainda não conseguem deixar de serem influenciados pelos seus
desinteresses e clara inquietação em saírem da escola. São nesses momentos, que me
pergunto qual tipo de método e material seria mais adequada para a realidade desses
alunos. Algo que observo em seu cotidiano, são as recorrentes perguntas sobre seus
relacionamentos afetivos entre si. A conversa, em muitas situações, inicia-se com essas
perguntas ou provocações que acabam por abafar as aulas de “quais os tipos de sujeito”
ou mesmo das regras básicas de acentuação (conteúdos que foram revisados pela
professora no dia 18 de novembro na turma do sétimo ano). Com relação aos alunos do
sexto ano, a professora realizou uma revisão dos tipos de numerais, o diferencial foi que
na utilização dos exemplos, a professora utilizou os alunos para a explicação, “Italo
mora no décimo andar, são cinco andares acima de Lorena”, assim os alunos divertiram-
se com a diferenciação dos numerais ordinais e cardinais.
Sinto que o conteúdo passível de ser ministrado no sétimo deveria ter enfoque
em suas áreas de interesse, música e jogos de celular. Com o funk eu poderia trabalhar
noções de identidade e a realidade nas comunidades, sei que a maioria dos alunos detêm
pouca renda e dependem enormemente da alimentação fornecida pela escola.
Dias: 25/11/2019 e 28/11/2019
Conforme combinado com a professora Maria, resolvemos que esse seria o dia
da revisão dos alunos do sexto ano (25/11/2019). Sendo assim, a professora incentivou-
me a fazer uma atividade que valeria uma pontuação extra de dois pontos. Para isso, era
preciso realizar uma tarefa que contemplasse os numerais e as regras de acentuação
(oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas). Foi então que montei uma pequena proposta
de gincana. Para a revisão de ambos os assuntos decidi propor aos alunos a confecção
de cinco frases, cujos elementos deveriam ser feitas de pelo menos: uma palavra oxítona
(sem acento), oxítona (com acento), paroxítona (sem acento), paroxítona (com acento) e
uma proparoxítona; além de um numeral cardinal, ordinal, fracionário, multiplicativo e
coletivo. O intuito era que os alunos raciocinassem que os próprios numerais também se
apresentavam como oxítonas, paroxítonas e proparoxítonas, desse modo, um assunto
complementaria o outro. Com isso, as equipes poderiam terminar a atividade
rapidamente. Após explicar a atividade e, dando um exemplo no quadro (“Na primeira
vez que fui à praia, encontrei muito plástico”), dividimos as equipes da sala em meninos
e meninas, e iniciamos a minha primeira intervenção com a turma.
Quando começamos, os alunos se organizaram com suas devidas equipes e o
trabalho não iniciara até que tiramos às dúvidas dos estudantes. As meninas pareciam
refletir mais no conteúdo das frases, incentivei-as a fazerem frases engraçados, logo,
elas tentaram misturar os numerais com rimas e cantigas de roda. Fora então que
criaram a seguinte frase: “Uma batatinha quando nasceu se esparramou no chão”,
seguida de “Beatriz nasceu no sétimo dia do mês”. Já os meninos criaram as seguintes
frases: “O mágico faz mágica no dia vinte”, “Carlos comprou um carro pela primeira
vez” e “Ainda tenho metade do lápis”. No fim, acabou que os alunos não conseguiram
fazer as cinco frases, os meninos fizeram três e as meninas fizeram duas. Vale salientar
que nem todos fizeram a atividade, alguns ficaram conversando em suas cadeiras apesar
dos meus pedidos para se juntarem com os demais. Antes de encerramos acabei dando
os exemplos que faltaram e a professora registrou a atividade e a pontuação dos
estudantes, deu a pontuação máxima para os alunos, inclusive para aqueles que não
participaram.
Minhas expectativas era a de que os alunos fugissem das frases prontas, nos
exercícios didáticos e nas provas, os estudantes deparavam-se com as sentenças que
teriam de classificar. O pensamento de criar e modificar a palavra, é recorrentemente
impedido pelo método estruturalista. Gostaria de ter explorado mais a atividade,
simplificando-a ou diminuindo o número de frases que pedira, de cinco para três por
exemplo.
Enquanto isso, nas aulas do sétimo ano, a professora realizou uma tarefa de
interpretação textual, os alunos envolveram-se bem mais que as aulas de gramática
tradicional que eu acompanhara até aquele momento. Relatei, mais uma vez, o quanto a
música chamava a atenção dos estudantes já que a atividade consistia numa
interpretação da música do grupo nacional, Capital Inicial.
Na quarta-feira (28/11/2019) fora a vez dos alunos da sétima série. Como eu
sabia que eles são bem menos participativos do que os alunos mais novos, resolvi
pensar numa atividade que envolvesse também a movimentação corporal. Resolvi, com
a orientação da professora, fazer um “passa repassa” com eles. Fazendo uso de uma
sacola, colocamos algumas situações para os alunos montarem frases, “uma frase que
tenha uma oxítona sem acento e um sujeito composto”, a partir dos tipos de sujeito
(relacionando as regras de pontuação com os tipos de sujeito, como se dera no sexto
ano). Novamente, separamos a sala em dois grupos e fizemos a atividade. Permitimos a
utilização do livro didático, assim, eles conseguiram realizar a tarefa sem grandes
problemas. Os alunos, montavam as frases oralmente, o intuito era que, posteriormente,
cada grupo anotasse as frases que criaram no quadro, para não interromper a dinâmica
da gincana. Contudo, havia uma clara dificuldade dos estudantes de lembrarem e
utilizarem os conceitos na prática, mesmo faltando pouco tempo para a prova, tendo em
vista que o assunto havia sido revisado a pouco tempo. Dois alunos me perguntaram o
que seria um “sujeito oculto” e outro me perguntara o que seria um “sujeito composto”,
busquei exemplos do livro e expliquei os tipos de sujeito brevemente. Nesse instante,
recebemos a visita da professora Josete e, por isso, acabamos com a atividade sem
concluí-la.
Apesar dos alunos terem recebido os dois pontos de participação, percebi que a
atividade não foi tão efetiva, frente a clara dificuldade dos alunos, teria sido melhor ter
feito uma revisão pormenorizada do conteúdo, levando em consideração textos musicais
ou retirados do próprio livro didático. Frustrei-me mais uma vez com minha decisão, já
que tinha receio de trabalhar com o desinteresse dos alunos e, inventando uma atividade
mais agitada, perdia a compostura e o andamento da aula.
Dia: 02/12/2019
Os alunos tiveram a sua última aula antes da prova. Logo após a chamada, a
professora realizou tarefas de revisão no sexto e no sétimo ano, recapitulando o
conteúdo a partir das atividades do livro didático. Nessas circunstâncias, os estudantes
não se interessaram em tirar dúvidas ou mesmo em participar efetivamente da aula.
Mais uma vez, a cópia do quadro e os seguimentos do livro didático não chamaram a
atenção dos alunos para os ensinamentos da professora.
São nesses momentos que me pergunto se os alunos se debruçariam com mais
interesse nas aulas, caso tivessem maior contato com a literatura. Já que este privilegia o
próprio lugar de ser, a própria identificação com seu íntimo, com sua subjetividade.
Para muitos dos alunos, a aula não significa nada, pelo simples distanciamento de suas
realidades e da compreensão gramatical, ou da interpretação superficial de tirinhas.
Muitos ainda não tiveram a leitura como afirma Kramer (1999):
O leitor leva rastros do vivido no momento da leitura para depois ou para fora
do momento imediato – isso torna a leitura uma experiência. Sendo mediada
ou mediadora, a leitura levada pelo sujeito para além do dado imediato
permite pensar, ser crítico da situação, relacionar o antes e o depois, entender
a história, ser parte dela, continua-la, modifica-la. Desvelar (Kramer apaud
Suassuna, 1999, p. 107)

Dias: 04/12/19 e 05/12/19


Com as provas do estágio iniciando nesta quarta-feira, a ida ao minicurso de
Rildo Cosson, culminaram no fim das minhas atividades em campo. As aulas com o
professor, acompanharam uma enorme expectativa de minha parte, em outras cadeiras,
conheci o conceito de letramento literário e conhecer seu criador foi uma experiência
singular. A aula começou com considerações que ainda não tinha parado para pensar em
meu tempo de curso, a importância das avaliações (se elas conseguiram atingir um
propósito além da nota), a diferença entre alunos reais e alunos ideais, por exemplo.
Entrementes, o professor permitiu reflexões sore um teste de classe, que “tipo de leitor”
o professor tem em sala e se, após o termino das aulas, houveram mudanças na
perspectiva de leituras desses alunos. Para Rildo Cosson, uma avaliação deve ser:
global, integradora, motivadora, sistemática, contínua, orientadora e processual, ou seja,
deve reter um significado para os alunos e os professores.
No outro segmento da aula, fizemos uma atividade que deveria contemplar um
dos textos dispostos no sigaa. No caso do meu grupo, ficamos responsável pelo texto “a
canoa que virou coisa” conto baseado numa lenda indígena. Após pensarmos em como
trabalhar com o texto em sala de aula, tendo em vista que deveria ser uma atividade
avaliativo. Cosson olhou nossa primeira proposta e disse que deveríamos que melhorar,
fora apenas no dia seguinte (05/12/19), após enxugarmos as etapas e focar num aspecto
específico, que conseguimos terminar a atividade. Transcrevendo-a para o diário: seria
uma atividade para o sexto ano e ocorreria uma semana após o dia do índio. As etapas
seriam as seguintes: 1. Leitura em conjunto; 2. Discussão da moral da história,
identificando e relacionando com situações do contemporâneo (desmatamento e
apropriação das terras indígenas); 3. Confecção da Performance, encenar um novo final
para a narrativa; 4. Método de avaliação: observar como os alunos utilizaram a
criatividade do tema discutido para recriar e refletir sobre o enredo.
Após ouvirmos a proposta dos outros grupos, acabamos com o minicurso de
Rildo Cosson com um projeto de oficina em mãos.

Dia 12/12/19
No último dia de aula antes das férias, tivemos orientações individuais acerca
das oficinas. Minha ideia era a de trabalhar poesia, já que alguns alunos tinham contato
com esse gênero poético. Além de que, para aqueles que só tinham contato e
aproximação com a música, a poesia poderia ser trabalhada numa comparação com a
música. A professora orientou-me e optei por trabalhar diretamente com a música e o
texto poético. Especificamente, o funk e o texto poético.

Dia 02/03/20
Durante o período das férias, pude refletir pouco na experiência que desfrutei
nos estágios. Estava, de maneira geral, insatisfeito com minha performance e lembrei da
dica inicial das professoras, “escolham uma escola com bons professores, independente
da distância”. Por motivos práticos, escolhi justamente o oposto, não acho que a minha
escola seja ruim ou que a professora seja uma má profissional, apenas acho que o
método de aprendizagem, estruturalista, suprime e sufoca inadvertidamente o interesse
dos alunos. A biblioteca permaneceu fechada em todo o período em que estive como
estagiário, apenas alguns alunos do sexto ano tiveram experiência de leitura, partia-me o
coração não ter abertura para falar de literatura e a minha esperança seria ministrar a
oficina.
A primeira vez que visitei a escola, fora no início de fevereiro, contudo, havia se
iniciado uma reforma e a escola ainda estava adaptando o novo horário acadêmica, a
diretora orientou-me falar com a professora acerca dos novos horários. Infelizmente,
apenas na quinta-feira eu estaria com ela em sala. Planejei meus horários de forma que
eu fosse três dias da semana, sendo que a segunda e quarta eu permaneceria na sala dos
professores sem estar propriamente em sala de aula.
Nesse tempo ficava na sala dos professores lendo, não conseguia falar com os
outros professores da escola porque poucos tinham horário vago e, quando terminavam
suas aulas eles iam para casa. Contudo, a professora de biologia conversava um pouco
comigo, perguntava como estava a faculdade e sim estava gostando da escola. O único
contanto que tinha com os alunos era no intervalo, saia da sala dos professores e ia para
o pátio conversar um pouco com eles. Falávamos de música e desenhos de forma geral,
tentava incentiva-los a lerem alguma coisa, falei um pouco do conto “A máscara da
morte Escarlate” de Edgar Allan Poe para Gustavo, um aluno do sétimo ano, ele pareceu
interessado mas quando ofereci uma cópia do conto, ele recusou, disse que não
precisava. Anotei no caderno, para lembrar de dar uma cópia mesmo assim. No fim,
retornei para casa depois que as aulas se encerraram.

Dia:05/03
A minha orientadora, professora Maria José, havia iniciado o ano letivo com
todas as turmas do fundamental, visto que a antiga professora estava de licença.
Contudo, quando retornei à escola ela já havia se estabilizado com as turmas de sexto e
sétimo ano. Retornei, realmente com as atividades habituais de estagiário, no dia cinco
de março, a escola estava mobilizada para o carnaval. Os alunos do sétimo ano haviam
feito três textos: um poema em conjunto com a professora e duas músicas (uma paródia
e uma música com a temática do carnaval).
Havia faltado um dos professores e, em determinado momento, a professora me
pediu para ficar sozinho com os alunos até a apresentação começar. Fui tomado por
apreensão já que, até aquele momento nunca estive sem o acompanhamento dela em
sala. Os alunos haviam acabado de receber os livros didáticos e eu quis trabalhar uma
questão de interpretação de texto, contudo, os alunos pediram para ensaiar os textos
para a apresentação, então deixei-os a vontade. Contudo, logo os alunos pararam de
ensaiar e começaram a conversar entre si, não consegui estabelecer uma organização e
por mais que pedisse para lerem a questão, eles não acataram. Senti-me muito frustrado
e chateado, poderia ter preparado algo para eles se não tivesse sido requisitado de última
hora. Seguiu-se essa desorganização até que os alunos foram se apresentar com o
restante da escola.
Primeiramente, a diretora anunciara que aquele momento era a comemoração do
carnaval que ela devia a eles, era improvisado, mas com carinho, afirmava a diretora.
Mais tarde, a situação me lembrou o conto de Clarice, Restos de Carnaval, com certeza
alguns dos alunos conseguiram desfrutar do feriado carnavalesco, mas imaginei a
parcela sem oportunidade ou vontade de pular o carnaval, aquela pequena comemoração
era a pequena parcela do feriado que alguns não puderam desfrutar. Ouvi todas as
interpretações dos alunos. Com certeza, aquelas apresentações amparavam-se numa das
passagens da ABNT, a de entender a língua como “meio de construção de identidades
de seus usuários e da comunidade a que pertencem” (2017, p.85).
As apresentações tiraram um pouco da minha tristeza em sala, fui para casa em
seguida para pensar se um dia conseguiria ter mais controle e organização as minhas
aulas. Preciso urgentemente de prática em sala de aula.

Dia:09/03/20
Novamente, fiquei na sala dos professores, levara o livro de Vargas Llosa,
Travessuras da menina má, e lia a espera do intervalo para uma interação, mínima que
fosse, com os alunos. Fui conversar novamente com o grupo de três amigos, Gustavo,
Marcelo e João, já que esses eram quem se aproximavam mais de mim para conversar.
Acabei tentando discutir a narrativa de um dos desenhos que os três assistiram, um
anime japonês chamado, One punch man, na trama o personagem derrota todos com um
único e se frustra, constantemente por não ter um desafio, é uma comédia. Tentei
dialogar justamente com isso, como um desenho cativante e de comédia reflete uma
ideia de frustração e tédio, sentimos empatia pelo personagem e não achamos sem
graças as lutas curtas e com o mesmo resultado. Eles riram um pouco do raciocínio e
disseram que gostavam do anime pela diversão e pelo desespero do protagonista super
poderoso, mas mesmo assim insatisfeito. Fiquei feliz de ter conversado sobre a narrativa
com eles, fora o mais próximo de uma opinião literária que eu pude absorver de meus
alunos. Na próxima semana, iria começar a apresentação da Oficina.

Dia: 12/03/20
Neste dia, estava ansioso para a aplicação da oficina. A professora me reservou
duas aulas para a aplicação dividido em duas semanas, um total de três horas. Como
consta em meu planejamento, esperava o dobro de tempo para exercer a oficina, mas, de
toda forma, entendia a situação de mudança de turma e de horário, não tinha como ser
diferente. Como as aulas seguidas aconteciam na quinta-feira, tive sorte de desfrutar do
horário seguido. Os alunos do sétimo, que no ano passado eu acompanhava como o
sétimo, não gostavam do gênero funk, mas só soube disso quando apliquei a oficina
com eles. Durante a aula, os alunos ficaram em círculo e eu me dispus sentado numas
das extremidades. Quando iniciei, os alunos disseram que já não aguentavam mais a
música, apesar deles terem escrito uma paródia baseado nela algumas semanas
anteriores. De toda forma, eles pediram para não tocar a música na caixinha de som,
pedi então para imaginarem a letra sem o ritmo da canção (havia entregado um papel
com o poema de Manuel de Barros e a música de Thiaguinho MT). Eles leram em voz
alta e acabaram entonando a música no ritmo, eles riram e então comecei a discutir com
eles o que era mais importante numa música, o ritmo ou a letra. Depois de alguns
minutos, a maioria respondeu que era o ritmo que mais chamava a atenção, inclusive no
gênero funk.
Em seguida, perguntei a cada um dos alunos qual era a música ou o estilo
musical que eles mais gostavam, as respostas foram das mais variadas, desde Kpop
(música coreana) a MPB atual (Melín). Assim, coloquei na caixa de som um trecho de
cada música que eles pediram, nesses primeiros momentos a oficina correu bem e os
alunos participaram atividade. Contudo, depois desse exercício, pedi para observarem o
outro texto no papel o poema O menino que carregava água na peneira. Li em voz alta
o texto e perguntei se tinham palavras que eles não entenderam, disseram-me:
“alicerce”, “peraltagens” e “orvalhos” (palavras que eram cruciais para o entendimento
do texto), depois de explicadas, pedi para que lessem o texto mais uma vez, agora em
silêncio.
Poucos fizeram isso, apesar dos meus pedidos, alguns alunos conversavam entre
si e outros faziam outra atividade, estavam pintando o caderno. Os que leram pararam e
quando perguntei se sentiram alguma diferença me disseram que sim, mas mesmo assim
não entenderam muito bem o texto. Meu intuito era lê cada verso e procurar entender o
motivo do menino gostar de levar a água na peneira, queria que eles entendessem que
cada verso sinalizava para um significado e uma lógica, a de que brincar e escrever com
as palavras era carregar “água na peneira”, era preferir os “vazios” do que o cheio.
Contudo, quando comecei a indagar os alunos sobre cada verso, eles já não queriam
mais ler o texto novamente, apesar dos meus pedidos, nesse instante só tinha mais
quinze minutos, os alunos não quiseram me escutar e preferiram conversar entre si.
Estava próximo do horário do intervalo, então alguns alunos se levantaram e foram
esperar próximo a porta. Dei fim a oficina sem conseguir explanar o texto e com os
alunos pedindo para tocar outra música.
Com isso, acabei a oficina extremamente chateado e frustrado, senti que fui um
péssimo professor por não conseguir encantar os alunos e leva-los a lerem o texto, esse
era o principal objetivo da oficina. Decidi caprichar no próximo e último encontro,
queria o mínimo de interesse por parte deles no texto literário e não na música.
Contudo, com a suspensão das aulas, não pude recompensar minhas falhas e senti-me
mais amargurado com a execução das oficinas.

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