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Nota prévia:

Estes são os apontamentos semanais de DIREITO PROCESSUAL CIVIL, disponibilizados pela Comissão
de Curso dos alunos do 3º ano da licenciatura de Direito da Faculdade de Direito da Universidade do Porto,
para o mandato de 2023/2024.

Foram elaborados pelas alunas Lara Monteiro e Beatriz Oliveira, tendo por base as aulas e documentos
disponibilizados pelo docente Tiago Ramalho.

Salienta-se que estes apontamentos são apenas complementos de estudo, não sendo dispensada, por isso, a
leitura das obras obrigatórias e a presença nas aulas.
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Índice
SEMANA 1 – 11.09 a 15.09.................................................................................................................. 5
PARTE I – O OBJETO DO PROCESSO ......................................................................................................... 5
PARTE II - OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS........................................................................................ 7
PARTE III – A TRAMITAÇÃO PROCESSUAL............................................................................................. 7
PARTE IV – A SENTENÇA ............................................................................................................................ 8
O QUE É O PROCESSO CIVIL? .................................................................................................................... 9
1º Ponto: Monopólio do uso da força ................................................................................................. 9
2º Ponto – Transformar a sociedade de acordo com uma determinada ideia que conduzirá à
instrumentalidade do processo ......................................................................................................... 10
3º Ponto – O Estado ordena-se através do Direito .......................................................................... 12
• Princípio da separação e interdependência de poderes; ...................................................................................... 12

Quais são os textos normativos de referência para o processo civil?............................................. 13


PARTE I – OBJETO DO PROCESSO ........................................................................................................... 14
Pedido .................................................................................................................................................. 15
SEMANA 3 – 25.09 A 29.09 ............................................................................................................... 15
Ações Declarativas ............................................................................................................................. 16
Ações de Condenação (art. 10º nº3 CPC) ......................................................................................... 16
Ações de simples apreciação (art. 10º nº3 a) CPC).......................................................................... 17
Ações constitutivas (10º nº3 CPC) .................................................................................................... 17
Causa do Pedido ................................................................................................................................. 19
Como determinamos concretamente a causa do pedido de cada concreto ação?......................... 19
E se for um caso sujeito a vários regimes?....................................................................................... 20
• Ações constitutivas ou de anulação; ................................................................................................................... 20
SUJEITOS DO PROCESSO .......................................................................................................................... 22
Modalidade da parte .......................................................................................................................... 22
ATIVIDADE PROCESSUAL ........................................................................................................................ 23
Princípio do Contraditório ................................................................................................................ 24
Como é que o réu pode exercer a sua defesa? ................................................................................. 25
MODALIDADES DE DEFESA NO PLANO DA ADMISSIBILIDADE..................................................... 28
Defesa por Exceção Dilatória ............................................................................................................ 28
MODALIDADES DE DEFESA NO PLANO DO MÉRITO ........................................................................ 29
Impugnação de Facto......................................................................................................................... 29
Impugnação de Direito ...................................................................................................................... 30
Exceção Peremptória ......................................................................................................................... 30
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FINALIDADE DAS EXCEÇÕES PEREMPTÓRIAS .................................................................................. 32


1º Ponto: Desistência .......................................................................................................................... 34
2º Ponto: Confissão ............................................................................................................................ 34
3º Ponto: Transação ........................................................................................................................... 34
O Poder de Julgar .............................................................................................................................. 35
Finalidades da Fundamentação ........................................................................................................ 36
PARTE II – OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS ..................................................................................... 38

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SEMANA 1 – 11.09 a 15.09


Avaliação:
• Exame Final
Bibliografia Obrigatória:
• Sebenta – Tavares de Sousa;
• “A ação declarativa comum” – Lebre de Freitas;
• Código Processual Civil;
Bibliografia Opcional:
• “Manual de Processo Civil” – Castro Mendes e Teixeira de Sousa;
• “Direito Processual Civil” – Francisco Ferreira de Almeida;
Códigos Anotados (consultar em caso de dúvida em artigos específicos):
• CPC anotado – Lebre de Freitas;
• CPC anotado – Abrantes Geraldes;
• CPC anotado – Tavares de Sousa (gratuito e online: blogippc.blogspot.com).

O PROCESSO COMUM DA DECLARAÇÃO

PARTE I – O OBJETO DO PROCESSO

O processo é uma realidade prática respeitante à ação humana. E a atuação humana tem lugar por
referência a certos fins.
O processo comum da declaração propõe-se a resolver, com autoridade, uma controvérsia entre duas
pessoas. Tudo no processo é dirigido, com este propósito, ou seja, este só é praticado na medida em que possa
contribuir para a resolução da controvérsia. Se o fim do processo é resolver uma controvérsia então é necessário
estudar os específicos contornos do objeto do processo.
Do ponto de vista relacional, o processo civil estrutura-se enquanto relação processual ou instância, esta relação
processual tem 3 partes/polos:
• O autor
• O réu
• O tribunal
Esta relação de ação procede do seguinte modo:
• O autor apresenta ao tribunal uma situação de ação, posteriormente, o tribunal ordena a situação do réu,
constituindo este uma situação de contradição. Isto é, o réu é chamado para contradizer o autor. Após a
ação e a contradição, está completa a relação processual e pode começar a desenvolver-se o processo.
A relação processual é constituída para se dar a conhecer o objeto do processo. O objeto pode ser delimitado
objetiva e subjetivamente.

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• Subjetivamente – o objeto tem por sujeitos aqueles que sejam indicados como partes da relação
material controvertida apresentada pelo autor.
• Objetivamente:
o Pedido – é a providência jurídica ou o meio de tutela jurídica requerido pelo autor ao tribunal
(ex.: condeno o réu a pagar 1000 euros);
o Causa do pedido – é integrada pelos factos dos quais o autor extrai o seu pedido (ex.: foi
celebrado um contrato de compra e venda e o valor acordado foi de 1000 euros).
O objeto é então constituído pela relação material controvertida submetida pelo autor à apreciação do
tribunal. A partir do momento em que a instância está constituída, as partes ficam sujeitas aos efeitos de uma
eventual decisão sobre a relação material.
Não há processo sem pedido do autor, do mesmo modo que, tem de haver lugar à possibilidade de
contradição por parte do réu.
O réu pode-se “defender” em dois planos:
• Pode colocar em causa a admissibilidade da ação, ou seja, pode perante o tribunal sustentar que não
estão verificados pressupostos materiais para que se estabeleça a relação material (ex.: O réu não tem
legitimidade para colocar a ação)
o Quando o réu coloca em causa a admissibilidade da ação este defende-se por:
§ Exceção Dilatória – não é uma defesa que garanta que o réu não irá ser condenado no
futuro, apenas que ainda não estão verificados os pressupostos materiais necessários;
Nota: A exceção dilatória pode ser invocada em caso de incompetência relativa por parte do tribunal.
• Mérito da causa – incide diretamente sobre a relação material controvertida.
o Impugnação – o réu contraria diretamente o que o autor afirmou;
§ Direito
§ Facto
o Exceção peremptória – o réu introduz novos factos no processo, que permitem obstar àquilo
que o autor afirmou;
Assim sendo, embora o objeto do processo tenha por limites as partes do pedido e a causa do pedido, o
Tribunal terá de conhecer também um conjunto de elementos que o réu coloca em apreciação e das questões
que sejam de conhecimento oficioso. Quando o Tribunal já dispõe de todos os elementos necessários, este
poderá colocar termos à causa através da sentença.
Ex.: imaginemos que na petição inicial o autor afirma que celebrou um contrato de compra e venda de um
imóvel com o réu, no valor de 100.000 euros. Afirma, igualmente, que o réu não procedeu ao pagamento e
pretende a sua condenação a pagar o valor acordado no contrato, diz que ele próprio se chama João e a parte
contrária é o Manuel.
As partes da relação são o João e o Manuel, deste modo, as partes da ação apenas podem ser as mesmas.
O pedido é a condenação ao pagamento de 100.000 euros.

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E a causa do pedido é o incumprimento do contrato.


O réu, após a ação do autor, será chamado pelo Tribunal, e poderá defender das seguintes formas:
• Colocar em causa a admissibilidade da ação (afirmando que não é Manuel, mas sim o José e como tal
não tem parte na ação) – exceção dilatória;
• Negar ter celebrado um contrato – impugnação;
• Afirmar que aquele contrato é inválido porque foi celebrado por coação (introdução de novos factos) –
exceção peremptória;

PARTE II - OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS


Os pressupostos processuais colocam-se com o objetivo de obter conhecimento em relação ao objeto
do processo.
No processo comum da declaração distingue-se o plano da admissibilidade (diz respeito à relação
processual/instância) do plano do mérito (diz respeito à relação material controvertida), isto é, apenas se a ação
for admissível é que o Tribunal avança para o mérito.
A primeira coisa que o Tribunal tem de fazer é verificar se todos os pressupostos de admissibilidade
estão verificados. O réu pode invocar uma exceção dilatória quando estes pressupostos não se encontram
verificados.
É admissível corrigir a falta destes pressupostos ao longo do processo. Se os pressupostos persistirem
sem correção, o Tribunal recusar-se-á a conhecer o mérito dando-se uma “absolvição da instância”.
Os principais pressupostos processuais são:
• Personalidade Judiciária;
• Capacidade Judiciária;
• Legitimidade das partes;
• Competência do Tribunal nacional ou internacional;
• Patrocínio Judiciário – para se socorrer de um advogado ou, eventualmente, solicitadores;

PARTE III – A TRAMITAÇÃO PROCESSUAL

Nota: A tramitação da ação declarativa encontra-se regulada nos art. 552º e ss. do CPC, livro 3. É através da
tramitação processual que o Tribunal conhece o objeto do processo.
O processo civil subdivide-se em duas fases fundamentais com a possibilidade de existência de uma
intercalar.
• A primeira fase corresponde à submissão do litígio à apreciação do tribunal.
• A segunda fase ou fase intercalar diz respeito ao aferir dos pressupostos processuais e ao
planeamento da audiência final. Esta é uma fase de ligação entre o primeiro momento e o último.
• A terceira fase reconduz-se à produção de prova e ao julgamento de causa.

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Na primeira fase ou fase dos articulados têm lugar, precisamente, os articulados das fases, isto é, as
peças processuais ou atos processuais das partes nas quais se apresentam os fundamentos da ação e da defesa.
É nesta fase que se forma quer a relação processual quer a delimitação do objeto do processo. O autor apresenta
a petição inicial e o réu apresenta, após citação do Tribunal, a contestação. Esta fase pode tornar-se bastante
complexa, uma vez que, também podem existir pedidos do réu contra o autor. Esta fase decorre tendo como
protagonistas as partes, como tal, não contempla uma intervenção do juiz, é destinada a que as partes entrem
em contacto com concreto julgador que ainda não está a resolver nada. O Tribunal limita-se a receber os atos
que patenteiam as partes.
Por sua vez, a segunda fase ou fase da audiência prévia, já prevê a entrada no processo, de um juiz ao
qual cabe a gestão do processo, isto é, cabe ao juiz aferir se estão ou não reunidos todos os pressupostos
processuais, e em caso afirmativo, inicia-se a planificação da audiência final.
Enquanto a primeira fase comtempla como apenas as partes enquanto protagonistas, nesta fase junta-se
a elas o julgador.
Por fim, na terceira fase ou fase da audiência final, produz-se a prova que seja necessária para constituir
o processo (ex.: declarações das partes, testemunha, etc.), têm, portanto, as partes, mediante os seus
representantes, a possibilidade de discutir a controvérsia com o juiz, ou seja, apresentar as suas conclusões sobre
qual deverá (nas suas perspetivas) ser a solução do litígio.
Nota: tanto a audiência prévia como a audiência final são presenciais.
Nota: A prova ou “instrução da causa” faz-se ao longo de todo o processo.
Posteriormente, possuindo já o juiz todos os elementos necessários ao processo, dá-se a sentença.

PARTE IV – A SENTENÇA

A sentença corresponde à resposta judicial ao pedido do autor. A sentença pode ser impugnada através
de:
• Recurso – recorre-se a um Tribunal superior, isto é, recurso do Tribunal a quo para o Tribunal ad
quem;
• Reclamação – feita ao próprio Tribunal;
Um caso é considerado julgado a partir do momento em que se assume o valor de indiscutibilidade de
uma sentença, isto é, quando esta já não pode ser impugnada.
• Formas especiais de tutela – formas de atuação processual que por alguma razão se distinguem do
processo comum da declaração
o Providencias cautelares – são uma modalidade de proteção judicial adotadas para o período
durante o qual ainda não é possível uma decisão estável da causa, isto é, medidas provisórias
que são adotadas);

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o Processos especiais – seguem uma tramitação diferente da tramitação comum por diferentes
razões (ex.: jurisdição voluntária)
• Meios alternativos de resolução de litígios – perderam a importância atualmente;
o Arbitragem – meio de mediação;
o Mediação;
o Julgados de paz;

Semana 2 – 18.09 a 22.09


O QUE É O PROCESSO CIVIL?
O processo civil pode ser definido como a sequência ordenada e concatenada de atos, dirigidos à
resolução de uma controvérsia submetida ao direito privado.
Nota: A palavra “processo” provém do verbo latino proceder que significa “marcha para a frente”.
Em conseguinte, o processo é um método para resolver controvérsias com uma decisão que beneficia
de autoridade pública, só que esta decisão será tomada de acordo com uma ideia de resolução que resulta da lei
substantiva.
No entanto, nem sempre foi assim, em tempos históricos, nos quais embora houvesse processo, não
havia uma lei prévia que carecesse de ser aplicada quando suscitada uma controvérsia para a qual se procurava
chegar a uma solução acordada entre as partes.
Historicamente houve formas de organização do processo em que a resolução prescindia de um alei
anterior, procurava- se chegar a uma solução mais ou menos consensual entre as partes, eventualmente com o
recurso a um terceiro que beneficiasse de alguma respeitabilidade social. Todavia, o processo civil atual não é
abstrato, mas próprio da forma de estar contemporânea, isto é, a forma de estar do estado constitucional, uma
modalidade especifica do estado moderno de direito.
As características específicas do atual processo civil estão ligadas às características do estado moderno,
especialmente ligadas a três características:
• O estado moderno chama a si o monopólio do uso da força;
• O estado moderno chama a si a pretensão de transformar a sociedade, de entre outras formas,
através da lei;
• O estado moderno ordena-se através do direito;

1º Ponto: Monopólio do uso da força


Um dos propósitos fundamentais característicos da organização política na Europa, seja ou não sob a
forma de Estado, foi a pacificação social e o adoçamento dos costumes, isto é, uma transformação de um
determinado comportamento social e moral que reduzisse a violência das relações processuais e no sentido de
trazer a atividade humana para quadros mais previsíveis.

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Esta pacificação social deu-se através de várias formas, nomeadamente, através de canalizar esta
violência, isto é, dirigir a violência para um determinado inimigo exterior utilizando a violência de modo a
servir o interesse público pacificando- se o interior (ex.: cruzadas); pode procurar-se pacificar agora diretamente
o próprio interior da sociedade, tal ocorreu a partir da Idade Média com programas de transformação dos
costumes e das práticas, a este período dá-se o nome de Estado Polícia – um estado de fomento económico,
educativo e social com novas práticas de legislação – corrigindo as práticas de violência; proibição ao recurso
individual à força/ arrogação pelo estado do exclusivo da força legítima, ou seja, se o estado chama a si o
monopólio do uso da força, daí decorre por consequência que cada um dos membros da comunidade está privado
de por si só à força de que já dispõe, a comunidade politica retira aos seus membros uma possibilidade tática
que efetivamente tem, se o faz então torna-se necessário oferecer uma determinada contrapartida, isto é, se os
membros da comunidade estão proibidos de na eventualidade de se verem envolvidos num conflito o resolverem
com violência então torna-se necessário oferecer uma alternativa que permita superar o conflito, essa alternativa
é justamente o processo, este é a alternativa dada para resolução de uma controvérsia em contrapartida da
proibição pré mencionada.
Por esta razão é que no CPC no art 1º se faz menção precisamente a esta ideia de proibição individual
do uso da força, sendo que, todos os restantes artigos são a opção que é dada pelo estado.
Daí que a doutrina tenha identificado um direito subjetivo à tutela jurídica como contrapartida desta
proibição dirigida a todos os particulares. Cada um deles tem uma pretensão contra o estado de caso necessário
poder recorrer a um processo, ou seja, poder desencadear um processo – os individuais podem, se quiserem,
lutar com outro através do processo e não fisicamente.
Cada um esta privado da possibilidade de recorrer à força salvo certas hipóteses excecionais, em que se
admite a autotutela, isto é, que a pessoa pelos seus próprios meios defenda a sua posição – ex.: ação direta (art.
336º CC, legitima defesa (art. 337º CC), etc.
Estes meios apenas são admitidos quando haja impossibilidade de recurso aos meios normais, desde
logo, a um processo, mas também pode ser, por exemplo, um meio administrativo.
Embora a lei admita uma certa autotutela executiva, isto é, que alguém recorra faticamente à força
quando esteja impossibilitado de solicitar auxílio dos meios normais de proteção, não existe autotutela
declarativa, melhor dizendo, a pessoa não tem autotutela para declarar por si mesma qual o seu direito. Não há,
uma vez que a comunidade política pretende reservar para si o monopólio de dizer o direito, é ela própria que
reserva o direito de dizer se um determinado comportamento é ou não conforme o direito/diretrizes que regem
o direito material.

2º Ponto – Transformar a sociedade de acordo com uma determinada ideia que conduzirá à
instrumentalidade do processo
Como foi supramencionado, o processo nasce como uma alternativa dada aos particulares ao recurso à
força. A controvérsia submetida à apreciação do tribunal será resolvida de acordo com aquelas regras que foram

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predispostas pelo legislador justamente pela tal pretensão do estado moderno de regular as relações humanas de
acordo com os tais critérios de valor que tem por mais relevantes.
Por tal razão, o processo civil diz-se instrumental/adjetivo em relação ao direito substantivo. O CPC
sinaliza imediatamente no seu art. 2º que o processo está subordinado ao direito material.
Desta instrumentalidade do processo civil decorrem duas consequências:
• Se o processo civil é instrumental de direito substantivo, isto significa que ele se deve orientar pelas
mesmas ideias de fundo, pelos mesmos valores fundamentais daquele direito a cujo serviço se
encontra;
Mas podemos extrair a consequência rigorosamente inversa:
• As disposições de direito material apenas através e mediante o processo adquirem a sua
concretização definitiva, uma determinada figura substantiva que não se realiza no processo não
tem valor, isto é, não há regime jurídico que seja perfeitamente compreendido antes de ser abordado
na sua realidade processual.
Nota: quem não compreende o processo, não está a compreender em que concreto sentido uma determinada
posição jurídica material merece proteção jurídica.
Nota: O que gramaticalmente é um adjetivo? Determina ou especifica o sentido da coisa. E exatamente isso que
faz o processo. Quem são compreendendo o processo não está a compreender em que concordo sentido uma
determinada posição jurídica material merece proteção jurídica.
Nos vários países da Europa, o processo não tem sempre o mesmo estatuto. Há duas formas de organizar
o processo no contexto das várias disciplinas jurídicas, dependendo de país para país.
• Pode-se distinguir as várias disciplinas de direito substantivo que se contrapõe ao direito processual
geral (ex.: quando alguém é processualista, neste caso, debruça-se quer sobre o processo civil como
sobre o processo penal, administrativo, etc. – é o caso de Espanha);
• Distingue-se as várias disciplinas de direito substantivo assim como os vários ramos de direito
processual (é ocaso de Portugal, Alemanha, Itália, etc.);
Nota: na opinião do professor esta é a melhor alternativa, uma vez que, o processo só pode ser alinhado com
a ajuda do direito substantivo a cujo serviço se encontra. Não existe nenhum processo em abstrato, existe
apenas em relação a ramos concretos do direito.
Muitos autores defendem o processo civil como direito público, costuma dizer-se que o processo civil
é um direito instrumental e público. O professor discorda totalmente, uma vez que, é evidente que o processo
civil envolve o exercíciodo poder público, mas isto não é decisivo para uma qualificação enquanto direito
público. Quando falamos da distinçãoentre direito público e direito privado temos de ter em consideração
não a circunstância do direito resultar do exercíciode prerrogativas de direito público, mas da índole da
matéria sobre a qual o direito se debruça.
A finalidade do processo é regular uma controvérsia entre iguais. O mesmo problema coloca-se no
direito privado/civil.O processo partilha das características do direito a cujo serviço se encontra. Sob este

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ponto de vista, o processo civil é sempre o último desdobramento de um determinado ramo do direito.
Em sentido amplo, incide sobre o estatuto das pessoas, sobre as relações e sobre o seu próprio processo.
Sem determinado processo um certo ramo de direito substantivo está ainda imputado de tudo aquilo que
carece para se realizar.
O processo civil constitui a modalidade comum do processo, isto é, sempre não haja um processo
especial a resolução de uma determinada controvérsia segue-se os termos do processo civil. Quando há um
processo especial, ainda assim, remete-se subsidiariamente sempre para o processo civil.
Exemplos de direitos processuais especiais (cada um ao serviço do seu ramo de direito substantivo – cada
ramo do direito subjetivo precisa do seu processo para se realizar de modo pleno):
• Direito Administrativo – CPTA;
• Direito tributário – CPPT;
• Jurisdição Constitucional – LTC;
• Processo Penal – CPP;
• Direito do Trabalho – CPT;

3º Ponto – O Estado ordena-se através do Direito


É característica também do Estado Moderno que a resolução de controvérsias particulares seja feita
mediante o poder público específico que é o poder jurisdicional, isto é, a jurisdição encontra-se organizada
enquanto poder. Umas das características dos estados europeus foi a tentativa de transformar o modo de vida
das diferentes populações, e tal transformação foi procurada realizar-se através da lei (e não só), e dentro do
conteúdo dessa lei estava a proibição do recurso à força.
Um dos resultados do esforço de pacificação das relações sociais foi, a final, uma igualmente
fortíssima e inédita concentração de poder nas mãos de um vértice central, ou seja, o estado moderno vive
nesta ambivalência sem a qual não é compreendido, por um lado, pretende ser o grande ordenador das relações
sociais, por outro, constitui um novo centro com um potencial poder sem qualquer paralelo, que é o próprio
estado que priva de poder todas as entidades queconsigo podem rivalizar.
Daí que após uma primeira fase, entre os séc. XVI e XVIII, num segundo momento tenha havido uma
reação no sentidode limitação deste mesmo poder a partir do séc. XVIII, nomeadamente com o movimento do
constitucionalismo moderno. Este está estritamente ligado com a ideia de conter um poder que foi concentrado,
através de constituições escritas, propagação de direitos humanos que garantam a separação entre o Estado e
a sociedade, separação de poderese princípios relativos à própria separação de poderes (princípio da legalidade,
princípio da proporcionalidade, etc.).
Se o processo civil supõe o exercício de um poder jurisdicional que é um poder público então também
este poder reclamaum conjunto de balizas que garantam o seu exercício adequado. Em especial há duas balizas
fundamentais:
• Princípio da separação e interdependência de poderes;

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• Princípio da independência judicial – a função judicial envolve a plenitude do poder público (art.
288º CRP), devendo, no entanto, obedecer àqueles que são os critérios da legalidade. Esta está
ordenada naquele texto queconstituiu o estatuto do poder público – CRP – art. 202º e ss.
É a partir destas coordenadas fundamentais que se organiza o processo civil.

Quais são os textos normativos de referência para o processo civil?


• CPC – regula a ordenação do processo, isto é, a sequência de atos que devem ser adotados para a
resolução deuma controvérsia;
• A lei de organização do sistema judiciário – regula a orgânica de funcionamento dos tribunais
judiciais, isto é, quais são os concretos tribunais em que se desdobra a ordem dos tribunais judiciais
– categorias de tribunaisexistentes;
• CRP – várias disposições da CRP assumem relevância para o processo civil, especialmente os artigos
202º e ss.
o Dupla relevância do ponto de vista jurídico e também na sua relação com Direito Processual;
os atuaistextos constitucionais desempenham uma dupla função prática:
§ 1º finalidade: ordenar o funcionamento do poder político – tarefas do estado,
competências, etc.
§ 2ª finalidade: previsão de certos catálogos de direitos fundamentais e de meios de
fiscalizaçãoda constitucionalidade – qualquer ordem jurídica precisa de resolver o
seguinte problema: compatibilizar a sujeição à lei com a liberdade individual.
Uma das formas históricas que confere liberdade ao jurista para desaplicar a lei foi conformar um
direito que estaria acima do direito ordenado, seria o direito natural.
Atualmente, o meio utilizado é o apelo ao texto constitucional, este em razão da sua indeterminação
pode funcionar como um meio para um jurista diante de uma norma cuja bondade pretende colocar em causa
a desaplicar.
Neste ponto de vista, as normas de direito constitucional poderão ser olhadas como pretextos para a
desaplicação de certas normas de direito ordenado. Normas como, o art. 20º CRP (normas de referência),
inspirado no art. 6º da CUEDH,que prevê o acesso ao direito. Deste artigo da CRP resultam muitos sub-
direitos que poderão ser invocados para a desaplicação de normas processuais.
A doutrina constitucional extrai do direito de acesso ao direito os quatro seguintes corolários: direito
de ação, direito aoprocesso, direito a uma decisão da causa e direito a uma execução.
O art. 20 nº2 prevê a proibição da negação da justiça por insuficiência de meios. O tribunal não
prevê que o acesso à justiça seja gratuita apenas proíbe que seja negado por insuficiência de meios
económicos. Para realizar este direito encontra-se previsto o regime constante da lei 34/2004 o qual prevê a
possibilidade de requerer apoio judiciário.
Do art. 20º nº3, resulta também o direito de poder aceder a alguém especialmente qualificado para

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poder obter uma informação, isto é, um parecer jurídico. Em princípio apenas advogados e solicitadores
poderão dar consultas jurídicas. Este direito é também constante na lei 34/2004.
Por sua vez, o art. 20º nº4 conjetura o direito ao patrocínio judiciário e fazer-se acompanhar de
advogado perante qualquer autoridade, a razão de ser deste direito é a complexidade técnica da ordem jurídica
que necessita de esclarecimento.
Por último, o art. 20º nº5 fala-nos sobre o direito a uma decisão em prazo razoável, ou seja, o direito
a que a dinâmica de funcionamento dos tribunais seja de tal forma a que a decisão final não surja em momento
excessivamente tardio. Note-se que não se exige uma decisão rápida, mas em prazo razoável, isto é, não se
pretende uma decisão arbitrária, massim equilibrada, tomada em tempo razoavelmente mensurado.
Recorre igualmente a exigência de criação de procedimentos especialmente celebres destinados
à proteção de DLG (art. 20 nº5), a esta injunção constitucional prevista que está na origem na matéria
administrativa de DLG (art. 109º CPTA e 878º e ss. CPC).
Faz igualmente referencia à exigência de um processo equitativo, art. 20º nº4 parte final, este processo
não é senão uma cláusula geral que aponta genericamente para uma ideia de razoabilidade, de equilibro, de
justeza do processo. Ela chega ao texto constitucional por inspiração do art. 6º CEUDH. No âmbito da
jurisprudência do tribunal europeu dos direitos humanos são abrangidos pelo processo equitativo, o direito
de liberdade de armas, direito ao princípio do contraditório, fundamentação de decisões, acesso ao processo
e aos dados, à prova, direito ao prazo razoável e à fundamentação das decisões.
Tão importante é considerar o que está abrangido pelo direito constitucional como o que está dele
excluído. Ora pergunta-se se é uma exigência constitucional a garantia de acesso ao direito ao recurso, essa
garantia é apenas dada em matéria penal art. 32º nº1 CRP. Em matéria civil adota-se um parecer mais
matizado, isto é, entende-se que resulta da CRP o dever de existir um sistema de recurso, mas não resulta
que o recurso tenha de ser garantido em todas as circunstâncias.
Ao confrontarmos o art. 10º nº 1 do CPC, vemos que as ações podem ser organizadas em duas grandes
tipologias, podetratar se por ações declarativas (livro 3 COC) ou ações executivas (livro 4 CPC). As ações
declarativas têm em vista declarar o direito, são neste sentido ações jurisdicionais.

PARTE I – OBJETO DO PROCESSO


Como é que delimita a controvérsia? Para abordarmos o objeto do processo é conveniente considerar
o art. 580º e 581º CPC.
De acordo com o art. 581º nº1, o objeto pode ser delimitado através de três elementos distintos:
• Sujeito (respeita às partes, isto é, àqueles que estão sujeitos aos efeitos da decisão);
• Pedido (essencial no processo, este não pode ficar aquém nem ir além; tem de ser formulado pelo
autor queeventualmente pode alterar a sua pronúncia);
• Causa (corresponde à própria realidade jurídica, ou seja, objeto da controvérsia);
Sublinha-se que é às partes que cabe esta delimitação, são as partes que decidem contra quem a ação é

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proposta, qual o pedido e qual a causa do pedido e quais as questões judiciais que o tribunal deva conhecer
para o processo.

Pedido
É pelo pedido que tem início a ação declarativa, por isso, o primeiro ato processual intitula-se petição
inicial porque por intermédio dela se dirige um pedido ao tribunal.
Este ato (art. 552º CPC), petição inicial, é aquilo a que dogmaticamente se chama um ato postulativo
(um ato medianteo qual se dirige o pedido de uma decisão a alguém). O autor dirige um pedido ao tribunal de
que decida no sentido favorável à sua pretensão (ex.: requerimento que um aluno faça à faculdade).
Uma ação civil, portanto, apenas se inicia na sequência deste impulso de um particular, não se inicia ex
oficcio, não se inicia oficiosamente, apenas haverá lugar a um início oficioso, se e na medida em que houver
um interesse público na resolução da causa. São raras as matérias em que se aceita que uma entidade pública
inicia oficiosamente uma causa. (Ex.: investigação da paternidade art. 1808º CPC e 804º CC – este tipo de
investigação tem como objetivo a não existência de crianças com pai incógnito, o que é um interesse público.)
O pedido pode ter várias modalidades:
Pedido singular – se o pedido for singular a regra é que ele deve ser certo, individualizado e
concretizado, contudo, emdeterminadas circunstâncias a lei admite que este siga uma outra estrutura,
nomeadamente, é possível deduzir pedidos alternativos (a lei permite estes pedidos em relação a
direitos que do ponto de vista substantivo tenham esta estrutura);

Pedidos genéricos ou ilíquidos (art. 556º nº1 CPC): – um pedido genérico é um pedido que não está
completamente concretizado, em geral não são admitidos (apenas os casos do art. 556º nº1 a) e b) CPC),
mas alei faculta esta modalidade quando o objeto mediato da ação seja uma universalidade de facto ou
de direito; o pedido genérico terá de ser concretizado, essa concretização é feita mediante um incidente
de liquidação (art.358º e ss. CPC) e pode ser deduzido durante a ação ou após a sentença;
• Pedidos de prestações de vincenda: quando se trate de uma ação relativa a prestações periódicas, se
o devedordeixar de pagar pode pedir-se a sua condenação não só nas prestações já cumpridas como
naquelas que se vierema vencer posteriormente;

SEMANA 3 – 25.09 A 29.09

Pedido plural – em alternativa pode o autor formular vários pedidos:


• Cumulação de pedidos (art. 555º CPC) – na cumulação de pedidos são realizados vários pedidos
em simultâneo pedindo-se a procedência de todos ao mesmo tempo. Esta modalidade é admissível
quando os pedidos sejam compatíveis entre si e não se verifiquem as circunstâncias que impedem a
coligação (art. 36º e 37º CPC);
Ex.: alguém pede a anulação de um contrato e a condenação do réu a indemnizá-lo por culpa in
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contrahendo.
• Vários pedidos subsidiários (art. 554º CPC) – esta modalidade é formulada para a eventualidade
de não proceder um pedido anterior, isto é, o autor formula vários pedidos de modo que caso o
primeiro não proceda possa proceder o segundo e assim sucessivamente.
Ex.: A anulação do contrato e a título subsidiário o respetivo cumprimento do contrato – Não é
compatível anular um contrato e pedir para cumprir o mesmo, deste modo, o único modo de os
compatibilizar é através depedidos subsidiários. Nestes o autor pretende dois cenários alternativos,
caso o primeiro não proceda tem sempreuma segunda opção.

Ações Declarativas
É a partir do pedido formulado pelo autor que se definirá qual a finalidade da ação. Nos termos do art. 10º
nº3 CPC, asações declarativas podem ter 3 finalidades diferentes:
• Ações de Condenação;
• Ações de Simples Apreciação;
• Ações Constitutivas;

Ações de Condenação (art. 10º nº3 CPC)


As ações de condenação são as ações paradigmáticas, isto é, o processo de declaração desenvolveu-se
tendo por especialreferência as ações de condenação, apenas posteriormente autonomizou as restantes.
Uma ação de condenação é uma ação destinada a exigir que de um réu “a prestação de coisa ou de um facto”,
ou seja, são ações destinadas a condenar o réu à observância de um determinado comportamento perante o
autor.
Ex.: quando existe um determinado vínculo obrigacional, o devedor tem o dever de realizar uma prestação.
Havendo um litígio a respeito desta prestação a ação judicial seria de condenação porque dirigia o
cumprimento do devedor a realizar a prestação debitória – exemplo a partir do Direito das Obrigações.
Ex.: quando alguém é titular do direito de propriedade pode sempre que a fruição do seu bem seja perturbada
reivindicar(ação de reivindicação art. 1150º CC) a coisa, exigir que a coisa lhe seja restituída – exemplo a partir
de Direitos Reais.
Nas ações condenatórias, via de regra, têm lugar quando se reage a um direito violado, perante esta
situação, o autor, pede proteção jurídica pedindo a condenação do réu a observar um determinado
comportamento devido. Em determinadas circunstâncias estas ações podem ter lugar não no pressuposto de
um direito violado, mas na previsão deque isso possa acontecer (ex.: pedido de condenação de obrigação a
cumprir prestações que ainda não se venceram – art. 557º CPC prestações vincendas).
A previsão da violação de um direito implica ações inibitórias, estas são as ações de condenação
destinadas a inibir o réu para que no futuro observe um determinado comportamento. Estas serão admitidas
apenas nos casos em que a lei prevê esta modalidade de tutela preventiva.

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Ex.: São admitidas na clausulas contratuais gerais (art. 25º CPC); no âmbito da propriedade industrial e da
proteção dodireito do autor (nos termos dos códigos respetivos); enquanto expressão da tutela do direito de
propriedade ou da posse(art. 1276º CPC), etc.
Nota: Este tipo de ações adequa-se à proteção dos direitos absolutos é-lhe então também admitido, o âmbito
da proteçãodos direitos de personalidade (art. 70º nº2).

Uma particularidade das ações inibitórias é que estas assentam em condenar o réu a observar um
comportamento futuro,devendo especificar-se qual o núcleo de condutas do réu que se encontram proibidas.
Como meio de garantia prevê-se uma sanção pecuniária compulsória (art. 829º-A CC).
Ex.: Alguém tem um vizinho que faz muito ruido, pode propor uma ação de condenação destinada a inibir o
vizinho defazer barulho como meio de incutir ao cumprimento fixa-se uma ação por cada vez que faça ruido
ou por cada dia que o faça.

Ações de simples apreciação (art. 10º nº3 a) CPC)


As ações de simples apreciação são ações nas quais se procura somente declarar a existência ou não de um
direito ou deum facto. Têm um alcance menor, isto é, não há um ato condenatório, há uma simples declaração e
é nisso que se esgotaa tutela jurídica.
As declarações de simples apreciação podem ser:
• Positivas - quando destinadas à declaração de um determinado facto ocorreu ou um determinado
direito existe.
• Negativas – são negativas quando as ações funcionam como uma provocação dirigida à parte
contrária de defender o seu direito ou afirmar determinado facto, isto é o autor afirma uma situação
de dúvida ou incerteza acerca de um determinado direito ou facto que não existe, devendo a parte
contrária provar a posição jurídica que, porventura, arroga.
Ex.: Ação de declaração de nulidade de um negócio jurídico; Ação de investigação da paternidade;
ação de declaração da indignidade para efeitos sucessórios – a tutela do direito esgota-se nestas
declarações.
• Mistura das duas – este tipo de ações são muito raras.

Ações constitutivas (10º nº3 CPC)


As ações constitutivas dirigem-se a produzir uma mudança na ordem jurídica, isto é, a modificar um
determinado regimesubstantivo. As ações constitutivas visam conformar um determinado regime de direito
material que é conformado através da ação. Estas são a tipologia da ação pela qual se exercer processualmente
direitos potestativos – direitos que por declaração produzem uma mudança na ordem jurídica estando a parte
contraria em estado de sujeição.
Ex.: Uma ação de anulação de negócios jurídicos – esta é uma ação constitutiva que conforma um negócio

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eficaz num negócio ineficaz; uma ação de divórcio – introduz uma modificação na ordem jurídica, sito é,
coloca termo ao estado de casado; uma ação de divisão de coisa comum (copropriedade) – ação pela qual um
bem que é propriedade de váriaspessoas, é dividido tornando-se cada uma das pessoas proprietário singular.
Nota: O direito de exigir a divisão (art. 1412º CC) segue a forma de processo especial nos termos do 925º e
ss. CPC.
Devido à enorme importância do pedido para a definição e delimitação do objeto processual, afirma-
se o princípio do pedido. Nos termos do art. 3º nº1 CPC, na sua primeira parte, não pode o tribunal resolver
o conflito de interesses que está na base da ação, sem que um pedido lhe tenha sido dirigido, isto é, se o que
está em jogo são posições jurídicas privadas, então, apenas os respetivos titulares podem dar início à ação
com o risco de ganhar ou de perder. Daí que, desde uma longa tradição jurídica haja certos vocábulos ou
expressões que traduzem esta ideia de limitação do tribunalpelo pedido do autor, em especial, “nemo iudez
sine auctore”, ou seja, “nenhum juiz sem autor” e “ne eat indez ultra petito partium”, isto é, “não vale o juiz
além dos pedidos das partes”.
Daí que, uma vez formulado o pedido, o juiz se deva ocupar dele inteiramente, não deixando de responder a
nada do que lhe é suscitado nem ficando à quem nem indo além daquilo que lhe é pedido. Em qualquer uma
dessas hipóteses a sentença será nula.
Caso o juiz fique à quem do que lhe é pedido a sentença é nula por omissão de pronuncia (art. 615º nº1 d) 1ª
parte) CPC), caso o juiz vá além a sentença é nula por excesso de pronuncia (art. 615º nº1 b) 2ª parte e e)
CPC).
Eventualmente, em alguns casos muito circunscritos é admitido que o juiz dê uma solução à parte
ligeiramente diferente daquela que foi nominalmente pedida – ex.: art. 609º nº3 CPC – faculta-se a
possibilidade do juiz poder decretar a restituição da posse, em vez da manutenção da posse ou vice-versa,
segundo o que for mais adequado.
Do mesmo modo, é possível que quando haja erro na qualificação do meio processual, o juiz pode corrigi-lo
oficiosamente – art. 193º nº2 CPC.
Em qualquer uma dessas hipóteses o tribunal não está a substituir só o autor na produção dos seus interesses,
está apenasa adequar a situação processual àquilo que foi explicitado pelo autor, mas que foi indevidamente
configurado do pontode vista do ordenamento jurídico.

Se não houver pedido:


• Caso não exista sequer uma petição inicial, não existe processo. Conforme resulta do art. 259º nº1,
o processoinicia-se com o recebimento da petição inicial, logo se não há petição não há processo.
• Caso exista petição inicial, mas na petição inicial não constar pedido – nos termos do art. 552º
nº1 e) CPC,o autor deve formular um pedido na petição inicial. Caso falte o pedido, a petição inicial,
padece de um vício, de uma nulidade de especial gravidade que se chama ineptidão da petição
inicial.
Nos termos do art. 186º nº2 a) CPC a petição inicial é nula quando falte o pedido, igual regime se há
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de aplicarquando muito embora se formule o pedido este seja inteligível, isto é, não se consiga
perceber o que o autor quer. Quando a petição inicial é inepta, nulo será todo o processo (art. 186º
nº1 CPC).
Não podia ser outra a solução legal, de facto, se o processo deve ser iniciado pelo interessado e, se o
ato pelo qual o interessado pretende iniciar não permite descortinar a finalidade por si procurada,
então o processo não pode cumprir o seu propósito.
Este regime que se aplica quando haja falta ou inteligibilidade do pedido vale, de igual modo, quando
se consubstanciem pedidos incompatíveis entre si (art. 186º nº2 c) CPC), uma vez que, se se cumulam
pedidos incompatíveis entre si, então não é possível perceber o que pretende realmente o autor.

Causa do Pedido
Nos termos do art. 581º nº4 CPC, existe uma identidade causa do pedido quando a pretensão deduzida
nas duas ações procede dos mesmos factos jurídicos.
A causa de pedir é integrada por aqueles concretos factos dos quais o autor extrai a sua pretensão, que
exerce em juízo
– teoria da substanciação. O autor, para agir no processo, deve substanciar, por factos, a pretensão que
pretende ver reconhecida. Aliás este é o detentor do ónus da delegação desses mesmos factos.
• “Da Mihi facta, dabo tibi ius” – dá-me os factos, dar-te-ei o direito;
• “Ex facto ius oritur” – a partir do facto nasce o direito, isto é, pode-se extrair do direito a pretensão
exercida pelo autor em juízo;

Como determinamos concretamente a causa do pedido de cada concreto ação?


A causa do pedido de cada concreta ação é determinada através da norma jurídica. A norma jurídica
tem dois elementos a previsão e a estatuição. A certos eventos (previsão) associa-se uma determinada
consequência (estatuição).
A previsão da norma verifica-se em cinco requisitos:
• Facto
• Ilícito
• Nexo de causalidade
• Dano

Assim, a causa do pedido é constituída pelo conjunto de factos que permitem concluir pela verificação
da previsão danorma.
Ex.: art. 483º CPC - No dia 12 de setembro, o Manuel deu um murro no nariz do João e este ficou com enormes
mazelas – descrição factual que permite aplicar a norma jurídica.
Do ponto de vista metódico como é que o autor apresenta a causa do pedido?

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1. Deverá enquadrar juridicamente o caso;


2. Deverá enquadrar quais os pressupostos e normas em geral dos quais depende a aplicação das
normas quegarantam o seu direito;
3. Descrever os factos que permitem a aplicação dessas mesmas normas;

Ex.: alguém comprou um livro e agora pretende condenar o réu a entregar o livro.

1. Enquadramento jurídico:
a. contrato de compra e venda;
b. art. 874º - definição de contrato de compra e venda;
c. art. 879º b) – existe a obrigação de entrega da coisa;
2. Enquadramento dos pressupostos:
a. Em caso de incumprimento, pode exigir-se a condenação, ou seja, o credor pode exigir
judicialmente oseu cumprimento (art. 817º CC);
b. Normas de formação do negócio (art. 217º e ss. CC);
3. Factos que permitam a aplicação dessas normas:
a. O autor apresenta a situação factual de forma que, caso o tribunal conclua que ela se
verifica, a açãopossa proceder.
b. São destes factos de que depende a aplicação destas normas. O autor apresenta a situação
factual deforma que, caso o tribunal conclua ela se verifica, a ação possa proceder.

Nota: se o mandatário processual nada souber de direito, nunca vai conseguir descrever a ação.

E se for um caso sujeito a vários regimes?

O mandatário deve ter a prudência de elencar factos que permitam a aplicação de todos os regimes, se não
o fizer o juiznão vão conseguir extrair consequências que sejam favoráveis ao autor.
A lei no seu art. 581 nº4 2ª parte especifica duas hipóteses concretas de causa do pedido, isto é, especifica
como sedetermina o pedido em:
• Ações reais – a causa do pedido é o facto jurídico de que deriva o direito real, ou seja, o autor deve
descrevero facto que originou a aquisição do direito real;
• Ações constitutivas ou de anulação;
Ex.: Alguém pretende anular um determinado negócio jurídico: a causa de pedido determina os factos que
permitemconcluir uma concreta causa de anulação, por exemplo, uma ameaça.
Os factos que integram a causa do pedido não são os únicos que são considerados ou que relevam para
o processo. As alegações ou enunciações de facto, presentes na ação são mais ricas do que o que respeita

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exclusivamente à causa do pedido.


No art. 5 nº1 CPC vemos que na verdade há diferentes categorias de factos sujeitas a regime jurídico
diferenciado.

A matéria de facto que está presente na ação pode ter aquela riqueza, mas o que prevalece são os factos
essenciais que devem ser alegados pelo autor.
Também a causa do pedido contribui para delimitar o objeto do processo, assim nos termos do art. 608º
nº2 CPC, o juizdeve resolver todas as questões que tenham sido submetidas à sua apreciação, tal significa que
o juiz deve responder àsquestões tal como substanciadas e especificadas pela causa do pedido. Se porventura
o juiz deixar de conhecer essas questões ou conheça de questões que não possa, a sentença é nula (art. 615º
nº1 b) CPC).
A alegação factual feita pelo autor circunscreve o âmbito factual temático sobre o qual incidirá a ação.
Quid iuris caso a causa do pedido seja apresentada de modo insuficiente?
Rigorosamente podemos distinguir entre a falta de causa do pedido e ininteligibilidade ou insuficiência.
Sendo a causa do pedido um elemento delimitativo do objeto da ação é claro que a causa do pedido deve
ser indicada na petição inicial, de facto prevê o art. 552º b) que o auto deve expor os factos essenciais que

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compõe a causa do pedido – caso este não exponha ou o que exponha seja ininteligível, a petição, tal como
acontecia com o pedido, é inepta art. 186º nº2 a) CPC e todo o processo é nulo (art. 186º nº2 c) CPC).
Da mesma forma, o processo será nulo quando se formulam causas do pedido substancialmente
incompatíveis (art. 186º nº2 c) CPC). Se pedido estiver em contradição com a causa de pedir, também a petição
inicial é inepta (art. 186º nº2 d) CPC).

E se a causa do pedido não faltar, mas for insuficiente, isto é, não inscrever com concretização suficiente
a situação daqual o autor pretende extrair a sai pretensão?
A lei prevê que o juiz possa proferir um despacho de aperfeiçoamento dando a oportunidade de
contraditório à parte contraria. Ora, em resposta a esta possibilidade ou o autor pode complementar ou
concretizar a causa do pedido.
Ex.: causa imperfeita – o autor afirma que o réu causou um acidente. – esta causa do pedido é incompleta
porque o réunão descreve as causas do acidente.

SUJEITOS DO PROCESSO

Os sujeitos correspondem às partes sujeitas à decisão processual.


Quem é que é parte para efeitos o objeto do processo?
Ex.: António propõe uma ação judicial contra Bernardo em que afirma que celebrou um contrato com uma
determinadasociedade, nos termos da qual a sociedade lhe deve uma certa quantia. Neste caso quem é que é parte
do litígio? Antónioe a sociedade. Por outro lado, quem são os sujeitos da relação material controvertida? As
partes da relação processual são A e B.
Para efeitos da delimitação do objeto as partes são aqueles contra quem a ação foi proposta. É parte
quem inicia a ação(autor) e quem é citado como réu.
São partes, portanto, quem inicia e contra quem é movida a ação, assim o processo civil adota uma
noção formal de parte, porque importa é quem esta formalmente na ação.
Quem deve ser parte? De acordo com o pressuposto da legitimidade processual, vale a regra de que
devem ser partes os sujeitos da relação material controvertida, isto é, as partes em sentido formal devem
corresponder aos sujeitos da relaçãomaterial alegada. Se corresponderem, as partes dizem-se legitimas, se não,
são ilegítimas.
Ex.: De acordo com o exemplo acima mencionado, o Bernardo é parte, mas não é parte legitima portanto
poderá ser pedida a sua absolvição.

Modalidade da parte

O processo civil prevê que possa haver várias configurações possíveis das partes.

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• Quanto ao número
• Singular – quando haja apenas um autor e um réu;
• Plural – quando haja vários autores e/ou vários réus. Quando exista pluralidade de partes elas podem
organizar-se de duas formas, sob a forma de:
• Litisconsórcio – quando as partes fazem parte de uma mesma relação jurídica (ex.: vários
coproprietários);
• Coligação – quando o que associa as partes são relações jurídicas diferenciadas (ex.: A
realizaum contrato de CCV contra B e posteriormente B realiza um CCV da mesma coisa
com C. A pretende declarar a nulidade do primeiro contrato e reivindicar a coisa contra C.
Propõe uma ação contra B (deduz o pedido com base no fundamento na nulidade da venda)
e contra C (deduz o pedido com base na titularidade da coisa)).
• Quanto à sua relação com o objeto do processo
• Principal – sujeita à própria relação controvertida;
• Acessória – Não é parte da relação processual, as tem uma posição jurídica dela
dependente;
Nota: pode haver uma terceira parte oponente, isto é, que se opõe tanto ao autor como ao réu.
Quid iuris, caso as partes não sejam indicadas na ação e não se consiga determinar quem é indicado sobretudo
como réu? A lei não prevê esta hipótese, mas o professor acha que dará lugar à inaptidão da petição inicial. Se
vale para a faltade pedido e de causa do pedido, então também tem de valer para a falta de indicação das partes.

ATIVIDADE PROCESSUAL

O que é que não integra a delimitação do objeto da causa? O enquadramento jurídico.


A lei prevê, no seu art. 552º CPC, que as partes devem, na petição inicial, expor as razões de direito
que servem de fundamento à ação. Simplesmente vale a regra de que o juiz de direito não está adstrito a estas
razões de direito. O juizpode dar o enquadramento jurídico que entender (art. 5º nº3 CPC).
Significa isto que, a parte pode dispensar de dar o enquadramento jurídico?
Apesar de o juiz poder dar outro enquadramento jurídico, a parte tem o maior interesse em apresentar
o seuenquadramento jurídico o melhor que consiga de modo a persuadir o juiz à sua pretensão.
O ideal é a peça processual da parte oferecer a um possível julgador o máximo de facilidade em resolver
aquele processo.O grande prejudicado pelo não desenvolvimento do direito é a parte.
Nota: Proibição non líquet – sempre que substantivamente for claro o que é pretendido por uma parte e tal
for compreendido pelos diferentes intervenientes do processo, como o efeito útil da ação é o mesmo muda
apenas a configuração jurídica necessária para chegar a esse resultado, o processo não acaba.
Este princípio de o tribunal pode conhecer do direito tem, porém, duas limitações:
• Limitação Material – o tribunal não pode aplicar regimes jurídicos que dependam da vontade dos

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interessadosquando esta vontade não tenha sido exercida no processo (ex.: numa causa de anulação
o regime substantivo diz que apenas têm legitimidade os interessados – art. 287º CC.)
• Limitação Processual – o princípio do contraditório vale também em relação ao próprio tribunal,
isto é, pretende garantir-se que sempre que alguém é afetado por uma decisão que tenha sido tomada
previamente tenha sempre a oportunidade de contrariar. Isto significa que se, porventura, o tribunal
pretender dar um enquadramento jurídico não discutido, deva oferecer às partes, previamente, a
oportunidade de se pronunciaremsobre ele (art. 3º nº 3 2ª parte CPC), de acordo com o princípio da
proibição de decisões surpresa. Se porventura, uma decisão judicial é proferida violando o
contraditório neste sentido esta decisão padece do vício de nulidadeinvocável nos termos gerais.

SEMANA 4 – 02.10 a 06.10

Nos termos do art. 3º nº1 CPC, o processo não é guiado apenas pelo princípio do pedido, a par deste
temos o princípio do contraditório. Não existe processo sem ambos os princípios estarem presentes, o primeiro
pede necessariamente a existência do segundo, antes da tomada de decisão. Esta é uma ideia fundamental de
igualdade entre as partes.
Nota: relativamente ao princípio do pedido, este, em sentido amplo, diz respeito à petição inicial onde o autor
apresenta um articulado ao tribunal, na qual formula um pedido, uma certa causa do pedido, contra uma
concreta pessoa, assim, delimitando as partes. Em sentido estrito, o princípio do pedido apenas diz respeito ao
pedido em si.

Princípio do Contraditório
O princípio do contraditório releva, por um lado, enquanto possibilidade de contraditar a parte
contrária, por outro, enquanto possibilidade de contraditar o próprio tribunal.
Hoje quando se fala no princípio do contraditório considera-se os desenvolvimentos doutrinais que
foram feitos no âmbito alemão em torno de uma norma que, na Alemanha, se encontra no art. 103º da respetiva
constituição. Este prevê aquilo a que aí se designa, por Lebre de Freitas, como “a pretensão a ser escutado
juridicamente”, portanto, a ideia deste artigo é de que sempre que alguém age perante uma autoridade judiciária
tem o direito a ser escutado antes de uma decisão que a acuse.
As duas concretizações fundamentais desta pretensão no sentido de direito são justamente poder
contraditar a parte contrária e poder contraditar o próprio juiz.

1. Possibilidade de contraditar a parte contrária


A possibilidade de contraditar a parte contrária é a dimensão mais tradicional do princípio do contraditório, ou
seja, a de que, antes do tribunal responder a um pedido, se deve ouvir o contrainteressado, esta ideia
corresponde ao vocábulo latino “audiatur et altera pars” (“Que se ouça também a outra parte”). Esta é a regra,
por assim dizer, que deve balizar todo aquele que toma uma decisão relativa a terceiro.
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Na eventualidade de haver várias partes deve garantir-se que cada uma possa ser escutada a respeito da sua
posição particular e que nenhuma saia prejudicada pela atuação de alguma co-parte.

2. Possibilidade de contraditar o próprio tribunal


Mesmo quando o tribunal tem poderes para oficiosamente aplicar um determinado enquadramento jurídico,
este está processualmente adstrito a somente extrair as conclusões jurídicas desse regime após ter dado às
partes a oportunidade de se pronunciarem sobre se ele deve ou não se aplicar naquele caso.
Neste caso, o princípio do contraditório traduz-se no princípio da proibição das decisões surpresa. Quando este
princípio não é respeitado temos uma nulidade processual.

Quais são os momentos do processo em que é especialmente relevante o princípio do contraditório?


• No plano da alegação dos factos que constituem a causa do pedido e as exceções deduzidas pelo
réu
o Manifesta-se na possibilidade dada à parte contrária de negar as afirmações que foram feitas
contra ela.
• Plano da prova
o Manifesta-se no facto de ambas partes terem a possibilidade de propor os meios probatórios
convenientes para se aferir da verdade ou falsidade das afirmações que fizeram;
o Manifesta-se no facto da atividade probatória realizada no processo deve, sempre que
possível, ter lugar em audiência (presentes os mandatários das partes) na qual justamente
seja possível a possibilidade de contraditar – é o chamado princípio da audiência
contraditória (art. 415º CPC);
o As partes, através dos seus mandatários se possam pronunciar sobre os resultados que se
devem extrair da prova produzida no processo;
• Plano da discussão de direito
o A cada uma das partes é dada a possibilidade de não só contraditar a outra como contraditar
o tribunal sobre qual é o melhor enquadramento jurídico para resolver aquela controvérsia;

Como é que o réu pode exercer a sua defesa?


É o autor que introduz o objeto processual na ação e fá-lo através da sua petição inicial. Assim sendo, a
petição inicial ao ser recebida produz desde logo um efeito processual e, em segundo lugar, introduz a discussão
de uma determinada questão material.
Qual é o efeito processual produzido pelo recebimento da petição inicial? É iniciar a própria relação
processual, constituir aquele processo.

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Qual é a discussão material que o autor introduz? É a discussão daquele determinado objeto do
processo. Quando é que se inicia a relação processual/instância? Quando o autor inicia a petição inicial e ela é
recebida.

Relação material
Um concreto processo tem sempre duas dimensões:
• Dimensão da Admissibilidade – saber se aquela relação processual pode ou não operar;
• Dimensão do mérito – respeita à resolução do próprio conflito de interesses apresentado pelo autor.
Nota: O plano que se tem de observar primeiro é o plano da admissibilidade, uma vez que, o Tribunal apenas
avança para o mérito de a ação for admissível.
A defesa do réu pode assentar em dois planos:
• Contraditar a admissibilidade da ação
• Contraditar o mérito da ação

Defesa no plano da admissibilidade


Caso o réu contradite a admissibilidade da ação então, este está a contraditar mediante aquilo a que se
chama de exceção dilatória (art. 577º CPC).
Qual é o regime a que está sujeita a exceção dilatória? Quando há uma exceção dilatória, o mesmo é
dizer, quando falta um pressuposto processual, o Tribunal, enquanto a exceção persistir, não pode conhecer do
mérito da causa (art. 576º nº2 1ª parte CPC). Se esta falta não for sanada, em princípio, tem por consequência
a absolvição do réu da instância (art. 576º nº2 e 278º nº1 CPC). A absolvição do réu da instância, em termos
processuais, significa que aquela ação termina sem que o Tribunal tenha conhecido do mérito, isto é, sem que
tenha resolvido o conflito – a ação não pode ser admitida sem o pressuposto em falta e, por conseguinte, não
há razão para que o réu se tenha de manter nela.
Se o réu é absolvido apenas da instância significa que a decisão que o tribunal tenha proferido, uma
vez transitado em julgado (art. 628º CPC) tem o valor de caso julgado formal (art. 620º nº1 CPC), ou seja, o
transito em julgado significa a inimpugnabilidade da decisão pelos meios ordinários – recurso ordinário ou
reclamação, dependendo dos casos.
Quando a decisão é inimpugnada pelos meios ordinários, ela estabiliza, torna-se indiscutível, logo o
caso entra em trânsito julgado formal, ou seja, o seu valor produz-se apenas dentro do processo, isto é, não
chegou a conformar a relação material.
Ex.: A pede a condenação de B a cumprir 5000 euros com base num contrato. O Tribunal a conhecer da ação
apercebe- se que não é competente para esta causa, porque a competência é de outro tribunal. Se se tratar de
um caso de incompetência absoluta, o Tribunal absolve o réu em instância.

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É possível interpor uma nova ação no tribunal competente? Sim porque na primeira instância não de
chegou ao plano do mérito logo a decisão ficou por fazer. Isto é, tal não obsta a que B não venha a ser
condenado num nova ação.
Estas exceções não protegem definitivamente o réu elas diferem para um momento futuro a eventual
discussão da causa. Daí que o réu se puder, tenha o máximo interesse em apresentar uma defesa de mérito
quanto à questão material e não apenas quanto à questão processual.

Defesa no plano do mérito


A defesa do réu, no plano do mérito, pode operar de três modos diferentes:
• Por impugnação de facto, ou seja, impugnando/negando os factos afirmados pelo autor;
• Mediante uma impugnação de direito, ou seja, dando um enquadramento jurídico à causa, diferente
daquele que foi oferecido pelo autor procurado sustentar a improcedência da ação;
• Por exceção peremptória, ou seja, o réu alega novos factos que permitem aplicar uma norma que
impeça, modifique ou extinga o direito que o autor está a exercer;
Enquanto, que quando discutimos a relação processual estamos no plano da admissibilidade, quando
discutimos o mérito estamos num plano de procedibilidade, assim, já não em a ver com a questão da ação ser
ou não admissível, mas sim procedente ou improcedente.
Portanto, no plano do mérito a ação pode ter duas saídas:
• Procedente – responde positivamente ao pedido – condenação do pedido;
• Improcedente – responde negativamente ao pedido – absolvição do pedido;
Uma vez que o tribunal conheceu do mérito, quando a decisão transita em julgado, já não têm o valor
apenas formal, têm também o valor de caso julgado material, ou seja, será obrigatória não só naquele concreto
processo, mas fora daquele (art. 619º CPC).
O autor ao apresentar a petição inicial ao Tribunal dá início à relação processual que tem por partes, o
autor, o Tribunal e o réu. Tal relação está sujeita a requisitos de admissibilidade, sendo estes, os pressupostos
processuais.
A relação processual não é um fim em si próprio, esta tem em vista que o Tribunal resolva uma
determinada controvérsia, uma determinada relação material controvertida/controvertível. É através dela que
se vai delimitar o objeto do processo e tendo por partes o autor e o réu da instância.
A relação material controvertida já não respeita ao plano da admissibilidade, mas ao plano do mérito ou
da procedibilidade.
Há uma diferença entre as decisões que dizem respeito à admissibilidade e ao mérito. Quando a decisão
diz respeito à admissibilidade dá-se a absolvição do réu na instância (art. 576º nº2, 577º e 278º nº1 CPC), uma
vez que, a decisão não incidiu sobre o mérito tem o valor de casa julgado formal (art. 620º CPC), significa que
aquela decisão tem um valor no processo, mas deixou imputada a relação material, visto que, o tribunal não se
pronunciou sobre ela por não estarem verificados os pressupostos para o efeito.

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Se a ação for admissível o Tribunal avança para o mérito. No plano do mérito o Tribunal pode proferir
dois tipos de decisões ou de condenação do pedido (decisão de procedência) ou de absolvição do pedido
(decisão de improcedência). Se proferir tal decisão, como incide sobre o mérito, a ação já terá o valor de caso
julgado material (art. 619º CPC). O réu poderá invocar a exceção de caso julgado (art. 580º e 581º CPC).
Perante isto, o réu, pode defender-se, por um lado, no plano da admissibilidade, ou seja, sustentando que
a ação é inadmissível, que não pode avançar para o mérito, portanto, neste caso, o réu defende-se perante uma
exceção dilatória. Será que a invocação de uma exceção dilatória protege definitivamente o réu? Não,
porque se o caso apenas tem valor de caso julgado formal, nada obsta que no futuro se volte a interpor uma
ação para discutir a relação material.
O réu pode defender-se no plano do mérito, isto é, o autor alega o pedido e a causa do pedido e o réu
pode:
• impugnar os factos que interferem na causa do pedido, ou seja, negando/impugnando os factos
afirmados pelo autor – impugnação de facto;
• reagir ao pedido dando um enquadramento jurídico à causa diferente daquela que foi oferecida
pelo autorprocurando sustentar a improcedência da ação – impugnação de direito;
• introduzir novos factos que impeçam, modifiquem ou extingam os efeitos pretendidos pelo autor
– exceção peremptória.

MODALIDADES DE DEFESA NO PLANO DA ADMISSIBILIDADE

Defesa por Exceção Dilatória


O réu defende-se por exceção dilatória quando suscita perante o Tribunal a inexistência de um
determinado pressuposto processual. Ora não se verificando um determinado pressuposto processual então o
tribunal fica impedido de conhecer o mérito da causa. Ora as generalidades das exceções dilatórias são de
conhecimento oficioso, a regra é de que não tem de ser suscitada pela parte (art. 558º CPC) mesmo sendo esta
a regra é claro que o réu tem o interesse em suscitar expressamente a questão, uma vez que, ela pode passar
inadvertida ao Tribunal.

Quais são as exceções dilatórias?


As exceções dilatórias encontram-se previstas no art. 577º CPC. Este elenco não é taxativo, sempre que
houver uma determinada norma que condicione a atividade do Tribunal à verificação de um certo pressuposto
processual temos de extrai uma exceção dilatória. Esta é a norma que prevê um pressuposto processual visto da
perspetiva do réu.

Qual é o efeito próprio da exceção dilatória?


As exceções dilatórias obstam a que o Tribunal conheça do mérito da causa (art. 576º nº2 1ª parte CPC).
Embora a exceção dilatória enquanto persista, obste a que o Tribuna conheça do mérito da causa, é possível que
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a falta do pressuposto processual seja sanada. Sempre que a falta do pressuposto processual seja sanável, o
Tribunal deve procurar, em primeiro lugar, que a instância seja regularizada nos termos do art. 6º nº2 CPC, só
se ela não o for é que poderá extrair consequências mais gravosas da falta do pressuposto processual ou da
persistência da exceção dilatória.

Quais são as consequências da exceção dilatória?


Via de regra é a absolvição do réu da instância (art. 576º nº2 2ª parte e art. 278º nº1 CPC).
A exceção dilatória mesmo quando tem esta última consequência não obstará a que possa haver uma
nova ação com o mesmo objeto porque o caso julgado que produz a sentença de absolvição da instância é
meramente formal.
Uma vez que as exceções dilatórias estão ligadas à admissibilidade da relação processual, elas,
doutrinalmente, são chamadas exceções processuais porque têm como fundamento o próprio processo.

MODALIDADES DE DEFESA NO PLANO DO MÉRITO

Impugnação de Facto
O réu pode impugnar os factos articulados pelo autor, ora é muito importante este meio de defesa, uma
vez que, a lei processual prevê um verdadeiro ónus de impugnação.
Nota: dever – quando alguém está adstrito a ter de observar um comportamento; ónus – encargo de ter de
observar um comportamento sobre pena de ter de sofrer consequências desfavoráveis).
No âmbito de processo civil um ónus de impugnação (art. 574º CPC) consiste em que o réu deve tomar
posição jurídica perante os factos que constituem a causa de pedido. O autor tem de alegar os factos de que
extrai a sua pretensão ele tem de tomar posição em relação a estes factos.
Qual é a consequência decorrente de não tomar posição? Se a não tomar posição, tais factos consideram-
se admitidos por acordo (art. 574º nº2 1ª parte CPC).
Ex.: O autor afirma que no dia 1 de setembro o réu declarou que lhe vendia 50 kg de batatas. O réu na contestação
não diz nada. O tribunal não vai investigar estes factos, vai aceitá-los sem discussão. O que não foi discutido já
está admitido e, portanto, não será objeto de apreciação pelo juiz – em processo civil, “quem cala consente”.
Sendo assim, o réu perante a alegação feita pelo autor poderá tomar três atitudes:
• Impugnação de facto: pode operar de qualquer uma destas formas o que é importante é que tome
posição definida perante os factos alegados pelo autor (art. 574º nº2 CPC – executa-se da admissão
por acordo os factos articulados pelo autor que estejam em oposição com a defesa considerada no seu
conjunto).
o Direta – quando contradiz frontalmente
Ex.: O autor afirma que o réu no dia 1 de setembro declarou que lhe vendia 50 kg de batatas,
o réu diz que não.
o Indireta – quando o réu afirma factos totalmente incompatíveis com os do autor.
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Ex.: no dia 1 de setembro estava de férias na amazónia, sem rede no telemóvel, logo não pude
fazer a venda.
Nota: se houver pluralidade de partes a impugnação feita por uma parte não aproveita às demais.
• O réu nada faz – na eventualidade do réu não impugnar os factos consideram-se admitidos por acordo
(art. 574º nº2 1ª parte CPC). Só assim, não se verifica quando, se por um facto que não admite
confissão ou se for um facto que tenha de ser provado por documento escrito.
• O réu declara que não sabe – neste caso importa apurar se se trata de um facto pessoal ou um facto
sobre o qual o réu deva ter conhecimento. Em qualquer um dos casos referidos a declaração de que
não sabe equivale a uma confissão nos termos do art. 574 nº3 1ª parte CPC. Caso seja um facto não
pessoal ou do qual o réu não deva ter conhecimento equivale a impugnação (art. 574º nº3 2ª parte
CPC).
Ex.: O autor afirma que o réu no dia 1 de setembro estava no Porto. O réu afirma que viajou, mas não
sabe para onde – equivalente a uma confissão (art. 574º nº3 1ª parte CPC).
O réu teve um acidente e a asseguradora afirma que não sabe se houve ou não acidente – impugnação
(art. 574º nº3 2ª parte).

Impugnação de Direito
Consiste na sustentação, pelo réu, de que os factos articulados pelo autor não permitem extrair a
consequência jurídica que o próprio pretende. A impugnação de facto traduz-se num diferente enquadramento
jurídica da causa dado pelo réu para obstar à respetiva procedência.
O que vale para o pedido do réu é o que vimos para o autor. O tribunal é livre de conhecer do direito, embora
às partes seja conveniente pronunciarem-se, com o objetivo de convencer o tribunal.

Exceção Peremptória
O réu compreendendo a norma(s) jurídica(s) que funda(m) o pedido do autor, recorre a contra normas
que impedem, modificam ou extinguem os efeitos jurídicos procurados pelo autor. Estas contra normas também
têm previsão, pelo que na exceção peremptória o réu alega os factos que permitam a aplicação das normas ao
enquadramento jurídico que este pretende (art- 576º nº3 CPC)
Ex.: Uma norma que fale de incumprimento do contrato em que o autor invoque as regras da declaração negocial
(art. 406º e 817º CC). O autor quer a condenação do réu a cumprir um contrato (pedido), portanto alega os factos
correspondentes à causa do pedido.
O réu pode invocar outras normas, diferentes das do autor, para contraditar o seu efeito. O réu pode
indicar uma norma relativa a uma causa de nulidade, isto é, pode alegar factos que permitem concluir uma
nulidade ou pode alegar um regime de alteração de circunstâncias, ou seja, alegar que se modificaram os termos
do contrato ou ainda o regime do cumprimento do contrato.

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As exceções peremptórias, nesta medida, alargam o conjunto de temáticas que são discutidas na ação,
isto é, a ação não versa apenas sobre o pedido e causa do pedido, mas implica que o Tribunal conheça das
questões invocadas pelo réu na exceção peremptória.
Assim, as exceções peremptórias consistem na alegação de factos impeditivos, modificativos ou
extintivos do direito exercido pelo autor (art. 576º nº3 CPC), uma vez que se trata da invocação de factos,
carecem eles de ser alegados pelo réu. Da mesma forma que o autor tem o ónus de alegar os factos que integram
a causa de pedido e o pedido, o réu tem o ónus de alegar os factos que integram a exceção.
Como supramencionado, as exceções peremptórias podem assentar na alegação de facto impeditivo,
modificativo ou extintivo. A diferença entres estes está no momento temporal em que o facto ocorreu ou no seu
efeito jurídico sobre a pretensão exercida em litígio.
O autor alega a causa do pedido, os factos que integram a causa de pedir são aqueles dos quais o autor
extrai a sua pretensão, ou seja, são factos constitutivos. Por sua vez, os factos impeditivos são contemporâneos
aos factos constitutivos. Os factos modificativos ou extintivos são posteriores.
Os factos modificativos alteram a pretensão, mas não a eliminam por completo ou passo que os
extintivos “acabam com ela”, isto é, conduzem à não produção de efeitos.

Ex.: imaginando que o autor está a exercer um crédito contratual quais são os factos constitutivos? São os factos
dos quais se extraem a celebração do contrato (declarações negociais, vicissitudes, etc.).

Factos impeditivos – factos comtemplados na celebração do contrato, que impeçam a sua produção de efeitos
(coação, causas de nulidade ou anulação, inexistência, etc.).
Factos modificativos – alteração de circunstâncias (um segundo contrato que modifique o primeiro, etc.).
Factos extintivos: factos que permitem a aplicação de normas extintivas (cumprimento, causa de
impossibilidade, compensação, etc.).

Ex.: Ação de Reivindicação (art. 1311º CC) – ação pela qual aquele que alega ser proprietário exige que a coisa
lhe seja restituída. Esta ação afirma o poder do proprietário sobre a sua coisa onde quer que ela se encontre.

Factos constitutivos – factos de onde o autor extrai a sua propriedade e desapossamento (neste caso o
réu pode dizer que ele próprio não tem a coisa - exceção).
Facto impeditivo – nulidade do contrato aquisitivo (o réu afirma que o autor não é o proprietário da
coisa logo o contrato seria nulo).
Facto modificativo – o réu afirma que de facto tem uma coisa consigo, mas que não é obrigado a
restituir porque tem o direito de retenção.
Facto extintivo – o autor já não é o proprietário porque o réu adquiriu a propriedade por usucapião.

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As exceções peremptórias poderão ser conhecidas oficiosamente caso não estejam dependentes da
vontade do interessado. À contrário, hipótese há em que elas só podem ser conhecidas se o interessado
demonstrar interesse em delas se prevalecer.
Ex.: direito de anulação; direito de prescrição (art. 303º CC); usucapião (art. 1292º CC).
Quando uma exceção depende da vontade do interessado pode ser chamada exceção em sentido próprio,
quando pode ser conhecida oficiosamente ela chama-se, doutrinalmente, objeção.
Mesmo quando uma exceção pode ser conhecida oficiosamente, o Tribunal só pode considerá-la se os
factos delas relativos, já estiverem no processo (art. 578º CPC).
Ex.: O cumprimento é de conhecimento oficioso. Se dos factos alegados pelo autor é possível concluir que há
alguma exceção, então o Tribunal pode conhecer oficiosamente, mas se não for possível, isto é, se não houver
factos que substanciem a exceção, o Tribunal não pode investigar, logo é altamente conveniente que o réu alegue
os factos.
Em que casos se pode dar conhecimento da exceção sem que o réu tenha alegado nada? Nulidade.

FINALIDADE DAS EXCEÇÕES PEREMPTÓRIAS

A finalidade das exceções peremptórias é obter a absolvição do pedido (art. 576º nº3 1ª parte CPC, ou
seja, uma decisão (art. 619º CPC) que vem obter a forma de caso julgado material com força dentro e fora do
processo. Quando a lei processual fala de exceções peremptórias tem em vista essencialmente o efeito, contudo
uma análise mais atenta do regime das exceções peremptórias permite concluir que em alguns casos a sua
consequência não é a absolvição do pedido, mas sim a condenação, a cumprir no momento oportuno – exceções
materiais dilatórias.
Nas exceções materiais dilatórias dá-se a invocação do primeiro obstáculo de natureza substantiva que
tem o efeito de paralisar ou suspender temporariamente o exercício do direito que o autor deve fazer valer no
âmbito de uma ação judicial.
Nota: Remissão do art. 576º nº3 CPC para o art. 5º nº1 CPC.
As exceções peremptórias, uma vez que, respeitam ao mérito/procedibilidade são chamadas exceções materiais
e já não processuais.

Qual é a ordem lógica da organização de uma defesa?


1. Exceções dilatórias;
2. Impugnação;
3. Exceções Peremptórias;
Vale a regra do processo civil, que toda a defesa do réu deve ser concentrada na contestação nº 573º
CPC, portanto, é no mesmo ato que o réu recorre a todos estes meios de defesa. Qual é o intuito? É que na
sequência da petição inicial e da contestação (569º e ss. CPC), o tribunal consiga responder a todas estas
questões.
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Nota: Art. 563º CPC – “O réu é citado para contestar, sendo advertido no ato da citação da consequência da
falta de contestação.” – oportunidade de apresentação de defesa.
Começamos por ver de que modo o autor pode delimitar o objeto do litígio. Agora consideramos de que
forma o réu pode colocar-se perante esse objeto do processo e apresentar a sua defesa (princípio do
contraditório).
Resulta até agora, que são as partes, e não o Tribunal, que delimitam a controvérsia. Se assim é, então,
de facto, aquilo que será objeto de controvérsia num determinado processo é somente o que é nele apresentados
pelas partes. A esta soberania das partes sobre o objeto do processo se designa por princípio do dispositivo.
O que se pretende com o princípio do dispositivo é sublinhar que se as posições jurídicas são objeto do
processo, pertencem às respetivas partes, então do mesmo modo que só elas podem decidir acerca da
conveniência a mitigar então também ao longo de todo o processo poderão manter a possibilidade de conformá-
lo no sentido que tenha de mais conveniente, nomeadamente, podendo modificar o objeto ou colocar termo à
causa por ato seu. Se quisermos, o princípio do dispositivo não é senão o reflexo da autonomia privado no
processo civil.

Ex.: alguém é proprietário de um imóvel e pode, no plano substantivo, vendê-lo, onerá-lo, etc. Então, no plano
adjetivo, também é o proprietário que pode interpor uma ação, colocar termo a uma ação, etc. Sobre este ponto
de vista, o princípio do pedido, por exemplo, é uma manifestação do princípio do dispositivo.

Próximo deste princípio do dispositivo temos o chamado princípio da controvérsia que traduz o que
os juristas alemães designam por máxima audiência/controvérsia. O princípio da controvérsia diz que a
responsabilidade por alimentar a controvérsia cabe às próprias partes, por isso, o princípio pode também dizer-
se princípio da autorresponsabilidade probatória das partes porque são elas que deverão tomar iniciativa para a
prática de atos que convêm para que seja proferida uma decisão a seu favor.
Assim, este princípio da controvérsia está estritamente ligado à ideia de autorresponsabilidade e
preclusão, isto é, à ideia de que quando alguém não pratica um determinado ato num momento oportuno incorre
no ónus de ver precedida a oportunidade de o vir a praticar em momento posterior.
O princípio do dispositivo pretende denotar a soberania das partes sobre o objeto do processo. Esta
soberania tem uma sua expressão muito clara nos negócios jurídicos de alta composição do litígio, ou seja, de
resolução de controvérsia, através de atos das próprias partes que, intervindo sobre o objeto do processo,
determinam a utilidade da tramitação (art. 283º e ss. CPC):
1. Desistência – ato que provém do autor que pode desistir do pedido ou da instância;
2. Transação (verbo transigir) – contrato entre o autor e o réu, através do qual, cada um concedendo
uma medida,colocam termo à controvérsia;
3. Confissão – ato que provém do réu;

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SEMANA 5 – 09.10 a 13.10


1º Ponto: Desistência
Na desistência, o autor abdica do próprio direito que está a exercer na ação. A desistência pode respeitar
ao pedido ou à instância:
• Desistência do Pedido
Por conseguinte, a desistência do pedido tem por consequência a extinção do próprio direito substantivo
que poderia eventualmente existir (art. 285º nº1 CPC). A desistência do pedido, uma vez que, respeita
integralmente ao autor, é livre (art. 286º nº2 CPC), isto é, não precisa do consentimento do réu, dado que, o réu
não é através desta prejudicado.
Ex.: O autor pede a condenação do réu a pagar uma determinada quantia e decide, por algum motivo, desistir
desse pedido. Não pode haver uma nova ação que volte a mitigar sobre o mesmo objeto (diz respeito ao plano
do mérito).
• Desistência da Instância
Por sua vez, a desistência da instância, consiste em o autor desistir somente da ação, mas reservando o
direito substantivo, ou seja, o autor desiste da concreta relação processual, desiste da ação, mas reserva a
possibilidade voltar a mitigar sobre aquele objeto, visto que, este não está a dispor do objeto da ação, mas apenas
da relação processual. Não obsta a uma nova ação e quanto à sua eficácia, se ocorrer após a contestação, depende
da aceitação do réu (art. 286º nº1 CPC), isto é, após o ato pelo qual o réu contesta, a lei considera igualmente o
seu interesse em mitigar aquela concreta ação.
Nota: Do mesmo modo que o réu, a partir do momento em que é citado, está sujeito a que seja proferida uma
decisão contra si, também o autor, a partir do momento em que a contestação é proferida, está sujeito a uma
decisão contrária aos seus interesses, por exemplo, a absolvição do réu.

2º Ponto: Confissão
A confissão diz respeito à confissão do pedido, esta tem de ser distinguida da confissão como meio
probatório.
A confissão prevista como meio probatório consiste em alguém declarar a verdade de um facto que lhe
é desfavorável (art. 352º CPC).
A confissão do pedido é muito mais do que isto, é o ato pelo qual o réu reconhece que o pedido contra
si dirigido é procedente. Ora, uma vez que, a confissão é inteiramente desfavorável aos interesses do réu, ela
pode ser praticada por ele sem necessidade do consentimento do autor.

3º Ponto: Transação
A transação do contrato, enquanto a desistência e a confissão são atos unilaterais, é um contrato
celebrado entre autor e réu, nos termos do qual, mediante concessões recíprocas, colocam termo a uma

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controvérsia. Ora, tratando-se de um contrato com efeitos simultaneamente substantivos e processuais, está
regulado no CC nos art. 1248º a 1250º. A transação do contrato pode ser judicial ou extrajudicial.
A transação extrajudicial verifica-se em relação a litígios que não são objeto de nenhuma ação.
Ex.: celebra-se um CCV de uma máquina. O comprador informa o vendedor que a máquina veio defeituosa. O
vendedor nega tal facto, no entanto, este cede ao comprador, por mútuo consenso, e dá-lhe uma máquina nova.
A transação judicial verifica-se por referência a um litígio que está a ser objeto de uma determinada
ação. Aqui o litígio tem em vista terminar essa mesma ação e reger as relações das partes, não mediante uma
sentença proferida pelo juiz, mas através da forma exercida pelos próprios interessados.
Quando se verifica uma destas três possibilidades (desistência, confissão ou transação), o seu efeito
processual não é automático. Antes que produzam o seu efeito sobre a relação processual/instância, impõe-se
que o juiz afira se as partes dispunham ou não de poderes para a prática desse ato (art. 290º CPC).
A matéria objeto destas três possibilidades é disponível se o juiz, apreciando a desistência, confissão ou
transação, concluir pela disponibilidade, profere, por sentença, nos precisos moldes de uma das modalidades.
Estas sentenças são designadas por sentenças homologatórias. Nestas, o juiz, ao invés de resolver a
controvérsia, delimita-se a homologar a desistência, confissão ou transação. É um ato pelo qual o juiz declara
que aquilo que foi pretendido pelas partes é conforme o direito. Este ato está na sua esfera de disponibilidade,
por isso, o juiz condena ou absolve nos precisos termos pretendidos pelas partes- tem como único propósito dar
força processual ao acordo das partes.
Nota: quem é que materialmente resolveu a controvérsia? Foram as partes, o juiz limitou-se a declarar o direito
e, por consequência, extinguiu a ação.
Nota: as controvérsias são negócios de auto composição da lide.
Justamente por aquilo que resolve a controvérsia ser um ato praticado pelas partes, esse ato pode,
posteriormente, ser declarado nulo ou anulado (art. 291º CPC), podendo tal repercutir-se na sentença
homologatória.

O Poder de Julgar
Qual é o poder do juiz sobre o objeto do processo?
O juiz tem o poder de julgar, como se constitui, qual o seu âmbito quais as matérias submetidas a este
poder, etc. A relação processual tem três polos:
• Autor
• Réu
• Tribunal – destaca-se uma figura: o juiz.
O juiz é a pessoa a quem se atribui um poder público de julgar, de resolver com autoridade uma
controvérsia. Este poder está sujeito aos parâmetros gerais previstos na CRP que balizam o exercício desta
função pública.
1. Princípio da Separação de Poderes;

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2. Independência da função judicial (art. 204º CRP) – este parâmetro apresenta uma dupla dimensão:
a. Por um lado, engloba a independência externa, isto é, a independência da ordem
jurisdicional no seu conjunto diante de outros poderes;
b. Por outro lado, engloba a independência interna, isto é, a independência de cada concreto
juiz em relação aos demais juízes.
Para garantia da independência interna prevê-se um amplo conjunto de meios, por exemplo, a fixação
de regras de competência legal, ou seja, a competência decisória do juiz depende não de um ato pessoal de
alguém que lhe confia a posição, mas de um regime previsto na lei – princípio do juiz natural, princípio do
previsto na lei.
Os juízes estão sujeitos a um órgão disciplinar próprio, sendo este, o concelho superior da magistratura.
Além disso, estão também sujeitos a um estatuto específico, o dos magistrados judiciais, onde se prevê várias
garantias como, os juízes são irresponsáveis; têm direito a um estatuto remuneratório condigno; entre outras.
Todos estes fatores têm em vista, no seu resultado, que, quando o juiz exerce a sua função, tem por objetivo
somente a aplicação do direito no caso concreto – o juiz está somente submetido ao direito e à lei.
No âmbito do próprio processo, a independência concretiza-se enquanto imparcialidade, isto é,
enquanto garantia de que o juiz não está previamente condicionado de um modo em que não possa tomar partido
por uma das partes, seja motivada, não por qualquer condicionamento prévio, mas somente por aquela que vier
a ser a convicção do próprio julgador naquela concreta situação.
Como garantias de imparcialidade da decisão estão dois regimes (art. 115º a 129º CPC):
1. Regime de Impedimento;
2. Regime de Suspeição;
A independência do juiz tem em vista libertá-lo de qualquer condicionamento, mas para que se possa
submeter integralmente à lei ou ao direito. Justamente para se poder sindicar o sentido da decisão judicial prevê-
se o dever de fundamentação das decisões judiciais (art. 205º nº1 CRP e 152º CPC). Se o poder do juiz é um
poder vinculado, então as respetivas decisões devem expressar claramente os motivos que conduziram o
julgador à convicção de que apenas aquela decisão se justificava no caso concreto.

Finalidades da Fundamentação
1. Permitir ao próprio juiz controlar a sua decisão, uma vez que, a exigência de fundamentação permite ao
decisor tomar consciência do seu próprio erro;
2. Dar a conhecer aos próprios destinatários da decisão quais foram as razões que a motivaram de modo a
tentar persuadir os próprios destinatários da bondade da decisão tomada, facilitando a sua aceitação;
3. Permitir a sindicância da decisão para um tribunal superior, nomeadamente para efeitos de recurso;
Uma sentença ou uma decisão não é um ato cognitivo, é um ato de vontade, o juiz exerce a sua vontade
no sentido favorável ou desfavorável à controvérsia. Sem fundamentação a vontade é nula, é puro exercício de
força, é incontrolável, é cega. A exigência de fundamentação tem em vista, nestes termos, racionalizar o

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exercício da força ao permitir aceder àquilo que possa ter motivado esse mesmo exercício e dessa forma permitir
agilizar se essa motivação é adequada, ou não, para a consequência que dela se pretende extrair.

Quem é que pode decidir acerca do objeto do processo?


É o juiz, com um estatuto de independência e de sujeição à lei, com um dever de fundamentação.

Como é que se constitui o poder de julgar?


O poder de julgar é atribuído a um concreto juiz quando o processo é distribuído (art. 203º e ss. CPC).
Este é um ato de secretaria que distribui um processo entregue entre os concretos juízes daquele tribunal. A
partir do momento em que o processo é distribuído, ele está alocado a um concreto julgador.

Até quando dura este poder de julgar?


O poder de julgar é concedido para que o juiz resolva a controvérsia e esgota-se quando o juiz profere
sentença (art. 613º CPC). Ora, resolvendo a controvérsia através da sentença, o poder já foi plenamente exercido
e, por conseguinte, desparece naquele concreto julgado.
Se, no decurso da ação, o juiz for proferindo decisões, vai esgotando gradualmente o poder de julgar
em relação a essas concretas matérias que decidiu. Com efeito, o poder de julgar esgota-se, não só em geral
quando é proferida uma sentença, mas, em especial, à medida que cada despacho é proferido. O poder de julgar
é um poder que se perde à medida que se exerce. Quando é exercido plenamente, perde-se completamente.

Quanto ao modo do seu exercício


O poder de julgar pode exercer-se:
• Por despacho: há despachos que estão sujeitos a um regime específico em que, muito embora sejam
proferidos, o juiz pode posteriormente rever a decisão, são os chamados despachos de mero expediente
(relação entre o juiz e secretaria) ou despachos no uso do poder discricionário (art. 152º nº 1 e nº4
CPC);
• Por sentença: este ato decisório coloca termo à controvérsia. É um ato conclusivo do processo nos
termos do art. 152º nº2 CPC. No caso de provir de um tribunal superior designa-se por acórdão.

Tanto o despacho como a sentença são ambos modos de exercício que contêm atos decisórios do juiz.
Embora sejam ambos atos unilaterais do juiz, estes podem ter de ser decididos na audição das partes, esta é uma
exigência que decorre do princípio do contraditório. No entanto, a prévia audição das partes não retira
unilateralidade a esses modo de exercício. Há casos em que a lei prevê que deva haver acordo entre o juiz e as
partes, por exemplo, nos termos do art. 151º nº1 CPC.
Âmbito do poder de julgar: o juiz tem o poder de julgar o quê?
1. O juiz tem o poder de apreciar a admissibilidade da ação – princípio da kompetenz-kompetenz;

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2. O juiz tem competência para apreciar quaisquer incidentes que sejam suscitados na ação, isto é, quaisquer
questões que devam ser resolvidas como pressupostos para que possa resolver a controvérsia;
3. O juiz tem competência para apreciar do mérito da ação: pode conhecer do pedido e da causa do pedido e
pode conhecer das exceções materiais (exceções peremptórias) deduzidas pelo réu (art. 91º nº1 parte final
CPC);
4. O juiz tem competência para conhecer das questões prejudiciais que sejam relevantes para a resolução da
causa, mesmo que a competência, para o seu conhecimento a título principal, caiba a outro tribunal,
normalmente a um tribunal penal ou a um tribunal administrativo;

Ex.: A pede contra B a nulidade do contrato, alegando que o contrato é nulo porque o seu objeto é um
medicamento cuja comercialização foi proibida pelo ministério da saúde.
Se a ação tivesse por finalidade aferir da validade daquela proibição, era competência dos tribunais
judiciais ou administrativos?
O que deu entrada no tribunal civil foi a validade do contrato, no entanto para que o tribunal a isso
responda, tal implica que conheça de uma matéria de lei administrativa. Na ação civil, o tribunal vai poder
conhecer desta matéria (art. 91º nº2 CPC), mas apenas como pressuposto para responder ao pedido para o qual
tem competência. O art. 91º nº1 CPC permite que o juiz, em lugar de conhecer diretamente da questão
prejudicial, decida aguardar que o tribunal competente para ela se pronuncie primeiro.

5. O juiz tem competência para conduzir o próprio processo (art. 6º CPC), isto é, este tem o poder de gestão
processual, por outras palavras, o juiz tem a competência de dirigir ativamente o processo, adequando-o
formalmente de forma que ele possa adquirir o seu propósito.

PARTE II – OS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

A finalidade de uma ação é, evidentemente, obter uma sentença de mérito que resolva a controvérsia
submetida pelas partes. De todo o modo, a possibilidade de resolução desta controvérsia está condicionada ao
respeito por um determinado conjunto de exigências que, se não forem observadas, impedem o tribunal de se
debruçar sobre o fundo da causa. A estas exigências, cuja teorização esteve ligada ao autor Oskar Von Bülow,
designam-se, justamente, por pressupostos processuais.
Numa ação judicial, tem de se distinguir com muita clareza o plano da admissibilidade do plano do
mérito da causa. Os pressupostos processuais englobam todas aquelas condições que se devem respeitar para
que se admita que o tribunal se possa conhecer do mérito.
Por conseguinte, estas condições são, em princípio de observância necessária para que a controvérsia
seja resolvida mediante uma sentença. O plano da admissibilidade é um plano anterior ao mérito da causa, logo,
ao longo de todo o processo há a preocupação do juiz em analisar se estão reunidos ou não os pressupostos para
que se possa desencadear a atividade processual.
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Dados específicos vocacionados para o controlo dos pressupostos processuais:


O processo civil subdivide-se em duas fases fundamentais com a possibilidade de existência de uma
intercalar.
• A primeira fase corresponde à submissão do litígio à apreciação do tribunal – fase dos articulados;
• A segunda fase ou fase intercalar diz respeito ao aferir dos pressupostos processuais e ao planeamento
da audiência final – fase de ligação entre o primeiro momento e o último;
• A terceira fase reconduz-se à produção de prova e ao julgamento de causa – fase da audiência final;
Diante deste esquema, qual será o momento próprio para o controlo dos pressupostos processuais?
A fase que marca o primeiro contacto entre o juiz e a causa é a fase de ligação. Nesta, o juiz afere se a
ação é ou não admissível. Deste modo, o momento normal para controlar os pressupostos processuais é,
portanto, o do despacho saneador que marca o fim da fase intermédia (art. 595º nº1 a) CPC). O juiz, no despacho
saneador, conhece das exceções dilatórias (existem quando falta um pressuposto processual) que tenham sido
suscitadas. Prevê a lei que quando falta um pressuposto processual o juiz deve procurar a regulação da instância.
Por isso, se o juiz, percebe que há algum erro antes, este terá de realizar um despacho pré-saneador, logo, estes
despachos funcionam de forma articulada.
Eventualmente o juiz pode conhecer da verificação dos pressupostos processuais quer antes, quer depois
do despacho saneador.

1ª Exceção – há casos em que o juiz logo na fase dos articulados intervém no processo, tal ocorre quando a
petição inicial está sujeita a um despacho liminar (art. 226º nº4 CPC). A regra é que o autor apresente a petição
inicial e o tribunal cite o réu imediatamente, o juiz aqui, em princípio, não intervém. Excecionalmente, nos
casos previstos (art. 226º nº4 e) CPC) o autor apresenta a petição inicial, mas ela é imediatamente sujeita a uma
apreciação preliminar pelo juiz. O ato que o juiz aqui pratica é um despacho liminar, quando a petição inicial é
manifestamente infundada ou não estão reunidos os pressupostos para iniciar aquele processo, mas via de regra,
este despacho não existe na ação declarativa. Mas, quando exista, o juiz pode, nesse momento, aferir
imediatamente da regularidade da instância, se estão ou não verificadas os pressupostos. Se, porventura, não
estiverem verificados e a sua falta não for sanada a consequência é o indeferimento liminar.
2ª Exceção – o juiz pode conhecer, em data posterior, à gestão inicial do processo. Este pode conhecer de
pressupostos processuais até na própria sentença. Com efeito, conforme resulta do art. 608º nº1, mesmo na
própria sentença, o juiz antes de avançar para o mérito conhece da admissibilidade, salvo os casos em que a lei
o exclua. Mas num processo bem produzido, os problemas de admissibilidade já foram resolvidos na gestão
inicial do processo (fase intermédia).

Os diferentes pressupostos podem classificar-se, de acordo com diferentes categorias:


• Quanto ao objeto:
o Respeitam às partes

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§ Personalidade Judiciária;
§ Capacidade Judiciária;
§ Patrocínio Judiciário;
o Respeitam ao Tribunal
§ Competência;
o Respeitam ao objeto do processo
§ Litispendência;
§ Caso Julgado;
o Respeitam à relação entre as partes e o objeto do processo
§ Legitimidade;

• Quanto à sanação
o Sanáveis – aqueles cuja falta pode ser colmatada na própria ação;
o Não sanáveis – aqueles cuja falta não poder ser colmatada, logo a sua falta faz com que a ação
seja julgada necessariamente inadmissível;
Esta distinção é importante, uma vez que, o legislador prevê que quando a falta do pressuposto seja
sanável, o tribunal deva ativamente providenciar pela regularização da instância (art. 6º nº2 CPC). O juiz deve
fazer tudo o que estiver ao seu alcance para garantir a utilidade daquela ação. Portanto, se o pressuposto
processual em causa é sanável deve procurar a regularização da instância para que seja possível conhecer do
mérito e que a ação, com o esforço que implica, não seja desperdiçada.
• Modo de Conhecimento
o Oficioso – não dispondo a lei diferentemente, a regra é que o pressuposto processual possa
ser conhecido oficiosamente;
o Provocado – suscitado pela parte a sua inobservância para que o tribunal a reconheça;
Relativamente ao tempo do conhecimento, vale a regra, de que podem ser conhecidos a todo o momento (até ao
final da sentença). Contudo, casos há em que a lei impede o seu reconhecimento a partir de certa altura (ex.:
incompetência relativa até ao despacho saneador).
• Iniciativa para a sanação
o Podem ser sanados pelo próprio juiz;
o Podem ser sanados apenas pelas partes;
Diferente deve ser o comportamento do juiz, consoante o regime que valha para esta iniciativa. Havendo
a falta de um pressuposto sanável, o juiz, nos termos do art. 6º nº2 CPC, deve providenciar pela sua sanação.
Ora, este providencia de modo diferente consoante tenha ou não poder de regularizar a própria instância. Se o
juiz tiver o poder, ele próprio ordena à prática desse ato (regulariza oficiosamente), se não tiver esse poder,
convida as partes a praticar o ato adequado à regularização.
• Quanto ao efeito dos pressupostos processuais

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o Positivos – têm-se de verificar para que a ação seja admitida;


o Negativos – não se podem verificar, sob pena da ação não ser admitida (ex.: exceção de caso
julgado); Qual o regime geral previsto na lei para o tratamento da falta de um pressuposto
processual?
O efeito próprio e imediato da falta de um pressuposto processual é o dever de o juiz se abster de
conhecer do mérito da causa (art. 576º nº2 1ª parte CPC).
Apreciando o concreto pressuposto processual em causa, o juiz deverá ajuizar se ele é:
o Sanável (art. 6º nº2) – o juiz deve providenciar pela regularização da instância, seja ordenando a
regularização, seja convidando à regularização. Se a instância for regularizada, o processo continua e
o tribunal pode conhecer o mérito da causa. Se não for, absolve o réu da instância;
o Insanável – em princípio, a sua consequência será a absolvição do réu da instância ou, se for no
âmbito do despacho liminar, indeferimento liminar da petição inicial. Ora, numa absolvição de
instância (=relação processual, que é composta pelo autor, réu e tribunal), a relação processual está
inteiramente constituída, mas o tribunal destrói-a porque não são reunidos os pressupostos processuais
para ela perdurar. No caso do despacho liminar, ele é proferido logo a seguir à apresentação da petição
inicial (ainda não se constituiu a relação processual). O tribunal recusa que esse processo seja
continuado com a citação do réu. Uma vez transitada esta sentença em julgado, ela tem valor de caso
julgado formal.

Como vimos, a regra para o juiz controlar a regularização da instância é a fase intermédia. Portanto, uma
vez terminada a fase dos articulados, a secretaria abre conclusão do processo ao juiz, isto é, coloca um ato para
uma decisão do juiz. O juiz consultando os articulados do autor e do réu, aprecia se falta ou não um pressuposto
processual.

Se faltar um pressuposto processual:


• Insanável – dá-se a absolvição da instância no despacho saneador (momento processual próprio para
conhecer dos pressupostos processuais);
• Sanável – o juiz profere despacho pré-saneador ordenando a regularização ou convidando à
regularização. No momento do despacho saneador aprecia-se se já foi ou não regularizado.
E se esta apreciação da regularidade da instância tiver lugar no momento do despacho liminar?
• Se o pressuposto for insanável – o juiz pode indeferir, ou seja, ordena o indeferimento;
• Se o pressuposto for sanável – o juiz pode regularizar ou convidar à prática dos atos necessários para
esse meso efeito;
Nota: O concreto modo de como um determinado processo é tramitado depende da forma geral prevista na lei
ou da concreta adequação adotada pelo juiz em concreto (ex.: ato de convidar as partes a regularizar, caso seja
esse o caso, nos termos do art. 6º nº2 CPC).

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E se o juiz apenas se apercebe da falta do pressuposto processual na sentença?


• Se o pressuposto processual for sanável: a lei nada prevê, logo o juiz terá de ordenar a regularização
a instância ou convidar à prática dos atos convenientes para esse efeito;
• Se o pressuposto processual for insanável: o efeito próprio de uma exceção dilatória que não tenha
sido sanada, é a absolvição do réu da instância.

Por conseguinte, a exceção dilatória não obsta a que se proponha uma nova ação com o mesmo objeto
(art. 620º e 279º nº1 CPC). Mesmo que tenha havido absolvição da instância, é possível aproveitar alguns efeitos
decorrentes da propositura da primeira ação (aquela que terminou com a absolvição do réu da instância), quando
seja proposta uma nova ação no prazo de 30 dias a contra do trânsito em julgado (art. 279º nº2 CPC). Podem
ser aproveitados os chamados efeitos civis da propositura de uma ação e os efeitos da citação. Eventualmente,
nos casos previstos no art. 279º nº3, podem mesmo ser aproveitadas as provas produzidas na primeira ação.
É possível propor uma mesma ação respeitante ao mesmo negócio? Sim, se o tribunal não conhecer o
fundo da causa. Mas pode já ter decorrido mais de um ano a contar do conhecimento da anulação – neste caso,
aproveita-se os efeitos civis da primeira no prazo de 30 dias, mesmo quando a ação termina com a absolvição
da instância, pode a nova ação aproveitar efeitos civis da primeira.
Ex de um efeito civil: com a propositura da ação, interrompe-se o prazo para a caducidade do direito (331º/1
CC). Ex. de uma ação sujeita a caducidade: anulação do negócio jurídico celebrado sob coação.
Finalmente, ainda quanto ao regime geral dos pressupostos processuais, excecionalmente, é possível
que, embora faltando um pressuposto processual, o tribunal conheça do mérito da causa (art. 278º nº3 CPC).

Quais são os casos excecionais em que se pode admitir a aplicação deste regime? Quando o pressuposto
processual em causa se destina a proteger o interesse de uma das partes, quando não esteja presente nenhuma
outra exceção dilatória e quando a decisão seja integralmente favorável a essa parte protegida pelo pressuposto
processual em falta (condições cumulativas).
Ex.: É proposta uma ação em que o réu é menor, no entanto, o tribunal só se apercebeu que ele era menor no
momento da sentença, ou seja, apercebe-se que este não tem capacidade judiciária. A regra normal seria a
regularização da instância, mas aqui vale o art. 278º nº3 que diz que o tribunal pode conhecer do mérito caso a
sentença seja integralmente favorável ao menor, pelo que deixa de ser necessário regularizar a instância.
Portanto, a lei pretende que a parte esteja devidamente tutelada no processo.

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