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24.06.

2009

Violência x Proteção Social

ParaTodos: O senhor poderia definir o conceito de segurança pública?


Pedro Bodê: Temos duas idéias: a segurança de repressão e a segurança de proteção. Quanto mais o pais é comprometido
com acesso a bens ligados aos princípios democráticos, mais a segurança está ligada a sua idéia social que é a de proteção. E
fundamental fazer a separação entre a segurança de repressão (que é o carro preto, a polícia, que remete à repressão), e a
segurança pública, enquanto proteção para quem está em desvantagem em relação aos outros, o que exige um processo de
inclusão social. Em países, onde nao ha proteçao social, mais a segurança tende a ser identificada com repressão.

ParaTodos: Hoje, no pais, a noção de segurança está voltada para a repressão? Bodê: Há alguns indicadores dessa situação.
A polícia nunca matou tanto e o nível de encarceramento atingiu índices históricos. As políticas públicas não têm tido a
intensidade que deveriam ter para nos levar para a noção de segurança enquanto proteção e produção de espaços de bem
estar coletivo. As políticas públicas não têm tido a intensidade que deveriam ter para proteger os mais fracos, em contraponto
aos ricos, que não precisam porque têm acesso a segurança privada.

ParaTodos: Como inverter a lógica, levando o aparato de segurança mais para a proteção social do que para a repressão?
Bodê: A única maneira é de baixo pra cima, com pressão e demanda popular. Essa configuração serve a muita gente, que está
ganhando dinheiro com esta situação. Como por exemplo, com o encarceramento. O preso no Paraná custa R$ 1 ,3 mil em
média. Os custos da repressão são altíssimos e esse aparato serve para reprimir a população mais pobre. E o Estado brasileiro,
mesmo com as feições democráticas de agora, não abre mão deste recurso. Os movimentos sociais da esquerda brasileira
acharam que a mudança da sociedade alteraria esse conceito. Mas não houve mudança estrutural, apenas cosmética. Talvez
um pequeno grupo de esquerda venha a pautar a reforma estrutural no sistema de segurança pública, assim como se pauta a
reforma agrária e urbana. A solução é reformar e trazer o debate à tona.

ParaTodos: Discute-se muito a necessidade de desmilitarização da polícia e a unificação das polícias civil e militar. Qual é sua
opinião?
Bodê: A Polícia Militar é um enclave autoritário no interior do Estado, que traz uma polaridade: o estado que protege e o
estado que reprime. Esse é o estado que as polícias freqüentam, sendo que há choques dentro do interior deste mesmo estado.
É necessária a desmilitarização das polícias, juntamente com sua integração. Não tem sentido ter duas polícias. Juntamente
com isso, deveríamos multiplicar os órgãos de ouvidoria e criar corregedorias independentes, polícia técnica independente. Isso
já produziria um efeito significativo.

ParaTodos: Além dessa questão, quais os principais pontos de uma reforma estrutural na área de segurança pública?
Bodê: Um ponto é tornar o judiciário mais acessível e rápido, pois sem isso, não há justiça, permitindo todo o tipo de ação
individual. Temos que ter um aparato judicial que não garanta privilégios. Precisamos de um sistema mais ágil e democratico,
que nao seja tao discricionario, quer dizer, o sistema policial continua prendendo as pessoas não pelo que elas fazem e sim pelo
que elas são. Nao importam os atos e sim o perfil. Por exemplo, uma advogada sendo acusada de tráfico é um desvio de
comportamento, vira cleptomaníaca. Se é um pobre, a visão é de um primeiro passo para a carreira criminosa. Há um processo
de policialização da demanda social. Numa situação onde deveria estar o serviço social, entra a polícia. A grande mudança
continua sendo a criação. formas de integração e proteçao social. Pois é impossível pensar em uma sociedade melhor e
protetora, em que o indivíduo não tenha acesso ao seus direitos básicos, como educação, saúde e emprego.

ParaTodos: E as defensorias públicas, que papel teriam nestas mudanças?


Bodê: Fundamental. Temos que ter uma defensoria pública com peso do Ministério Público. Somente com inclusão e
integração é que a gente consegue produzir proteção.

ParaTodos: A relação que se estabelece entre conjuntura econômica e violência é direta?


Bodê: A relação é no sentido que a conjuntura econômica produz exclusão, que por sua vez, produz desigualdade. Parece que
a atividade criminosa tem mais a ver com reprodução de desigualdade do que com exclusão. Qual a diferença? Há regiões do
pais onde há uma brutal exclusão, mas em que a desigualdade não é percebida e é neutralizada. Nas cidades maiores, essa
desigualdade é muito percebida, dentro de uma cultura em que as pessoas são orientadas a consumir e trocar o “ser” pelo
“ter”. Aí, nós temos aqueles crimes em que o garoto rouba porque quer se vestir com marcas famosas. Essa vinculação existe,
mas é relativa porque a grande massa dos trabalhadores não se envolve em práticas criminosas E, por outro lado, as classes
médias se envolvem frequentemente e não são punidas. Entramos, então, na questão de uma sociedade de privilégios, com
moral e ética fracas. Aí é uma questão de princípios e valores.

ParaTodos: O que é a cultura do medo?


Bodê: Cultura do medo é o seguinte. Qual a probabilidade de você ser atacado por um tubarão ou ser intoxicado por um
sanduíche de atum? A probabilidade de ser intoxicado pelo sanduíche de atum é infinitamente maior. Não é o medo do crime
em proporções como nós vivenciamos, mas na verdade é reflexo de outras formas de desproteção. As pessoas têm uma
ansiedade generalizada, em função da falta de proteção maior. A cultura do medo é o processo pela qual as inseguranças mais
gerais, como emprego, saúde, educação, entre outras, produzem uma ansiedade que é transformada em medo do crime de
latrocínio, do furto. E por mais que se faça, as pessoas não se sentem seguras.

ParaTodos: Por que essa sensação de insegurança não cessa?


Bodê: Porque se faz uma espécie de projeção, concentrando todos os medos em um só. Nós temos uma sociedade em que os
processos de solidarização são muito baixos. Além disso, no medo se encontrou uma indústria que permite uma renovação do
processo de acumulação. Produzir aparatos para resolver o medo está dando muito dinheiro. No caso do Brasil, a segurança
privada é uma indústria milionária, que cresce à medida que o estado, que deveria nos proteger, não faz isso.

ParaTodos: O senhor poderia definir o conceito de segurança pública?


Bodê: Temos duas idéias: a segurança de repressão e a segurança de proteção. Quanto mais o pais é comprometido com
acesso a bens ligados aos princípios democráticos, mais a segurança está ligada a sua idéia social que é a de proteção. E
fundamental fazer a separação entre a segurança de repressão (que é o carro preto, a polícia, que remete à repressão), e a
segurança pública, enquanto proteção para quem está em desvantagem em relação aos outros, o que exige um processo de
inclusão social. Em países, onde nao ha proteçao social, mais a segurança tende a ser identificada com repressão.

ParaTodos: Hoje, no pais, a noção de segurança está voltada para a repressão?


Bodê: Há alguns indicadores dessa situação. A polícia nunca matou tanto e o nível de encarceramento atingiu índices
históricos. As políticas públicas não têm tido a intensidade que deveriam ter para nos levar para a noção de segurança
enquanto proteçãoe produção de espaços de bem estar coletivo. As políticas públicas não têm tido a intensidade que deveriam
ter para proteger os mais fracos, em contraponto aos ricos, que não precisam porque têm acesso a segurança privada.

ParaTodos: Como inverter a lógica, levando o aparato de segurança mais para a proteção social do que para a repressão?
Bodê: A única maneira é de baixo pra cima, com pressão e demanda popular. Essa configuração serve a muita gente, que está
ganhando dinheiro com esta situação. Como por exemplo, com o encarceramento. O preso no Paraná custa R$ 1 ,3 mil em
média. Os custos da repressão são altíssimos e esse aparato serve para reprimir a população mais pobre. E o Estado brasileiro,
mesmo com as feições democráticas de agora, não abre mão deste recurso. Os movimentos sociais da esquerda brasileira
acharam que a mudança da sociedade alteraria esse conceito. Mas não houve mudança estrutural, apenas cosmética. Talvez
um pequeno grupo de esquerda venha a pautar a reforma estrutural no sistema de segurança pública, assim como se pauta a
reforma agrária e urbana. A solução é reformar e trazer o debate à tona.

ParaTodos: Discute-se muito a necessidade de desmilitarização da polícia e a unificação das polícias civil e militar. Qual é sua
opinião?
Bodê: A Polícia Militar é um enclave autoritário no interior do Estado, que traz uma polaridade: o estado que protege e o
estado que reprime. Esse é o estado que as polícias freqüentam, sendo que há choques dentro do interior deste mesmo estado.
É necessária a desmilitarização das polícias, juntamente com sua integração. Não tem sentido ter duas polícias. Juntamente
com isso, deveríamos multiplicar os órgãos de ouvidoria e criar corregedorias independentes, polícia técnica independente. Isso
já produziria um efeito significativo.
ParaTodos: Além dessa questão, quais os principais pontos de uma reforma estrutural na área de segurança pública?
Bodê: Um ponto é tornar o judiciário mais acessível e rápido, pois sem isso, não há justiça, permitindo todo o tipo de ação
individual. Temos que ter um aparato judicial que não garanta privilégios. Precisamos de um sistema mais ágil e democratico,
que nao seja tao discricionario, quer dizer, o sistema policial continua prendendo as pessoasnão pelo que elas fazem e sim pelo
que elas sao. Nao importam os atos e sim o perfil. Por exemplo, uma advogada sendo acusada de trafico é um desvio de
comportamento, vira cleptornaníaca. Se é um pobre, a visão é de um primeiro passo para a carreira criminosa. Ha um processo
de policialização da demanda social. Numa situação onde deveria estar o serviço social, entra a policia. A grande mudança
continua sendo a criação . formas de integração e proteçao social. Pois e impossivel pensar em uma sociedade melhor e
protetora, em individuo nao tenha acesso ao seus básicos, como educação, saúde e emprego.

ParaTodos: E as defensorias públicas, que papel teriam nestas mudanças?


Bodê: Fundamental. Temos que ter uma defensoria pública com peso do Ministério Público. Somente com inclusão e
integração é que a gente consegue produzir proteção.

ParaTodos : A relação que se estabelece entre conjuntura econômica e violência é direta?


Bodê: A relação é no sentido que a conjuntura econômica produz exclusão, que por sua vez, produz desigualdade. Parece que
a atividade criminosa tem mais a ver com reprodução de desigualdade do que com exclusão . Qual a diferença? Há regiões do
pais onde há uma brutal exclusão, mas em que a desigualdade não é percebida e é neutralizada. Nas cidades maiores, essa
desigualdade é muito percebida, dentro de uma cultura em que as pessoas são orientadas a consumir e trocar o “ser” pelo
“ter”. Aí, nós temos aqueles crimes em que o garoto rouba porque quer se vestir com marcas famosas. Essa vinculação existe,
mas é relativa porque a grande massa dos trabalhadores não se envolve em práticas criminosas E, por outro lado, as classes
médias se envolvem frequentemente e não são punidas. Entramos, então, na questão de uma sociedade de privilégios, com
moral e ética fracas. Ai e uma questao de prrncipios e valores.

ParaTodos: O que é a cultura do medo?


Bodê: Cultura do medo é o seguinte. Qual a probabilidade de você ser atacado por um tubarão ou ser intoxicado por um
sanduíche de atum? A probabilidade de ser intoxicado pelo sanduíche de atum é infinitamente maior. Não é o medo do crime
em proporções como nós vivenciamos, mas na verdade é reflexo de outras formas de desproteção. As pessoas têm uma
ansiedade generalizada, em função da falta de proteção maior. A cultura do medo é o processo pela qual as inseguranças mais
gerais, como emprego, saúde, educação, entre outras, produzem uma ansiedade que é transformada em medo do crime de
latrocínio, do furto. E por mais que se faça, as pessoas não se sentem seguras.

ParaTodos: Por que essa sensação de insegurança não cessa?


Bodê: Porque se faz uma espécie de projeção, concentrando todos os medos em um só. Nós temos uma sociedade em que os
processos de solidarização são muito baixos. Além disso, no medo se encontrou uma indústria que permite uma renovação do
processo de acumulação. Produzir aparatos para resolver o medo está dando muito dinheiro. No caso do Brasil, a segurança
privada é uma indústria milionária, que cresce à medida que o estado, que deveria nos proteger, não faz isso.

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