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1 – Introdução
A dança fez parte da vida do homem desde os períodos mais
remotos. Figuras encontradas nas paredes de cavernas que datam de
mais de 5000 anos, tais como as existentes no Piauí, no Parque
Nacional da Serra da Capivara, representam cenas de danças. Na Pré-
história o homem começa a se agrupar em cidades, cada uma com sua
própria divindade protetora, a quem era preciso agradar através de
danças e rituais para garantir uma boa colheita. (MAGALHÃES, 2005)
(JUSTAMAND, 2011)
Roger Garaudy, filósofo francês, fala da dança como uma
forma de estar no mundo retomando a noção antiga das danças
primitivas, das danças órficas e das danças dionisíacas. O filósofo afirma
que a dança transcende a arte passando a ser um modo de viver para
todos os povos, em todos os tempos. Relaciona a dança à magia, à
religião, ao trabalho, à festa, ao amor. A dança fez parte dos rituais de
guerra e de paz, das cerimônias de casamento, dos funerais e das
celebrações de colheita. (GARAUDY, 1973)
Rolando Toro, psicólogo, poeta, pintor e estudioso chileno,
criador do sistema Biodança, ao estudar as manifestações antropológicas nas
danças primitivas, compreendeu aspectos desconhecidos da alma humana
associados ao vínculo primordial com a natureza, à experiência de fusão e ao
processo evolutivo da consciência cósmica. Toro percebeu que a dança integra
o ser humano consigo mesmo, com os seus semelhantes e com as forças da
natureza. (TORO, 2005)
Ao criar ou descobrir a Biodança, como preferia, Rolando
Toro criou vários exercícios que possuem antecedentes arcaicos, ou seja,
remontam a danças e cerimônias que possuem aspectos universais comuns.
Toro criou os exercícios de Biodança baseado nos
movimentos naturais do ser humano e nos gestos ligados aos costumes sociais
e nos gestos arquetípicos. O criador da Biodança esclarece, referindo-se a
estes gestos: “Tais gestos e movimentos, se realizados com uma única música
que intensifique a cenestesia estimulada pelas categorias motoras em ação,
tornam-se danças, dentro da concepção original da dança como movimento de
vida.” (TORO, 2005)
Os exercícios de Biodança deflagram vivências integradoras que
evocam nos participantes conteúdos primordiais que se estruturam sobre o
princípio que orienta a vida no universo, princípio que Rolando Toro chamou de
biocêntrico. As vivências têm sua representação fisiológica no sistema límbico-
hipotalâmico, centro regulador das emoções e dos instintos. Ao induzir
vivências, Biodança ativa a memória arquetípica humana promovendo
integração entre o organismo biológico e a estrutura cultural. (FREIRE, 2012)
Esta integração dos potenciais humanos, referida por Freire, se
expressa através de linhas de vivência quais sejam: vitalidade, sexualidade,
criatividade, afetividade e transcendência. Subjacente a estas linhas se
encontram os instintos ou pulsões biológicas respectivamente de conservação,
sexual, exploratório, gregário e de fusão. (TORO, IBF)
A vivência em Biodança acessa e movimenta os conteúdos
arquetípicos do inconsciente através do gesto e da dança. O participante “entra
em contato com a energia do arquétipo, criando uma dança que expressa o
seu inconsciente, ativando o psíquico e o físico e tendo como resultado a
renovação orgânica, função estruturante que amplia os potenciais de cada
pessoa”. (ALVES, 2016)
A Biodança em sua concepção herda a sabedoria e a intuição
primordial dos povos antigos. Podemos encontrar a ressonância de vários
mitos e arquétipos que dão fundamento mítico às vivências de Biodança. Por
exemplo, o mito de Orfeu, relacionado ao poder da música, como indutora de
processos transformadores no ânimo dos humanos; a herança de Dionísio
lembra quando o homem era uno com a natureza, o prazer de viver, a
liberdade e o êxtase. E o mito de Deméter está relacionado à busca da
expansão da consciência e à unidade cósmica. (TORO, 2005)
Ao comentar a fundamentação arquetípica das vivências em
Biodança, o criador do sistema informa:
pessoal, uma idéia que se revelou extremamente fecunda”. (TORO, 2005, pg 67)
2- Conceitos de Mito
O primeiro conceito fundamental para a compreensão da
vivência com mitos e arquétipos em Biodança, tema do presente
trabalho, é o conceito de Mito que será elucidado a partir da definição
de diversos autores.
Mircea Eliade, especialista no estudo das religiões define
assim o mito:
3– Conceitos de Arquétipo
Para compreendermos a relação entre mitos e arquétipos e sua
relação com a Biodança, veremos como surgiu o termo arquétipo bem como
suas definições.
Utilizado por Jung pela primeira vez em 1919, em Londres, no
simpósio Instinto e Inconsciente, o termo arquétipo já era conhecido da filosofia
e suas origens remontam até Platão. Do grego arkhé, que significa primeiro,
antigo, regente, original e typos, também oriundo do grego, que significa marca,
impressão, molde ou modelo, o termo arquétipo exprime a ideia de um molde,
marca ou modelo original. (MORAES, 2010)
Jung elaborou o conceito de arquétipo a partir da observação de
muitos temas repetidos em mitologias, contos de fada e nos sonhos e fantasias
de seus pacientes. Ele observou que as imagens que apareciam se
relacionavam principalmente com situações comuns da existência humana tais
como o nascimento, a iniciação social, o relacionamento sexual e afetivo e
situações de perdas, entre outros. Existem assim tantos arquétipos quantas
são as situações típicas da existência humana, formando um substrato
psíquico comum a toda humanidade. (SERBENA, 2010)
Para Sarpe, a identidade humana possui ressonância ontológica,
buscando a totalidade do Ser e os arquétipos têm a função de ajudar nessa
busca: “Os arquétipos são o mapa, para e de onde vamos buscar os núcleos
de expressão mais integradores do humano, mais profundos, mais amplos do
humano.” (SARPE, 2015 pg 42)
Rolando Toro observou em seus estudos que o homem sempre
realizou gestos arquetípicos que aparecem em pinturas e esculturas de todas
as épocas. São gestos que expressam adoração, sentimento de maternidade,
intimidade ou que se referem a atividades arcaicas ligadas à natureza, como a
agricultura. Selecionou alguns desses gestos arquetípicos – capazes de induzir
vivências profundas e transcendentes - e os chamou de Posições Geratrizes de
Dança. (TORO, 2005)
4 - Estratos do Inconsciente
Os gestos arquetípicos referidos por Rolando Toro residem na
parte inconsciente do psiquismo humano. Originado do latim inconscious
significa genericamente aquilo que não é consciente. Dentro do Modelo Teórico
da Biodança encontramos os quatro estratos do inconsciente: o inconsciente
pessoal, o inconsciente coletivo, o inconsciente vital e o inconsciente
numinoso.
Veremos uma pequena conceituação de cada um deles e como a
Biodança se relaciona com esses estratos do inconsciente.
4 - 1 Inconsciente Pessoal
Ponto central da psicanálise criada por Freud,
neurologista vienense no fim do século XIX e primeira metade do
século XX. Freud localiza o inconsciente como um lugar
psíquico, com conteúdos, mecanismos e uma energia específica.
Parte arcaica do psiquismo, formado na primeira infância, os
conteúdos inconscientes são acessados através da livre
associação de ideias, dos atos falhos, dos sonhos e através dos
sintomas psíquicos. (CORDEIRO, 2014)
Para Toro, o inconsciente pessoal possui dimensão
biográfica e se nutre da memória dos fatos vividos principalmente
na infância. “Gerado no encontro das tendências genéticas com
os fatores ambientais, pode ter o seu potencial estimulado ou
inibido.” (TORO, 2005).
4 - 2 Inconsciente Coletivo
O conceito de inconsciente coletivo proposto por Jung amplia
a ideia do psiquismo e do inconsciente pessoal passando a incluir
uma camada constituída de estruturas e imagens comuns a toda a
humanidade - os arquétipos - que se manifestam nos sonhos, mitos,
religiões e contos de fadas. (SERBENA, 2010)
Segundo Ferreira o inconsciente coletivo transcende a esfera
do individual e do atual relacionando-se com o universal e o arcaico.
Os conteúdos do inconsciente coletivo remetem-nos aos primórdios
da civilização e nos falam da história da humanidade. (...) “Como
fundamenta a psique humana, é comum a todos os homens,
rompendo as barreiras socioculturais e raciais.” (FERREIRA, 1997
pg 49)
Através do processo de individuação, o inconsciente coletivo
objetiva revelar o Self – o si mesmo. O acesso ao inconsciente
coletivo de dá pela análise do repertório arquetípico do paciente, por
meio da expressão artística e dos sonhos dirigidos. As cerimônias
de aplicação dos mitos propostas pela Biodança se encaixam nessa
via de acesso. (TORO, 2005)
4-3 Inconsciente Vital
Rolando Toro fala-nos de um psiquismo biológico talvez
mais profundo que o inconsciente coletivo:
vida.” (ANEXO1)
Betania Moura chama atenção para a conexão alcançada com o
divino, mediada pela vivência mítica e arquetípica e destaca a
corporeidade expressada com beleza e mistério, integrando o sagrado e
o profano.
ARTÊMIS
Artêmis, a mais popular e antiga Deusa da mitologia grega, cuja
palavra-chave é natureza, tem grande empatia com a Terra e com os seres
vivos. Autossuficiente, solitária, convicta de sua feminilidade, devido à sua forte
ligação com a mãe Leto, encontra o equilíbrio de masculinidade e feminilidade
em seu próprio interior. (COSTA, 2016)
A mulher - Artêmis é prática, atlética e aventureira; aprecia a cultura
física, a solidão, a vida ao ar livre e os animais; dedica-se à proteção do meio
ambiente, aos estilos de vida alternativos e às comunidades de mulheres.
(WOOLGER, 1987)
Sua dor é a dificuldade de se relacionar afetivamente, pois tende a
se fechar ao amor por prezar muito a sua liberdade. Sofre pela dor da
alienação na sociedade convencional e pelo afastamento do mundo natural, da
fauna e da flora. (COSTA, 2016)
ATENA
Atena, filha de Zeus, Deus supremo do Olimpo, é a Deusa da
Sabedoria. Nasceu da cabeça de seu pai, já adulta e inteiramente armada. Foi
a única habitante do Olimpo sem uma verdadeira mãe, o que a deixou sem
referência de feminilidade da figura materna. Sua energia se encontrava
predominantemente na cabeça, desconsiderando e negando sua realidade
corporal. Agressividade, racionalidade e autoridade são qualidades masculinas
que já tinha integradas dentro de si, o que eliminava qualquer tipo de busca de
um homem para seu relacionamento afetivo. (COSTA, 2016)
A mulher – Atena busca a realização profissional numa carreira,
envolvendo-se com educação, cultura intelectual, justiça social e com política.
(WOOLGER, 1987)
Por ser extremamente competitiva, acaba afastando as pessoas, mas
no fundo se sente frágil e vulnerável por trás da couraça e da armadura que
sustenta. Dificuldade com o corpo em relação à feminilidade e à maternidade.
(COSTA, 2016)
DEMÉTER
Deméter, a Deusa da Vida, da maternidade, mãe de todos nós. Filha
de Cronos e Reia, nunca parecia se cansar ou pensar em si mesma.
Realizava-se tendo como princípio norteador de sua vida a maternidade.
Generosa, dedicada, acalentadora, confortadora, vivendo para cuidar do outro.
Doava-se tão completamente que até se perdia no outro. Relacionava -se com
a terra e a natureza vegetativa como forças vivas e necessárias para nosso
alimento. Compreendia todos os instintos básicos que fazem parte da natureza
animal e corporal. (COSTA, 2016)
A mulher- Deméter é uma verdadeira mãe-terra que gosta de estar
grávida, de amamentar e de cuidar de crianças; está envolvida com todos os
aspectos do nascimento e com os ciclos reprodutivos da mulher. (WOOLGER,
1987)
Sente raiva e desnorteamento quando os filhos já não ficam junto a ela, o
que a faz sentir que perdeu o centro emocional de sua vida. Por doar-se
demais e nunca pensar em si mesma, vai até o limite de suas forças e faz-se
de vítima quando os filhos crescem por sentir-se “abandonada” por eles.
(COSTA, 2016)
AFRODITE
Filha de Gaia – a mãe Terra e Ouranos – o Pai Celeste, Afrodite
nasceu no mar, do membro de seu pai que fora decepado por Cronos, um dos
seus irmãos. Gregos e romanos adoravam-na por sua beleza, ternura e
sensualidade. Brilhava sobre a cultura grega, abençoando-a com as artes da
escultura, poesia e música. Fazer contato com Afrodite é fazer contato com o
prazer, é desobstruir o controle materialista da mente e permitir que a
sensualidade possa tocar o espírito. É ser corpo sem culpa de crescer, de
mudar, de envelhecer, de acabar e de continuar amando. (COSTA, 2016)
A mulher- Afrodite está voltada principalmente para relacionamentos
humanos, sexualidade, romance, beleza e para as artes. (WOOLGER, 1987)
Pode se colocar em situações de superficialidade e desvalorização ao
se identificar somente com seu corpo. (COSTA, 2016)
PERSÉFONE
Perséfone, a Deusa do Mundo Avernal, filha única de Deméter, foi
arrastada por Hades, que surgiu do Mundo Avernal para raptá-la e casar-se
com ela. Acabou fazendo um trato com Hades para permanecer parte do ano
com sua mãe já como uma deusa madura, que conhecia a sexualidade, a
morte e a separação. Aprendeu a viver no mundo da vida e da luz
representado pela mãe e no mundo das sombras e da morte, representado por
Hades. Rege o mundo sutil, a ligação entre consciente e inconsciente,
estabelece vínculos profundos, ligação com processos de morte e
renascimento. É sensível, visionária e intuitiva. (COSTA, 2016)
A mulher – Perséfone é mediúnica e atraída pelo mundo espiritual,
pelo oculto, pelas experiências místicas e visionárias, e pelas questões ligadas
à morte. (WOOLGER, 1987)
Sua dor é a dificuldade de se tornar independente, ficando sempre
emocionalmente imatura. Tem a tendência a ficar sempre menina, com laços
de dependência emocional e financeira com a família ou com o parceiro, por ter
dificuldade de perceber o seu próprio poder. Seu desafio é sacrificar a menina
frágil e tornar-se mulher independente. (COSTA, 2016)
De acordo com Betania Moura, a Roda das Deusas é estruturada em
dois módulos. A vivência propõe aos participantes dançar esses arquétipos
femininos com o objetivo de integrá-los e equilibrar essas forças psíquicas.
(MOURA, 2012)
No primeiro módulo todas as pessoas participantes da vivência,
dançam todas as deusas para identificar qual a deusa que rege a sua vida e
qual a que está adormecida. No segundo módulo, cada pessoa dança a deusa
que necessita potencializar. Entre um módulo e outro, a facilitadora faz um
momento de reflexão com cada participante para ouvir a história da construção
do feminino e do masculino dentro de si para então definir a deusa que será
dançada. (MOURA, 2012).
Para Betania Moura, ao dançar os arquétipos das deusas gregas
nessa extensão, os participantes têm a oportunidade de transcender valores e
crenças opressoras e alcançar maior liberdade frente à vida:
“Um dos aspectos que mais nos chamou a atenção, desde a primeira
experiência, foi justamente a intensidade da vivência, o comprometimento
corporal e emocional do participante ao dançar a resposta do Oráculo. Inclusive
pessoas com pouca experiência em Biodança nos surpreenderam, como
também exercícios simples, como um caminhar sinérgico, se transformaram
em uma dança de expressão intensa.”(Anexo 5)
(ANEXO 2)
“Um facilitador não faz uma análise segmentada deste processo. Não podemos
confundir a organização teórica do material observado com a observação em si. No meu caso
busco mais que observar, sentir os participantes, em ressonância empática. Desta forma
percebo o bem estar, ou a comoção emocional que se dá quando encontramos coisas que
temos que mudar em nossas vidas, ainda a alegria de descobrir-se em potenciais
anteriormente adormecidos. Sei que isto pode ser explicado através da formação de novas
sinapses, com a ampliação da percepção e consciência. Mas não utilizo nenhum instrumento
de mensuração, poderia criar um, mas confio mais na sensibilidade de minha percepção. Isto é
o suficiente para realizar meu trabalho e ter certeza de sua eficácia.” (ANEXO 1)
Ruth Cavacante observa no participante destas vivências e extensões,
mudanças significativas no que diz respeito à maior integração e crescimento
do potencial de amor e entrega:
“As mudanças de primeira ordem são mais rápidas de se conseguir, às vezes após
um ou dois anos de prática do grupo semanal há harmonia e expressão razoável das’ linhas de
vivencia’. Já o segundo e terceiro nível – vivencia de autorregulação sistêmica e vivência do
Princípio Biocêntrico nas ações do cotidiano requer mais prática e integração.” (ANEXO 4)
“Para nós essa experiência é muito válida, na medida em que ajuda participantes de
Biodança a superar desafios de sua existência ou a se harmonizar com situações que não
podem transformar”.
“Válida, também, por oferecer respostas que nós, como facilitadores limitados, não
temos condições de oferecer. O Oráculo, em sua sabedoria cósmica, aponta caminhos que
nós, como facilitadores, tentamos traduzir, usando a linguagem de Biodança, isto é: a
dança.”(ANEXO 5)
(ANEXO 1)
confere.” (ANEXO 3)
identidade tem sido um forte estímulo na minha jornada profissional em Biodanza.” (ANEXO
4)
“Todo aluno de Biodanza deveria passar por estes processos que são muitos
transformadores. A mudança alcançada é rápida e motivadora para que a pessoa continue nos
grupos regulares.” (ANEXO 6)
10 – ANEXO 1 Questionário
11 - Referências Bibliográficas
5 - REIS, Alice Casanova dos. A Dança da Vida: A Experiência Estética da Biodança. São
Paulo.2012 (Tese)
6 - TORO, Rolando. Curso de Formação Docente em Biodança. Apostila da IBF (A
Vivência)
27 - WILHELM, Richard. I Ching: o livro das mutações. São Paulo: Pensamento, 2006. p.
3-8.
29 - APPY, Maria Luiza. I Ching o Livro das Mutações Elaborado por M.Luiza Appy,
com base em textos do I Ching de Rolando Toro. 2013
Toro:http://www.ilcerchiodellavita.it/Marlise_Brasile.pdf