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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva


versão impressa ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.4 no.1 São Paulo jun. 2002

ARTIGOS

Alterações neuropsicológicas associadas à depressão

Neuropsychological impairment associated with depression

Patrícia Porto1; Marcia Hermolin2,3; Paula Ventura4

Equipe de Avaliação Neuropsicológica


RESUMO

O presente artigo tem por objetivo descrever as principais alterações cognitivas encontradas na
depressão, bem como as suas correlações com estudos de neuroimagem. Não está claro, no
entanto, se as alterações seriam relacionadas a disfunções no funcionamento cerebral ou se
seriam um epifenômeno da alteração de humor ou das ruminações depressivas. Nesta revisão,
objetiva-se, também, ressaltar a importância da avaliação neuropsicológica em idosos para
favorecer o diagnóstico diferencial entre processos demenciais e a pseudodemência
depressiva, assim como descrever fatores que podem predizer deficits cognitivos em
deprimidos como a presença de traços psicóticos.

Palavras-chave: Depressão, Alterações cognitivas, Neuropsicologia.

ABSTRACT

The aim of the present paper is to describe the main cognitive impairment found in the
depression, as well as its correlations with neuroimage studies. It is not clear, however, if the
impairment would be related to disturbed cerebral functioning or to an epiphenomenon of
disordered mood or depressive rumination. This review will emphasize the importance of
neuropsychological assessment in the elderly in order to improve the differential diagnosis
between dementia and pseudodementia, as well as to describe factors that can predict cognitive
impairment in depression, as for example, psychotic features.

Keywords: Depression, Cognitive impairment, Neuropsychology.

A depressão é um dos problemas atuais mais comuns encontrados pelos profissionais de


saúde mental (Barlow, 1999). Parece provável que nenhum fator isolado possa explicar a
ocorrência da depressão, mas sim que esta seja o resultado de uma interação entre vários
fatores diferentes. Seu início e evolução estão ligados a um grande número de variáveis
biológicas, históricas, ambientais e psicológicas. Estas incluem histórico familiar de depressão
ou alcoolismo, perda ou negligência precoce dos pais, eventos negativos e recentes da vida,
cônjuge crítico e hostil, ausência de relacionamento de confiança, falta de apoio social
adequado e uma longa história de baixa auto-estima (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1997).

A depressão pode acarretar alterações cognitivas como deficits de memória, de atenção,


dentre outros. Estes serão melhor avaliados por um especialista em neuropsicologia.

A neuropsicologia vem-se desenvolvendo cada vez mais nos Estados Unidos e começou a se
desenvolver recentemente no Brasil. Tem por objetivo, o estudo das relações entre o cérebro e
o comportamento e conta com várias áreas de atuação e de investigação. Esta área da
psicologia utiliza baterias de testes específicos para a avaliação de cada função cognitiva, além
da anamnese e da avaliação clínica. A neuropsicologia, aliada à medicina e à tecnologia
médica, pode ajudar o paciente deprimido, à medida que identifica áreas cognitivas que
estejam comprometidas.

Alterações cognitivas
A depressão é uma síndrome que pode cursar com alterações cognitivas. Investigações
clínicas têm explorado a função neuropsicológica de pacientes deprimidos há pelo menos duas
décadas. No entanto, pouco se sabe sobre a especificidade dos distúrbios cognitivos nesses
quadros. A dificuldade observada no desempenho cognitivo de pessoas com depressão é
também critério para o diagnóstico de quadros em que lesões ou disfunções cerebrais estejam
em jogo. Desta forma, é importante reconhecer o perfil cognitivo tanto quantitativo quanto
qualitativo da depressão e tentar traçar a partir daí a sua neuroanatomia funcional e reconhecer
seus subtipos (unipolar, bipolar, primária ou secundária).

Existem evidências que sugerem a presença de deficits neuropsicológicos acompanhando o


Episódio Depressivo Maior (Laks, Marinho, Rosenthal e Engelhardt, 1999). Observa-se que
esses deficits se apresentam de forma ampla e tendem a incluir anormalidades envolvendo a
sustentação da atenção, função executiva, velocidade psicomotora, raciocínio não verbal e
novas aprendizagens. Contudo, a disfunção neurocomportamental associada ao Transtorno
Depressivo Maior parece depender de diferenças individuais, com somente alguns indivíduos
deprimidos demonstrando comprometimento.

Na avaliação neuropsicológica de pacientes deprimidos, os domínios cognitivos mais


comumente afetados são: evocação após intervalo de tempo, aquisição da memória, atenção,
concentração, flexibilidade cognitiva e abstração(Zakzanis, Leach e Kaplan, 1999). Entretanto,
é importante ressaltar que nem todos os pacientes deprimidos apresentam estes deficits.
Estudos demonstraram que os deficits de memória associados à depressão são similares aos
de pacientes com disfunção subcortical (por exemplo, doença de Hungtington) (Laks et al,
1999). Bieliauskas (1993) demonstrou que os deficits de memória estão diretamente
relacionados à depressão em idosos, principalmente em pacientes com história crônica e
recorrente de episódios de depressão. Basso e Bornstein (1999) demonstraram que os
pacientes com Transtorno Depressivo Maior com episódios recorrentes apresentam maior
probabilidade de ter deficits cognitivos do que aqueles que apresentam episódio único.

A atenção é uma das principais funções da cognição estudadas nos processos depressivos,
talvez pela facilidade com que é avaliada sua alteração que pode ser observada mesmo ao
exame clínico superficial. Outro fator fundamental para o desempenho do paciente com
depressão é o seu nível de motivação, fator psicológico que interfere sobremaneira no
funcionamento cognitivo e comportamental desses indivíduos (Laks et al, 1999).

Depressão no idoso

A avaliação neuropsicológica é de suma importância no paciente idoso, especialmente quando


há queixas de deficits cognitivos, como problemas de memória que dificultam o diagnóstico
diferencial entre processos demenciais e a pseudodemência depressiva, uma vez que
depressão maior pode cursar com deficits cognitivos.

Quando o processo demencial se encontra em estágio avançado, o diagnóstico é facilmente


estabelecido; mas nos estágios iniciais, o diagnóstico só é possível através de cuidadosa
avaliação neuropsicológica. Estudos mostram que cerca de 20% dos pacientes idosos
deprimidos apresentam deficits cognitivos (La Rue, Spar e Hill, 1986). O diagnóstico diferencial
entre demência e depressão é bastante difícil em muitos casos. Estima-se que de 1% a 31%
dos pacientes com diagnóstico de síndrome demencial tenham, na realidade, depressão com
problemas de memória associados (Katzman, Lasker e Bemstein, 1988). Esta é uma questão
que merece atenção tendo-se em vista que o tratamento inadequado da depressão inexistente
num paciente com demência pode não causar dano algum, mas o tratamento com
antidepressivos com propriedades anticolinérgicas, como por exemplo, a imipramina, pode
exacerbar problemas de memória. Na verdade, o idoso pode apresentar comorbidade de
depressão e demência, o que demanda um manejo específico no que se refere ao tratamento.

Estudos prévios com grandes amostras de idosos (Forsell, Fratiglioni, Grut e Winblad, 1993)
indicaram que os sintomas de depressão podem dividir-se em duas categorias:

• Distúrbio motivacional que inclui: perda de interesse, perda de energia, dificuldade de


concentração, mudanças psicomotoras;
• Distúrbio do humor que inclui: disforia, alteração do apetite, sentimento de culpa,
pensamentos e ideação suicida.

Existem algumas evidências que sugerem que os sintomas motivacionais descritos acima
estariam mais relacionados ao desempenho do funcionamento cognitivo de idosos revelados
pelos testes neuropsicólogicos do que os sintomas de humor (Backman, Hill e Forsell, 1996).
Uma possível razão para isso é que os sintomas motivacionais afetam a habilidade de atenção.

Depressão com traços psicóticos

Um fator que pode predizer deficits cognitivos em deprimidos é a presença de traços psicóticos.
Indivíduos deprimidos com traços psicóticos têm distúrbio significativo na forma e conteúdo do
pensamento e são propensos a se distraírem com seu próprio estado interno. Dessa forma,
parece que algumas características podem potencialmente comprometer o desempenho do
paciente na avaliação neuropsicológica. Além do mais, indivíduos deprimidos com traços
psicóticos tendem a apresentar os sintomas da depressão de maneira mais grave do que os
indivíduos deprimidos sem traços psicóticos (Corley, 1996, citado por Basso 1999). Portanto,
como a disfunção na memória está positivamante associada ao Transtorno de Humor grave
(Bornstein, 1991 citado por Basso 1999), indivíduos psicóticos deprimidos podem mostrar de
forma mais acentuada comprometimento da memória e outros deficits cognitivos.

Há evidências que propõem a presença de grande disfunção cerebral na depressão em


psicóticos. Por exemplo, indivíduos psicóticos deprimidos têm mais freqüentemente recaídas
do episódio depressivo, e seus episódios são maiores do que aqueles vivenciados por
deprimidos não psicóticos (Coryell, 1996 citado por Basso, 1999). Depressão com traços
psicóticos é também marcada por alta morbidez, grande comprometimento residual e pouca
resposta à farmacoterapia. Estes indivíduos apresentam mais freqüentemente anormalidades
na estrutura cerebral que os indivíduos deprimidos não-psicóticos. Tem-se, por exemplo, um
aumento do terceiro ventrículo (Schlegel, 1989 citado por Basso, 1999), e grande atrofia
cerebral, (Gewintz, 1994 citado por Basso 1999). À medida que essas anormalidades podem
ser refletidas na avaliação das funções cognitivas, indivíduos deprimidos com traços psicóticos
podem apresentar desempenho pior do que indivíduos deprimidos não psicóticos.

Neuroimagem

Os estudos neuropsicológicos associados à neuroimagem trouxeram considerável avanço para


o entendimento dos correlatos neuroanatomofuncionais dos transtornos psiquiátricos.
Distinguem-se três tipos de exames, de acordo com seus objetivos: a tomografia
computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) avaliam alterações estruturais do
cérebro; a ressonância magnética funcional (RMf), a tomografia por emissão de pósitron (PET)
e a tomografia por emissão de fóton único (SPECT) geram imagens que descrevem o estado
funcional e metabólico do cérebro como um todo e de determinadas regiões, permitindo a
investigação sem a utilização de métodos invasivos (Weight e Bigler, 1998).

Em idosos deprimidos, é possível observar algumas mudanças anátomo-funcionais como


redução do fluxo sanguíneo no córtex frontal, temporal e giro do cíngulo; intensidade de
substância branca e lesões subcorticais do núcleo cinzento, (Coffey et al, 1988; Figiel et al,
1991) e alargamento ventricular e diminuição da densidade cerebral. Estudos “post mortem”
encontraram comprometimentos mais graves no locus coeruleus em pacientes com Doença de
Alzheimer e Depressão do que naqueles somente com Doença de Alzheimer.

Os estudos estruturais se ocuparam, no início, em medir volume global do encéfalo, volume


dos lobos, fissuras corticais e ventrículos em pacientes depressivos comparados a normais
com o objetivo de encontrar atrofias ou outras alterações que pudessem justificar a
sintomatologia e quadro clínico nesses casos.

Um estudo de revisão desses achados encontrou 22 trabalhos sobre tomografia


computadorizada nos transtornos de humor. Nenhum deles encontrou evidências de
anormalidades no volume cerebral ou nas medidas dos sulcos corticais. O dado mais
consistente desses estudos foi o aparecimento de ventrículos dilatados nos pacientes
comparados com o controle, embora esses estudos tenham amostras mistas de transtorno
unipolar e bipolar (Dougherty e Rauch, 1997). No entanto, esse dado não é de maneira
nenhuma específico dos transtornos de humor, tendo sido relatado em estudos com pacientes
esquizofrênicos, abuso de álcool e doenças demenciais. Como muito desses estudos foram
feitos com uma amostra mais idosa, é possível que este seja um fator de viés para os dados
encontrados. Nenhum dos estudos considerados examinou os achados a partir de hipóteses,
limitando-se apenas a constatar atrofia global, o que pode ser conseqüência de anormalidades
do neurodesenvolvimento ou refletir neurodegeneração que não apresente correlação nem com
o estado nem com traços que predisponham ao transtorno (Doughert e Rauch, 1997; Soares e
Mann, 1997).

A ressonância magnética não oferece informações muito específicas para correlação entre
neuroimagem e o quadro depressivo porque, de 16 estudos realizados com essa técnica, 8
elaboraram hipóteses e compararam com grupo controle quanto à hipersensibilidade de sinal
na substância branca, 5 examinaram bipolares e 5 estudaram depressivos idosos sem
especificação de bipolaridade ou unipolaridade (Doughert e Rauch, 1997). As principais regiões
onde se encontraram as alterações são a substância branca subcortical, periventricular e
frontal e o núcleo caudado, especificamente em bipolares e idosos unipolares. Esses dados
dão reforço à idéia de que a depressão seja um processo subcortical, ao menos em algumas
de sua formas de apresentação (Brumback, 1993).

A avaliação de regiões específicas corticais pela ressonância magnética mostra evidência de


alterações no lobo frontal de pacientes com depressão unipolar, mas não em pacientes
bipolares com menor volume desse lobo nos depressivos unipolares (Soares e Mann, 1997).
Os resultados de estudos sobre o lobo temporal são contraditórios, com alguns mostrando
aumento e outros diminuição do volume desses lobos em bipolares, embora para depressivos
unipolares não haja alterações. Não foram encontradas alterações nos lobos parietais (Dolan,
Bench, Brown, Scott e Frackowiak, 1994).

Quanto ao envolvimento de estruturas subcorticais na geração e apresentação da depressão,


os dados não são ainda de todo convincentes. Há por exemplo, poucos estudos volumétricos
com ressonância magnética para o tálamo embora relatos isolados descrevam depressão com
infartos nessa região. Estudos com tomografia computadorizada apresentam dados de volume
menor dos gânglios da base em depressivos unipolares, o que não acontece com bipolares
(Greenwal et al, 1996).

Os estudos de neuroimagem funcional para áreas corticais acompanham os achados


estruturais no que diz respeito ao lobo frontal. Há fortes evidências de diminuição de fluxo
sanguíneo e metabolismo nessa região tanto em depressivos unipolares como em bipolares. Já
em relação ao lobo temporal, a maioria dos estudos não encontrou dados confirmatórios de
anormalidades no metabolismo de glicose nessa região em depressivos unipolares ou
bipolares, sendo que esse último grupo de pacientes não foi suficientemente estudado (Soares
e Mann, 1997).

As estruturas límbicas também não apresentam alterações com tomografia por emissão de
fóton único (SPECT) ou tomografia por emissão de pósitron (PET), embora um trabalho de
Drevets e colaboradores em 1992 tenha encontrado aumento no fluxo sanguíneo no
hipocampo e amígdala direita em pacientes unipolares puros não medicados. Essa exceção
aos achados negativos na maioria dos estudos pode indicar a necessidade de refinamento da
seleção para que os resultados positivos sejam encontrados, definindo assim subtipos de
disfunção em que a explicação dos transtornos e disfunções seja correlacionada aos
respectivos circuitos. Seguindo essa linha de raciocínio, o giro do cíngulo tem recebido atenção
especial devido às suas complexas e ricas aferências e eferências representando
possivelmente diferentes sistemas neurais do ponto de vista funcional (Elbert e Edmeier, 1996).
A porção anterior do córtex cingulado tem papel fundamental nas funções motoras e
emocionais, enquanto a região posterior está envolvida com funções visuoespaciais e de
memória com pouca influência sobre o afeto. As alterações de comportamento mais descritas
em animais após lesões no giro do cíngulo anterior incluem agressividade diminuída, menos
timidez, medo do ser humano, empobrecimento emocional, diminuição da motivação,
impaciência e comportamento social inapropriado com seres da mesma espécie. Um estudo de
uma mulher em momentos de tristeza e alegria mostrou elevação do fluxo sanguíneo no córtex
cingulado anterior sendo que o estado de alegria era inversamente proporcional ao fluxo
sanguíneo da amígdala. Na tristeza, o aumento do fluxo na amígdala era diretamente
proporcional ao estado (George et al, 1997).

Embora seja necessário ter a devida cautela na correlação desses achados em pessoa normal
com os dados encontrados em pacientes deprimidos, uma possível explicação para o aumento
do metabolismo na tristeza pode residir na avaliação do tempo em que a investigação é feita.
Padrões de hiperfrontalidade e aumento do metabolismo em áreas correlacionadas do ponto de
vista funcional são substituídos por hipofrontalismo num curso mais crônico da depressão
(Elbert e Edmeier, 1996).

Além disso, embora os sintomas depressivos em si não sejam provenientes de anormalidades


observadas no córtex cingulado, algumas alterações nos processos cognitivos são certamente
relacionadas a disfunções nessa região.

Discussão

Não está claro se o comprometimento da função cognitiva de pacientes com transtornos do


humor é característico apenas do estado agudo ou se está presente mesmo fora das crises,
sendo, desse modo, um traço estável da doença e, portanto, um marcador da mesma, de onde
se poderiam, inclusive, inferir as alterações neuroanatomofuncionais (Paradiso, Lamberty,
Garvey e Robinson, 1997 ). Alguns autores chegam até mesmo a pôr em dúvida se há
alterações no desempenho neuropsicológico de pessoas com transtornos do humor, alegando
que, se assim fosse, o campo da neuropsicologia estaria em sérios problemas já que os
indivíduos com esses transtornos revelariam resultados indiferenciados dos que ocorrem em
pessoas com lesões cerebrais. Os resultados dos testes neuropsicológicos, segundo esses
autores, seriam normais quando se conseguisse motivar o paciente a cooperar (Laks, et al,
1999). Assim é importante estudar o efeito da motivação sobre o funcionamento
neuropsicológico e comparar indivíduos sãos com deprimidos quanto a esse aspecto. A
simples aplicação de testes selecionados para medir atenção e a constatação de alterações
nos resultados dos mesmos, para concluir que o indivíduo tem deficits de atenção, é um tipo de
raciocínio circular que pouco acrescenta ao assunto, porque não leva em consideração que
essas mesmas alterações podem acontecer, também, pelos problemas psicopatológicos
inerentes à crise depressiva. Também, os aspectos da personalidade e dos esquemas de
funcionamento das cognições depressivas precisam ser levados em conta e podem ser
avaliados objetivamente através de testes como o MMPI (Butscher, Dahlstrom e Graham,
1989) e da escala de depressão de Beck (Beck, Ward e Mendelson, 1961).

Grande parte dos estudos relatam uma relação entre deficits cognitivos e Transtorno
Depressivo Maior, porém, ainda há controvérsias a respeito da gravidade ou magnitude desses
deficits (Bieliauskas, 1993). A função cognitiva de pacientes com Transtorno Depressivo Maior,
pode variar de preservada a extremamente prejudicada, tornando, com isso, difícil a descrição
das disfunções cognitivas que podem fazer o diagnóstico diferencial entre depressão e
demência em idosos.

Conclusão

A Depressão foi abordada, neste trabalho, sob as visões anatômica e neuropsicológica. Isso
possibilitou a percepção do quanto cada uma dessas áreas têm a contribuir. Contudo,
compreender a depressão nestes aspectos isolados pode não ser suficiente. É possível uma
interação entre o psicológico e o biológico. Assim sendo, essas áreas não precisam ser
consideradas como excludentes, pois são enfoques diferentes que lidam com o mesmo
substrato. Com isso, a depressão não deve ser considerada somente uma alteração bioquímica
ou psicológica, mas de ambos.

Os estudos neuropsicológicos com deprimidos apontam para alterações na aquisição da


memória, atenção, concentração, flexibilidade cognitiva e abstração. Quanto aos estudos de
neuroimagem, há evidências para hipofrontalidade, disfunção do giro do cíngulo anterior e
aumento de ventrículos em sujeitos idosos. É importante ressaltar a necessidade de mais
estudos para o melhor entendimento do processamento cognitivo e suas correlações
neuroanatomofuncionais.

Concluímos que a depressão deve ser entendida e avaliada sob múltiplos aspectos, e daí a
importância de uma equipe multidisciplinar visando a uma melhor qualidade de tratamento.

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Zakzanis K. K., Leach L., Kaplan E. (1999). Neuropsychological Diferential Diagnosis. USA:
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Recebido em: 30.07.2002


Primeira decisão editorial em: 18.08.2002
Versão final em: 31.08.2002
Aceito em: 06.09.2002

1
Psicóloga da equipe de avaliação neuropsicológica. Endereço para Correspondência: Rua
Noronha Torrezão, 605, Santa Rosa - Niterói – RJ – 242240- 181. E-
mail patrícia_rporto@hotmail.com
2
Psicóloga da equipe de avaliação neuropsicológica. E-mail hermolin@iis.com.br
3
Ambos os autores contribuíram igualmente para a execução do trabalho
4
Psicóloga e supervisora da equipe de avaliação neuropsicológica. E-
mail ventura@imagelink.com.br
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Jornal de Pediatria
Print version ISSN 0021-7557On-line version ISSN 1678-4782

J. Pediatr. (Rio J.) vol.80 no.2 suppl.0 Porto Alegre Apr. 2004

http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572004000300014

ARTIGO DE REVISÃO
Avaliação neuropsicológica da criança

Danielle I. CostaI, Luciana S. AzambujaI, Mirna W. PortuguezII, Jaderson C. CostaIII

I
Psicólogas pós-graduadas em Neuropsicologia das Epilepsias e Neuropsicologia Infantil,
Programa de Neurologia Infantil e Unidade de Neuropsicologia, Serviço de Neurologia, Hospital
São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)
II
Professora adjunta, Departamento de Medicina Interna e Pediatria, Disciplina de neurologia,
Faculdade de Medicina, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (FAMED-
PUCRS)
III
Professor titular, Departamento de Medicina Interna, Disciplina de Neurologia, FAMED-
PUCRS

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: O objetivo deste trabalho é descrever a metodologia empregada na avaliação


neuropsicológica de crianças e suas contribuições, priorizando aqueles aspectos de interesse
dos profissionais da área da saúde, em especial pediatras, psicólogos, psiquiatras,
neurologistas.
FONTE DOS DADOS: Revisão da literatura sobre o tema proposto nos últimos anos e
incluídas referências de livros texto e manuais dos testes imprescindíveis para a compreensão
do exame neuropsicológico e aporte da experiência da Unidade de Neuropsicologia do HSL -
PUCRS.
SÍNTESE DOS DADOS: A avaliação neuropsicológica não se limita a aplicação de testes
psicométricos e neuropsicológicos organizados em baterias, mas objetiva, também, avaliar a
relação destes achados com a patologia neurológica e/ou comportamental e em estabelecer a
possível área cerebral envolvida. Adicionalmente, a interpretação cuidadosa destes resultados
deve ser associada à análise da situação atual do sujeito e do contexto onde vive.
CONCLUSÃO: O resultado final deve fornecer um perfil neuropsicológico do paciente que,
combinado à avaliação dos aspectos neurológicos/clínicos, psicológicos e sociais, permitirá
auxiliar no seu diagnóstico e/ou orientar sobre o melhor aproveitamento de suas
potencialidades.

Palavra chave: Neuropsicologia, avaliação neuropsicológica infantil, testes, funções corticais


superiores.

Introdução

A neuropsicologia é a ciência que estuda a relação entre o cérebro e o comportamento


humano. Como área específica de estudo, tem um desenvolvimento relativamente recente,
embora sua fundamentação científica seja resultante de várias décadas de conhecimento e
investigação.
Segundo Cunha1, inicialmente, a avaliação neuropsicológica pretendia chegar à identificação e
localização de lesões cerebrais focais. Atualmente, baseia-se na localização dinâmica de
funções, tendo por objetivo a investigação das funções corticais superiores, como, por
exemplo, a atenção, a memória, a linguagem, entre outras. A neuropsicologia entende a
participação do cérebro como um todo no qual as áreas são interdependentes e inter-
relacionadas, funcionando comparativamente a uma orquestra, que depende da integração de
seus componentes para realizar um concerto2. Isso se denomina sistema funcional.

O principal enfoque da neuropsicologia é o desenvolvimento de uma ciência do comportamento


humano baseada no funcionamento do cérebro.

Dessa maneira, sabe-se que, a partir do conhecimento do desenvolvimento e funcionamento


normal do cérebro, pode-se compreender alterações cerebrais, como no caso de disfunções
cognitivas e do comportamento resultante de lesões, doenças ou desenvolvimento anormal do
cérebro.

A neuropsicologia infantil, que tem por objetivo identificar precocemente alterações no


desenvolvimento cognitivo e comportamental, tornou-se um dos componentes essenciais das
consultas periódicas de saúde infantil, sendo necessária a utilização de instrumentos
adequados a esta finalidade (testes neuropsicológicos e escalas para a avaliação do
desenvolvimento).

Os resultados dessas escalas e testes refletem os principais ganhos ao longo do


desenvolvimento e têm o objetivo de determinar o nível evolutivo específico da criança. A
importância desses instrumentos reside principalmente na prevenção e detecção precoce de
distúrbios do desenvolvimento/aprendizado, indicando de forma minuciosa o ritmo e a
qualidade do processo e possibilitando um "mapeamento" qualitativo e quantitativo das áreas
cerebrais e suas interligações (sistema funcional), visando intervenções terapêuticas precoces
e precisas.

Avaliação neuropsicológica na criança - indicações e contribuições

A avaliação neuropsicológica é recomendada em qualquer caso onde exista suspeita de uma


dificuldade cognitiva ou comportamental de origem neurológica. Ela pode auxiliar no
diagnóstico e tratamento de diversas enfermidades neurológicas, problemas de
desenvolvimento infantil, comprometimentos psiquiátricos, alterações de conduta, entre outros.

A contribuição deste exame na criança é extensiva ao processo de ensino-aprendizagem, pois


nos permite estabelecer algumas relações entre as funções corticais superiores, como a
linguagem, a atenção e a memória, e a aprendizagem simbólica (conceitos, escrita, leitura,
etc.). O modelo neuropsicológico das dificuldades da aprendizagem busca reunir uma amostra
de funções mentais superiores envolvidas na aprendizagem simbólica, as quais estão,
obviamente, correlacionadas com a organização funcional do cérebro. Sem essa condição, a
aprendizagem não se processa normalmente, e, neste caso, podemos nos deparar com uma
disfunção ou lesão cerebral.

Ao fornecer subsídios para investigar a compreensão do funcionamento intelectual da criança,


a neuropsicologia pode instrumentar diferentes profissionais, tais como médicos, psicólogos,
fonoaudiólogos e psicopedagogos, promovendo uma intervenção terapêutica mais eficiente.

O conjunto dos instrumentos utilizados nos possibilita uma avaliação global das capacidades
da criança, bem como das dificuldades encontradas por ela em seu desempenho dia a dia. Não
se trata de "rotular" ou "enquadrar" a criança como integrante de grupos problemáticos, e sim
de evitar que tais dificuldades possam impedir o desenvolvimento saudável da criança.

Ainda quanto à avaliação em crianças, torna-se importante salientar algumas questões, entre
elas o fato de o desenvolvimento cerebral ter características próprias a cada faixa etária.
Portanto, dentro desse padrão de funcionamento cerebral, é importante a elaboração de provas
de acordo com o processo maturacional do cérebro. Por exemplo, "quando se fala de
imaturidade na infância, esta não deve ser entendida unicamente como deficiência"3, devido às
peculiaridades do desenvolvimento cerebral na infância. Diferentemente do adulto, o cérebro
da criança está ainda em desenvolvimento, tendo características próprias que garantem uma
diferenciação e especificidade de funções.

Segundo Antunha3, as baterias de testes neuropsicológicos adaptados para crianças são em


número bastante reduzido. Devem contemplar:

_ a organização e o desenvolvimento do sistema nervoso da criança;

_ a variabilidade dos parâmetros de desenvolvimento entre crianças da mesma idade;

_ a estreita ligação entre o desenvolvimento físico, neurológico e a emergência progressiva de


funções corticais superiores.

Testes utilizados

Estão relacionados a seguir alguns testes utilizados na avaliação neuropsicológica,


descrevendo-se, de maneira sucinta, as potencialidades de cada teste ou bateria como
instrumento de ajuda na investigação neuropsicológica.

Inteligência

Os testes de inteligência para crianças medem primariamente habilidades essenciais ao


desempenho acadêmico.

Entre eles, o de Stanford-Binet4 foi o primeiro nos Estados Unidos. Adaptado das escalas
originais de Binet-Simon, baseia-se maciçamente no desempenho verbal e cobre desde os 2
anos até a idade adulta (23 anos), fornecendo uma idade mental e um quociente de inteligência
(QI).

O padrão-ouro internacional para a quantificação das capacidades intelectuais são as escalas


Wechsler de inteligência, subdivididas pela faixa de idade. Essas escalas consistem em uma
série de perguntas e respostas padronizadas que medem o potencial do indivíduo em áreas
intelectuais diferentes, como o nível de informação sobre assuntos gerais, a interação com o
meio ambiente e a capacidade de solucionar problemas cotidianos.

O teste WPPSI5 (do inglês Wechsler Preschool and Primary Scale of Intelligence - Escala de
Inteligência Wechsler para Pré-Escolares e Primário) é uma versão para crianças menores das
escalas Wechsler, permitindo avaliar a inteligência de crianças entre 4 e 6,5 anos. É constituída
por seis subtestes verbais e cinco de natureza manipulativa. Normalmente, a aplicação de
cinco subtestes de cada uma das subescalas (verbal e de execução) é suficiente para uma
análise fidedigna. A escala também permite recolher algumas informações sobre a organização
do comportamento da criança.

O WISC-III6 (Wechsler Intelligence Scale for Children-III - Escala de Inteligência Wechsler para
Crianças-III) é a escala mais usada para avaliar a inteligência de crianças cobrindo as idades
de 6 anos a 16 anos, 11 meses e 30 dias. Fornece escores nas escalas verbal e de execução,
bem como um QI de escala total. Inclui muitos tipos de tarefas, oportunizando a observação
das dificuldades da criança e de suas habilidades. É importante salientar que crianças com
dificuldades motoras em geral são penalizadas neste teste, que não deve ser usado quando tal
deficiência estiver presente. O subteste Cubos do WISC-III (Figura 1) visa averiguar a
capacidade de análise, síntese e planejamento de coordenadas vísuo-espaciais e a praxia
construtiva. Pede-se ao sujeito que reproduza, com cubos de faces coloridas, desenhos que
lhe são mostrados. Para cada modelo é estipulado um prazo limite para execução.
Embora o QI não seja uma medida para localizar disfunções cerebrais, o resultado de QI
contribui para dar maiores informações sobre o nível geral de funcionamento do paciente e,
assim, servir de referência para outras funções mais específicas, como memória, linguagem,
etc. Tanto o Stanford-Binet como o WISC-III e o WIPPSI são administrados individualmente a
cada sujeito.

Quando o paciente não apresenta condições de expressar-se verbalmente, usam-se os testes


Matrizes Progressivas de Raven7 e Escala de Maturidade Mental Colúmbia8, que avaliam a
inteligência geral e estimam a capacidade de raciocínio geral de crianças de uma forma não-
verbal. O objetivo do teste Matrizes Progressivas de Raven (Figura 2) é descobrir as relações
que existem entre as figuras e imaginar qual das oito figuras apresentadas completaria o
sistema.

Tradicionalmente, a inteligência está relacionada com as habilidades acadêmicas, porém


existem outros tipos de inteligência (como, por exemplo, a caracterizada pela capacidade de
relacionar idéias complexas, formar conceitos abstratos, derivar implicações lógicas através de
regras gerais) que, muitas vezes, não é possível mensurar através dos testes convencionais. A
este respeito, Primi9,10 salienta que, nas abordagens da inteligência, duas são tratadas como
fundamentais: a inteligência cristalizada (que prioriza o conhecimento) e a inteligência fluida
(que prioriza o raciocínio). A primeira se refere à profundidade das informações adquiridas via
escolarização e geralmente é usada na resolução de problemas semelhantes ao que se
aprendeu no passado (como nos testes tradicionais de inteligência). A segunda se refere à
capacidade de processamento cognitivo, ou seja, a capacidade geral de processar informações
ou as operações mentais realizadas quando se resolvem problemas relativamente novos.

Com o propósito de avaliar a inteligência de uma forma global, foi padronizada para a
população brasileira a bateria de provas de raciocínio (BPR-5) 11, a qual oferece estimativas do
funcionamento cognitivo geral e das habilidades do indivíduo em cinco áreas específicas:
raciocínio abstrato, verbal, espacial, numérico e mecânico. Este instrumento auxilia os
examinadores a tomarem decisões sustentadas na avaliação das aptidões e raciocínio geral,
tais como, por exemplo, na avaliação das dificuldades de aprendizagem. É organizado em duas
formas: A) para estudantes da 6ª à 8ª série do ensino fundamental; B) para alunos da 1ª à 3ª
série do ensino médio.

Memória

Para esta função, são utilizados instrumentos que avaliam a capacidade de aprendizado de
funções de memória, como, por exemplo, o Teste de Aprendizado Auditivo Verbal de Rey (Rey
Auditory Verbal Learning Test - RAVLT) e o Teste de Aprendizado Visual de Desenhos de Rey
(Rey Visual Design Learning Test - RVDLT)12. Os testes que envolvem aprendizado, isto é, a
repetida exposição ao material a ser recordado, são mais sensíveis para detectar prejuízos de
memória do que testes apresentados somente uma vez. No teste de Aprendizado Auditivo
Verbal de Rey (Figura 3), lê-se a lista de palavras para o examinando, pausadamente, cinco
vezes consecutivas. Após cada uma das vezes em que são apresentadas as 15 palavras, o
sujeito deve fazer a evocação do material, sem precisar seguir a mesma ordem de
apresentação.
O WRAML (do inglês Wide Range Assessment of Memory and Learning _ Short Form)13 é um
instrumento psicométrico destinado a avaliar a capacidade de aprender e memorizar
ativamente vários tipos de informação em pacientes na faixa etária de 5 a 17 anos (memória
visual, aprendizado verbal, memória para histórias).

Linguagem

Um dos testes mais utilizados para a avaliação da linguagem é o Boston Naming Test14, que
utiliza figuras de objetos para avaliar a capacidade de reconhecimento e nomeação. É
empregado em crianças com dificuldades de compreensão ou produção de palavras ou
material verbal escrito. Pode ser usado a partir dos 6 anos de idade. Também são utilizados o
Teste de Fluência verbal (FAS, do inglês Verbal Fluency), testes de compreensão, como o
Teste de Token15, compreensão de textos, escrita e leitura. A avaliação inclui, ainda, os
seguintes tópicos: órgãos fonoarticulatórios, hábitos orais e desenvolvimento da linguagem.

Algumas particularidades precisam ser respeitadas e levadas em conta quando se avalia uma
criança com lesão cerebral. Cabe ao profissional ter clareza dos propósitos, conhecimentos,
habilidade e adequação das técnicas e instrumentos de investigação a serem utilizados, como
também ter conhecimento das possíveis alterações e limitações decorrentes da lesão cerebral,
para que não sejam cometidos equívocos ao concluir-se a avaliação neuropsicológica.

Em muitas das crianças com lesão cerebral, encontram-se alterados os canais formais de
expressão e comunicação com o meio. Sendo assim, o profissional por vezes precisa criar
estratégias a fim de que a criança possa se comunicar e, então, interagir e melhor entender o
que se passa com ela.

Devemos auxiliar a criança a nos mostrar seu potencial e a comunicar-se utilizando recursos
que lhe possibilitem compreender o que está sendo solicitado, a representar o que compreende
e/ou quer realizar (através de gestos, mímicas, fala, expressão gráfica ou ação).

Lobos frontais

Nos últimos anos, cresceu muito o interesse pelas funções do lobo frontal. É nessa parte do
cérebro que se encontram as maiores diferenças entre os seres humanos e seus antepassados
na evolução. Os lobos frontais constituem uma das maiores regiões do encéfalo, com funções
ainda pouco conhecidas, embora nos últimos anos tenham se acumulado importantes
conhecimentos sobre suas atividades. Agora se sabe que é no lobo frontal que se situam as
habilidades humanas mais complexas, como o planejamento de ações seqüenciais, a
padronização de comportamentos sociais e motores, parte do comportamento automático
emocional e da memória.

Para a adequada avaliação das funções "frontais" (funções executivas), é necessário ter
conhecimento das etapas evolutivas desta estrutura, isto é, do seu processo de maturação, o
que é particularmente importante quando avaliamos uma criança. A avaliação do lobo frontal é,
em geral, mais difícil de ser realizada, pois envolve funções mais complexas e pouco
conhecidas. Entre as diversas funções dos lobos frontais estão a plasticidade do pensamento,
a capacidade de julgamento, a habilidade de produzir idéias diferentes, a organização da
informação, a capacidade de dar respostas adequadas aos estímulos, de estabelecer e trocar
estratégias e de planejar uma ação. Essas habilidades podem ser avaliadas através do teste de
fluência verbal, fluência para desenhos, Wisconsin Card Sort Test (WCST)16, Trail Making
Test17 e Stroop Test18, que avaliam a capacidade de manter a atenção concentrada e de não
sofrer interferências de respostas não-exigidas no momento. No teste Trail, a tarefa do sujeito
na parte A (Figura 4) é ligar, com o lápis, círculos consecutivamente numerados, distribuídos
aleatoriamente em uma folha de papel; na parte B (Figura 5), existem, além dos números,
também letras impressas na folha de resposta, e a seqüência a ser ligada deve intercalar as
duas séries, números e letras (1-A, 2-B, 3-C). A tarefa deve ser realizada o mais rapidamente
possível.
O WCST avalia a função executiva do lobo frontal. Mede a modulação de respostas impulsivas,
a direção do comportamento, as habilidades em desenvolver e manter uma estratégia na
solução de um problema, apesar das mudanças de contingência, a flexibilidade, o
planejamento, a organização, a ineficiência de conceitualização inicial e a dificuldade em
encontrar soluções para problemas cotidianos, bem como o nível de perseveração, que vem a
ser o problema que muitas pessoas têm de ficar remoendo um mesmo assunto ou repetindo
um mesmo comportamento motor. Pode ser aplicado a partir dos 6 anos de idade.

Diversos subtestes da Escala de Inteligência Wechsler (WISC III e WPPSI) também auxiliam na
investigação de disfunções frontais, tais como analogias, compreensão, códigos, etc.

Lobos parieto-occipitais

As funções relacionadas às habilidades vísuo-espaciais, organização vísuo-espacial


(percepção) e planejamento são avaliados pelo teste de cópia da Figura Complexa de Rey-
Osterrieth19, enquanto que habilidades percepto-vísuo-espaciais são avaliadas pelo teste
de Hooper Visual Organization20. As figuras de Rey (Figura 6) objetivam avaliar a atividade
perceptiva e a memória, verificando o modo como o sujeito apreende os dados perceptivos que
lhe são apresentados e o que foi conservado espontaneamente pela memória. A testagem é
composta de duas etapas: a primeira é a cópia da figura, e a segunda é a recordação da
mesma após 30 minutos. A avaliação também pode ser realizada através do subteste Cubos
das escalas Wechsler.
Escala do Desenvolvimento Infantil de Bayley (Bayley Scale of Infant Development _ Bayley II-
Bsid-II)

O Bayley II21 é um teste destinado à avaliação do desenvolvimento de crianças nas idades de 1


a 42 meses. O teste é dividido em três escalas: motora, mental e de comportamento, com
quociente de desempenho para cada área. As três escalas são consideradas complementares,
tendo cada uma sua importância na avaliação da criança.

A escala mental avalia aspectos relacionados com o desenvolvimento cognitivo e com a


capacidade de comunicação (capacidade de discriminar formas, atenção, habilidade motora
fina, compreensão de instruções, nomeação, resolução de problemas e habilidades sociais).

A escala motora avalia o grau de coordenação corporal (aspectos como sentar, levantar,
caminhar, subir e descer escadas) e motricidade fina das mãos e dedos.

A escala comportamental permite avaliar aspectos qualitativos do comportamento da criança


durante o teste, tais como atenção, compreensão de orientações, engajamento frente às
tarefas, regulação emocional, entre outros.

O material do teste é atraente e de fácil utilização. Também existe o Bayley Infant


Neurodevelopment Screener _ BINS, que é uma versão simplificada, usada para triagem de
desenvolvimento em crianças de 3 a 24 meses, assim como o Denver II22.

Análise dos resultados

Mencionamos alguns dos testes que são utilizados na avaliação de crianças. Sugere-se a
utilização de mais de um teste ao avaliar cada função, para uma maior fidedignidade das
conclusões neuropsicológicas.

Salienta-se, ainda, a importância de analisar a performance completa do paciente em todo o


processo e sua combinação com outros exames. A contribuição dos achados do exame
neurológico, de neuroimagem, neurofisiológico e neuropsicológico é trabalho para uma equipe
multidisciplinar.
Em conclusão, o neuropsicólogo escolhe seus instrumentos baseado na sua experiência e
treinamento específico, mas deve ter consciência de que os testes não são absolutos. A
interpretação dos resultados exige conhecimento de aspectos cognitivos e afetivos, assim
como de fatores que possam interferir em uma tarefa.

O psicólogo interessado nessa área deve estar ciente da complexidade de cada função e das
formas de avaliá-la através de testes. Estando inteirado dessas questões, deve aprofundar
seus estudos sobre o funcionamento cerebral e as diversas patologias do sistema nervoso
central. Diante do resultado quantitativo obtido através dos testes, faz-se necessária uma
avaliação qualitativa detalhada e estudos das funções intelectuais implicadas em cada um dos
itens de cada prova, permitindo que se faça a relação entre função/disfunção e área cerebral.
Só após essa análise criteriosa será possível contribuir com recomendações e condutas ao
programa de reabilitação dessa criança e corroborar a investigação clínica.

Referências

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22. Frankenurg WK, et al. Denver II. Denver (CO): Denver Developmental Materials, Inc.;
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Endereço para Correspondência


Mirna Wetters Portuguez
Serviço de Neurologia, Unidade de Neuropsicologia
Hospital São Lucas - PUCRS
Av. Ipiranga, 6690
CEP 90610-000 - Porto Alegre, RS
Fone/Fax: (51) 3339.4936
E-mail: mirna@pucrs.br

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Psico-USF, v. 13, n. 1, p. 125-133, jan./jun. 2008 125 1 Endereço para
correspondência: Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Núcleo de Estudos e
Pesquisas em Adolescência (NEPA/UFRGS) Rua Ramiro Barcelos, 2.600 – sala 115 – Santa
Cecília – 90035-003 – Porto Alegre-RS E-mail: jelessinger@ig.com.br

Avaliação neuropsicológica dos transtornos psicológicos na infância: um estudo de


revisão

Jeane Lessinger Borges – Universidade Federal do Rio Grande do Sul1 Clarissa


Marceli Trentini – Universidade Federal do Rio Grande do Sul Denise Ruschel Bandeira –
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Débora Dalbosco Dell’Aglio – Universidade Federal
do Rio Grande do Sul

Resumo

Este artigo apresenta uma revisão da literatura sobre a avaliação neuropsicológica dos
déficits cognitivos associados aos transtornos psicológicos na infância e adolescência, com
base em pesquisas publicadas no período de 2000 a 2006. Foi realizado um levantamento
abrangendo publicações nacionais e internacionais indexadas nas bases de dados Medline,
SciELo e PsycInfo. Os resultados indicaram um aumento da produção científica na área da
avaliação neuropsicológica do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, autismo,
transtornos de humor e transtorno de conduta. Observou-se a presença de poucos estudos
nacionais, indicando a necessidade de pesquisas na área de avaliação neuropsicológica no
Brasil. Palavras-chave: Avaliação neuropsicológica; Transtornos psicológicos; Testes; Infância.
Neuropsychological assessment of psychological disorders in childhood: A review study
Abstract This study comprises a review about neuropsychological assessment of Borges, J. L.,
Trentini, C. M., Bandeira, D. R., Dell’Aglio, D. D. Avaliação neuropsicológica dos transtornos
psicológicos na infância... Psico-USF, v. 13, n. 1, p. 125-133, jan./jun. 2008 126 têm sido
realizadas (Cataldo, Nobile, Lorusso, Battaglia & Molteni, 2005). De um modo geral, essas
pesquisas demonstram alterações no funcionamento dos sistemas cerebrais em relação aos
transtornos mentais na infância e na adolescência, contribuindo para uma melhor compreensão
teórica sobre as bases neurobiológicas subjacentes a esses quadros. Contudo, parece haver
uma lacuna na literatura brasileira no que se refere a este tema. Assim, considerando a
importância da avaliação neuropsicológica infantil para a investigação clínica dos transtornos
psicológicos, este estudo apresenta uma revisão da literatura sobre o tema e descreve
brevemente os instrumentos neuropsicológicos mais utilizados nesta área. Método Foi
realizada uma revisão de literatura investigando os estudos teóricos e empíricos relacionados à
avaliação neuropsicológica dos transtornos psicológicos em crianças e adolescentes nos
seguintes Bancos de Dados: Medline, SciELo e PsycInfo. “Os descritores utilizados foram os
seguintes termos: “avaliação neuropsicológica”, “testes neuropsicológicos”, “neuropsychological
evaluation”, “neuropsychological assessment” e “neuropychological battery”, tendo sido
selecionada a faixa etária de zero a 14 anos. Neste estudo, foram selecionados artigos
publicados em revistas científicas nacionais e internacionais no período de janeiro de 2000 a
junho de 2006. Inicialmente, foram encontrados 1.919 artigos. Buscou-se, então, refinar esta
primeira seleção, buscando dar uma maior ênfase aos estudos sobre o uso da avaliação
neuropsicológica dos transtornos psicológicos na infância e adolescência. O título e o resumo
dos artigos foram utilizados nesta segunda etapa e, ao final, 154 artigos foram selecionados
para esta revisão. A partir desse resultado, uma análise de freqüência da avaliação
neuropsicológica e o tipo de transtorno psicológico foi realizada. Resultados A Tabela 1
apresenta a freqüência de artigos sobre os prejuízos neuropsicológicos associados a diferentes
transtornos psicológicos em crianças e adolescentes, por transtorno e por ano. De um modo
geral, observou-se que há uma crescente produção científica referente ao TDAH (65,60%).
Ainda foram encontrados estudos sobre a avaliação neuropsicológica do autismo (16,80%), dos
transtornos de humor (9,74%) e transtorno de conduta (7,80%) em crianças e adolescentes.
Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) Para a descrição sobre as pesquisas
na área da avaliação neuropsicológica do TDAH foram selecionados 26 estudos, dos 101
encontrados nesta revisão, os quais têm ressaltado a importância do papel das funções
executivas (FE) e do córtex frontal neste transtorno. Ressalta-se que foram encontrados dois
estudos nacionais. No primeiro, Amaral e Guerreiro (2001) apresentaram uma proposta de
avaliação neuropsicológica para o diagnóstico de TDAH. No segundo, Schmitz e colaboradores
(2002) sugeriram diferenças no desempenho cognitivo entre adolescentes com diferentes
subtipos de TDAH, indicando a necessidade de diagnóstico específico. Os artigos revisados
revelaram uma associação entre prejuízos nas FE e o TDAH (Reeve & Schandler, 2001;
Shallice e colaboradores, 2002). Crianças com TDAH têm apresentado baixo desempenho na
inibição de resposta, no planejamento de tarefas e na atenção seletiva, e um maior aumento na
perseveração de resposta, quando comparadas a grupos controle (Papadopoulos, Panayiotou,
Spanoudis & Natsopoulos, 2005; Schulz e colaboradores, 2005). Pesquisas indicaram
diferentes direções de desfecho no desempenho cognitivo quando são avaliadas as variáveis
(a) subtipos do TDAH: desatento, hiperativo e misto (Hinshaw, Sam, Treuting, Carte & Zupan,
2002; Nigg, Blaskey, Huan-Pollock & Rappley, 2002; Schmitz e colaboradores, 2002); (b)
gênero (Seidman e colaboradores, 2005); (c) período do desenvolvimento (Drechsler, Brandeis,
Foldenyi, Imhof & Steinhausen, 2005); e (d) presença de comorbidade psiquiátrica (Fischer,
Barkley, Smallish & Fletcher, 2005; Oosterlaan, Scheres & Sergeant, Tabela 1 – Descrição da
freqüência de artigos por transtorno e por ano na avaliação neuropsicológica infantil Transtorno
psicológico/ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 n % Avaliação neuropsicológica do
TDAH 10 17 19 8 18 29 101 65,60 Avaliação neuropsicológica do autismo 6 5 2 2 7 4 26 16,80
Avaliação neuropsicológica dos Transtornos de humor 1 2 5 7 15 9,74 Avaliação
neuropsicológica do transtorno de conduta 3 3 4 2 12 7,80 Total 19 23 26 8 29 45 4 154 100
Borges, J. L., Trentini, C. M., Bandeira, D. R., Dell’Aglio, D. D. Avaliação neuropsicológica dos
transtornos psicológicos na infância... Psico-USF, v. 13, n. 1, p. 125-133, jan./jun. 2008 127
2005; Sarkis, Sarkis, Marshall & Archer, 2005). Ainda foram citados déficits na memória
imediata como um importante componente neuropsicológico do TDAH (Cornoldi e
colaboradores, 2001; Westerberg, Hirvikoski, Forssberg & Klingberg, 2004). Estudos
investigaram o uso do metilfenidato em crianças com TDAH, apontando os benefícios deste na
atenção, memória imediata e tarefas visoespaciais (Bedard, Ickowicz & Tannock, 2002; Bedard,
Martinussen, Ickowicz & Tannock, 2004; O’Driscoll e colaboradores, 2005). Na mesma direção,
os resultados indicaram que o efeito do Metilfenidato interfere de forma diferenciada na
atenção, dependendo da dose utilizada (Konrad, Günther, Hanisch & Herpertz-Dahlmann,
2004). Os artigos revisados apontaram uma maior validade preditiva e discriminante para o
diagnóstico de TDAH e seus déficits cognitivos quando se utilizam múltiplos instrumentos
neuropsicológicos para avaliação de FE (Doyle, Biederman, Seidam, Weber & Faraone, 2000;
Perugini, Harvey, Lovejoy, Sandstrom & Webb, 2000). Um estudo de metanálise descreveu os
principais instrumentos neuropsicológicos utilizados para a avaliação do TDAH, entre eles, o
Continuous Performance Test (CPT), Gordon Diagnostic System (GDS), Children’s Checking
Task (CCT), Stop Signal Task, Trail Making Test, Wisconsin Card Sorting Test (WCST), Stroop
Interference Task, entre outros (Frazier, Demaree & Youngstrom, 2004). Particularmente, dois
instrumentos foram mais utilizados na avaliação cognitiva do TDAH nas pesquisas revisadas: o
Wisconsin Card Sorting Test (WCST) (ou Teste Wisconsin de Classificação de Cartas) e o
Stroop Color-Word Test. Em relação ao WCST, uma metanálise (32 artigos) realizada por
Romine e colaboradores (2004) apontou características de sensitividade e especificidade
adequadas deste instrumento entre grupos com TDAH e grupos controle. Conforme esses
autores, o tamanho do efeito (effect size) das variáveis do WCST variaram entre um efeito
médio (0.5) (percentual de acertos, total de erros, número de categorias e erros perseverativos)
e um baixo efeito (erros não-perseverativos e fracasso em manter o contexto). Tais dados
suportam as evidências de outro estudo de metanálise, indicando em 70% dos estudos da
avaliação de déficits do lobo frontal o uso do WCST (Alvarez & Emory, 2006). Embora um pior
desempenho no WCST possa indicar prejuízos no funcionamento do córtex frontal, esse
resultado isolado não pode ser considerado suficiente para o diagnóstico de TDAH (Romine e
colaboradores, 2004). Em relação ao Stroop Test, o estudo de metanálise, realizado por
Homack e Riccio (2004), apontou que diferentes versões desse instrumento têm sido utilizadas
na avaliação de FE em crianças e adolescentes, sendo a versão de Charles Golden a mais
comumente citada (em 22 dos 33 estudos revisados). De acordo com esses autores, o Stroop é
capaz de discriminar prejuízos neuropsicológicos em crianças com TDAH quando comparadas
a grupos não-clínicos. No entanto, não há consistência nos resultados para discriminar o grupo
de crianças TDAH de outros grupos clínicos. Os resultados indicaram especificidade do Stroop
para discriminar crianças com TDAH de crianças com transtorno de conduta, comportamento
disruptivo e problemas emocionais; mas não foi capaz de discriminar crianças com problemas
de aprendizagem, autismo e síndrome de Tourette. Nesse sentido, embora um pior
desempenho no Stroop seja indicativo de prejuízos frontais, este não é suficiente para o
diagnóstico de TDAH. Autismo Foram encontradas 26 pesquisas enfocando os aspectos
neuropsicológicos do autismo. A maioria desses estudos (n= 10) apontou déficits em FE e na
memória (n= 6). De um modo geral, baixo desempenho no WCST (Shu, Lung, Tien & Chen,
2001) e falhas nas habilidades sociais, na comunicação, na memória de trabalho, na atenção e
no comportamento direcionado a metas foram relacionadas ao baixo desempenho nas FE
(Bishop & Norbury, 2005; Gilotty, Kenworthy, Sirian, Black & Wagner, 2002; Ruble, & Scott,
2002). Contudo, pesquisas têm apontado peculiaridades na disfunção executiva no autismo e
entre os diferentes grupos de crianças com transtornos do desenvolvimento. Nesse sentido, um
estudo investigou a presença de prejuízos em FE em crianças autistas e em crianças com
TDAH, comparando-as ao grupo controle, enfocando a inibição de resposta, o planejamento, a
flexibilidade cognitiva e a memória (working memory) (Goldberg e colaboradores, 2005). Os
resultados indicaram que o grupo autista obteve pior desempenho na memória imediata, porém
não foi encontrada diferença significativa entre os grupos nas demais tarefas. Déficits em
tarefas verbais, que necessitavam de maior habilidade em mudança cognitiva, e na iniciativa
para estratégias de recuperação léxica foram encontrados em jovens adultos com autismo e/ou
transtorno de Asperger, enquanto a inibição de resposta não apresentou alteração (Kleinhans,
Akshoomoff & Delis, 2005). O estudo de Ozonoff e Strayer (2001) apontou que não houve
diferença entre crianças com autismo e o grupo controle em tarefas neuropsicológicas que
avaliavam working memory. Em contrapartida, prejuízos nessa função foram encontrados em
crianças autistas, bem como inibição de controle e planejamento, embora estes não tenham
sido correlacionados a déficits de linguagem (Joseph, McGrath & Tager-Flusberg, 2005). Nesse
sentido, é necessária certa cautela na afirmação de que FE estão afetas no autismo, uma vez
que os prejuízos podem ser Borges, J. L., Trentini, C. M., Bandeira, D. R., Dell’Aglio, D. D.
Avaliação neuropsicológica dos transtornos psicológicos na infância... Psico-USF, v. 13, n. 1, p.
125-133, jan./jun. 2008 128 específicos e não globais. Ainda, ao avaliar a presença da
diferença de desempenho em FE entre crianças autistas, crianças com transtorno de Asperger
e crianças com transtorno do desenvolvimento não especificado, uma pesquisa observou que
este último grupo apresentou melhor desempenho do que os dois primeiros (Verte, Geurts,
Roeyers, Oosterlaan & Sergeant, 2006). Em relação à memória, um pior desempenho no
funcionamento visual, verbal e espacial foi encontrado em crianças autistas (Williams,
Goldstein & Minshew, 2006). Mediante uma bateria neuropsicológica da memória e de
ressonância magnética, foi encontrada uma associação entre os prejuízos dessa função e o
lobo temporal medial (Salmond, Ashburner, Conelly, Friston, Gadian & VerghaKhadem, 2005).
Em oposição a este dado, crianças autistas não apresentaram falhas nem em tarefas de
memória implícita nem de memória explícita, sugerindo que não há evidências de déficits no
lobo temporal medial (Renner, Klinger & Klinger, 2000). Ainda, crianças com diferentes níveis
de autismo apresentaram desempenhos variados em tarefas de memória (Bebko & Ricciuti,
2000) e usaram mais estratégia de recência na recuperação de conteúdo verbal (Renner e
colaboradores, 2000). Transtornos de humor Na literatura revisada, observou-se uma maior
ênfase sobre a avaliação neuropsicológica do transtorno bipolar (TB) entre os transtornos de
humor na infância e adolescência (11 de 15 estudos). De um modo geral, pacientes pediátricos
com TB apresentaram prejuízos na memória declarativa, atenção sustentada, atenção visual,
flexibilidade cognitiva e velocidade psicomotora (Dickstein e colaboradores, 2004; Doyle e
colaboradores, 2005; Glahn e colaboradores, 2005). Pior desempenho em tarefa de cognição
social e flexibilidade de resposta foram encontrados em um grupo pediátrico de TB (McClure e
colaboradores, 2005). Ao revisarem estudos neuropsicológicos e de neuroimagem, Caetano e
colaboradores (2005) indicaram déficits na atenção, memória e em FE em crianças e
adolescentes com TB, quando comparados a grupo controle e outros grupos clínicos. Os
estudos de neuroimagem sugeriram anormalidades no funcionamento do circuito frontallímbico
associadas ao TB. Pesquisas realizadas, ainda, propuseram que os déficits neuropsicológicos
do TB tanto podem estar associados a comorbidade com o TDAH, para tarefa de atenção
mapeada em fMRI scans (Adler e colaboradores, 2005), quanto podem ser independentes,
para atenção sustentada, memória e velocidade de processamento (Doyle e colaboradores,
2005). Um estudo longitudinal indicou que 67% dos jovens adultos com TB apresentaram
desempenho mais baixo no WCST, avaliados na adolescência, quando foram comparados a
indivíduos sem depressão maior (17%) e com depressão unipolar (19%) (Meyer e
colaboradores, 2004). Além disso, diferenças no desempenho cognitivo entre crianças
deprimidas e crianças ansiosas foram investigadas. Nesse sentido, crianças e adolescentes
com depressão (grupo depressão) e ansiedade (grupo ansiedade) foram avaliadas mediante
tarefas de atenção e de memória, e comparadas a grupo controle (Günther, Holtkamp, Jolles,
Herpertz-Dahlmann & Konrad, 2004). O resultado desse estudo apontou uma dissociação entre
os grupos depressão e ansiedade, tendo sido encontrados prejuízos na memória verbal apenas
em crianças deprimidas. Não foram observadas diferenças no desempenho da atenção entre
esses dois grupos. Em outro estudo, meninos ansiosos e deprimidos apresentaram déficits na
seqüência, na alternância e na resolução de problemas, evidenciando prejuízo no
funcionamento do lobo frontal (Emerson, Mollet & Harrison, 2005). Ainda crianças deprimidas
obtiveram pior desempenho no Verbal Fluency Test e no Stroop Test do que o grupo controle,
sugerindo problemas na atenção e em FE (Cataldo, Nobile, Lorusso, Battaglia & Molteni, 2005).
Transtorno de conduta Nesta revisão foram encontrados 12 estudos referentes aos prejuízos
neuropsicológicos do transtorno de conduta (TC), transtorno desafiador opositivo (TDO) e/ou
comportamento delinqüente. O TC na infância e a delinqüência juvenil têm sido relacionados à
presença de déficits em FE (Kelly, Richardon, Hunter & Knapp, 2002; Veneziano, Veneziano,
LeGrand & Richards, 2004). Foram encontradas três pesquisas de revisão teórica sobre a
presença de prejuízos cognitivos relacionados ao TC (Hill, 2002; Raine, 2002; Teichner &
Golden, 2000). Tais pesquisas providenciam um suporte teórico acerca de déficits
neuropsicológicos associados às FE, particularmente, em relação a falhas na inibição do
controle de impulso, na avaliação das conseqüências e na regulação do afeto. Da mesma
forma, esses estudos indicaram a presença de outras variáveis (genéticas, temperamentais e
ambientais) no desenvolvimento do TC, bem como sugeriram um continuum desses déficits ao
longo do desenvolvimento. Um outro aspecto apontado nos estudos sobre prejuízos
neuropsicológicos do TC diz respeito à presença de comorbidade com o TDAH (Oosterlaan e
colaboradores, 2005; Toupin, Déry, Pauzé, Mercier & Fortin, 2000). No estudo longitudinal de
Toupin e colaboradores (2000), crianças com TC, em follow-up de um ano, apresentaram pior
desempenho em quatro de cinco tarefas de FE. Os sintomas de TDAH foram considerados
preditores de TC, mas não o desempenho cognitivo. Já na Borges, J. L., Trentini, C. M.,
Bandeira, D. R., Dell’Aglio, D. D. Avaliação neuropsicológica dos transtornos psicológicos na
infância... Psico-USF, v. 13, n. 1, p. 125-133, jan./jun. 2008 129 pesquisa de Oosterlaan e
colaboradores (2005) não foram encontrados déficits em FE, em crianças com TC. Porém a
presença TDAH parece predizer um pior desempenho em FE nos casos de comorbidade entre
TDAH/TDO/TC. Desta forma, os déficits nas FE envolvidos nos casos de TC ainda não estão
totalmente esclarecidos. Considerações finais O presente estudo buscou apontar um panorama
das publicações científicas recentes na área da avaliação neuropsicológica da criança e do
adolescente. Como pode ser visto na sessão de resultados, os estudos que investigam
aspectos neuropsicológicos dos transtornos na infância dedicam-se basicamente à avaliação
das FE, sobretudo no que se refere aos prejuízos do córtex pré-frontal no TDAH, autismo, TB e
TC. Em relação ao autismo, os resultados controversos impedem uma generalização dos
déficits em FE. Crianças deprimidas apresentaram pior desempenho na memória e em FE, e
nos casos de TB pediátrico foram encontrados prejuízos na memória, na atenção e em FE.
Esses dados corroboram o estudo de Rocca e Lafer (2006), referente aos aspectos
neuropsicológicos do TB. Na mesma direção, aspectos neuropsicológicos da depressão,
incluindo alterações na atenção sustentada, no controle inibitório e na capacidade de
alternância de foco atentivo foram apontados por Rozenthal, Lakc e Engelhard (2004). Em
relação aos problemas de conduta na infância e adolescência, pesquisas futuras se fazem
necessárias, por não haver maior clareza nos achados neuropsicológicos encontrados até o
momento. A presença de prejuízos nas FE também tem sido encontrada com adultos com
comportamento antisocial e psicopatia (Morgan & Lilienfeld, 2000). Nesse sentido, pesquisas
longitudinais podem fornecer elementos para uma maior compreensão sobre mudanças ou
permanência dos déficits cognitivos na evolução do TC na infância para comportamento anti-
social na vida adulta. Tendo em vista a predominância de alterações funcionais das FE nos
transtornos psicológicos revisados, ressalta-se a importância de uma maior compreensão dos
aspectos neurodesenvolvimentais das FE na área da neuropsicologia infantil, uma vez que
estas se desenvolvem até o final da adolescência. A avaliação neuropsicológica das FE na
criança pode fornecer subsídios à prevenção e à intervenção clínica, bem como elementos
para um modelo conceitual mais complexo sobre os quadros psicológicos, integrando os
prejuízos cognitivos às alterações comportamentais e emocionais. Em relação aos
instrumentos utilizados na avaliação das FE, destaca-se a importância de novos estudos sobre
a validação e a normatização de testes neuropsicológicos, buscando apontar critérios de
fidedignidade e validade apropriados ao contexto sociocultural, à amostra selecionada (clínica e
não-clínica) e aos diferentes quadros psicopatológicos e/ou neurológicos. Ressalta-se, ainda,
que poucos estudos brasileiros foram encontrados nesta revisão. Uma hipótese é que a
avaliação neuropsicológica ainda seja um campo de atuação recente e pouco explorado pelos
psicólogos, apesar da aprovação da neuropsicologia como uma área de especialização, pelo
Conselho Federal de Psicologia. Nesse sentido, destaca-se a importância deste campo de
atuação profissional, que pode contribuir para um maior conhecimento sobre as relações entre
prejuízos cognitivos e psicopatologia. Sugere-se, ainda, a realização de estudos longitudinais
que possam contribuir para uma melhor compreensão dos prejuízos cognitivos e dos efeitos da
cronificação ou remissão dos sintomas ao longo do desenvolvimento. Uma maior integração
entre as pesquisas clínicas e os estudos de neuroimagem pode aumentar a validade dos
resultados sobre prejuízos cognitivos associados a transtornos psicológicos na infância.
Algumas limitações foram encontradas nos estudos revisados. A presença de comorbidades
psiquiátricas, o uso de medicação psicotrópica, o pequeno tamanho das amostras, amostras
muito específicas e a utilização de instrumentos reduzidos são algumas das limitações que
podem comprometer a generalização dos resultados. Dessa forma, observa-se que são
necessários cuidados metodológicos, principalmente na composição das amostras e na
escolha dos instrumentos, para que os estudos sobre prejuízos neuropsicológicos na infância
sejam mais consistentes.

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Reformulado em abril de 2007 Aprovado em maio de 2007 Borges, J. L., Trentini, C. M.,
Bandeira, D. R., Dell’Aglio, D. D. Avaliação neuropsicológica dos transtornos psicológicos na
infância... Psico-USF, v. 13, n. 1, p. 125-133, jan./jun. 2008 133 Sobre as autoras: Jeane
Lessinger Borges é psicóloga, graduada pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos
(UNISINOS), aluna de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Curso de Especialização em
Neuropsicologia (UFRGS). Clarissa Marceli Trentini é psicóloga, especialista em Psicologia
Clínica: ênfase em Avaliação Psicológica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul (PUCRS) e Doutora em Ciências Médicas – ênfase em Psiquiatria (UFRGS). Atualmente é
professora adjunta do Instituto de Psicologia (UFRGS). Denise Ruschel Bandeira é psicóloga,
mestre e doutora em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS), professora e coordenadora do
Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Débora Dalbosco Dell’Aglio é psicóloga, mestre e doutora em Psicologia do
Desenvolvimento (UFRGS), professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e chefe do Departamento de Psicologia
do Desenvolvimento do Instituto de Psicologia (UFRGS).
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Revista Brasileira de Terapias Cognitivas


versão On-line ISSN 1982-3746

Rev. bras.ter. cogn. v.3 n.1 Rio de Janeiro jun. 2007

ARTIGOS

Transtorno obsessivo-compulsivo na adolescência

Obsessive-compulsive disorder in adolescence

Irani Iracema de Lima Argimon I; Mônica Giaretton Bicca II; Juciclara Rinaldi III

I
Psicóloga, Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Psicologia
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Supervisora de Estágio de Psicologia
Clínica do Serviço de Atendimento e Pesquisa em Psicologia no Laboratório de Intervenções
Cognitivas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
II
Psicóloga, Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
III
Estudante do último semestre de Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul

Endereço para correspondência

RESUMO

O presente relato de experiência profissional discorre sobre o tratamento associado, fármacos


e Terapia Cognitivo-Comportamental, de uma adolescente diagnosticada com Transtorno
Obsessivo-Compulsivo (TOC) – o quarto transtorno psiquiátrico mais freqüente na população.
A paciente, juntamente com sua mãe, trouxe como motivo da busca de tratamento o elevado
número de medicamentos ingeridos ao dia, as dificuldades escolares, de sono e de
relacionamento com colegas. Desta forma, o objetivo do artigo é apresentar um histórico do
quadro clínico da paciente, presente e passado, bem como realizar considerações sobre o
diagnóstico, atentando para o histórico de desistências de tratamento que ocorreram ao longo
da vida da paciente, juntamente com aparentes ganhos secundários. Além disso, serão
apresentadas as adaptações realizadas para o tratamento do TOC, com as técnicas
comportamentais e cognitivas utilizadas.

Palavras-chave: TOC, Adolescente, TCC, Psiquiatria infantil.

ABSTRACT

This report presents the case of a female teenager with Obsessive-Compulsive Disorder (OCD).
OCD is the fourth most frequent psychiatric disorder, affecting 1-3% of the population. The
patient reports that the reasons she presents this disorder are the high number of medications
she ingests everyday, learning difficulties, sleeping problems, and relationship problems with
her classmates. Thus, the objective of this article is to present the patient’s previous and current
history, as well as her diagnosis. In addition to that, the report highlights her history of treatment
interruptions throughout her life, as well as her secondary gains. We will also present the
adaptations utilized in the treatment of OCD, as well as the behavioral and cognitive techniques
used.

Keywords: OCD, Adolescence, CBT, Child psychiatry.

Introdução

O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) acarreta prejuízos na vida de crianças e de


adolescentes com esse transtorno. Os pacientes apresentam perda na capacidade de
desempenhar as funções na escola, na sociedade e em casa. Esta perda parece estar
relacionada à maior severidade da doença (Piacentini, Bergman, Keller & McCraken, 2003). No
presente caso, além dos prejuízos descritos anteriormente, havia dificuldade da família em dar
continuidade ao tratamento da paciente.
O TOC é o quarto transtorno psiquiátrico mais freqüente, segundo Del-Porto (2001), precedido
pelas fobias, pelo abuso, pela dependência de drogas e pela depressão maior. É um transtorno
psiquiátrico que acomete, aproximadamente, de 1 a 3% da população (Kochan, Qureshi &
Fallon, 2000; Torres & Lima, 2005). As taxas do TOC na infância e adolescência são
semelhantes às taxas dos adultos, que variam de 1,9 a 4% (Zohar, 1999).

Na infância, comumente as compulsões antecedem o início das obsessões, que podem ser
menos habituais nos adultos (Rosário-Campos & Mercadante, 2000). Em relação à idade em
que se iniciam os sintomas, pode-se subdividir os grupos quanto ao gênero: os homens os
apresentam mais precocemente. Para eles, o transtorno se inicia na infância, enquanto para as
meninas na adolescência. Conforme a idade avança, a prevalência tanto para homens quanto
para mulheres se assemelham, ou seja, chega a 1:1 na vida adulta (Zohar, 1999; Rosário-
Campos, 2001). Esta característica é embasada por achados, como o de Del-Porto (2001), que
realizou um estudo com 105 pacientes, no qual os homens foram diagnosticados com menos
idade do que as mulheres.

A interação entre indivíduo e ambiente resulta em comportamento aprendido. O tipo de


educação – mais ou menos rígida –, a cultura e a família podem influenciar na origem de
crenças que norteiam a vida do indivíduo (Cordioli, 2004; Salkovskis et al., 2000). Há consenso
que a ocorrência de educação com responsabilidade excessiva, o exagero na importância dos
pensamentos, dos perigos e dos riscos, resulta em comportamentos perfeccionistas (Cordioli,
Braga, Margis, Souza & Kapczinski1, 2001; Salkovskis et al., 2000).

Para o tratamento de crianças e adolescentes com TOC, o indicado é o tratamento combinado.


Segundo um estudo realizado pela Pediatric Obsessive-Compulsive Disorder Treatment Study
Team (2004), a primeira escolha é a Terapia Cognitivo-Comportamental associada a um
inibidor seletivo de recaptação da serotonina. Segundo esse mesmo estudo, a segunda opção
de tratamento é apenas a Terapia Cognitivo-Comportamental. O inibidor de recaptação da
serotonina utilizado amplamanente é a fluoxetina. A freqüência na escolha desse medicamento
se deve aos resultados satisfatórios no tratamento de crianças e adolescentes com TOC e ao
fato de seu custo ser acessível à população. A indicação diária é de 20 a 60mg (Geller et al.,
2001).

O objetivo deste artigo é relatar a experiência no tratamento do TOC da adolescente em


questão, ressaltando os padrões de funcionamento reforçadores aos comportamentos
compulsivos da mesma e a dificuldade de manter o tratamento até seu término.

Relato do Caso

A paciente com o diagnóstico de TOC é natural de Porto Alegre, estudante da 7ª série do


Ensino Fundamental. Seu nível socioeconômico é de baixa renda. Quando chegou para o
tratamento, estava com 13 anos de idade e, durante o processo terapêutico, completou 14
anos. Ao chegar, apresentava aparência, comportamento e comunicação infantilizados, não-
condizentes para esta faixa etária. Também demonstrava altos níveis de ansiedade,
constrangimento e baixa habilidade social.

A mãe referiu que a filha teve desenvolvimento adequado durante a infância, porém, salientou
que a paciente não se relacionava com crianças da sua idade, porque se dizia doente. Aos sete
anos, foi diagnosticada com TOC, passando a usar medicação pelo período de um ano. Após
este tempo, a mãe concluiu que a filha havia melhorado, então cessou o tratamento. Aos nove
anos, seu avô paterno faleceu. Segundo relato da mãe, esse episódio foi difícil para a filha,
mesmo tendo pouco contato com o avô. O falecimento do avô coincide com o início das
dificuldades escolares na 4ª série do Ensino Fundamental. A paciente desenvolveu uma
inflamação intraocular (uveíte). O relacionamento com os colegas de aula era difícil. No geral,
quando a paciente buscou tratamento, as notas escolares estavam abaixo ou na média exigida.

A paciente relatou que se sentia triste e diferente das colegas de mesma idade, e não
conseguia dormir à noite, pois tinha medo do escuro. Na semana da primeira consulta, relatou,
ainda, que havia urinado na cama por não ter ido ao banheiro. O motivo desse comportamento
foi a tentativa de evitar ter que contar os objetos do banheiro e, na volta, ter que contar os
objetos do quarto. Em seus relatos, acrescentou insatisfação em outros aspectos de sua vida,
como: (a) não possuir amigas na escola; (b) estar acima do peso; (c) precisar fazer várias
contagens, estando estas circunscritas à sua casa. Acrescentou que havia sido diagnosticada
com possível Transtorno de Humor Bipolar (THB) há dois anos, sendo tratada com fármacos e
terapia. Entretanto, o tratamento foi interrompido pela mãe. A paciente relatou que preferia que
as informações sobre seus problemas fossem pedidas a sua mãe, pois não saberia explicar os
seus problemas. No histórico familiar, o avô materno e duas primas do mesmo ramo familiar
apresentam TOC. O avô apresenta compulsões de contaminação, lavando as mãos repetidas
vezes.

O diagnóstico foi realizado nas primeiras sessões do tratamento. A dúvida que permaneceu por
mais tempo foi quanto à questão do possível THB. No decorrer do tratamento, essa hipótese foi
descartada. O diagnóstico multiaxial inicial foi descrito da seguinte forma: Eixo I: F42.8,
Transtorno Obsessivo-Compulsivo sem especificador; Eixo II: Z03.2, não observado; Eixo III:
H30, uveíte recorrente; Eixo IV: Z55.8, problemas sociais e escolares; Eixo V: início AGF = 50,
final AGF = 85 (CID-10, 1994; DSM-IV/TR, 1994).

Tratamento

A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) foi escolhida como forma de terapia, após a


triagem da paciente. O uso do tratamento associado (terapia e fármacos) é indicado para
tratamento de TOC. A TCC apresenta bons resultados no tratamento de TOC, principalmente
quando associada à medicação (Cordioli, 1998; Rosário-Campos, 2001). Nas sessões
seguintes, foi realizada psicoeducação para a paciente. Após cinco sessões, as técnicas da
Terapia Comportamental para o TOC foram introduzidas no tratamento. A primeira tarefa de
prevenção foi verificar as portas e janelas uma única vez antes de dormir. No começo das
tarefas de enfrentamento, houve situações em que a paciente verificou uma única vez, em
outras, porém, verificou duas ou três vezes. Nas semanas seguintes, a compulsão de verificar
portas e janelas começou a diminuir.

A segunda tarefa de enfrentamento foi referente às compulsões de alinhamento dos sapatos e


tapetes. Nesses rituais, a paciente contava até o número quatro ao alinhar os sapatos.
Entretanto, nesta segunda etapa, a tarefa foi realizada mais lentamente, uma vez que ela
julgava ser difícil deixar de alinhar os sapatos. A última tarefa foi a tentativa de evitar os
pensamentos ruins, cujo conteúdo versava sobre a morte de seus familiares. Sempre que era
solicitada a tarefa de enfrentamento em sessão, foi questionado sobre a diminuição ou não do
sintoma trabalhado na semana anterior.

O foco na intervenção cognitiva do TOC iniciou após a intervenção comportamental, com


identificação e registros dos pensamentos automáticos e das crenças disfuncionais. O modelo
ABC foi demonstrado, para que a paciente entendesse como acontece a manutenção do ciclo:
a (A), situação que ativa crenças disfuncionais e/ou pensamentos automáticos negativos, leva
a (B), interpretação distorcida das crenças, que acarreta (C), acontecimentos emocionais,
comportamentais e psicológicos que reduzem o medo e mantêm o ciclo.

Uma das dificuldades apresentadas pela paciente foi identificar os pensamentos automáticos. A
pergunta: “O que passou pela minha cabeça naquele momento?” não auxiliou a paciente a
identificar os pensamentos automáticos, contudo, ao vincular às emoções, ela entendeu o
conceito. As crenças centrais distorcidas da paciente faziam com que sentisse obrigação de
rezar e verificar portas e janelas, a fim de que nada de ruim acontecesse para sua família. A
psicoeducação esclareceu à paciente que sua capacidade de raciocinar de forma lógica estava
comprometida devido ao TOC. Acrescentou, ainda, a importância das crenças, pois estas
influenciam os pensamentos, geradores de respostas emocionais, fisiológicas e
comportamentais.

Os instrumentos utilizados, ao longo do tratamento, foram: a Tríade Cognitiva que mostrou a


visão que a paciente tinha de si, dos outros e do mundo; o Child Behavior Checklist (CBCL)
(Achenbach, 1991), que é um questionário para avaliar competência social e problemas de
comportamento em indivíduos de 4 a 18 anos, a partir de informações fornecidas pelos pais,
indicando os vários âmbitos da vida da criança/adolescente — como comportamento, funções
cognitivas, afetividade e possibilidade de escore clínico para transtorno —; a Escala do
Inventário de Ansiedade de Beck (BAI) (Beck, Brown, Epstein & Steer, 1988), que indica a
presença de sintomas de ansiedade, sendo aplicada no início do tratamento. No decorrer do
tratamento, os sintomas da ansiedade também foram monitorados através da Escala de
Unidades Subjetivas de Desconforto (SUDS) (Wolpe, 1973). Já o Treino Respiratório foi uma
alternativa para auxiliar o controle da ansiedade da paciente, principalmente à noite, no horário
de dormir.

Os medicamentos ingeridos por ela, quando chegou ao atendimento, eram fluoxetina,


carbamazepina, cortisona (via oral e tópica) e cálcio. Inicialmente, usava carbamazepina pelo
diagnóstico de THB. Após dois meses, a medicação foi suspensa, pois a psiquiatra que a
acompanhou, durante a maior parte do tratamento psicoterápico, não concordou com o
diagnóstico. A fluoxetina já era usada pela paciente e continuou sendo ministrada pela
psiquiatra, pois é um dos medicamentos eleito para tratamento farmacológico do TOC, por ser
um antidepressivo inibidor da recaptação da serotonina, aprovada pelo Food and Drogs
Administration - FDA (Cordioli & Souza, 2005). A fluoxetina continuará sendo utilizada, mesmo
após o término da psicoterapia, por recomendação médica, pois a dosagem somente foi
estabilizada na metade do tratamento psicoterápico (40mg por dia). O tratamento da uveíte foi
realizado com cortisona, via oral e tópica, e foi finalizado com a remissão completa da
inflamação intraocular.

O manejo da família foi essencial para a continuidade do tratamento, pois, no histórico da


paciente, havia vários abandonos de tratamento. Para que esse comportamento não se
repetisse, a família foi convidada a participar do tratamento desde o início. Primeiro, foi
aplicado o teste CBCL (Achenbach, 1991) na mãe, em uma sessão especial, com o objetivo de
conhecer o desenvolvimento e as questões atuais da paciente. Em um relato de caso, Weiss,
Fogelman e Yaphe (2003) salientam a necessidade de conhecer o contexto familiar do
paciente, bem como observam a necessidade da psicoeducação da família com relação ao
TOC.

O pai, a avó materna e o irmão participaram do tratamento, mostrando-se atentos e com uma
visão clara do que acontecia, e salientando o desejo de vê-la crescer e viver como as
adolescentes de sua idade, entretanto, apontando dificuldade de impor limites à paciente. Ao
longo do tratamento, a mãe foi convidada a entrar em parte de algumas sessões com a
paciente, com o objetivo de esclarecer questões sobre o TOC e explicar atitudes da família que
auxiliariam no tratamento.

Discussão

O relato de caso demonstra alguns fatores que dificultavam e mantinham o transtorno da


paciente. O ambiente familiar foi observado desde o início por influenciar na descontinuidade
do tratamento. Cordioli (2004) afirma que o ambiente pode influenciar na origem de crenças,
norteando a vida do indivíduo. Neste caso, o ambiente apresentava-se em função da doença
da paciente, o que alimentava os sintomas e os ganhos secundários. Com a revisão de alguns
comportamentos da família, estes se apresentaram mais funcionais do que no início do
tratamento.

O funcionamento psicossocial da paciente, no final do tratamento, apresentou desempenho


satisfatório. Estudos, como o de Piacetini et al. (2003), apontam para prejuízos psicossociais na
vida de crianças e adolescentes com TOC, com impactos diferentes, dependendo da gravidade
do transtorno. No presente caso, a paciente apresentava prejuízos em diferentes áreas de sua
vida, entretanto, ao final do tratamento, a paciente demonstrou ganhos no funcionamento
psicossocial. Ela foi aprovada no ano letivo, melhorou o relacionamento com os colegas de
classe e começou a sair para se divertir com as colegas de aula. A paciente reduziu o peso em
8 kg, com tratamento acompanhado por nutricionista, e passou a dormir tranqüilamente, sem
pesadelos ou necessidade da porta do quarto estar aberta.

Como a TCC é realizada em conjunto – terapeuta e paciente –, foi argumentada a importância


de a relação estar pautada pela sinceridade, empatia, cordialidade e responsabilidade (Carlat,
2007). Na sessão seguinte, após os esclarecimentos à paciente, a mesma voltou com sua
agenda para anotar as tarefas que deveria realizar durante a semana. Em alguns casos, há
indicação de realizar sessão conjunta com os familiares e paciente. No presente caso, a
paciente aceitou apenas a participação da mãe em partes das sessões, não consentindo a
presença de outros familiares, por isso não houve a sessão com todos os familiares que
participaram do início do tratamento. Ressalta-se a importância do manejo com a família para a
continuidade do processo terapêutico, devido às reiteradas desistências de tratamento e à
dificuldade de manter uma rotina caseira. Acrescenta-se que a família foi essencial para
contornar as dificuldades psicossociais apontadas pela paciente.

Resumindo, esse caso apresentou aspectos tradicionalmente presentes no TOC. Porém, a


idade da paciente exigiu alguns cuidados na psicoterapia, como: atenção constante quanto ao
tratamento farmacológico e adaptação das técnicas comumente utilizadas nestes casos.
Destaca-se, ainda, a atenção necessária às peculiaridades de cada caso, a fim de empregar as
técnicas almejando a melhora dos sintomas do transtorno.

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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia


versão On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.7 no.1 Juiz de Fora jun. 2014

ARTIGOS

Dependência química, amizade e desenvolvimento humano1

Substance abuse, friendship and human development

Janine Marinho DagnoniI,2; Agnaldo GarciII

I
Universidade do Estado da Bahia, Teixeira de Freitas, Brasil
II
Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, Brasil
RESUMO

Existem muitos estudos sobre a influência dos amigos no uso/abuso de substâncias, mas sem
conclusões definitivas. Neste sentido, o presente trabalho objetiva investigar a rede de amigos
no início do uso de drogas e a rede atual de adolescentes usuários do Centro de Atenção
Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS-ad) de uma cidade do interior da Bahia, para verificar as
mudanças na constituição e características destas redes. Treze adolescentes com idade média
de 16,6 anos responderam a um questionário semi-estruturado. Os dados foram submetidos a
análises descritivas, de frequência e de conteúdo. Os resultados sugerem tendências para a
compreensão de relações entre dependência química e amizade relacionadas ao
desenvolvimento humano. A amizade no mundo das drogas diferenciou-se por atividades
conjuntas de risco (roubo, tráfico, etc.). Os usuários de substâncias psicoativas relatam
influência direta e indireta de amigos no início e na manutenção do uso de drogas e o uso
parece diminuir o número de amigos até restringi-los ao ambiente familiar.

Palavras-chave: Dependência Química, Amizade, Adolescência.

ABSTRACT

Much has been studied about the influence of friends on the use and abuse of psychoactive
substances, however, there is no definite conclusion on the subject. In this sense, the present
work is relevant since its general goal is to investigate the network of friends at the beginning of
the drug use and the present network of adolescent users under treatment in Psychosocial
Alcohol and Drugs Mental Healthcare Center (CAPS-ad) of a country town at Bahia State
(Brazil), to check the changes in the constitution and in the characteristics of these networks of
friendship at the time of initial use and when they were interviewed. Thirteen teenagers (with an
average of 16.6 years-old), users of CAPS-ad, answered a semi-structured questionnaire. Data
were analyzed by descriptive, frequency and content aspects. The results suggest important
trends of the relationship between substance abuse and friendship related to human
development. The friendship in the world of drugs seems to differ by the performance on risk-
related activities (stealing, drug traffic, etc.). The psychoactive substance users perceive the
direct and indirect influence of friends in the beginning and during the maintenance of drug use
and such use, on the other hand, seem to influence the friendships, reducing the number of
friends up to restrict them to the family environment.

Keywords: Substance Abuse, Friendship, Adolescence.

A dependência química é um tema contemporâneo e relevante devido ao aumento do número


de usuários, à diminuição da idade de início de uso e à diversidade de drogas utilizadas nos
últimos anos (Laranjeira, 2007; Soldera, Dalgalarrondo & Filho, 2004; Tavares, Béria & Lima,
2001). Ademais, são muitos os impactos deste uso, como, por exemplo, a violência doméstica
(Ziberman & Blume, 2005), acidentes, mortes no trânsito e criminalidade (Brasil, 2003; Brasil,
2009).

Koller, Morais e Cerqueira-Santos (2009) mencionam que o desenvolvimento humano ocorre


em função de um processo onde há uma "interação recíproca da pessoa com seu contexto
através do tempo, sendo uma função das forças que emanam de múltiplos contextos e de suas
relações" (p.24). Esta afirmativa está consonância com a teoria ecológica de Bronfrenbrenner
(1996), que afirma que, para haver desenvolvimento saudável, é importante vivenciar
ambientes distintos, mediados pela relação de vínculos apoiadores positivos, considerados os
vínculos estabelecidos entre pessoas que promovem uma convivência harmoniosa entre os
ambientes frequentados. Estes vínculos diminuem os conflitos cognitivos gerados pela
convivência com a diferença, exercendo, portanto, uma força positiva a favor do
desenvolvimento. Koller, Morais e Cerqueira-Santos (2009) apresentam também fatores de
risco ao desenvolvimento humano, que são aqueles que estão presentes no contexto ecológico
e aumentam a probabilidade de que a pessoa desenvolva problemas físicos, psicológicos,
comportamentais e sociais, como ocorre, por exemplo, no caso da dependência química.

Neste aspecto, cabe ressaltar a adolescência como contexto, visto que é justamente nesta fase
que o jovem se encontra mais vulnerável ao expandir seu círculo de relacionamentos para além
dos limites familiares (Papalia & Olds, 2000; Senna & Dessen, 2012), e neste processo há um
grande investimento e esforço a favor da constituição de seu senso de identidade, em busca de
autonomia (Smetana, 2011; Pratta & Santos, 2006). Feeney (2007) afirma que, para o
desenvolvimento efetivo da autonomia, é importante que o indivíduo em desenvolvimento se
sinta seguro nas relações de apoio que o cercam, para que se sinta à vontade ao explorar
terrenos desconhecidos, tendo a certeza de que, caso as novas experiências não sejam
satisfatórias, haverá um lugar seguro ao qual recorrer. Estabelece, assim, uma importante
relação entre dependência e independência, no que diz respeito aos relacionamentos
humanos. A dependência é, portanto, um

Processo clínico pelo qual os indivíduos estão aptos a se direcionar para figuras de apego para
aprender, explorar e descobrir quando se sentem seguros e contentes e pelo qual os indivíduos
estão aptos a se mover em direção as figuras de afeto para conseguir conforto, segurança
quando ameaçados de alguma forma (Feeney, 2007, p.268).

Neste sentido, verifica-se o papel das relações no desenvolvimento, sendo necessário um


pouco de dependência no que tange a relacionamentos interpessoais de qualidade, para o
alcance da autonomia humana. Pereira e Garcia (2007) afirmam que indivíduos oriundos de
contextos culturais que valorizam a família podem apresentar dificuldades na adaptação a
ambientes que valorizam a autonomia emocional frente à família, pois uma maior dependência
nas relações familiares poderia estar associada a uma menor influência exercida pelos amigos.
Isto poderia ser considerado, portanto, um argumento a mais a favor da importância da
dependência de certos vínculos para se mostrar autônomo diante de outros, já que, ao
diferenciar-se de seus amigos, pela aproximação com a família, os indivíduos constituiriam sua
identidade. Neste caso, a dependência dos vínculos familiares promoveria a diferenciação do
grupo de amigos, partindo da dependência para a independência como foi defendido por
Feeney (2007).

A importância das relações para o desenvolvimento não é um tema recente. Piaget


(1932/1994) já afirmava que, para haver o desenvolvimento da autonomia, as relações de
cooperação entre iguais seriam fundamentais. A restrição à interação e relação em níveis
hierarquicamente distintos, como pode ser o caso, por exemplo, das relações familiares, tende
a dificultar a emergência da autonomia e a favorecer a manutenção do indivíduo em um nível
heterônomo do desenvolvimento. Assim, uma fase de heteronomia seria fundamental para o
desenvolvimento da autonomia, que necessariamente deveria substituir progressivamente a
fase anterior. Seguindo esta mesma lógica, os estudos de Guardia e Patrick (2008) afirmam
que nas relações recíprocas (românticas e de amizade), as pessoas têm mais potencial para
troca mútua, o que favorece a motivação para satisfação das necessidades psicológicas
básicas, quer sejam a autonomia, a pertença ou a competência.

Para os mesmos autores, na adolescência, os amigos e parceiros são figuras centrais e a


satisfação das necessidades neste contexto se torna vital para o bem-estar e funcionamento da
relação. Ademais, a satisfação das necessidades fornece uma base para o desenvolvimento da
orientação das pessoas, que possibilitará o engajamento em atividades. Pelo convívio com os
outros, as pessoas desenvolvem razões para se envolver e manter seus comportamentos. O
comportamento pode, assim, ser regulado por motivação intrínseca, onde, a partir de um maior
grau de autonomia, o indivíduo age por interesse e por prazer na atividade por si mesma, é
regido por uma tendência geral de regular o comportamento. Assim, maiores índices de
motivação autônoma garantem mais comportamentos positivos na interação, como
aproximação do outro, pedir esclarecimento e conduzir compreensão do parceiro.
Em geral, maior autonomia se traduziria em mais abertura e flexibilidade nas relações e,
portanto, de acordo com Bukowski, Simard, Dubois e Lopez (2011), os adolescentes podem se
colocar em risco caso não consigam traduzir interações comportamentais em representações
de amizade mais abertas e flexíveis. Schat e Kelloway (2008) também apresentam o suporte
social como efeito moderador de bem-estar, satisfação e comprometimento, em uma revisão
ampla de estudos realizados, em especial, no ambiente empresarial.

Steinberg (2001) também afirma que a adolescência é uma fase onde o indivíduo se encontra
mais vulnerável para assumir riscos, pois, a atividade cerebral dopaminérgica aumenta, o que
favorece a busca por recompensas imediatas.

Ainda, é marcante a dificuldade no controle cognitivo, o que desfavorece a análise dos custos
potenciais dos comportamentos de risco, dentre os quais se encontra o uso abusivo de drogas,
aumentando as chances de se engajar nos mesmos. Tendo em vista que a dependência
química impõe riscos ao desenvolvimento humano, os relacionamentos podem se tornar
fatores de proteção, caso se tornem influências que melhorem e alterem respostas pessoais a
certos riscos de desadaptação ou adoecimento (Koller, Morais & Cerqueira-Santos, 2009).

Edwards (2004) avaliou americanos em tratamento pelo abuso de substâncias e encontrou que
os fatores de proteção mais relevantes neste processo foram: sentir-se cuidado, experiências
espirituais, insight, comprometer-se, empoderamento da auto-estima, alívio da dor emocional,
remorso, reconexão com valores tradicionais, segurança e gratidão, dentre outros. Todos eles
eram relacionados ao apoio e suporte emocional. Ferreira e Garcia (2008) também ressaltam a
importância do apoio social de parentes e amigos na adaptação de adolescentes com doenças
crônicas. Estes dados representam uma evidência a mais para a concepção de que os
relacionamentos interpessoais são fatores primordiais para intervenção diante da dependência
química, na medida em que se apresentam como fatores de proteção que facilitam a adaptação
dos indivíduos às circunstâncias adversas advindas do abuso de substâncias.

Amparo, Galvão, Alves, Brasil e Koller (2008) inserem escola, amigos e família entre as
principais redes de proteção aos comportamentos de risco. Del Prette e Del Prette (2008)
discutem a importância do desenvolvimento de habilidades sociais como a empatia na relação
entre os adolescentes enquanto fator de proteção a comportamentos disruptivos, a exemplo
daqueles relacionados à dependencia química. Ainda, Dishion e Owen (2009) afirmam que o
uso de substâncias em jovens adultos pode ser considerado como um resultado da influência
de amigos e de processos de seleção destes amigos, e ressaltam que trabalhos de prevenção
deveriam considerar aspectos subjacentes aos âmbitos inter e intrapessoal ao uso crônico,
dependência e abuso de substâncias psicoativas. Papalia e Olds (2000) ressaltam a
vulnerabilidade dos adolescentes à influência dos amigos, no contexto mais específico da
adolescência, onde o tema das relações de influência exercidas entre os pares se torna
evidente, incluindo tanto estimular o uso quanto mantê-lo e, em alguns casos, ser suporte para
parar de usar. Em conjunto, estes dados refletem que a relação entre amizade e dependência
química é bastante complexa.

Ciesla, Valle e Spear (2008) apresentam um estudo com adolescentes em tratamento pelo
abuso de álcool nos Estados Unidos da América e, na tentativa de investigar os fatores
determinantes da recaída, encontraram que, além de raça, sexo e uso de maconha, fatores
ligados ao relacionamento interpessoal, como participação em grupos que promovam suporte
social, bom rendimento escolar e ter amigos que dão suporte demonstraram estar associados
negativamente à recaída. No entanto, verifica-se que em um estudo que investigou o impacto
do uso de álcool pelo melhor amigo, pelo irmão e pelo amigo do melhor irmão no uso do
adolescente, em delineamento onde foram estudadas famílias com dois irmãos, os resultados
demonstraram que o maior efeito encontrado foi pelo processo de seleção de parceiros (Polen,
Engels, Vorst, Scholte & Vermulst, 2009). Os efeitos dos amigos e dos irmãos não se
sustentaram ao longo do tempo, o que foi avaliado longitudinalmente.

É possível verificar, a partir dos estudos apresentados, que muito já foi estudado sobre os
aspectos inerentes à influência dos amigos no uso e abuso de substâncias, no entanto, não há
uma conclusão definitiva. É neste sentido que o presente trabalho encontra sua relevância, pois
tem como objetivo geral investigar a rede de amigos no início do uso de drogas e a rede atual
de adolescentes usuários do CAPS-ad de uma cidade do interior da Bahia, para verificar as
mudanças na constituição e características destas redes de amizade no momento inicial do uso
e quando foram entrevistados. Os objetivos específicos são: (1) caracterizar a amostra; (2)
avaliar as motivações para envolvimento com a droga (iniciar, continuar a usar e para parar de
usar, se for o caso); (3) caracterizar a rede de amigos do início do uso e a atual e (4) investigar
a percepção da influência dos amigos para o uso/não uso de drogas.

Método

Foram entrevistados treze adolescentes, sendo dez meninos e três meninas, com idade média
de 16,6 anos (variando de 14 a 18 anos), usuários do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e
Drogas (CAPS-ad), presentes na instituição em outubro e novembro de 2009 e fevereiro e
março de 2010, os quais foram convidados pelo coordenador do serviço e demonstraram
disponibilidade para participar, caracterizando uma amostra por conveniência, apesar de terem
sido os únicos adolescentes a frequentarem o serviço no período da coleta de dados.

A coleta de dados foi realizada por meio de uma entrevista semiestruturada, com questões
fechadas e abertas, que deveriam ser justificadas e exemplificadas. A análise foi descritiva e de
frequência para os dados das questões fechadas e de conteúdo, de acordo com Bardin (1997)
para as questões abertas.

Resultados e Discussão

Caracterização da amostra

Dos treze entrevistados, sete se caracterizaram como católicos, mas apenas dois referiram que
estavam envolvidos efetivamente com o catolicismo. Outros dois se denominaram evangélicos
(Assembléia de Deus e Batista) e outros dois se denominaram evangélicos/católicos.

Oito entrevistados não estavam estudando, sendo que dois pararam na 4ª série, dois na 5ª,
dois no supletivo, um no 1º ano do segundo grau e um na 8ª série. Quatro participantes
interromperam seus estudos por algum tempo, por causa das drogas, mas retornaram aos
estudos em 2010. Destes, três retornaram na 6ª série do ensino fundamental e um no supletivo
de 5ª e 6ª séries. Apenas um encontrava-se em ensino regular, no 3º ano do ensino médio.

As drogas que os entrevistados relataram usar foram diversas, desde lícitas (cigarro e álcool) a
ilícitas (maconha, crack, cocaína e outras), como pode ser verificado na Tabela 1. Nem sempre
o entrevistado relatou que usava apenas um tipo de droga. Dentre os treze usuários, dois
relataram que usavam apenas maconha e um que experimentou cocaína uma vez, mas passou
mal e nunca mais usou. A idade de início de uso da droga variou de 11 a 16 anos e as drogas
que mencionaram foram usadas desde o começo da prática. O tempo de uso variou de um a
sete anos.
Quanto à utilização social de drogas, nove entrevistados relataram utilizar as drogas
acompanhados e seis sozinhos. Dos onze usuários de maconha, seis afirmaram utilizá-la
acompanhados. Em relação ao uso de crack, a maioria relatou que o uso era feito sozinho
(n=4). Estes dados refletem que, nesta amostra, o uso de maconha pode ser considerado uma
atividade de grupo. Desta maneira, a convivência com os colegas acaba reforçando o próprio
uso, já que eles pertencem àquele grupo e participam das atividades inerentes a ele, aspecto
que, segundo Pratta e Santos (2006) pode ser considerado característico da adolescência.

Outro dado relevante, decorrente deste estudo e condizente com as atividades inerentes ao
grupo indica que doze dos treze participantes estavam envolvidos com o crime, praticado em
conjunto no grupo. O único participante que não teve qualquer envolvimento com o crime
relatou apenas o uso de álcool e continua regular na escola. Este dado está consistente com a
literatura (Minayo & Deslandes, 1998; Beato Filho, 2001), que afirma que os índices de
criminalidade são maiores em ambientes onde há uso e tráfico de drogas. Isto sugere a
necessidade urgente de atuação diante do problema das drogas frente ao envolvimento do
usuário com o crime e sua adesão e continuidade com os estudos na adolescência, a fim de
minimizar a criminalidade e maximizar a adesão aos estudos, o que seria um fator favorecedor
para o desenvolvimento saudável.

Motivações para envolvimento com a droga

Os exemplos e justificativas dos participantes foram categorizados por análise de conteúdo, de


modo que foram encontradas cinco categorias relacionadas ao início do uso de drogas: (1)
busca de bem-estar (para ficar "doidão", porque acha legal, gostoso ou divertido) (n = 12); (2)
influência (influência dos amigos, ter facilidade de acesso à droga, considerar ter a "mente
fraca" e alguém na família usar); (3) lidar com problemas/sofrimento (presença de sofrimento
na família, fim de namoro, para esquecer problemas, perda de ente querido) (n=9); (4)
aspectos relacionados ao pertencimento grupal (conseguir respeito e se sentir mais forte e
corajoso) (n=4) e (5) curiosidade (n=3). Estes resultados encontram-se coerentes com os de
Pratta e Santos (2006), que apresentam como fatores motivadores para o início do uso de
drogas curiosidade, diversão ou prazer, busca de bom relacionamento com outras pessoas e
uso por parte dos amigos, dentre outros.

Quanto aos motivos pelos quais os participantes continuaram usando drogas depois de terem
começado, novamente cinco categorias foram encontradas: (1) influência (n=6) (três dos
amigos e três por considerar ter a "mente fraca"); (2) lidar com problemas/sofrimento (presença
de sofrimento na família, fim de namoro, para esquecer problemas, perda de ente querido)
(n=5); (3) busca de bem-estar (para ficar "doidão", porque acha legal, gostoso ou divertido)
(n=3); (4) para se sentir mais forte e corajoso (n=3); (5) Outros (n=3): medo de morrer, não sei
(resposta literal do participante, como foi utilizado em todas as outras categorias), abstinência.
Os dados sugerem que os motivos são parcialmente diferenciados para o início e a
manutenção do uso de drogas.

A curiosidade, por exemplo, na manutenção em comparação ao início do uso, deixa de


aparecer como aspecto referente ao pertencimento grupal. A influência se torna o motivo mais
preponderante, a busca de bem-estar diminui e a busca de se sentir mais forte e corajoso
surge como fator mais importante na manutenção do uso em comparação aos motivadores
para início. Um aspecto que justificaria esta mudança é que os efeitos maléficos do uso de
drogas podem começar a aparecer, como a diminuição da rede, por exemplo, e "tornar-se
corajoso e forte", pode ser um veículo não de pertença grupal, mas, de se destacar no grupo
ou chamar a atenção dele. De acordo com Dishion e Owen (2009), o fato dos amigos e
conhecidos continuarem usando drogas por perto aumenta a probabilidade de o participante do
grupo usar.

São vários os motivos que levaram alguns dos usuários a pensar em parar o uso de drogas: (1)
a família ser contra o uso e apoia parar (n=8); (2) ameaça à saúde/vida (proximidade da morte,
saúde) (n=7); (3) envolvimento com o crime (roubos, tráfico, prisão) (n=5); (4) sentimento de
abandono/perda de confiança (n=4); (5) sentimentos morais (vergonha, arrependimento, muito
sofrimento/humilhação) (n=4) e (6) influência divina ("Deus tocou meu coração") (n=1).

Caracterização da rede de amigos do início do uso e a atual


Os participantes indicaram os amigos principais da época em que iniciaram o uso de drogas e
aqueles do momento da entrevista, distinguindo os amigos que não influenciaram o uso de
drogas, daqueles considerados como tendo influenciado, assim como sua origem. A Tabela
2 apresenta o número de amigos apresentados pelos participantes em cada um dos contextos
de interação, indicando se influenciaram ou não o uso de drogas, tanto na rede de início quanto
na rede do momento da realização da entrevista.

Houve uma restrição da rede inicial (n=51) para a rede atual de amigos (n=18). No início, a
rede era composta, principalmente, por amigos do bairro (n=39), enquanto na rede atual
predominam pessoas da família (n=6) e Deus (n=4). Um dos participantes afirmou não ter tido
amigos em nenhum momento e outros dois consideram que atualmente não têm amigo algum.
No início e atualmente houve influência dos amigos no processo. Em apenas um caso houve
aumento da rede, onde o participante manteve a rede inicial e resgatou uma amizade da
infância ao parar de usar drogas.

Os participantes foram solicitados a informar quem eram seus amigos antes do uso, no
decorrer do uso e após terem parado (quando foi o caso), sem fazer qualquer distinção ao tipo
de amizade estabelecida. Cinco participantes relataram que alguém deixou de ser seu(sua)
amigo(a) depois de começar a usar droga, e onze fizeram novas amizades, por conta do uso
de drogas, por conta de atividades conjuntas relacionadas ao uso (comprar, usar, buscar,
encontrar formas de obter a droga, até mesmo roubando). Oito participantes perceberam
mudança nos relacionamentos atuais por causa do uso de drogas. Destes, cinco relataram que
a mudança foi marcada por uma restrição da convivência, como exemplifica os seguintes
relatos: "distanciei de tudo, hoje é só o pai"; "quando usava andava só com eles, hoje que parei
ando com todos e prefiro andar com os que não usam"; "nunca mais os vi".

Os demais (n=3) relataram perceber diferença, no entanto, não demonstraram clareza quanto
ao tipo de mudança. Onze perceberam que o uso de drogas influenciou os relacionamentos de
modo negativo, incluindo: diminuição da confiança (n=4), diminuição da intimidade (n=1),
restrição da rede (n=2), envolvimento com o crime (n=2), maior agitação e perturbação (n=2).
Dois perceberam mudanças positivas, pois relataram que ficaram mais abertos e obtiveram
mais respeito.

Os resultados apresentados encontram sustentação na literatura. Segundo Souza, Kantorski e


Mielke (2006), a rede de suporte de usuários de CAPS-ad é bastante comprometida. Tendo em
vista os impactos da restrição das redes de apoio e de pares para o desenvolvimento humano
de maneira integral (Bronfrenbrenner, 1996; Piaget, 1932/1994; Muza & Costa, 2006), os
resultados demonstram que os entrevistados se encontram em situação de risco. Mangia e
Muramoto (2005) ressaltam a importância das redes sociais, por propiciarem "o
desenvolvimento de ações solidárias e de suporte ao enfrentamento de questões do cotidiano
entre grupos vulneráveis, além da construção e fortalecimento do sentido de pertencimento a
um grupo social" (p. 26).

Coerentemente, Paludo e Koller (2005) afirmam que o ambiente da rua pode aumentar a
vulnerabilidade do jovem, exigindo dele uma maior resiliência para lidar com os riscos e evitar
os possíveis efeitos negativos. E a maioria dos amigos dos participantes deste estudo emerge
deste contexto. No entanto, apesar de precisarem de amigos para lidar com as adversidades
da rua, os amigos precisam dar suporte para tanto e, como grande parte dos participantes
afirmou que a qualidade da amizade não era tão satisfatória, a diminuição da rede pode ter um
lado positivo.

Neste sentido, uma restrição da rede de convivência pode significar uma diminuição do suporte
para enfrentamento dos riscos e para o fortalecimento do sentimento de pertença, fundamental
à saúde do adolescente (Senna & Dessen, 2012). No entanto, apesar da restrição do número
de amigos, os participantes se voltam mais à família, que se apresenta como uma fonte de
apoio central, um retorno às referências de socialização primária, um momento de dependência
temporária, um porto seguro, a partir do qual partem em busca de sua autonomia, o que pode
proteger o participante dos riscos e influências da rua, já que a literatura apresenta a
importância da mudança de hábitos da época de uso, o que implica mudança na rede de
amigos e de lugares que o usuário frequentava (Silva & Serra, 2004).

É importante considerar que este retorno à família é decorrente da restrição do grupo de


amigos externos a ela, ocasionado pelo uso crônico de substâncias, o que se espera que não
seja definitivo e o adolescente possa ampliar novamente sua rede de apoio e suporte, incluindo
pares que deem suporte social satisfatório, a partir de relacionamentos recíprocos, de
cooperação a favor do desenvolvimento saudável, aspecto já ressaltado anteriormente (Piaget,
1932/1994), como também fundamental para o desenvolvimento da autonomia.

Influência dos amigos para o uso/não uso

Doze participantes perceberam a influência de amigos para usar droga, quer seja influência
direta (chamavam para usar, ofereciam, falavam que era bom) (n=11), influência indireta (viam
usando, sentiam o cheiro, dava vontade) (n=8) ou influência em atividades conjuntas
(ajudavam roubar, iam junto comprar droga, enturmavam-se) (n=6).

Todos relataram ter tido ajuda de amigos ou colegas para obter a droga e 12 disseram que os
amigos/colegas estavam usando e ofereceram/colocaram a droga para eles(as), sendo que um
relatou que sabia quem vendia e foi atrás desta pessoa para comprar. Alguns (n=7) afirmaram
terem influenciado alguém a usar, sendo que 67% (n=4) das pessoas influenciadas aceitaram e
acabaram usando drogas por influência do participante.

Alguns foram ajudados por mais de uma fonte de apoio a parar de usar drogas. 18,75 % dos
participantes (n=3) afirmaram não ter parado e, dos 81,25% (n=13) que afirmaram ter parado
ou estar tentando parar, alguns (n=6) disseram que a família ajudou. Outros (n=4) afirmaram
que ninguém ajudou, que pararam ou estão tentando parar sozinhos; um disse estar sendo
ajudado pelo CAPS-ad; um afirmou ter sido ajudado por um amigo e outro por um conhecido
mais velho.

Quanto ao tipo de apoio dado ou recebido, alguns autores (Ferreira & Garcia, 2008; Schat &
Kelloway, 2003) foram fontes de inspiração para a escolha das categorias utilizadas neste
estudo. Em relação aos resultados, os participantes afirmaram ter recebido e dado apoio
emocional para parar de usar droga, relataram que davam conselhos, inclusive salientando que
"não era bom" usar drogas. Consideraram como apoio emocional recebido os amigos sentirem-
se preocupados com o participante. Como apoio material recebido, os participantes disseram
que recebiam bicicleta emprestada, arma, drogas, dinheiro para comprar drogas e roupas de
marca no momento do início do uso.

Já no momento da entrevista, recebiam especialmente roupas, oportunidade de estudo,


dinheiro e preocupação com o bem-estar. Quanto ao apoio informacional recebido
anteriormente, recebiam informação sobre endereços onde comprar drogas, onde obter
dinheiro para comprar drogas, onde assaltar, incentivo para iniciação sexual precoce, local de
festas e mulheres interessadas. O apoio informacional atual recebido foi de "coisas boas",
conforme afirmou um participante, além de estratégias e locais para buscar ajuda e não usar
mais drogas e se afastar de amigos que usavam drogas.

Estes exemplos sugerem que os amigos praticavam atividades de risco em conjunto, o que foi
considerado como apoio em alguns casos e que, mesmo sendo em pequena incidência, e sem
necessariamente parar de usar droga, em outros casos, eles conversavam e se apoiavam na
tentativa de parar. Segundo Pereira e Garcia (2007), a influência é apresentada como um fator
importante nas relações.

Considerações Finais

Os dados indicam a percepção, por parte dos usuários de drogas, da influência direta e indireta
de amigos no início e na manutenção do uso de drogas. Este uso, por sua vez, parece
influenciar as amizades, diminuindo o número de amigos e restringindo-os ao ambiente familiar.
A amizade no mundo das drogas parece diferenciar-se por atividades conjuntas de risco
(roubo, tráfico, compra etc.). Mas, no presente estudo, nem toda influência percebida dos
amigos foi negativa, apesar de todo estímulo dos amigos para iniciar o uso, permitir acesso à
droga, assim como estimular a manutenção do uso. E em alguns casos, os amigos apoiaram a
recuperação do usuário de drogas.
Cabe ainda considerar que, no processo de recuperação da dependência química, o
afastamento dos amigos que influenciam o uso é considerado uma estratégia eficiente. Assim,
a diminuição da rede de amigos no momento da entrevista não deve ser vista apenas
negativamente, mas um retorno ao núcleo familiar em busca de segurança para explorar o
mundo com maior autonomia. No entanto, é importante que novas amizades sejam feitas a fim
de ampliar a rede de suporte social a favor do desenvolvimento saudável.

A partir das considerações feitas, ressalta-se a importância de intervenções junto aos


adolescentes visando o tratamento e prevenção, como: (a) oportunizar espaços onde os
adolescentes possam estabelecer redes de amizade e de apoio em geral, quer sejam
atividades físicas, artísticas e/ou culturais e educacionais, dentre outras; (b) capacitar a equipe
profissional e (c) enfocar o trabalho interdisciplinar. Na medida em que a problemática da
dependência química pode ser considerada multifatorial, estas intervenções devem ser
realizadas a partir de uma mobilização tanto individual quanto focada nos pares e pais, levando
em conta a sua influência como fontes de suporte social.

Considera-se que a pesquisa apresentada foi exploratória, pelo tamanho da amostra, estratégia
de coleta de dados e por ter sido feita em um único local, o que dificulta a generalização dos
dados. No entanto, os resultados sugerem questões relevantes que podem ser melhor
avaliadas em estudos futuros com amostras maiores e em outros contextos de investigação.

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Recebido em: 02/12/12


Aceito em: 20/06/13

1 Apoio: CAPES
2 Contato: jmdagnoni@hotmail.com
Praça Dom Helvécio, 74 - DPSIC - Bairro Dom Bosco
São João del-Rei, MG - CEP 36.301-160

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PsicoUSF
versão impressa ISSN 1413-8271

PsicoUSF v.11 n.1 Itatiba jun. 2006

ARTIGOS

Transtorno de estresse pós-traumático e funções cognitivas

Post traumatic stress disorder and cognitive functions

Christian Haag KristensenI, 1; Maria Alice de Mattos Pimenta ParenteII, 2; Alfred W.


KaszniakIII, 3
I
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
II
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
III
Universidade de Arizona

Endereço para correspondência

RESUMO

O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é um transtorno prevalente, associado a


alterações neurobiológicas e cognitivas. O presente artigo é um estudo teórico sobre as
aplicações da avaliação neuropsicológica no TEPT. Inicialmente são revisados aspectos
conceituais do transtorno, bem como alterações neurobiológicas relacionadas aos prejuízos
cognitivos comumente detectados. Finalmente, argumenta-se que a avaliação dos prejuízos
nas funções de memória, atenção e, sobretudo, funções executivas são relevantes tanto para a
intervenção clínica junto ao paciente quanto para o refinamento das teorias psicológicas do
TEPT.

Palavras-chave: Transtorno de Estresse Pós-Traumático, Cognição, Trauma, Funções


executivas.

ABSTRACT

Post Traumatic Stress Disorder (PTSD) is a prevalent disorder which is associated with
neurobiological and cognitive impairments. This paper is a theoretical review of the uses of
neuropsychological assessment in PTSD. Conceptual aspects of this disorder are reviewed, as
well as the neurobiological alterations related to cognitive impairments. Finally, it is argued that
the assessment of memory, attention, and executive function impairments is as relevant to the
clinical intervention as it is to the refinement of the psychological theories of PTSD.

Keywords: Post Traumatic Stress Disorder, Cognition, Trauma, Executive functions.

Transtorno de Estresse Pós-Traumático

Embora a história da humanidade tenha sido acompanhada pela presença de eventos


traumáticos, naturais ou provocados pelo próprio ser humano, foi somente durante a segunda
metade do século XIX e início do século XX - a partir de inovações tecnológicas nos meios de
transporte, que se esboçaram teorias sobre as reações humanas após experiências
traumáticas. Com a progressiva utilização de locomotivas a vapor, o transporte ferroviário de
passageiros cresceu e popularizou-se. Mas à proporção que um contingente maior de pessoas
desfrutava desse conforto, também acidentes se tornaram relativamente freqüentes, tanto
quanto disputas jurídicas por compensação financeira (Young, 2000). Interpretações
divergentes para a etiologia dos fenômenos apresentados por vítimas de acidentes ferroviários
foram propostas em termos: (a) "orgânicos", mais notavelmente nos trabalhos de John
Erichsen (1818-1896) e Herman Oppenheim (1858-1919) ou (b) "funcionais", conforme
posições adotadas por Jean-Martin Charcot (1825-1893) e alguns de seus alunos, como Pierre
Janet (1859-1947) e Sigmund Freud (1856-1839).
Posteriormente, situações de guerra ofereceram grande quantidade de casos, contribuindo não
somente para o refinamento de formulações teóricas, mas também para a proposição de
intervenções terapêuticas variadas (Marlowe, 2000). Embora a associação entre a experiência
a um evento estressor traumático e a manifestação de um conjunto de reações características
possa parecer óbvia, foi somente na década de 1980 que os profissionais de saúde mental
reconheceram o estresse pós-traumático como um construto psicológico válido, bem como uma
condição passível de diagnóstico e tratamento (Yehuda & McFarlane, 1995).

O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é definido no DSM-IV (American Psychiatric


Association, 1994) como uma resposta sintomática envolvendo revivência (critério B), esquiva
de estímulos associados ao trauma e entorpecimento da responsividade geral (critério C) e
excitabilidade aumentada (critério D) a um evento estressor (critério A). É um transtorno que
acarreta sofrimento clinicamente significativo e/ou prejuízo social ou ocupacional (critério F),
com presença de sintomas superior a 1 mês (critério E).

Na população geral, é possível estimar que em torno de 60% a 90% dos indivíduos são
expostos a um evento estressor potencialmente traumático ao longo da vida (Breslau e
colaboradores, 1998; Kessler, Sonnega, Bromet, Hughes & Nelson, 1995). Embora a taxa de
exposição a eventos estressores seja elevada, o percentual de indivíduos na população geral
que apresenta o TEPT ao longo da vida é mais baixo, podendo ser estimado entre 8% a 9%
(Breslau e colaboradores; Kessler e colaboradores). Ainda que a grande maioria de indivíduos
expostos a situações potencialmente traumáticas não desenvolva o transtorno (Yehuda &
McFarlane, 1995), o TEPT tem sido considerado o quarto transtorno mental mais comum
(Yehuda, 2002), resultando em conseqüências sociais e econômicas significativas (Ballenger e
colaboradores, 2004).

O diagnóstico do TEPT é fundamentalmente clínico. No entanto, apesar do esforço empregado


na definição de critérios diagnósticos válidos e confiáveis, existe considerável controvérsia
sobre a adequação dos critérios atuais para o TEPT (Ballenger e colaboradores, 2004;
McNally, 2003). Prejuízos no funcionamento cognitivo foram incluídos nos relatos iniciais das
reações pós-traumáticas (Young, 2000) e compõem, atualmente, o núcleo central do que é
caracterizado no DSM como TEPT. Tem sido sugerido que a avaliação neuropsicológica possa
contribuir para elucidar os prejuízos cognitivos associados ao TEPT (Horner & Hamner, 2002;
Wolfe & Charney, 1991), esclarecendo questões diagnósticas. Assim, o objetivo deste trabalho
é revisar as possíveis aplicações da avaliação neuropsicológica no TEPT, enfatizando sua
relevância para o refinamento de teorias psicológicas. Para tanto, será realizada uma breve
revisão da neurobiologia do TEPT, seguida pela apresentação de uma teoria sobre o
processamento cognitivo no transtorno. Logo após, alguns estudos neuropsicológicos são
apresentados, com particular atenção àqueles focalizando prejuízos em funções executivas.

Neurobiologia do TEPT

Durante a década de 1930, uma contribuição fundamental na investigação dos efeitos


neurobiológicos à exposição a eventos estressores foi dada por Hans Selye, que reconheceu a
natureza paradoxal da resposta corporal ao estresse (McEwen, 2002): os sistemas corporais
ativados que auxiliam na proteção do organismo e na restauração da homeostase, se mantidos
em ativação por um período prolongado, causam prejuízos ao organismo. A resposta biológica
a eventos estressores envolve a ativação dos sistemas endócrino e imunológico, bem como de
circuitos neurais específicos (Bremner, 2002; Charney, 2004; Graeff, 2003; Nemeroff, 2004). Já
a resposta psicológica varia amplamente, incluindo desde formas adaptativas de lidar com o
estresse até depressão e outras psicopatologias (Cicchetti & Walker, 2001), entre as quais o
TEPT (McNally, 2003; Yehuda, 2002).

Considerando as limitações e objetivos do presente trabalho, é importante destacar que a


resposta biológica a eventos estressores depende da ativação do complexo locus ceruleus-
noradrenalina-sistema nervoso simpático (Charney, 2004) e do eixo hipotálamo-hipófise-
adrenal (HHA), em especial do hipotálamo (McEwen, 2002; Yehuda, 2001). Nessa região, as
células do núcleo paraventricular promovem a síntese e secreção do hormônio de liberação da
corticotrofina (CRH) e neuropeptídeos como a vasopressina. Pelo sistema porta esses
peptídeos passam do hipotálamo à hipófise anterior, onde o CRH estimula a síntese e a
liberação do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) na circulação sistêmica (McEwen). Por sua
vez, o ACTH circulante estimula a liberação de glicocorticóides pela supra-renal. Esses
hormônios esteróides adrenais - dentre os quais destaca-se no ser humano o cortisol -
desempenham um papel central na resposta a eventos estressores, produzindo lipólise,
glicogenólise e o catabolismo de proteínas, mantendo altas as concentrações de substratos
energéticos no sangue, além de suprir a resposta imunológica do organismo (Charmandari,
Kino, Souvatzoglou & Chrousos, 2003; McEwen; Sapolsky, 2003). Em uma situação normal, ao
cessar a exposição a um estressor, o eixo HHA promove uma autolimitação do sistema mas no
TEPT, como será descrito abaixo, a neurobiologia segue um outro curso (Bremner, 2002; De
Bellis, 2005; Graeff, 2003; Yehuda, 2001).

A investigação neurobiológica do TEPT tem privilegiado o eixo HHA e o sistema nervoso


simpático pelo papel fundamental destes na resposta ao estresse (De Bellis, 2005; Nemeroff,
2004). Fisiologicamente, o TEPT pode ser conceituado como uma resposta crônica e
desadaptativa. Nesse transtorno ocorre uma hiperativação do sistema nervoso simpático,
caracterizada pela produção aumentada de adrenalina (epinefrina) e noradrenalina
(norepinefrina) na circulação sanguínea pelos próprios terminais simpáticos e pela medula da
supra-renal (Graeff, 2003; Nemeroff, 2004). Diferentemente do que ocorre em outros
transtornos, como a depressão ou mesmo a resposta imediata a um estressor, no TEPT
evidencia-se um aumento na sensibilidade do eixo HHA, resultando na diminuição do cortisol
plasmático e urinário (Charmandari e colaboradores, 2003; Yehuda, 2001). Assim, a
neurobiologia do TEPT caracteriza-se pela diminuição dos níveis basais de cortisol, resultante
do aumento na inibição por retroalimentação (feedback) negativa, secundário ao aumento no
número e sensibilidade dos receptores glicocorticóides (Yehuda, 2001).

Estruturas encefálicas como o hipocampo, o hipotálamo, a amígdala e o córtex pré-frontal


estão envolvidas nos processos de retroalimentação do eixo HHA (Sapolsky, 2003) e têm sido
preferencialmente identificadas em estudos clínicos com indivíduos com TEPT (Bremner, 2002;
Charney, 2004). Assim, alterações no eixo HHA e no complexo locus ceruleus-noradrenalina-
sistema nervoso simpático têm sido associadas a prejuízos em diversos sistemas funcionais
nos indivíduos com TEPT (Bremner, 2002; De Bellis, 2005; Elzinga & Bremner, 2002).

No entanto, as alterações associadas ao TEPT não são limitadas à desregulação de sistemas


neuroquímicos, envolvendo ainda modificações na estrutura e no funcionamento encefálicos.
Estudos empregando técnicas variadas de neuroimagem, como (a) imageamento por
ressonância magnética, (b) tomografia por emissão de pósitrons, (c) tomografia
computadorizada por emissão de fóton único, (d) imageamento por ressonância magnética
funcional, ou mesmo combinações de algumas dessas técnicas têm demonstrado prejuízos
estruturais e funcionais no encéfalo relacionados aos sintomas de TEPT (Bremner, 2002; para
uma revisão crítica desses estudos, ver Hull, 2002). Outras metodologias, como o exame
neurológico apontam na mesma direção (Gurvits e colaboradores, 2000). Tomados em
conjunto, esses estudos sugerem razoável evidência sobre o prejuízo em estruturas
encefálicas e funções cognitivas relacionadas ao TEPT. As principais áreas funcionalmente
prejudicadas em indivíduos que desenvolveram TEPT após um evento estressor incluem:
córtex pré-frontal, córtex visual de associação, hipocampo, giro cingulado, amígdala e
núcleo accumbens (Hull; Horner & Hamner, 2002). Estas são estruturas funcionalmente
relevantes na performance de processos integrativos, como as funções executivas, regulação
do comportamento emocional, orientação espacial, e interpretação emocional, codificação e
armazenamento de informação (Mesulam, 2000).

Funcionamento cognitivo e avaliação neuropsicológica do TEPT

Considerando a natureza do TEPT, não é surpreendente que teorias psicológicas tenham sido
propostas em grande diversidade para explicar as desordens cognitivas e emocionais
características do transtorno (ver revisão em Brewin & Holmes, 2003). Entre outras tantas, uma
teoria que tem recebido crescente apoio empírico é a abordagem cognitiva proposta por Ehlers
e Clark (2000). O conceito central nessa abordagem é que o TEPT torna-se persistente quando
uma sensação de ameaça atual, corrente, influi no processamento cognitivo do trauma. Essa
sensação de ameaça (ou perigo iminente) resulta: (a) de avaliações excessivamente negativas
do trauma e/ou de suas conseqüências (e sintomas) e (b) da natureza da memória do evento
traumático, caracterizada por uma pobre elaboração, pobre integração em relação à memória
autobiográfica, forte memória associativa e forte pré-ativação (priming) perceptual. Essa
sensação de ameaça atual, uma vez ativada, é seguida pela expressão sintomatológica do
TEPT (revivência persistente do evento traumático e excitabilidade aumentada) além de outros
estados emocionais. Assim, além da presença de memórias do trauma pobremente elaboradas
- que facilmente são ativadas por associações situacionais - um conjunto de cognições,
metacognições e comportamentos contribui para a persistência do TEPT (Ehlers & Clark).

Apesar da grande ênfase direcionada às características específicas da memória do evento


traumático - bem como às desordens de sistemas múltiplos de memória (Elzinga & Bremner,
2002; McNally, 2003), prejuízos em outras funções cognitivas têm sido freqüentemente
associados ao TEPT. A investigação neuropsicológica dessa associação iniciou na década de
1980 (por exemplo, Everly & Horton, 1989), embora estudos com prisioneiros de guerra tenham
sido conduzidos já em décadas anteriores. Em um trabalho seminal, Wolfe e Charney (1991)
advogaram o uso da avaliação neuropsicológica para, entre outros objetivos: (a) estimar
habilidades cognitivas; (b) facilitar a compreensão da sintomatologia pós-traumática,
especialmente quando o evento estressor inclui um potencial dano físico ao sistema nervoso
central - por exemplo, após acidentes de trânsito; (c) auxiliar no planejamento das intervenções
terapêuticas; (d) favorecer a compreensão sobre o curso temporal do transtorno. Mais de uma
década após a publicação de Wolfe e Charney, os avanços nessa área de investigação são
notáveis. Revisões da literatura na área (Danckwerts & Leathem, 2003; Horner & Hamner,
2002) foram capazes de incluir em torno de 20 estudos empíricos sobre avaliação
neuropsicológica no TEPT, bem como a edição de um livro recente sobre o tema (Vasterling &
Brewin, 2005).

Ao revisarem a literatura na área, Horner e Hamner (2002) observaram que os prejuízos nas
funções cognitivas, verificados através de testagem neuropsicológica, apresentaram-se de
forma relativamente uniforme, independentemente da natureza do evento estressor. Entre as
funções cognitivas mais comumente prejudicadas nos indivíduos com TEPT, ao longo dos
diferentes estudos revisados, encontram-se: (a) memória, em maior grau envolvendo
recuperação imediata de informações verbais e visuais e, em menor grau, recuperação não-
imediata; (b) atenção, nas modalidades verbal e visual; e (c) funções executivas, incluindo
provas de resolução de problemas (Horner & Hamner). Ao menos três aspectos merecem
consideração adicional. Primeiro, é importante notar como os prejuízos nas funções cognitivas
acima listadas são compatíveis com as alterações funcionais ou anatômicas associadas ao
TEPT identificadas em estruturas encefálicas (conforme descrito na seção anterior). Estruturas
como o hipocampo, amígdala, córtex pré-frontal e giro cingulado são componentes centrais do
substrato neurobiológico que permite o processamento mnêmico, atencional e executivo
(Mesulam, 2000; Royall e colaboradores, 2002). Segundo, esses prejuízos em funções
cognitivas demonstráveis através de testagem neuropsicológica em populações clínicas
apresentam-se em consonância com aqueles identificados através de estudos empíricos na
tradição da psicologia cognitiva experimental, empregando tarefas de escuta dicótica,
reconhecimento auditivo, procedimento de Stroop modificado (ou Stroop emocional) e memória
autobiográfica, entre outras provas experimentais (McNally, 1998). Terceiro, os prejuízos em
funções cognitivas demonstrados tanto através da avaliação neuropsicológica quanto da
investigação experimental, não somente oferecem grande apoio empírico à abordagem
cognitiva proposta por Ehlers e Clark (2000) para explicar o TEPT, como também podem ser
utilizados para avançar com a teorização. Nesse sentido, além do emprego clínico para a
avaliação neuropsicológica no TEPT destacado por Wolfe e Charney (1991), o presente
trabalho propõe uma finalidade adicional, qual seja, sugerir a avaliação neuropsicológica como
uma metodologia de investigação empírico-clínica para o avanço das teorias psicológicas do
TEPT.

Como ilustração do terceiro ponto acima levantado, é possível indicar que o prejuízo em
funções executivas é um componente central no modelo do processamento cognitivo no TEPT.
No modelo proposto por Ehlers e Clark (2000), por exemplo, de maneira mais ou menos
explícita, ênfase é dada a erros de interpretação de estímulos ambientais, dificuldades em
processos de automonitoramento e prejuízos na integração de conteúdos mnêmicos. Esses
são processos que envolvem justamente a participação de funções executivas (Mesulam, 2000;
Royall e colaboradores, 2002), cujos prejuízos parecem ser centrais na sintomatologia do
TEPT. Embora a definição de funções executivas não seja consensual, é importante notar que
a investigação neuropsicológica demonstrou prejuízos em diferentes processos cognitivos
associados ao TEPT dependentes do funcionamento executivo, como memória prospectiva
(Moradi, Neshat-Doost, Taghavi, Yule & Dalgleish, 1999), raciocínio abstrato (Beers & De
Bellis, 2002), flexibilidade mental (Kristensen & Borges, 2004; Stein, Kennedy & Twamley,
2002) e memória de trabalho (working memory, Stein e colaboradores). Em linhas gerais, o
prejuízo no funcionamento executivo tem sido sugerido em estudos com indivíduos expostos a
combate (Vasterling, Brailey, Constans & Sutker, 1998), prisioneiros de guerra (Sutker,
Vasterling, Brailey & Allain, 1995) ou expostos a estressores variados, incluindo combate ou
abuso sexual (Koenen e colaboradores, 2001). Adicionalmente, as estruturas encefálicas que
participam dos circuitos fronto-subcorticais provendo o substrato neural para o desempenho
das funções executivas (Heyder, Suchan & Daum, 2004; Royall e colaboradores, 2002) têm
sido implicadas no TEPT (Bremner, 2002; De Bellis, 2005; Yehuda, 2001).

Considerações finais

Embora a investigação neuropsicológica possa ser de grande utilidade no refinamento das


teorias psicológicas do TEPT, algumas limitações atuais devem ser reconhecidas. Quanto aos
aspectos metodológicos, é importante notar que a avaliação neuropsicológica tem sido
conduzida, em boa parte dos estudos, em amostras relativamente pequenas (Horner &
Hamner, 2002). Em termos diagnósticos, a elevada comorbidade entre os participantes com
TEPT em relação a outros transtornos, como Depressão Maior, Transtorno de Ansiedade
Generalizada, e abuso de álcool e substâncias, dificulta a identificação do prejuízo cogni-tivo
especificamente associado ao TEPT (Danckwerts & Leathem, 2003; Vasterling e
colaboradores, 1998). Estudos conduzidos com participantes expostos a combate ou
prisioneiros de guerra são particularmente propícios a incluir, pelas características da própria
população, participantes com elevada comorbidade, elevado uso de medicação, baixo nível
socioeconômico e baixa escolaridade em relação à população geral (Danckwerts & Leathem),
além de problemas relacio-nados à motivação, como compensação financeira e benefícios por
invalidez (Horner & Hamner).

Os prejuízos no funcionamento cognitivo são aspectos constitutivos do TEPT. Não por acaso,
teorias psicológicas recentes têm privilegiado desordens no processamento cognitivo de
eventos estressores trau-máticos para explicar a ocorrência do TEPT. A avaliação
neuropsicológica dos indivíduos com TEPT tem sido sugerida, entre outros fatores, por
contribuir na estimativa das habilidades cognitivas, responder a questões diagnósticas
diferenciais e auxiliar no planeja-mento terapêutico. A possibilidade de contribuições dessa
natureza é suficiente para justificar a adoção da avaliação neuropsicológica como um
procedimento de rotina nos pacientes com suspeita diagnóstica de TEPT.

Além das relevantes aplicações clínicas, o presente trabalho sugere que a avaliação
neuropsico-lógica tenha um papel central no refinamento das teorias psicológicas do TEPT.
Para tanto, algumas limitações metodológicas identificadas nos estudos atuais devem ser
superadas. Investigações futuras na área poderiam empregar metodologias combinadas, como
imageamento funcional e avaliação neuropsico-lógica, incluindo tarefas próximas a situações e
contextos cotidianos (Danckwerts & Leathem, 2003). Além das funções cognitivas
tradicionalmente avaliadas no TEPT, como memória e atenção, tarefas e testes sensíveis a
prejuízos executivos deveriam ser rotinei-ramente incluídos em qualquer avaliação neuropsico-
lógica. Particularmente na avaliação das funções executivas, especial ênfase deveria ser
conferida à sondagem de prejuízos cognitivos relacionados ao cotidiano dos pacientes, pois
características da situação altamente estruturada na testagem neuropsicológica podem
minimizar as dificuldades reais, quando a demanda pelo comportamento ocorre em um
contexto flexível e errático (Mesulam, 2000), diminuindo assim a validade ecológica das tarefas
propostas (Royall e colaboradores, 2002).

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Endereço para correspondência


Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Laboratório de Neurociências
Av. Unisinos, 950 - Caixa Postal 275
93022-000 São Leopoldo-RS
Tel./Fax: +55-51 3332-0326
E-mail: chkristensen@yahoo.com.br

Recebido em abril de 2005


Reformulado em setembro de 2005
Aprovado em fevereiro de 2006

Sobre os autores:

1
Christian Haag Kristensen é doutor em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), bolsista PDEE-CAPES na Universidade do Arizona
(2002/2003). Atualmente é professor assistente no Curso de Psicologia da Universidade do
Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) e pesquisador no Laboratório de Neurociências
(UNISINOS).
2
Maria Alice de Mattos Pimenta Parente é doutora em Psicologia pela Universidade de São
Paulo (USP), tendo realizado Pós-Doutorado na Universidade de Montreal, Canadá e
Universidade Tolouse Le-Mirail, França. Atualmente é professora titular no Instituto de
Psicologia (UFRGS).
3
Alfred W. Kaszniak é doutor em Psicologia pela Universidade de Illinois, Chicago, EUA.
Atualmente é chefe do Departamento de Psicologia na Universidade do Arizona, professor de
Psicologia, Psiquiatria e Neurologia e diretor do Programa de Neuropsicologia Clínica na
Universidade do Arizona.

Av. Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 - Centro


13251-900 Itatiba-SP

edusf@saofrancisco.edu.br

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