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CRÉDITOS:

Texto:
Autor - Dr. Dagoberto José Fonseca
Professor Doutor do Departamento de Antropologia, Política e Filosofia, Coordenador do Centro de Estudos das Culturas e
Línguas Africanas e da Diáspora Negra (CLADIN) e do Laboratório de Estudos Africanos, Afro-Brasileiros e da Diversidade (LEAD)
da Faculdade de Ciências e Letras - Campus de Araraquara - UNESP.

Coordenação da Publicação: “Trilhas Negras e Indígenas”

Profa. Dra. Rachel de Oliveira


Coordenadora do Projeto Trilhas Negras (2005/2006); Professora Titular de Ensino Fundamental (aposentada); Professora
Doutora membro do Departamento de Ciências da Educação da Universidade Estadual de Santa Cruz- UESC – BA – Ilhéus

Profa. Dra. Maria Aparecida Silva Bento


Diretora do CEERT; Doutora em Psicologia pelo Instituto de Psicologia da USP; Pesquisadora Associada do Instituto de Psicologia
da USP; Ex-conselheira titular do Conselho Nacional de Segurança Alimentar – CONSEA; Membro da Comissão de Direitos
Humanos do Conselho Federal de Psicologia e autora de diversos livros e teses.

Diagramação: Jucelino Alves

Colaboração Técnica CEERT


Dra. Marly Silveira - Pedagoga
Profª Dra. Lucimar Rosa Dias - Pedagoga
Daniela Portela - Pedagoga
Neusa Poli - Educadora
Júlia Rosemberg - Psicóloga
Mafoane Odara Poli Santos - Psicóloga
Shirley Santos -Psicóloga
Myriam Chinalli - Psicanalista

São Paulo - 2008


CONE

Informações sobre a CONE


HISTÓRICO A segunda e a terceira etapas, correspondem à sistematização
e análise dos dados e à elaboração de publicações. Para a
Esta publicação resulta de ações desenvolvidas no projeto realização destas etapas, a Secretaria contratou o CEERT –
“Trilhas Negras e Indígenas” da Secretaria Municipal de Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades,
Educação de São Paulo, por meio do Grupo de Educação Étnico- que tem larga experiência com este tipo de trabalho. Desta
cultural. Este projeto, que durou oito meses (janeiro a outubro forma, foram desenvolvidas duas publicações:
de 2006), teve como objetivo principal obter informações das
A primeira, já lançada, comportando os resultados da
escolas da rede (CEI, EMEI, EMEF, EJA e CECI) sobre os motivos
consulta, analisa os fatores que mais se destacaram nas
que contribuem e/ou facilitam a implementação das Diretrizes
respostas das escolas.
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-
raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira E a segunda, esta rica publicação, elaborada pelo Prof.
e Africana. Também interessava saber se, e como, as escolas Dr. Dagoberto Fonseca, busca oferecer uma resposta
incluem os princípios contidos nestas diretrizes. E, além disso, substantiva, a uma das recorrentes problemáticas colocadas
analisar o material obtido e organizar publicações, a fim de pelos professores: a ausência de material sobre a história da
colaborar na definição de futuras ações neste campo. África e dos descendentes de africanos no Brasil .
Para conseguir estes dados, o projeto foi feito em três Profa. Dra Raquel de Oliveira - Coordenadora do
etapas: a primeira, diretamente coordenada pela Secretaria de Projeto Trilhas Negras (2005/2006); Professora Titular de
Educação, consistiu na instituição, por meio da portaria SME Ensino Fundamental (aposentada); Professora Doutora
6.935, de 17/11/05, da Semana de Debate sobre a Educação membro do Departamento de Ciências da Educação
das Relações Étnico-raciais. Nesta etapa as escolas tiveram da Universidade Estadual de Santa Cruz- UESC – BA
sessões de estudo, durante novembro de 2005, nos horários – Ilhéus
de Jornada de Estudos Integrados – JEI, ou nos períodos Profa. Dra Maria Aparecida Silva Bento – Diretora
que escola considerou adequados, visando não prejudicar as executiva do CEERT, Centro de Estudos das relações de
aulas. Essas atividades foram coordenadas pelos orientadores trabalho e desigualdades
pedagógicos e/ou diretores do estabelecimento.
Durante as sessões, as escolas deveriam responder as
perguntas abaixo e enviar as suas respostas às respectivas
coordenadorias de educação que encaminharam à Secretaria
o material recebido para posterior análise.
“Quais são os motivos que contribuem e/
ou dificultam a implementação das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História
e Cultura Afro-brasileira e Africana?”
“A escola já inclui, ou incluirá, os princípios
contidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação das Relações Étnico-raciais e
para o ensino de História e Cultura Afro-brasileira
e Africana no Projeto Pedagógico da Escola em
2006? Descreva as ações em desenvolvimento ou
as que estão sendo propostas.”


Onde está a África e os africanos na grade
curricular das escolas brasileiras?
A África e o Brasil afro-brasileiro: Por que a África, os africanos e africanas são
história, cultura, ciência e arte importantes para entendermos o Brasil e o mundo?
De qual parte da África vieram os africanos que
Introdução construíram e colonizaram o Brasil?

São várias as perguntas que temos de responder, atualmente,


sobretudo em função da elaboração da lei 10.639, que institui
a obrigatoriedade do ensino das culturas e histórias africana
e afro-brasileira no ensino fundamental e médio no país.
As perguntas acima existem porque a África mantém-se

A África é o segundo continente mais populoso do mundo, apenas atrás da Ásia,


e o terceiro continente mais extenso. Os continentes americano e asiático são
maiores que o africano. O continente africano tem cerca de 30 milhões de km²,
cobrindo 20,3 % da área total da Terra e mais de 800 milhões de habitantes
em 57 países, representando cerca de um sétimo da população do mundo.
Cinco dos países da África foram colônias portuguesas e têm o português
como língua oficial, São eles: Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Cabo
Verde e Guiné-Bissau. Vale salientar que em Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé
e Príncipe também se fala crioulo, um idioma criado a partir da junção das
línguas nativas com o português.

O continente africano possui cerca de 1.500 idiomas locais, regionais e


nacionais, sendo as vinculadas com as nações européias reconhecidas como
“oficiais”. As línguas faladas no continente são classificadas como: línguas
afro-asiáticas ou camito-semíticas; nilo-congolesas; khoisan e crioulas. A língua
nilo-congolesa é a que tem o maior número de falantes, enquanto khoisan é
que tem o menor número de falantes.


como um continente desconhecido para a imensa maioria lideranças culturais, políticas e econômicas.
da população brasileira. Infelizmente, essa ignorância A África subsaariana, principalmente, foi desprezada pelas
atinge professores e alunos das escolas de ensino infantil, sociedades e sistemas de ensino ocidentais, aparentemente pela
fundamental, médio e universitário (para não dizer, superior), idéia de que ela fosse destituída da escrita. Essas sociedades e
porque a escola brasileira não aborda o passado nem o grupos sociais, étnicos, sexuais e religiosos precisam ser estudados,
presente africano, muito embora esse passado africano esteja pois têm e estão na história e na cultura brasileira2 . No entanto,
tão presente no cotidiano nacional, através da palavra falada, antes de analisarmos a presença africana no Brasil e seu
cultura, religiões, instituições, economia, ciência, arte etc. O legado ao nosso país, queremos tratar, ainda que brevemente
continente africano guarda uma grande riqueza mineral, da influência africana em outras partes do mundo.
ecológica, cultural, religiosa e lingüística é um continente
que preserva as suas diversidades. Esse desconhecimento e o
silêncio em relação à África têm sido uma opção arbitrária,
portanto política dos nossos educadores, docentes e das

Vale ressaltar que este mapa da África foi construído no processo colonizador Esta fonte é do ano de 1979, portanto, não revela o momento atual, mas dá uma noção
empreendido pelas potências européias, ao longo do século XV, e consolidado dos países mais populosos do continente. Vale ressaltar que os dados populacionais na
na Conferência de Berlim, que ocorreu entre 15 de Novembro de 1884 e 26 de África são apenas estimados.
Novembro de 1885, nesta cidade.


África: lugar das primeiras está cada vez mais comprovada a
descobertas, invenções e anterioridade da evolução do continente
africano dos elementos citados (agricultura,
instituições humanas criação de gado, metalurgia, especialização
ocupacional) que convergem no
O continente africano, além de ser o berço da humanidade desenvolvimento da civilização5 .
é, também, o das civilizações3, embora essa afirmação possa
ser contestada pela definição de civilização e segundo a Na África ocorreu a primeira revolução tecnológica da
situação geográfica dada pela New Columbia Encyclopedia4 : humanidade, a passagem de caçador e coletor de frutos e
raízes para a agricultura e pecuária. A agricultura africana,
é aquele complexo de elementos culturais no vale do rio Nilo, tem cerca de 18 mil anos, é duas vezes
que primeiro apareceram na história mais antiga do que no sudoeste asiático6. A pecuária
humana, entre 8 e 6 mil anos atrás. Nessa
apareceu há 15 mil anos, perto da atual Nairobi (Quênia).
época, baseada na agricultura, criação de
Sua técnica sofisticada de domesticação de animais deve
gado e metalurgia, começou a aparecer a
ter se espalhado para os vales dos rios Tigre e Eufrates,
especialização ocupacional extensiva nos
vales dos rios do sudoeste da Ásia (Tigre e séculos depois7 .
Eufrates). Apareceu lá também a escrita, bem
como agregações urbanas bastante densas que
Rio Eufrates (nome grego tradicional, em aramaico Frot/Frat, em persa antigo Ufrat, em
acomodavam administradores, comerciantes
árabe ‫تارفلا‬, e em turco Fırat) é um dos rios que forma a Mesopotâmia com o
e outros especialistas
Rio Tigre, onde hoje se encontra o atual Iraque. O rio é formado pela união de dois
afluentes: o Kara (Eufrates Ocidental), que nasce nas montanhas orientais da Turquia, ao
norte de Erzerum, e o Murat (Eufrates Oriental), que se origina no lago Van. O rio tem
O Nilo é um rio africano formado pela confluência de dois outros rios, o Nilo Branco aproximadamente 2.780 km de extensão e sua porção superior escoa por entre canyons
(Bahr-el-Abiad) e o Nilo Azul (Bahr-el-Azrak). O Nilo Branco é formado, principalmente, e gargantas para o sudoeste, através da Síria e, depois, do Iraque. Os rios Kabhur e Balik,
do degelo do Monte Heha que se torna um curso de água no Burundi, com o nome de que se originam também na Turquia, juntam-se ao rio Eufrates na porção oriental da Síria.
Kagera, e deságua no lago Vitória, onde nasce o Nilo Branco. O Nilo Azul (Bahr-el-Azrak) Após isso, ao longo de todo o seu curso, o rio Eufratres não recebe mais contribuições
nasce no lago Tana (Etiópia), confluindo com o Nilo Branco em Cartum, capital do de outros cursos d´água. Abaixo de Bassora, no sul do Iraque, o rio une-se ao rio Tigre
Sudão. O Nilo deságua no mar Mediterrâneo, no Egito, e sua bacia hidrográfica abrange para formar o rio Shatt al-Arab, que vai desaguar no Golfo Pérsico.
3 milhões de km². Foi revelado, em pesquisa recente, que o Nilo é o segundo maior rio
do mundo em extensão, com O rio Tigre (em árabe ‫ةلجد‬, Dijla, em turco; Dicle, na Bíblia Hiddekil) é o mais
6.695 km, perdendo apenas oriental dos dois grandes rios
para o Rio Amazonas, no que delineiam a Mesopotâmia
Brasil, que tem 6.868 km. junto com o Eufrates, que
corre desde as montanhas de
O Nilo, desde tempos Anatólia, através do Iraque.
imemoriais, é a base de tudo De fato, Mesopotâmia significa
para as populações ribeirinhas. terra entre rios. O Tigre tem
Era o Nilo que fornecia a água 1.800 km de extensão. Nasce
necessária à sobrevivência e ao nos Montes Tauros da Turquia
plantio do Egito. Atualmente, o oriental e corre para sudeste,
Nilo garante a sobrevivência até unir-se ao rio Eufrates,
de um décimo da população próximo a Al Quma, no sul
africana. do Iraque.


As diferentes etnias africanas um processo de apagamento e descrédito dos conhecimentos
utilizaram-se de veículos diversos africanos tornando-os exóticos, místicos e míticos. Elisa
para propagar seu saber, visão de também menciona a citação do conde Constantino Volney,
mundo, etc. para as gerações futuras. membro da Academia Francesa:
Um grande número delas, sobretudo Lembrei-me da notável passagem onde
nas sociedades subsaarianas, optou diz Heródoto: “E quanto a mim, julgo ser os
pela transmissão oral, uma de suas colchianos uma colônia dos egípcios porque,
marcas culturais. No entanto, as iguais a estes, são negros de cabelo lanudo”.
populações africanas presentes nos Em outras palavras, os antigos egípcios eram
limites do deserto do Saara e do Sudão verdadeiros negros, do mesmo tipo que todos
legaram a escrita à humanidade. os nativos africanos. (...) Pensem só, que esta
Os sistemas de escrita dos Akan e raça de negros, hoje nossos escravos e objeto
Manding originaram a escrita egípcia de nosso desprezo, é a própria raça a quem
e meroítica. Hoje está comprovado devemos nossas artes, ciências e até mesmo o
que a escrita dos faráos veio do Sudão8 . uso da palavra!
A pedra Rosetta que é uma inscrição com hieróglifos
egípcios e outras línguas antigas conhecidas ao ser decifrada,
em 1787, comprovou-se que quase todo o conhecimento
científico, religioso e filosófico da Grécia antiga teve origem Conhecido na Antiguidade como Núbia, o Sudão é incorporado ao mundo árabe na
no Egito (África). Elisa Nascimento informa que Sócrates, expansão islâmica do século VII. Entre 1820 e 1822, é conquistado e unificado pelo
Platão, Tales de Mileto, Anaxágoras e Aristóteles estudaram Egito e, posteriormente, entra na esfera de influência do Reino Unido. Em 1881, eclode
com sábios africanos. O saque empreendido no continente uma revolta nacionalista chefiada por Muhammad Ahmed bin’ Abd Allah, líder religioso
africano e a destruição da biblioteca de Alexandria encobrem conhecido como Mahdi, que expulsa os ingleses, em 1885. Ele morre logo depois e os
britânicos retomam o Sudão, em 1898. No ano seguinte, a nação é submetida ao domínio
O povo Akan é um grupo étnico da África Ocidental, presente na Costa do Marfim e Gana. egípcio-britânico. Obtém autonomia limitada em 1953 e independência total em 1956. O
O Secretário Geral da Nações Unidas, Kofi Annan, é o mais famoso falante da língua akan. Sudão é, hoje, o maior país da África e está em guerra civil há 46 anos. O conflito entre o
O seu nome “Kofi” significa que ele nasceu em uma quinta-feira. governo muçulmano e guerrilheiros cristãos e de religiões tradicionais, baseados no sul do
território, revela as realidades culturais opostas da nação. A guerra e prolongados períodos
O mandinga é uma etnia da África Ocidental que vive em Gâmbia, Guiné, Guiné-Bissau, de seca já deixaram 1,5 milhão de mortos. A introdução da Sharia, a lei islâmica, causou
Costa do Marfim e Senegal. a fuga de mais de 350 mil sudaneses para países vizinhos. Entre outras medidas, a lei
determina a proibição de bebidas alcoólicas e punições por enforcamento ou mutilação.
Atualmente, um massacre de imensas proporções está ocorrendo no país. Segundo
informações de Johann Hari do Independent; na Folha de São Paulo de 08/10/2005:
“Finalmente, o genocídio no oeste do Sudão está quase terminando. Há um problema,
porém, o genocídio está chegando ao fim apenas porque não restam negros para matar ou
submeter à limpeza étnica. No esforço para limpar o oeste do país de zurgas - termo que
pode ser traduzido como crioulos - o governo da Frente Islâmica Nacional já exterminou
mais de 400 mil deles e expulsou outros 2 milhões de suas casas. As milícias racistas
governamentais, conhecidas como Janjaweed, adorariam continuar a matar e devastar. No
entanto, os povoados negros já foram todos queimados, e todas as mulheres negras já
foram estupradas .O primeiro genocídio do século 21 transcorreu sem transtornos, e os
genocidas venceram”.


As contribuições das diversas nações africanas, ao longo Imhotep é o primeiro arquiteto cujo nome
da história, para o desenvolvimento cultural, econômico, é conhecido através de documentos históricos
político, científico e tecnológico da humanidade são vastas escritos. Ele viveu no XXVII século a.C., tendo
e complexas, embora esse reconhecimento seja prejudicado sido vizir ou ministro-chefe de Djozer, o
pela perspectiva preconceituosa que o ocidente europeu- segundo rei da terceira dinastia egípcia. Ele
norte-americano, e sob sua influência cultural e científica, foi comparado pelos gregos a Hermes (deus
nutre em relação ao continente-pai. Essa cultura do norte grego) e recebeu o título TRIMEGISTUS (três
da África tem sido extremamente importante para toda a vezes grande). Descobriu alguns elementos
humanidade até hoje, particularmente pelos conhecimentos químicos, demarcou o posicionamento de
que ainda revela. algumas centenas de estrelas, estabeleceu o
funcionamento do universo através do estudo
O conhecimento tecnológico estava presente em diversos da física, foi autor do maior livro da filosofia
ambientes culturais e sociais na África antiga. O saber médico, Hermética, O Quibalion, e arquitetou a maior
sanitário, os cálculos matemáticos e o universo astronômico pirâmide do Egito, a pirâmide de Sakkara,
eram, em graus diferenciados, parte deste continente. A medicina com seis enormes degraus, e que atinge
egípcia, por exemplo, tinha o seu conhecimento a partir dos aproximadamente 62 metros
experimentos e estudos voltados para o interior do organismo O conhecimento médico não se restringia apenas ao norte
humano, elaborado em função da prática da mumificação, do africano, na região que hoje compreende a Uganda, país da
embalsamento do corpo dos faraós e de pessoas influentes desta África Central. Encontramos o saber antigo dos Banyoro,
sociedade. Deste modo, se a medicina tem um pai é o cientista que já fazia cesariana antes de 1879, quando o Dr. R. W.
clínico egípcio Imhotep, que acerca de 3.000 anos antes de Cristo Felkin, cirurgião inglês, conheceu essa técnica, de extrema
já aplicava os conhecimentos médicos e cirúrgicos9.

Vale ressaltar que Hipócrates, considerado o


fundador da medicina pelos europeus, atuava por
volta de 460 a.C. na Grécia, responsável pela
convenção do chamado juramento hipocrático
como compromisso profissional do médico,
fazendo pouca ou nenhuma alusão a Imhotep em
seus registros científicos

Imhotep foi um misto de médico e mago. Os


antigos egípcios o colocaram no plano de um
Deus, identificando-o como Asclépios (ou Asclépio
ou Esculápio), deus da medicina. O estudioso
britânico Sir William Osler (séc. XIX) disse sobre
Imhotep: a primeira figura de um médico a surgir
claramente das névoas da Antigüidade.


eficácia e assepsia, anestesia, hemostasia e cauterização. O encontrados, ao lado do Lago Turkana, os
conhecimento médico cirúrgico antigo e tradicional na África restos de um observatório astronômico, o
também operava olhos removendo cataratas. Essa técnica que a evidencia e atesta a complexidade de
foi encontrada no Mali e no Egito, cerca de 4.600 anos atrás, desenvolvimento cultural pré-histórico na
onde, já se fazia a cirurgia para retirar tumores cerebrais10 . África subsaariana. Também um sistema de
Os Banyoro também detinham, séculos atrás, o conhecimento calendário complexo e preciso, baseado nos
acerca da vacinação e farmacologia. Logo, as técnicas médicas cálculos astronômicos, foi desenvolvido por
e terapêuticas africanas não estavam voltadas somente para o estes povos até o primeiro milênio a.C. 12 / 13 :
mundo mágico, mas para conhecimento científico, a observação O conhecimento dos Dogon, no Mali, em relação à
atenta do paciente11. astronomia é antigo. Há dados que informam que eles
A astronomia também era uma área de grande conheciam, 5 ou 7 séculos antes da Era Cristã, o sistema solar,
conhecimento dos africanos. a Via Láctea com sua estrutura espiral, as luas de Júpiter e os
anéis de Saturno. Já compreendiam que o universo é habitado
no atual país do Quênia, em 1973, foram
por milhões de estrelas e que a lua, deserta e inabitada, é
refletida pelo sol, à noite14

Diversos povos africanos lidaram com a metalurgia, há

Quênia: a República do Quênia está localizada na costa leste da África e tem Subsaariana: região da África composta por 34 Estados.
uma das melhores infra-estrutura para safári do continente. Nas extensas planícies
de savana do oeste do território, existem várias reservas nacionais de animais Dogon: um grande mistério cerca a vida dos dogons, povo, ao que se acredita, de
selvagens. Mais de 70 grupos étnicos vivem no Quênia, como os cambas, os quicuios ascendência egípcia. Depois de sair da Líbia, há milênios, fixaram-se na falésia de
e os calenjins, o que faz do país um mosaico de culturas e etnias. Para conhecer Bandiagara, no Mali, África Ocidental, levando consigo as informações sobre o Cosmo, que
melhor os países da África, visite o site: www.mulheresnegras.org/africa.html. remontam ao Egito pré-dinástico, anterior a 3200 a.C.

Lago Turkana: maior lago salgado da África, localizado ao norte da República do Mali: a República do Mali está localizada no noroeste da África e sua capital é Bamaco.
Quênia, é um importante laboratório para o estudo de comunidades animais e O norte de Mali fica no deserto do Saara. No centro e sul do país concentra-se a
vegetais. maior parte da população. Para conhecer melhor os países da África, visite o site: www.
mulheresnegras.org/africa.html.

à esquerda: o “ovo do mundo”, como é representado pelos


Dogon. À direita: a interpretação moderna, que o converte
em um “preciso diagrama orbital”. Nenhum dos numerosos
objetos englobados dentro do ovo está sobre a pretensa
“órbita”; dentro do “ovo” encontram-se também corpos que
não têm por que estar ali, como Emme Ya (Sírio C?) e Nyân
tolo que, segundo a suposta tradição Dogon, estão a uma
distância muito maior de Sírio A que Digitaria (Po tolo).


milhares de anos. Citamos, como exemplo, o desenvolvido séculos IX e XIII.
pelos Haya, acerca de 2.000 anos atrás, em que “produziam A matemática, a geometria e a engenharia são parte do
aço em fornos que atingiam temperaturas mais altas em
conhecimento antigo africano. As pirâmides do Egito, por exemplo,
duzentos a quatrocentos graus centígrados do que eram
revelam isso, na medida em que se projetou um monumento para
capazes os fornos europeus até o séc. XIX”15.
durar ao longo do tempo, mas que foi construído a 2.700 anos
A tecnologia aplicada na África antiga de Cristo, com ângulos de 0,7º. Os yorubás também detinham
encontra-se nas ruínas de Monomatapa. A um conhecimento tradicional, como diversas culturas, etnias e
Construção de Monomatapa, capital de um nações africanas, baseado em múltiplos de 2018.
império que durou trezentos anos, significa
uma verdadeira façanha de engenharia, A cultura e a civilização africana estão presentes na Ásia,
encerrando uma cidade murada de dez a partir da transposição dos rios Tigre e Eufrates, na região
mil habitantes. Coerente com a atitude que compreende a porta de entrada do Oriente Médio (Irã,
eurocêntrica, os estudiosos atribuíram sua Iraque, Palestina e Israel). John Baldwin em 1872, registrava
construção a povos exógenos à África, e até que
a extraterrestres, no vão esforço de negar Os povos descritos nas escritas hebraicas
que o Grande Zimbábue fosse construído por como de Cush foram os civilizadores
africanos negros16/17. primordiais do sudoeste da Ásia, e na
Vale ressaltar que essa antiga cidade de Zimbábue era a mais remota antigüidade a sua influência
sede de uma desenvolvida civilização que floresceu entre os estabeleceu-se em todas as regiões litorâneas,
desde o extremo leste até o extremo oeste do
Haya: povo de fala banta, habitante de uma região da Tanzânia. antigo mundo.
Monomatapa: antigo reino e atual Zimbábue A grande civilização suméria que se ergueu cerca de 3
milênios antes da Era Cristã, na região da Mesopotâmia, teve

Pirâmides do antigo império de Kush


ou Cush. Esta civilização viveu no Norte
A vista exterior das ruínas das muralhas do da África, região da Núbia, situada no
grande império de Monomatapa (Zimbábue). que é hoje o norte do Sudão, conhecido
Pintada por David Randall-MacIver em 1906, também como império meroítico.
uma ilustração do Grande Zimbábue.
Cush era o antigo imperador dos
Cuchitas. Estes termos são as referências
presentes no Antigo Testamento para
Grande Zimbábue Grande Zimbábue é o que restou de um povoado todo construído por os negros africanos. E a terra de Cush
uma muralha monumental. Centro de uma importante cultura dedicada à pecuária, seus era a África, segundo a leitura do Gênesis, na Bíblia. Vale destacar que Etíope e Etiópia
muros medem quase 10 m de altura. O motivo de seu abandono repentino é desconhecido, são termos designados para africanos no Novo Testamento bíblico.
embora sua lenda como santuário tenha persistido até o início deste século.

10
nos cuchitas do vale do Nilo (Egito) sua influência, já que Sumer ao islamismo, mencionadas na literatura grega e romana
era uma das colônias de Cush. Os sumérios identificavam- antiga como a Arábia Feliz. Os processos miscigenatórios que
se como “cabeças pretas”, numa nítida alusão à sua origem ocorreram nesta região de encontros milenares propiciaram
africana. Os africanos cuchitas foram os responsáveis pela o surgimento da população de Sabá, que teve como rainha
construção da cidade-estado de Ur, edificando moradias e a lendária Makeda. Mais tarde, essa rainha teve um filho
templos piramidais, cujas laterais lembravam escadarias, Menelik, com o rei Salomão, de Israel. Vale lembrar que a
seguindo a arquitetura dos núbios, denominadas ziggurats. Etiópia teve seu reino dirigido por mais de 3 mil anos pelos
A influência cultural dos cuchitas na Ásia desenvolveu-se na descendentes de Makeda. A linha do trono real etíope manteve
área que compreendia o Baluquistão (atual parte norte do Irã, esta linhagem com a posse de Haile Selassie I, no século XX21.
sul do Paquistão e a oeste da Índia), conhecida como Gedrosia, A grande civilização da Índia foi originalmente constituída
o país dos escuros. Os gregos chamavam-nos de Anariakoi, pela população de origem africana, segundo Cheik Anta
isto é, não arianos. Hoje, a região é denominada Khuzistan, Diop, Van Sertima e Rashidi. Sua economia era voltada para o
terra de Khuz ou Cush20 .
A península arábica também foi habitada originalmente
por negros, oriundos do norte e nordeste da África, cerca de
8 mil anos atrás. Eles eram chamados Veddoids, ainda hoje
seus descendentes estão, em quantidade significativa, no
mundo arábe. As relações intensas neste processo histórico
de migrações constantes entre os dois continentes (África
e Ásia) resultaram na construção de civilizações anteriores
Veddoid, fruto da mistura das raças Veddoid, presente no sul da península
Um zigurat é uma forma de templo, comum aos sumérios, babilônios e assírios, da época do mediterrâneas arábica
antigo vale da Mesopotâmia, construído na forma de pirâmide terraplanada. O formato era o de
vários andares construídos uns sobre os outros, com a diferença de que cada andar possui uma
área menor que a da plataforma inferior sobre a qual foi construído. As plataformas poderiam ser
retangulares, ovais ou quadradas, e o seu número variava de 2 a 7. O centro do zigurat era feito
de tijolos cozidos ao sol, enquanto o exterior da construção mostrava adornos de tijolos queimados.
Os adornos, normalmente, eram em cores diferentes, possivelmente com significações cosmológicas.
O acesso ao templo, situado no topo do zigurat, é feito por uma série de rampas construídas
no flanco da construção ou
por uma rampa espiralada
que se estendia desde a Em 1930, Ras Tafari Makonnen assumiu o poder, sob o nome de Haile Selassie I, passando
base até o cume do edifício. a ser o Imperador da Etiópia. O nome Haile Selassie I significa “O todo poderoso da
Os exemplos mais antigos trindade”. Ele tinha, também, outros títulos, como “Leão conquistador da tribo de Judah”,
de zigurats datam do final “O eleito de Deus” e “Rei dos Reis, Senhor dos Senhores”. Em 1931, Haile Selassie I decidiu
do terceiro milênio a.C., que todos os tipos de poderes ficariam nas mãos de Imperador. Para os rastafari, o
enquanto os maias tardios, Imperador Haile Selassie I é o Messias profetizado na Bíblia, visto que é um descendente
eram do século VI a. C.. direto de David, vindo da linha de Reis Etíopes que se estendia desde os tempos do Rei
Alguns dos exemplos mais Salomão e da Rainha Sheba (Sabá). Ele é da raiz de David. Os rastafari acreditam que
notáveis dessas estruturas Haile Selassie I é um Deus vivo para a raça negra, era o Imperador negro da Etiópia. Eles
Dur-Untash, ou Choqa zanbil, construído no séc.XIII a. C. por Untash incluem as ruínas nas cidades dizem que as escrituras o profetizaram como aquele que “tem o cabelo como lã, e os pés
Napirisha, é um dos zigurats mais bem conservados. Está situado de Ur e de Khorsabad, na como bronze”. Eles acreditavam, também, que Selassie era o Jesus de que o Cristianismo
nas proximidades de Suza, Irã. Mesopotâmia. falava e que o homem branco arranjou um estratagema para que não acreditassem que
Jesus era negro

11
mundo agrícola. Posteriormente, foi invadida pelos arianos, suas origens social, histórica e cultural a partir da presença
povos nômades e guerreiros, que dominaram a população e e influência africanas, particularmente da região do Egito e
a subjugaram, impondo-lhe uma cultura adversa a sua, de da Etiópia (nordeste) do continente africano. Os Sind eram
natureza patriarcal. Introduziram o sistema de castas, presente os africanos que povoaram a Índia e o Paquistão. Segundo
até os dias atuais22, baseado em critérios raciais. A palavra varna, o historiador e antropólogo indiano, Vidya Bhavan: “Temos
que em sânscrito quer dizer casta, também significa cor. A casta de começar com os povos negros da Índia pré-histórica,
baixa eram os sudras, ou seja, os negros. Na realidade indiana que foram seus primeiros habitantes. Originalmente,
atual e também no passado, os descendentes destes africanos parecem ter vindo da África através da Arábia e das
têm permanecido nas castas baixas, são denominados párias ou costas de Irã e Baluquistão”24.
outras categorias sociais tratadas com total desprezo pelas castas A ocupação da população africana na China, Japão e
privilegiadas. Sudeste Asiático remonta a aproximadamente 50 a 10 mil
Na Índia, a contestação ao sistema de castas é histórica. anos atrás. Os materiais paleontológicos e arqueológicos
Seiscentos anos antes da Era Cristã, com o culto de Sidhartha encontrados referentes aos homo sapiens de origem africana,
Gautama, o Buda, esse processo intensifica-se. Segundo Van chamado Liu Chiang, nas províncias de Szechuã e Kiangs,
Sertima e Rashidi, o nascimento deste culto floresce dentro das datam do período do pleistoceno. A mitologia chinesa
populações negras desta imensa nação, até porque o próprio identifica essa população original como os Ainu, de nariz
Buda era negro, como demonstram as estátuas e imagens chato e cabelo “duro”. A palavra Ainu tem origem no Egito e
antigas com traços evidentes da sua origem africana23. se refere à pessoa de cor preta. Espalhou-se por todo o mundo
e se pode encontrá-la no Japão e na Irlanda.
Heródoto já mencionava em suas obras, que a Índia tinha

Siddhartha Gautama nasceu no século VI A.C., aproximadamente há 2.500 anos (565 A.C.-
486A.C. ), na cidade de Kapilavastu, na região onde é hoje o Nepal.

Sakyamuni Buda Supremo Amitabha ou Opame


(Tibete)

12
No Japão, o lendário comandante Sakanouye Tamuramaro, escuros, com o cabelo em carapinhas”27.
conhecido pela sua valentia e determinação é ainda
homenageado pelos antigos com o provérbio: “Para um
samurai25 ter coragem é preciso que tenha sangue negro”26.
Os Ainus são interpretados no mito chinês como homens de
baixa estatura, possivelmente antepassados do povo Twa
(da África Central), de cabelo lanudo, que originaram as
instituições políticas, sociais, religiosas, as técnicas agrícolas, O templo foi
a cultura matrilinear e a escrita chinesas. Eles são lembrados construído entre
como aqueles que pertenciam à dinastia divina de Fu-Hsi 900 e 1.200 anos
(2953-2838 a.C.) e Shen-Nung (2838-2806 a.C.). Os Ainus antes de Cristo são
também desenvolveram o sudeste asiático, particularmente o parte das enormes
Camboja, legando a cultura Funan, que floresceu no 300 d.C., construções de
na medida em que estabeleceram uma sofisticada tecnologia pedra do Império
de engenharia hidráulica. do Khmer. Os
“No séc. VI, os Khmer absorvem essa traços faciais
cultura e a misturam com o culto budista neste templo
Shiva. Responsáveis pelo famoso complexo apontam para
arquitetônico de Angkor Wat, os Khmer eram uma população de
origem africana.

As pirâmides de Quin Ling Shan, na região de Xi’na (República Popular da China),


- a foto acima mostra um plano geral - foram descobertas por dois exploradores
No Japão, os Ainus encontram-se, sobretudo, ao norte nas ilhas de Hokkaido. Há, no Japão, australianos, em 1912. O complexo arquitetônico possui 100 pirâmides espalhadas
cerca de 150 mil pessoas, que são os seus ancestrais. por 2.000 quilômetros quadrados, com idade estimada em 5.000 anos. Vale salientar
que, até hoje, estas pirâmides são inexplicáveis, pois as autoridades chinesas têm
impedido estudos acerca delas, pelos ocidentais. Em 1994, o pesquisador alemão
Hartwig Hausdorf conseguiu fazer alguns estudos, mas teve de abandoná-los por causa
disso. Segundo este pesquisador, existem evidências de que há um grande número de
túmulos que contêm esqueletos de estranhos humanóides, com cabeça grande e altura
de 1,5 m. Além disso, junto deles, havia centenas de discos de granito com estranhos
hieróglifos. No entanto, as características apontam para as populações africanas que
migraram até esta região da China.

Os Twas, conhecidos popularmente como pigmeus, vivem na floresta dos seguintes países
da África Central: Camarões, Gabão, Congo, Burundi e Ruanda. Eles constituem o grupo
étnico Bantu. As imagens acima são de Baka, pigmeus de Camarões.

13
A presença dos africanos na Europa e na América também (...) são mais de 500. Muitas delas
é antiga. A Grécia e suas ilhas, na antigüidade, também aparecem por volta do século XII. (...) Algumas
contaram com a contribuição civilizatória dos negros: dessas virgens negras teriam sido trazidas
“Parece-me que esta civilização pertencia a um povo pelos cruzados, outras teriam chegado
africano”28. Referente a Creta, informa Evans: “Gostem misteriosamente, de barco. (...) Entre as
ou não do fato, os estudiosos clássicos são obrigados a mais célebres estão a de Kazan (Rússia), de
considerar as origens. Os gregos que discernimos nessa Czestochowa (Polônia), de Halle (Bélgica), de
nova aurora não eram nórdicos de pele clara, mas Eisiedehn (Suíça), de Mariazell (Áustria), de
essencialmente a raça de cabelo preto e pele escura”29. Chartres, de Puy, de Saint-Victor (Marselha)
e de Rocamadour, todas na França; de
As Nossas Senhoras negras estão presente em toda a Guadalupe (Saragoça), de Montserrat, de
Europa, desde tempos remotos: Nuria, todas espanholas. A de Saragoça seria
a mais antiga e, ainda, a de Loretta (Itália)30.
Essas virgens santas negras demonstram a relação sincrética
ou inculturada que retratam Ísis, deusa núbia e egípcia da
fertilidade. Plínio, antigo historiador romano, destaca esse
fenômeno, inclusive na Inglaterra e na Alemanha, talvez
introduzido pelos faraós egípcios que visitaram a Europa,

Ícone de Nossa Senhora de Kazan, na Igreja Ícone de Nossa Senhora de Czestochowa, Imagem de Nossa Senhora de Elsiedehn.
Ortodoxa Russa. Esta Nossa Senhora significa “aquela na Igreja Católica da Polônia, a Flor de Destinada a ser a patrona de seu povo,
que indica o caminho”. Tem o nome da cidade russa Lis da Polônia. aparece no século XI esta Nossa Senhora
de Kazan, onde, em 1579, teria sido recuperada por da Floresta Negra, onde hoje há a Abadia
uma menina de nove anos das ruínas de uma casa Einsiedeln (Suíça).
destruída por um incêndio.

14
entre 1.900 e 1.450 antes da Era Cristã. Vale ressaltar que seus traços físicos, quando retratados, não demonstram esse
nas legiões romanas havia muitos africanos que praticavam pertencimento racial.
o culto a Ísis e estiveram em toda a Europa, além do fato de Aparentemente, a população afro-arábica, denominada
que cerca de 1000 etíopes ocuparam Cádiz (atual Espanha) moura, tem origem no povo Garamante que habitava o Saara,
aproximadamente mil anos antes desta Era e se mantiveram cerca de 5.000 anos antes de Cristo, e invadiu o Egito em 640
por lá, por volta de 150 anos, formando uma comunidade d. C., atravessou o estreito de Gibraltar (Tariq ibn-Ziyad (ou
unida, forte e estrutura social e politicamente, antes de ser Tarik ibn-Ziyad), sob a liderança do general Gabel Tarig, e
submetida pelos romanos31. permaneceu na Europa de 711 até 1492, influenciando toda a
Com relação ao universo cristão, em particular, é pouco vida social, política, cultural, científica e religiosa. Inclusive,
referida a existência de 3 papas africanos na história da introduziu o pensamento aristotélico neste continente, a
Igreja Católica Apostólica Romana. O primeiro foi Vítor I (14º partir dos monastérios e da vida social laica, propiciando a
papa após S. Pedro), que assumiu em 189 e foi responsável interpretação de Aristóteles por São Tomás de Aquino, em sua
pela fixação da festa da Páscoa, no domingo. Além de Suma Teológica32. Essa população contribuiu imensamente com
ser o primeiro a celebrar a missa em latim, Miltíades, que a Europa Ocidental, em particular com Portugal e Espanha,
assumiu em 311, trabalhou para acabar com a perseguição não destruindo, ao longo destes 700 anos de ocupação, os
aos cristãos, assistindo a vitória de Constantino no poder monumentos e igrejas cristãs que lá encontrou, mantendo
romano. Gelásio I (492-496) ficou conhecido pela sua ação este acervo cultural ibérico e europeu. Vale mencionar que
social em prol dos empobrecidos, e é autor de diversos hinos o contrário ocorreu quando o ocidente europeu invadiu a
e ensaios teológicos. Esses três papas foram canonizados. África e o Oriente, particularmente aquele em que a maioria
Atualmente, não se menciona o fato de eles serem africanos e da população é islâmica.

15
A presença africana também se fez no norte europeu, na história natural e lingüística têm trazido, muito a contragosto
Escandinávia e na Irlanda. O Estado egípcio, desde a 12ª dos pesquisadores, intelectuais e governantes ocidentais, que
dinastia dos faraós Senusert I e Tutmose III, quase 2 milênios os africanos marcaram as civilizações pré-colombianas. Van
antes da Era Cristã, mantinha relações comerciais com essa Sertima demonstra crânios africanóides em Titilco, Cerro de
região européia, sobretudo para buscar minérios, como las Mesas e Monte Albán, no México, enfatizando que esses
estanho. As indústrias naval e bélica egípcias mantinham fósseis faziam parte do pré-clássico da civilização maia (povo
contato com essas regiões. MacRitchie informa que 3 do México e da América Central)34 . Segundo os dados fósseis
províncias escocesas eram negras até o século e, no século encontrados, havia 13,6% de africanos entre os olmecas,
XVIII, as ilhas ocidentais Skye, Jura e Arran ainda tinham população anterior aos maias.
uma maioria negra, oriunda desta população. É, ainda hoje, Constata-se que na população olmeca e, posteriormente,
lendária a presença dos fomorianos, marinheiros africanos na maia, nos seus registros orais e lingüísticos, freqüentes
que invadiram e tentaram conquistar a Irlanda, em tempos informações sobre “esse povo negro que veio do sol
remotos. As deusas egípcias Nath e Anu permanecem vivas nascente”, como retrata o Popul Vuh, o livro sagrado, mítico,
nos cultos tradicionais da Irlanda. Desse modo, verifica-se religioso e histórico dos maias. Esse relato fundamenta o
que nas mitologias escandinavas, sobretudo dinamarquesa, fato de que há, no idioma maia, diversas expressões que se
além da inglesa, francesa e alemã, estão presente os homens encontram nos idiomas inca e egípcio. Outros fatores, como
negros, de pequena estatura e cabelos lanudos (carapinha)33. as pirâmides egípcias, mexicanas e peruanas, bem como as
Os africanos, com o seu conhecimento náutico, estiveram técnicas de mumificação, expressam não uma coincidência,
nas Américas, muito antes de Colombo e Cabral, por exemplo. mas uma relação de intercâmbio científico e cultural, além
Desde 1862 as pesquisas históricas, etnológicas, craniológicas, das grandes esculturas em basalto, desenvolvidas pelos
botânicas, arqueológicas, oceonográficas, filológicas, de olmecas que-se, encontram em La Venta, San Lorenzo e Três

Tutmose III (16ª dinastia)

A mitologia céltica registra que os O. Brazil, segundo o termo gaélico antigo.


marinheiros fomorianos eram agentes da Denominação antiga referente ao Brasil. Imgens de esculturas olmecas de uma cabeça de pedra.
escuridão e do mal. Segundo essa mitologia,
os fomorianos, após serem expulsos das
ilhas célticas, refugiaram-se no reduto de

Nath ou Neith (egípcia): guardiã dos aspecto de tecelã.


mistérios escondidos, também apresenta o

Anu (celta): os deuses celtas na Irlanda são dado à luz todos eles. A Deusa Anu (ou
freqüentemente chamados de Povo da deusa Ana) era confundida com ela. Anu foi uma
Danu, mas isso não significa que ela tenha antepassada primitiva.
Popul Vuh: livro sagrado dos maias.

16
Zapotes, representando os reis nubas, o tipo étnico africano O império do Mali36 que foi o maior que o romano, quando o
que esteve entre eles, em tempos remotos. Os reis nubas são imperador era Abubakari II, irmão do lendário Mansa Musa,
de origem egípcia, da 25ª dinastia dos faráos núbios de 800 e teve contato com os registros orais desses contatos entre
600 a.C. que se tornaram, à época, a maior potência naval e africanos e americanos e pôs-se ao mar em 1.311, utilizando
bélica do mundo35 . esses rios dentro do mar, chegando à península de Yucatán,
O conhecimento naval africano era antigo. Os egípcios região litorânea do México. O Popul Vuh descreve o retorno do
construíram navios com estruturas de papiro ou madeira deus-serpente emplumado, registrando-o como um homem
costurada que lhes possibilitava navegar para diversas partes escuro, alto e barbado, vestido de branco, coincidindo com a
do mundo. Desde o ano de 2.600 a.C., elaboravam navios de figura do imperador Abubakari II, com o seu traje islâmico e
grande porte, com capacidade superior às naus européias usando barba37.
que chegaram à América mais de dois milênios depois. Já O conhecimento naval, cultural e científico dos africanos
nesta época utilizavam o remo e a vela, enquanto as naus de propiciou a chegada de Colombo e Cabral às Américas, pois
Cabral e Colombo dependiam exclusivamente do vento. Vale os portugueses tiveram acesso a essas informações no século
ressaltar que os africanos conheciam as rotas marítimas, que XV, por volta de 1450, quando já estavam na África ocidental,
chamavam “rios no meio do mar”. Essas teorias africanas traficando matéria-prima e pessoas para o seu país e toda a
propiciaram que em 1964 e 1965 o norueguês Thor Heyerdahl Europa ocidental. Neste contexto, seguiram as rotas marítimas
mostrasse, na prática, esses caminhos no meio do mar, já elaboradas nas cartas náuticas pelos africanos do norte e do
conhecidos havia milênios, pelos africanos. ocidente38.

Templo de Tikal (200


d.C até 850 d.C) em
Yucatán (México).
O nome Tikal quer
dizer lugar de vozes
ou lugar de línguas,
no idioma maia.
Abubakari II, irmão do imperador
do Mali, Mansa Musa.
Grafia dos números maias O mapa do território dos maias
(O Mundo dos Maias). Os maias
contemporâneos, cujo número talvez
supere sete milhões e meio de pessoas,
ocupam a região que se expande desde
a península do Iucatán (México), no
México, ao norte de El Salvador até,
as Honduras. Embora, do ponto de
vista cultural, sejam um único povo,
falam cerca de 30 línguas diferentes.
Reconstituem a sua ascendência até
pelo menos ao ano 2000 a.C. Entre
os anos 250 e 900 d.C., a época clássica, viveram agregados em cidades, algumas delas com 90 mil
habitantes. Construíram pirâmides grandiosas, como as que ainda hoje existem em Tikal, Copán, Palenque
Os hieróglifos: arte e escrita. e Calakmul, e ergueram enormes monumentos de pedra, ou estelas, para glorificar os seus reis.

17
relação institucional que regra essas situações, impedindo que
o devedor seja cativo para sempre e perca a sua identidade
Revendo Conceitos e Preconceitos pessoal ou mesmo étnico-nacional quando pertencente a
outro grupo social e cultural. Essa situação institucional vale
também para aqueles que pagam o espólio de guerra para o
Antes de entrarmos propriamente no tema intitulado, vencedor do conflito, nem por isso esse perde sua terra, mas
cabe informarmos que o sistema da escravidão, como paga a sua dívida em forma de tributos)41. Meltzer, citando o
instituição e prática sociocultural e político-econômico, tem antropólogo Paul Bohannon, diz que o escravizado
tido similaridades ao longo da história de diferentes povos, era uma espécie de parente – com direitos
mas não são iguais39. Há distinções entre o que ocorreu no diferentes dos outros parentes, diferentes
Egito, na Babilônia, na Grécia, em Roma, nas Américas pré- posições na família e no lar, mas, no entanto,
colombianas e aquelas impostas pelos europeus na América uma espécie de parente. (...) Esses escravos de
e na África, de modo que nem sempre podemos denominar fato trabalhavam – geralmente o trabalho
esses sistemas e instituições como escravistas, mas de feudal, mais pesado – mas também se casavam,
de cativeiro, por exemplo. inseriam suas famílias no grupo social e
formavam uma parte legítima da família
Esses sistemas e instituições conferem aos povos dominadores
ampliada42.
uma característica básica em suas culturas e sociedades. Eles
eram nômades, guerreiros, conquistadores, mas nem por isso A situação do cativo na África tinha histórica e,
destituídos da capacidade laboriosa de lavrar a terra e cuidar culturalmente, a finalidade de obter recursos materiais, e
do gado. A escravidão, como sistema político-econômico e definia status sociais e políticos. Eles exerciam trabalhos para
instituição estruturada socioculturalmente, pauta-se por outros, como em outras realidades sociais que o sistema e
diversas relações de subordinação do outro, tornando-o servil, instituição veio a existir ao longo do tempo. Na África, o cativo
escravizando-o de várias maneiras. Deste modo, enfatizamos da casa, da terra, do eito tinha a sua realidade estruturada
que a escravidão que submeteu os africanos no século XV, no domínio familiar. R. S. Rattray, um estudioso dos Ashanti,
tem diferenças flagrantes em relação àquela existente, revelou que esse grupo étnico-nacional da floresta tinha a
anteriormente, na própria Europa, e aquela que geralmente segunda concepção:
se menciona quando se trata da África anterior à conquista
européia40.
Muitas pessoas ignoram a diferença dos processos de
dominação “servil” na África e aquela instaurada na escravidão
existente nas Américas. Na África antiga, a escravidão não
existiu, mas sim o “cativo da casa da terra”, feito em função
da guerra; pelo empréstimo não pago, portanto, por dívida.
O cativo da casa ou da terra, geralmente, era um estranho, Menina Ashanti
um não parente, mas também, podia ser alguém do mesmo
grupo clânico (familiar) ou étnico-nacional. Essa situação de
cativo da casa, da terra, existente devido à dívida, vigora até
o pagamento. Tal dívida é estabelecida pelo grupo clânico,
étnico-nacional ou pelo indivíduo credor, portanto, existe uma
A etnia ashanti ou asante tinha o seu reino na região que hoje compreende Gana. O comércio
Os conceitos de escravos mencionados nas citações a seguir devem ser revistos. Observe de população ashanti escravizada que saiu para as Américas, inclusive para o Brasil, cessou na
que estamos adotando o conceito de escravizado. primeira metade do século XIX. Essa etnia constitui um dos maiores grupos étnicos africanos.

18
Um escravo podia casar-se; ter propriedade; Essa redução ao paradigma da natureza do escravo visa
ele mesmo possuir um escravo; prestar manter a escravidão no imaginário social das populações.
juramento; ser testemunha competente; e por Portanto, quando se diz que na África já existia a instituição
fim tornar-se herdeiro de seu senhor. (...) Em da escravidão, busca-se informar, ideologicamente, que o
poucas palavras, eram estes os direitos de um europeu não fez nada de errado, a não ser manter o africano na
escravo Ashanti. Em muitos casos, pareciam sua natureza. O conceito de escravizado pretende estabelecer
ter praticamente os mesmos privilégios uma outra história: a de que um sujeito livre, proprietário
normais de um homem livre Ashanti. (...) Nove do seu destino, livre e dono de suas capacidades mentais e
de cada dez escravos Ashanti possivelmente físicas, foi transformado, submetido a uma condição social
tornavam-se membros adotados da família; imposta pela escravidão, ou seja, de “peça”, “animal de tração”,
e logo seus descendentes misturavam-se e se
“mercadoria”.
casavam com parentes do proprietário, de
modo que só alguns conheciam sua origem). A realidade escravista, edificada nas Américas e Europa,
transformou o cativo em escravizado. Nesta realidade, a ordem
Diante do exposto até o momento, não podemos colocar a
era de compra e venda, de destituição territorial, patrimonial,
situação cultural e a experiência histórica africana referente
religiosa, do nome, do idioma, impondo a negação do seu ser,
ao cativo no mesmo plano que a escravização nas Américas
como sujeito submetido à ordem escravista, como ocorreu após
e na Europa, patrocinada pelos europeus ocidentais, judeus e
o ingresso intenso dos europeus e islâmicos, em particular,
islâmicos, após o século XV. Fazer isso é encobrir, escamotear e,
na África ocidental. A ordem e a relação escravista existente
mais do que isso, deturpar uma história para justificar outra.
nas Américas e na Europa também pautaram-se pela prática,
Portanto, na África não havia a escravidão como querem os
semelhante à adotada pelos arianos na Índia, há mais de
ex-escravistas e, ainda, conquistadores deste continente.
2.600 anos, tornando uns em párias e outros, em sudras, todos
Aproveitamos esse momento de revisão conceitual histórica rebaixados na nova ordem sociocultural e político-econômica
para estabelecer um outro conceito sociocultural e político- dos arianos. Esta nova ordem rebaixou-os, particularmente,
filosófico do africano escravizado de diferentes etnias- em função da cor da pele e da raça. Portanto, não foi algo
nacionais da África, que não nasceram escravos, mas foram exclusivo e inédito do período posterior ao século XV43.
escravizados pelo sistema político-econômico e pela instituição
sócio-jurídica implantada pelos conquistadores. O conceito de
escravo reduziu uma realidade histórico-cultural ao estado de
natureza. O escravo nasce, cresce e morre, irremediavelmente
preso à sua natureza, não há transformação social possível
para ele, inclusive, seus descendentes serão tratados como
escravos, filhos de uma natureza imutável, intransponível.
O conceito de escravizado que defendemos tem o mesmo fundo político-filosófico do
conceito de empobrecido, ou seja, não se nasce, cresce e morre pobre, mas se é tornado
pobre pelo sistema de espoliação econômica, política e cultural. As teorias socialistas e
comunistas, bem como a teologia da libertação, por exemplo, não vieram para libertar o
pobre, mas o empobrecido. Tratar o pobre como tal é remetê-lo ao estado de natureza,
não projetando sua mobilidade dentro da dinâmica social; culpando o, inclusive, pela não
alteração de sua história. Este conceito também equivale para a lógica imposta pela
nobreza medieval na Europa, aos faraós e demais governantes que impuseram, ao longo
da história, o estado de natureza, de nascimento, que não deve ser alterado. Justificou-se
esse estado pelo caráter e pela divinos.

19
escravizados. Essa condição social nova para os africanos
deu-se, sobretudo, no início do século XV com a expansão
Os africanos escravizados pelo européia e do islamismo em grande parte da África ocidental
e oriental, já que os muçulmanos habitavam a região que
mundo envolve o Maghreb (Marrocos, Tunísia, Líbia e Argélia), norte
da África desde o século V. respeitadas as devidas questões
conceituais, já aventadas,
Desde antes do tráfico atlântico, os
Os africanos escravizados eram oriundos de diversas escravos negros eram enviados ao Maghreb,
regiões, embora os estudos atuais ainda se concentrem ao oriente próximo e ao médio, à Turquia, e
principalmente na África ocidental. A escravização na mesmo às Índias. Encontram-se vestígios deles
África, nos moldes modernos, surgiu no século XV devido à na Europa e na Sicília. O tráfico europeu
necessidade de expansão do sistema mercantil pelos europeus, jogou-os em todo o continente americano, nas
ao aumento vertiginoso das migrações e às transplantações Antilhas e ainda na Europa. Quando, no século
em outros continentes. Este processo, em grande escala, XIX, desenvolveu-se o tráfico interafricano
inaugura uma nova etapa da subordinação, expropriação tropical, o deslocamento dos cativos, apesar
e exploração humanas no bojo desta modernidade imposta de não existir mais escoamento para eles fora
pelo ocidente europeu44. do continente, permaneceu considerável. (...)
O destino final dos escravos exportados da
Verificamos que os africanos estiveram em todas as África assume dimensões planetárias45.
regiões do planeta em eras históricas remotas, mas não como
O tráfico interno na África, atualmente, é mantido pelos
islâmicos, sobretudo utilizando a Mauritânia como fonte

Esquema mostrando como transportar escravos em um navio negreiro Um árabe, proprietário de escravos

20
deste processo social, que envolve outras áreas e etnias- Muitos desses africanos transplantados em Portugal e
nacionais deste vasto continente. O que se observa, entre nas suas ilhas, inclusive nas colônias de Cabo Verde e Santo
os traficantes árabes, é que eles tinham cuidado para não Tomé e Príncipe, os originários da Guiné foram os primeiros
esvaziar ou matar os lugares-fonte de seu pérfido comércio, a aportar no Brasil, nas primeiras décadas do século XVI,
diversificando as suas incursões guerreiras e saques em tendo em vista a plantação de cana-de-açúcar já existente
diferentes grupos étnicos-nacionais não islamizados, os no mediterrâneo e nas ilhas ibéricas48. Com essa investida
pagãos ou infiéis, para “não comprometer a reprodução sobre a nova colônia brasileira Portugal trazia para cá uma
das populações escravizadas”46. população que conhecia a tecnologia agrícola da cana-de-
O tráfico africano em direção à Europa iniciou-se em açúcar. Essa população africana, proveniente em um primeiro
meados do século XV para Portugal, atendendo as demandas instante, estava ainda em Portugal e nas ilhas. A sua entrada
sociais e econômicas existentes naquele país e nas ilhas de abundante dar-se-á pela via direta entre África-Brasil.
Açores e Madeira, além de abastecer Lisboa com esta mão-de- As técnicas de plantio já eram conhecidas pelos africanos,
obra estrangeira. Essa prática portuguesa foi avalizada pelo antes de Portugal aportar nas costas litorâneas do Atlântico,
Papa Nicolau V, em 1454, quando assinou a bula Romanus em Guiné e Angola49.
Pontifex. No entanto, desde 1444 os lusos já praticavam tal Os povos do oeste africano tinham,
tipo de comércio. Neste ano, houve “a primeira grande indubitavelmente, sistemas agrícolas bem-
expedição que os portugueses mandaram à África, com desenvolvidos. Os daomeanos conheciam
o fim único de capturar escravos, chefiada pelo famoso até mesmo um sistema de plantation; todos
Lançarote de Freitas, partindo de Lagos – onde se fundou
uma companhia especialmente para ‘prear negros’”47.

A palavra provém do vocábulo árabe (Mahrib ou Maghrib) que significa “lugar onde se
põe o sol” ou seja, a região que, na altura em que o vocábulo teria surgido, estava mais
a ocidente do mundo islâmico, opondo-se ao Iemên (que significa “direita”).

Oficialmente, a Mauritânia aboliu a escravidão somente em 1982, o último país do mundo


a fazê-lo. No entanto, constantemente verifica-se que a prática é mantida neste país
africano, tendo os islâmicos como agentes deste processo escravista contemporâneo.

A palavra “árabe” significa “claro”

Artigo de Alberto
da Costa e Silva,
Francisco Félix de
Souza, o Chachá, era
um brasileiro que
se tornou o maior
traficante de africanos
escravizados da costa
ocidental africana.

O Papa Nicolau V (1447 - Muitas vezes, a feitoria reunia a praça-forte e o entreposto comercial, como é o caso do
1455). Castelo de São Jorge da Mina.

21
esses povos – daomeanos, ashanti, yoruba, as ilhas Canárias e Américas51, sendo seguidos pelos franceses,
para mencionar apenas alguns dos mais belgas, ingleses, dinamarqueses e holandeses nesta tarefa
proeminentes – tinham um sistema de comercial, financiada pelas coroas reais européias52, bem
comércio cuidadosamente regulamentado; como para abastecer as suas recentes colônias implantadas
existia grande número de ligas artesanais. na América espanhola, sobretudo nas pequenas ilhas do mar
Muitos desses povos agricultores, pastores e mineradores do Caribe. “As bases portuguesas deslocaram-se para as
conheciam técnicas mais avançadas do que os lusos, eram ilhas de Cabo Verde, enquanto franceses e britânicos
hábeis na arte e no conhecimento de metalurgia e siderurgia. faziam o tráfico em Goréia , perto do que hoje é Dacar”53,
Os yorubas já trabalhavam o cobre e o estanho quando no Senegal.
entraram em contato com os lusos, trazendo esse conhecimento A maioria dos africanos escravizados era oriunda da
também ao Brasil. Os lusos conheceram a enxada de ferro África ocidental, já que nesta parte do continente os europeus
com os ganenses e nigerianos: tinham uma costa de 5 mil quilômetros, do norte do Senegal
as enxadas de ferro eram, é claro, essenciais até Angola, ao sul. “de 65 a 75% dos escravizados eram
à economia de Daomé, e talvez os produtos das regiões ao norte do rio Congo. Uma grande parcela
mais importantes manufaturados no jovem dos cativos pertencia a povos que viviam onde se situam
Estado. Assim, pois, os ferreiros eram Daomé, Gana e Nigéria”54.
reverenciados pelo povo, assim como os bons
artesãos50.
A partir de 1518, os portugueses, apoiados pela Igreja
Católica Apostólica Romana, ampliaram o tráfico de africanos
escravizados para as colônias espanholas, em particular paras

O Yoruba (Ioruba) é o segundo maior grupo étnico


na Nigéria, incluindo 18% da população total,
Imagem de Ogun (orixá aproximadamente. Eles vivem, em grande parte, no
yoruba dos metais) sudoeste do país. Também há comunidades de yoruba
significativas no Benin, Togo, Serra Leoa, Cuba e Brasil. O
yoruba é o grupo étnico principal nos estados de Ekiti,
Kwara, Lagos, Ogun, Ongo, Osun e Oyo.
A ilha de Goréia é pequena, tem 900 metros de comprimento, por 400 metros de largura
Segundo diversos pesquisadores, o termo yoruba é máxima, num total de 28 hectares. O Fort d’Estrées foi construído entre 1852 e 1856.
recente. De acordo com Biobaku, aplica-se a um grupo Os portugueses foram os primeiros europeus a estabelecer uma feitoria na ilha de Goréia
lingüístico de vários milhões de indivíduos. Ele acrescenta (1444), a partir da qual organizavam todo o comércio com o continente. Após 150
que, “além da língua comum, os yoruba estão unidos por anos de domínio português, a ilha mudou de mãos várias vezes (holandeses, ingleses e
uma mesma cultura e tradições de sua origem comum, franceses). O seu nome deriva do holandês, Goe-ree, o porto, por oferecer um excelente
na cidade de Ifé, mas não parece que tenham constituído porto de abrigo, protegido de eventuais ataques vindos do continente e ponto de partida
uma única entidade política. Também é duvidoso que, de navios negreiros. Daqui partiram mais de 15 milhões de escravos em direção à América
antes do século XIX, eles se chamassem uns aos outros (Louisiana, Cuba e Haiti), dos quais seis milhões não sobreviveram à viagem através do
por um mesmo nome”. Atlântico.

22
Os africanos escravizados para o Brasil, como em outras saúde, fazendo-os saltar, estender os braços
partes do mundo, eram aqueles com excelentes capacidades rapidamente, olhando na boca para avaliar
física, mental, produtiva e reprodutiva, portanto, perfeitos a idade; pois os capazes são tão astutos que
cultural, social e tecnologicamente. Os traficantes destas lhes raspam barba e cabelo (...) não é nada
populações não traziam crianças, velhos, mulheres grávidas fácil distinguir um velho de um de meia-
e portadores de necessidades especiais, na medida em que idade, a não ser pela queda dos dentes. Mas
visavam obter o máximo de lucratividade. Eles ocupavam todos nosso maior cuidado é não comprar nenhum
os espaços disponíveis nas médias e grandes navegações. que esteja com varíola, para não infestar os
demais a bordo55.
Neste particular, diz William Bosman, feitor das
Companhias das Índias Ocidentais Holandesas, em carta de As contribuições da ciência médica e higienista foram
1700, na costa do Daomé: importantes para os traficantes e seus compradores, os senhores
de engenho e fazendeiros nas Américas, Europa e Ásia, para
Quando esses escravos vinham para que adquirissem homens e mulheres plenamente capacitados
Fida, eram colocados todos em prisão. (...) Os
física e mentalmente. Esvaziando o continente africano
aprovados são separados; e os estropiados ou
destes seres capacitados produtiva e reprodutivamente, bem
defeituosos, colocados de lado como inválidos.
como fazendo com que esse continente perdesse seus talentos,
Estes são os que têm mais de 35 anos, ou têm
os braços, pernas, mãos ou pés mutilados,
realeza, sacerdotes, intelectuais e artistas para construírem,
perderam um dente, têm cabelos grisalhos, com sua força e criatividade, outras civilizações.
ou uma película nos olhos; e também todos
aqueles afetados por desarranjo venéreo ou
por várias doenças. (...) As mulheres custando
um quarto ou um terço mais barato que os
homens.
O capitão Thomas Phillips, do Hannibal, informa como o
cirurgião de seu navio verifica a população escravizada a ser Captura de negros
transportada para a América: destinados à escravidão,
Os melhores escravos, de acordo com o na região do Congo
grau de qualidade, os melhores primeiro,
etc., e nossos cirurgiões os examinavam em
todos os aspectos, para ver se tinham boa

O Daomé era um reino africano situado onde hoje é o atual Benin. O reino foi fundado
no século XVII e durou até o final do século XIX, quando foi conquistado com tropas
senegalesas pela França e incorporado às colônias francesas da África Ocidental. As origens Pintura representando
do Daomé podem ser traçadas a partir de um grupo Adjá, do reino costeiro de Aladá, um mercado de
que se deslocou para o norte e se estabeleceu entre os povos fon, do interior. Por volta escravos
de 1650, os adjás conseguiram dominar os fona e o Hwegbajá declarou-se rei de seu
território comum. Tendo estabelecido sua capital em Agbome (Abomei), Hwegbajá e seus
sucessores conseguiram estabelecer um Estado altamente centralizado. Toda a terra era
propriedade direta do rei, que coletava tributos, das as colheitas obtidas.

23
50 do século XVI, teve a contribuição de africanos aportados
em Cabo Verde, mas de diferentes grupos étnico-nacionais
Os africanos no Brasil: quem eram? sudaneses, porém, tendo como principais contribuidores,
neste momento econômico brasileiro, os africanos de
origem Bantu (Banto) situados nos atuais países de Angola e
República Democrática do Congo. Esses bantus contribuíram
intensamente com a agricultura no Brasil:
No Brasil, os africanos chegaram devido às necessidades Nos primeiros séculos da Era Cristã, em
portuguesas de ampliar o plantio e comercialização da cana- vastas regiões da África, ao sul do Saara,
de-açúcar, tanto interna, quanto para a Europa, bem como comunidades negras praticavam uma
pela visualização de que o tráfico atlântico era extremamente agricultura itinerante, assentada sobre a
lucrativo. Além disso, havia a deficiência orgânica das metalurgia do ferro, conheciam o pastoreio,
populações ameríndias ao seu contato físico, já que ela exerciam um artesanato crescentemente
acarretava mais prejuízo do que lucro. O ciclo econômico do refinado56.
pau-brasil foi viabilizado pela mão-de-obra indígena.
A disposição para a agricultura desses grupos de africanos
Foram “17 peças de escravizados” africanos que aportaram mostra que as feitorias lusas, ao longo do litoral africano, já
no Brasil em primeiro lugar, segundo os registros históricos tinham elaborado o perfil social, produtivo e tecnológico de
em 1533, com Pero de Góis. Posteriormente, em 1539, eles cada uma das etnias africanas com as quais tiveram contato,
são trazidos por solicitação de Duarte Coelho, donatário da ao longo deste final de século XV e em todo o século XVI e XVII.
capitania de Pernambuco. Eles vieram de Guiné. Utilizando-as segundo os seus interesses econômicos e tático-
O ciclo da cana-de-açúcar, iniciado no Brasil na década de estratégicos, os missionários católicos também contribuíram

Navio Negreiro, pintado por Os bantu ou bantos são um conjunto de


Rugendas. cerca de 400 grupos étnicos diferentes
existentes na África. Estendem-se desde
Escravos em um porão de os Camarões até a África do Sul e
embarcação (Rugendas, c. 1810) ao Oceano Índico. Pertencem à mesma
Imagem extraída do interior de família linguística, a das línguas bantu,
um navio negreiro. e partilham costumes comuns.

As nações ameríndias, em contato com os lusos e espanhóis, foram


quase dizimadas nos primeiros séculos, do contato pela carência de
anticorpos, levando-os a morbidade e mortalidade massivas.
Duarte Coelho Pereira foi o primeiro donatário da Capitania
Hereditária de Pernambuco, fundador de Olinda. Bastardo da antiga
família dos Coelhos, da nobreza agrária do Entre-Douro e Minho; A feitoria era uma instituição originária da Europa, onde cumpria o papel de elo comercial,
era filho de Gonçalo Coelho, escrivão da Fazenda Real e comandante e que os portugueses espalharam desde África ao Brasil e até mesmo à Índia. Podemos,
da expedição portuguesa que partiu para o Brasil, em 1503. Era então, denominar feitoria a organização de mercadores de um estado, que residiam num
casado com Dona Brites de Albuquerque. Pelos seus serviços na Índia mesmo local, fora das suas fronteiras. Esta organização visava defender os seus interesses
recebeu, em 1534, a doação de 60 léguas de costa no Brasil, nos comuns, principalmente econômicos, possibilitando a manutenção de relações comerciais
Capitanias do Brasil atuais estados de Pernambuco e Alagoas, que formavam a maior regulares e constantes na região onde estavam sediados. Implicavam, pois, pelo menos,
em 1534 capitania brasileira. uma representação autorizada e uma área própria.

24
com diversas informações importantes para a Coroa Lusa. maioria dos africanos era do sexo masculino, e havia a prática,
Com a centralização da atividade econômica focada na do senhor, de obter o máximo de trabalho de um escravizado,
mineração, buscar-se-á um novo contingente populacional substituindo-o rapidamente por outro, provocando uma taxa
africano, mais afeito às tecnologias de extração mineral. de mortalidade altíssima e de natalidade, baixíssima, já que
Vale ressaltar que não houve uma decadência da economia as condições eram extremamente insalubres, com recordes nos
canavieira, mas uma concentração na mineração, pois com índices de mortalidade e morbidade de africanos das etnias
ela a Coroa conseguiria mais recursos e impostos. Além disso, bantu, de Angola, Moçambique e dos yorubas provenientes,
com essa economia muitos portugueses vieram ao Brasil geralmente, da Nigéria e do Golfo do Benin; 2) uma das poucas
com o nítido objetivo de enriquecer rapidamente. O ciclo da compensações do africano na mineração era a possibilidade,
extração mineral ocorreu em Minas Gerais, Goiás e Mato mesmo remota, de comprar sua liberdade. Esta conquista era
Grosso do Sul, propiciando que o Brasil tivesse um aumento mais fácil de ser alcançada pelos afro-brasileiros do que pelos
três vezes superior de africanos escravizados da história em africano57.
um período econômico. A decadência da mineração na região de Minas Gerais
A atividade econômica exercida pelos africanos das etnias propiciou a tentativa de novos investimentos na economia
bantu e sudanesas contribuiu com a mudança significativa canavieira do nordeste, fazendo com que outros grupos
da composição sudeste do Brasil, além de alterar a capital da étnico-nacionais sudaneses (yorubas, achantis, fon, jejês,
colônia para o Rio de Janeiro, com a nítida intenção de escoar etc.) fossem traficados para o Brasil, no final do século XVII,
ouro para a metrópole lusa. produzindo um conjunto de rebeliões ao longo do século XIX
nesta região do país, entre as quais a revolta dos Malês, em
O uso do trabalho africano na mineração teve aspectos 1835, a maior revolta urbana da história brasileira58.
específicos: 1) a população escravizada no Brasil sempre
mostrou taxas negativas de crescimento vegetativo porque a Com as dificuldades da economia agrária nordestina

Mapa de extração mineral no Brasil (séc. XVIII)


Mapa mostra também o relevo e a hidrografia do Brasil, segundo as referências geográficas
do sec. XVIII.
Mapa extraído do livro Nova História Crítica do Brasil, de Mário Schmidt, da editora Nova
Geração.

25
pautada pela cana-de-açúcar propiciou o fluxo de migração brasileiras, após 1830, sendo responsável pelo deslocamento
interna no Brasil, sobretudo com a ascensão da economia dos centros de decisão do país.
cafeeira no Rio de Janeiro (Baixada Fluminense) e São Paulo Em poucas décadas, a cultura cafeeira produziu a maior
(Vale do Paraíba) tornando possível a que muitos africanos concentração regional de escravizados no Brasil, expandindo-
de diferentes regiões do Brasil e outros oriundos de Angola e se em áreas até então esparsamente povoadas. Os lucros do
Moçambique para trabalhar nesta lavoura. café, em São Paulo, propiciaram várias discussões matizadas
A cultura do café coincidiu com a crise escravista e o final pelos interesses econômicos e políticos, entre as quais as
de tráfico negreiro no plano externo, ocasionando, no plano desenvolvidas pelos pequenos e médios fazendeiros que,
interno, o deslocamento de escravos das minas e dos engenhos formados dentro de uma concepção burguesa e liberal,
para os cafezais. Era compreensível que isto ocorresse, visto emanada da Europa, fortaleceram a luta pelo fim do
que a produção cafeeira assumia a liderança das exportações escravismo, embora, sustentassem a idéia da mão-de-obra
assalariada, defendida pelos imigrantes europeus.
Os africanos escravizados que organizaram
a revolta dos malês eram os hauçás e nagôs Mesmo antes do término da escravidão, São Paulo já
oriundos de grupos islamizados, provenientes da utilizava o trabalho livre com os imigrantes europeus em
atual Nigéria. regime de parceria ou colonato. Esta conformação econômica
e populacional tornou São Paulo uma “província estrangeira”,
cuja realidade foi maximizada em relação às províncias do sul
(Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) que receberam
uma grande quantidade de mão-de-obra européia. Neste fluxo
os alemães e italianos que estavam, na Europa, em guerra por
unificação territorial.
Com a chegada destes e de outros europeus, a população
africana escravizada de origem bantu, proveniente do
tráfico interno, pelo litoral, mas também pelo Rio da Prata
(oriundos da região meridional da África, via Argentina e
Uruguai) estabeleceu-se no Brasil a rica e próspera economia
exportadora do charque nas estâncias gaúchas59.

A guarda nacional era recrutada entre os cidadãos com renda anual superior a 200 mil
réis, nas grandes cidades, e 100 mil réis, nas demais regiões. No confronto morreram sete
integrantes das tropas oficiais e setenta, do lado dos negros. Duzentos escravos foram
levados aos tribunais. Suas condenações variaram entre a pena de morte, os trabalhos
forçados, o degredo e os açoites, mas todos foram barbaramente torturados, alguns até
a morte. Mais de quinhentos africanos foram expulsos do Brasil e levados de volta à
África. Apesar de massacrada, a Revolta dos Malês serviu para demonstrar, às autoridades
e elites, o potencial de contestação e rebelião que envolvia a manutenção do regime Fazenda brasileira de café - século XIX.
escravocrata. Fazenda de café no Vale do Ribeira (SP).

26
Após a abolição legal da escravatura, e com o advento da e aumentar fazenda, nem ter engenho corrente”61.
República, o processo de europeização avançou nas regiões O que Antonil, Vieira, Matos, Alencar, Cunha, Lobato,
sudeste e sul do país. Os africanos e seus descendentes foram Viana não disseram ao longo da história da cultura brasileira
marginalizados do mercado de trabalho ascendente que é que o legado africano, para o Brasil, foi e tem sido imenso,
emergiu com a crescente urbanização e industrialização. desde a produção musical até a industrial, além das artes,
Muitos tiveram de negar a sua história e cultura tradicionais e ciências e instituições sociais e religiosas, na medida em que
construir sua ascensão na sociedade brasileira a partir destas foi ele, de fato e direito, o grande civilizador e colonizador da
negações, assim negando a sua identidade social e étnico-
racial. Para os “negros” na Velha República, abriram-se
duas alternativas irremediáveis; vedado
o caminho inequívoco da classificação
econômica e social pela proletarização,
restava-lhes aceitar a incorporação gradual à
escória do operariado urbano, em crescimento,
ou abater-se, penosamente, procurando no ócio
dissimulado, na vagabundagem sistemática ou
na criminalidade fortuita, meios para salvar
as aparências e a dignidade de homem livre60.
Com toda essa realidade vivida pelos africanos no
Brasil, desde o século XVI, embora tenham sofrido diversas
hostilidades, adversidades perpetradas pela violência
institucional patrocinadas pela escravidão e pelos
escravizadores que conquistaram o Brasil, foram eles que
construíram a civilização brasileira, na medida em que
colonizaram esta sociedade, como disse o jesuíta André João
Antonil: “Os escravizados são as mãos e os pés do senhor de
engenho, porque sem eles não é possível fazer, conservar

Estudo de Sandra Sofia Machado Koutsoukos mostra Estudo de Sandra Sofia Machado Koutsoukos mostra a foto de Carneiro & Gaspar, R.J., s/d. É
foto de Militão Augusto de Azevedo, S.P., 1879. É o o retrato de D. Marcellina, uma ex-escrava e ex-mucama, que havia sido libertada pelo seu
retrato de um casal de negros livres, que tentava senhor, seu Antônio, de quem ela era amante. E nessa foto, como em tantas outras da época,
“trilhar” seu caminho dentro daquela sociedade aparece uma mulher vestida e penteada à moda européia, com o seu leque. O leque era um
branca, exigente e racista. O casal fez-se fotografar detalhe importante, pois era um símbolo de distinção e frescura, cujo uso e manejamento
como os casais brancos da sociedade, vestidos e corretos, através de um ritmo elaborado de gestos, denotavam que a elegante era afeita aos
penteados à moda européia. A mulher exibe a sua usos da sociedade. Para compor o cenário da foto, o fotógrafo escolheu uma ambientação
sombrinha e o homem, o seu chapéu e, mais, ele rústica (também em moda, no período). Tal retrato de D. Marcellina foi anexado ao processo
adiantou um pouco o pé esquerdo e mostra, como de pedido de anulação de casamento (de 1887) movido pela esposa branca de seu Antônio,
quem não quer nada, seu sapato de pessoa livre. que o acusava de estar liquidando com a fortuna do casal para bem manter a amante
Nada nas roupas ou penteados liga-os à sua origem negra na Corte. E esse cartão-de-visita foi uma foto que ela, possivelmente, tirou para se
africana; a única coisa que nos remete à sua origem, ver retratada na nova condição de mulher livre e presentear os seus parentes e conhecidos
que os “denuncia”, é a sua cor. (e seu amante). Essa foto representaria quase um passaporte para ressaltar o status de sua
nova condição. Porém, tal retrato foi parar nas mãos da esposa traída de seu Antônio e a
fez agonizar de raiva da rival.

27
nação, no início do século XX: Brasil colônia, o Brasil independente, nação
foi o trabalho do negro que aqui sustentou, culta poderosa entre os povos civilizados (...)
por séculos e sem desfalecimento, a nobreza e Tratando-se da riqueza econômica, fonte da
a prosperidade do Brasil; foi com o produto organização nacional, ainda é o colono preto
do seu trabalho que tivemos as instituições a principal figura, o fator máximo62.
científicas, letras, artes, comércio, indústria Mais tarde, dirá veementemente Gilberto Freyre (1987, p.
etc., competindo-lhes, portanto, um lugar 462-63) que entre outros fatores civilizatórios:
de destaque como fator da civilização
foi ainda o negro quem animou a vida
brasileira.
doméstica do brasileiro de sua maior alegria.
Quem quer que compulse a nossa história, O português, já de si melancólico, deu no Brasil
certificar-se-á do valor e da contribuição do para sorumbático, tristonho; e do caboclo nem
negro na defesa do território nacional, na se fala: calado, desconfiado, quase um doente
agricultura, na mineração, como bandeirante, na sua tristeza. Seu contato só fez acentuar a
no movimento da independência, com as melancolia portuguesa. A risada do negro é
armas na mão, como elemento apreciável na que quebrou toda essa ‘apagada e vil tristeza’
família, e como herói do trabalho em todas as em que foi abafando a vida nas casas-grandes.
aplicações úteis e proveitosas. Fora o braço Ele que deu alegria aos são-joões de engenho;
propulsor do desenvolvimento manifesto no que animou os bumbas-meu-boi, os cavalos-
estado social do país, na cultura intelectual marinhos, os carnavais, as festas de Reis. Que à
e nas grandes obras materiais, pois que, sombra da Igreja inundou das reminiscências
educandos: feneceriam as aspirações mais alegres de seus cultos totêmicos e fálicos as
brilhantes, dissipar-se-iam as tentativas mais festas populares do Brasil; na véspera de Reis e
valiosas. Foi com o produto do seu labor que depois, pelo carnaval, coroando os seus reis e as
os ricos senhores puderam manter os filhos suas rainhas, fazendo sair debaixo de umbelas
nas universidades européias, e depois nas e de estandartes místicos, entre luzes quase de
faculdades de ensino do país, instruindo- procissão, seus ranchos protegidos por animais
os, educando-os, donde saíram veneráveis – águias, pavões, ... – cada rancho com o seu
sacerdotes, consumados políticos, notáveis bicho feito de folhas-de-flandres conduzido à
cientistas, eméritos literatos, valorosos cabeça, triunfalmente; os negros cantando e
militares, e todos quantos ao depois fizeram do dançando, exuberantes, expansivos (...) Nos

Manuel Raimundo Querino nasceu em


28 de julho de 1851 em Santo Amaro
(Bahia), e faleceu em 14 de fevereiro de
1923 em Salvador (Bahia). Mais conhecido
como Manuel Querino, foi o primeiro
historiador negro no Brasil. Descreveu a Curandeiro camaronês
capoeira baiana no seu último livro. A
Bahia de Outrora, em 1916. Jornalista,
poeta, militante político e abolicionista,
descreveu diversos artigos e livros.

28
engenhos, tanto das plantações como dentro muitas vezes até ao sacrifício. Foi no lar do
de casa, nos tanques de bater de roupa, nas senhorio que o negro expandiu os mais nobres
cozinhas, lavando roupa, enxugando prato, sentimentos de sua alma, colaborando, com
fazendo doce, pilando café; nas cidades, o amor dos pais, na criação de sua tenra
carregando sacos de açúcar, pianos, sofás descendência dos seus amos e senhores, com
de jacarandá de ioiôs brancos – os negros o cultivo da obediência, do acatamento, dos
trabalharam sempre cantando: seus cantos de respeito à velhice e inspirando simpatia, e
trabalho, tanto quanto os de Xangô, mesmo amor a todas as pessoas da família.
as festa, de ninar menino pequeno, As mães negras eram tesouro de ternura
encheram de alegria africana a vida para os senhores moços no florescimento da
brasileira. Às vezes um pouco de banzo: mas família dos seus senhores. Desse convívio no
principalmente de alegria63. lar, resultaram as diversas modalidades do
serviço íntimo, surgiram então a mucama
No tocante à relação do africano escravizado com a família
de confiança, o lacaio confidente, a ama-de-
do senhor, já que na maioria dos casos negros e negras não
leite carinhosa, os pajens, os guarda-costas e
puderam ter sua família:
criados de estima64.
Uma vez removido para o lar doméstico,
Embora possamos ter, na perspectiva de Querino, um mundo
o escravizado negro, de natureza afetiva, e,
no geral, de boa índole e com a sua fidelidade
quase idealizado e amalgamado pela cultura africana, destituído
a toda a prova, a sua inteligência (...) de violência aparente, constatamos que as mulheres africanas
conquistava a estima dos seus senhores pelo e afro-brasileiras, em todo o processo de escravização, foram
seu sincero devotamento, e sua dedicação usadas nos mais diversos serviços produtivos, seja no eito, seja
na casa do senhor/da sinhá como mucama, ama-de-leite, etc.
Porém, nesta sociedade colonial-imperial, de raiz patriarcal e
machista, elas também foram usadas como animais sexuais,
submetidas às mais variadas sevícias, estupradas muitas vezes
pelos senhores e sinhôzinhos da casa-grande e do sobrado. Elas
também não contavam com o apoio das sinhás, pelo contrário,
em muitos casos perderam a vida a mando dessas mulheres
brancas. Desses e outros tantos estupros, elas tiveram de
abortar, cometer infanticídio ou mesmo se suicidar, não
gerando essas crianças em seus ventres, posto que nasceriam
também escravizadas, mesmo quando o Brasil contava com
a lei do Ventre Livre, no século XIX. Desses relacionamentos
sexuais muitas crianças miscigenadas nasceram no país. Em
vários casos, as meninas africanas e afro-brasileiras tiveram
de exercer o caráter purgativo diante de homens acometidos
de sífilis65.
A despeito de toda e tanta violência social, sexual e étnico-
racial em que estiveram submetidas, essas mulheres negras
construíram um universo cultural repleto de símbolos e signos
Ilê Axé Iya Nassô Oká, Terreiro da Casa Branca, casa mais antiga de candomblé, Salvador/ que têm marcado a sociedade brasileira, seja a partir de suas
Bahia. crenças e religiosidades que remetem à antigüidade africana

29
dos ancestrais e antepassados, seja a partir da organização e negociavam a sua liberdade68.
familiar com o seu caráter matrilinear, seja a partir de um As contribuições das mulheres e homens oriundos da
cenário supostamente não violento, harmônico e sagrado, que África (de Cabo Verde à África do Sul, na costa Atlântica, e
é a cozinha com seus cheiros, suores e segredos66. Moçambique, na costa do Índico, e os africanos do interior do
em vendas ou quitandas, nas portas das continente) e seus descendentes brasileiros das nações Jala,
casas, ou ambulantes em tabuleiros, praticam Courá, Mina, Nagô, Ewe, Jeje, Haussá, Achanti, Nupe, Bornu,
o comércio urbano de comidas feitas, Gurúnci, Fulá, Malê, Cabindas, Benguelas, Congos, Angolas,
especialmente dos preparados culinários Macúas, Angicos, Sentys, Berbere, Jalofo, Felupo, Mandinga
africanos, muito do sabor da população, de etc. para o Brasil é imensa, ainda hoje incomensurável. As
condimentos, frutos, legumes, produtos da contribuições das diferentes civilizações (estados, nações e
costa67. países) é igualmente grandiosa e remonta a aproximadamente
As mulheres negras escravizadas adquiriram a alforria em 150 mil anos69.
maior número do que os homens, devido às tarefas domésticas, Em suma, para finalizar, deixo algumas indagações e
a questões econômicas que envolviam a sua manutenção recomendações: as contribuições africana e afro-brasileira
quando estavam com idade avançada para desempenhar ao Brasil foram feitas sob um regime jurídico-institucional
bem as suas tarefas, à possibilidade de seu marido negro e um sistema político-econômico dos mais violentos e longos
escravizado comprar a sua liberdade para que ela tivesse seus da história mundial. Então, pergunto: como seria a qualidade
filhos em liberdade e pela à arte de mercadejar nas ruas e e a quantidade dessas contribuições se eles e elas, com sua
vielas. O fato de estarem na rua, como mulheres de ganho, cultura ancestral e milenar, com seu conhecimento científico
propiciou essas condições, na medida em que economizavam e tecnológico estivessem fazendo tudo com prazer e podendo

Moqueca de camarão

Acarajé

Diversas etnias africanas representadas por mulheres escravizadas no Brasil.

30
criar com liberdade? Qual seria o rumo do Brasil e do
mundo? Pense nas grandes políticas públicas e nas mudanças
conjunturais que marcaram a vida social e as instituições
brasileiras, desde a colônia até hoje. Perceba que diversas
delas tiveram o africano e o afro-brasileiro como fonte de
inspiração, não para favorecê-lo. Depois de ter pensado nisso,
veja que o maior contribuinte da história da humanidade
continua sendo tratado ora como devedor, ora como um ser
abjeto, inferior e descartável, não como credor.

31
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O conteúdo do item foi baseado nos artigos inéditos Novas bases apud NASCIMENTO, 1996, p. 64
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apud NASCIMENTO, 1996, p. 60
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amazon.com); Mitos, ideologias e mentalidades: e por falar no A respeito de conhecimento mais aprofundado sobre a história
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no documento Diretrizes curriculares nacionais para a educação apud NASCIMENTO, 1996, p. 64
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Ver também, neste sentido, NASCIMENTO, E. L. Sankofa: Autores Africanos, 1982; EISNER, Will. Sundiata – uma lenda
Significado e intenções. Org. Elisa L. Nascimento. In: Sankofa: africana: o leão do Mali. Trad. A. de M. Soares, São Paulo: Cia. das
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SOUZA E MOTTA, 2003, p. 41 MEILLASSOUX, 1995
Ver, em detalhes, NASCIMENTO, E. L. Sankofa: Significado e apud MELTZER, 2004, p. 231-2
intenções. Org. Elisa L. Nascimento. In: Sankofa, Matrizes africanas
da cultura brasileira, Rio de Janeiro, Eduerj, v. 1, 1996, p. 27-29. MELTZER, 2004; NASCIMENTO, 1996
NASCIMENTO, Elisa L. (1996, p. 30). MELTZER, 2004, GILROY, 2001
apud NASCIMENTO, 1996, p. 58. MEILLASSOUX, Claude,1995, p. 54-5
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apud NASCIMENTO, 1996, p. 60-4 MILLER, 1997, p. 21-40; ALENCASTRO, 2000

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apud CHIAVENATO, 1986, p. 49
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