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DÉFICIT COGNITIVO:

UM DESAFIO PARA OS MÉDICOS DE


ATENÇÃO PRIMÁRIA

PATRICIA LICHTENFELS
Quando o nosso paciente apresenta uma queixa
de “esquecimento”, exemplos:

“Eu estou com a memória fraca...”


“Não consigo lembrar o nome dos meus netos...”
“Meu pai está esquecendo as coisas...”

Vamos considerar essa queixa como sendo um


DÉFICIT COGNITIVO
POSSÍVEIS CAUSAS DO DÉFICIT COGNITIVO:

• Déficit cognitivo associado ao envelhecimento


• Déficit cognitivo leve
• Déficit cognitivo devido a um quadro demencial
• Déficit cognitivo associado a um quadro de
depressão
O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO PRODUZ
IMPORTANTES MUDANÇAS FISIOLÓGICAS NO SNC:

ALTERAÇÕES NEUROANATÔMICAS:
• Atrofia cerebral, dimunuição do n° de neurônios

ALTERAÇÕES DE NEUROTRANSMISSORES:
• Diminuição das sínteses de dopamina e
catecolamina
declínio na transmissão colinérgica

ALTERAÇÕES NEUROFISILÓGICAS:
• Diminuição do fluxo sangüíneo cerebral, alterações
eletrofisiológicas
ESSES PROCESSOS RESULTAM EM SINTOMAS E
MANIFESTAÇÕES ASSOCIADAS AO
ENVELHECIMENTO:

FUNÇÃO COGNITIVA:
1. Esquecimentos

2. Declíneos neuropsicológicos
• Atenção seletiva
• Fluência verbal
• Percepção visual complexa
• Análise lógica
O declínio cognitivo que acompanha a idade tem
início e progressão extremamente variáveis,
dependendo de fatores educacionais, de saúde e
de personalidade, bem como do nível intelectual
global e capacidades mentais específicas do
indivíduo.

Tratado de Geriatria e Gerontologia


Freitas & col., 2002
O DECLÍNIO COGNITIVO É INFLUENCIADO
PELOS SEGUINTES FATORES:

• Dieta
• Estilo de vida
• Meio ambiente
• Predisposição genética
• Patologias
• Efeito colateral de drogas
O PACIENTE QUE REFERE UMA QUEIXA DE DÉFICIT
COGNITIVO PODE ESTAR APRESENTANDO:

• Perda de memória gradual e objetiva comparada a


dos adultos jovens normais, um adequado
funcionamento intelectual e sócio-ocupacional e
ausência de demência. O que caracteriza: DÉFICIT
COGNITIVO ASSOCIADO AO ENVELHECIMENTO

• Déficit de memória além do esperado para sua


faixa etária e nível educacional, mas não preenche
critérios diagnósticos de demência. O que
caracteriza: DÉFICIT COGNITIVO LEVE
• Diversos estudos têm sido conduzidos com o
objetivo de estudar o perfil cognitivo da população
que envelhece, sobretudo daqueles que têm queixa
de memória, na tentativa de verificar qual a relação
existente entre déficit cognitivo leve e o
desenvolvimento de quadros demenciais

• Os estudos têm demonstrado que os pacientes


com déficit cognitivo leve apresentam um risco
aumentado para o desenvolvimento de quadro
demencial

D.A. Bennett. Mild Cognitive Impairment, Clin. Geriatr. Med. 2004


COMO AVALIAR O NOSSO PACIENTE?

• Anamnese
• Exame físico e neurológico
• Avaliação da função cognitiva (mini-exame do
estado mental + teste do relógio)
• Avaliação de depressão (escala de depressão
geriátrica)
• Avaliação das atividades da vida diária
ANAMNESE

• Drogas - qualquer classe de drogas tem o


potencial de causar delirium em paciente
vulnerável, mas as drogas de maior risco e
que devem ser usadas com precaução no
paciente idoso são: benzodiazepínicos,
antihistamínicos, antihipertensivos,
bloqueadores H2, AINES, corticóides, etc.
EXAME FÍSICO

• Avaliação da visão (cartão de Jaeger)


• Avaliação da audição (teste Whisper)
• Avaliação do estado nutricional
• Avaliação de incontinência urinária
(hidrocefalia de pressão normal)
Cartão
de
Jaeger
AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO COGNITIVA

Mini-exame do estado mental (MMSE)

• É o instrumento mais utilizado para avaliar a


função cognitiva.

• Ele pode ser utilizado na detecção de perdas


cognitivas, no seguimento evolutivo de doenças e
no monitoramento de resposta ao tratamento
ministrado
M.F. Folstein &Col. “Mini-Mental State”, Jour. Psych. Res., 1975
PONTUAÇÃO DO MINI EXAME:

≥ 25 pontos - função cognitiva preservada

≤ 24 pontos - prejuízo cognitivo

11 a 20 pontos - prejuízo cognitivo moderado

≤ 10 pontos – prejuízo cognitivo severo


PONTUAÇÃO DO MINI EXAME:

Escores medianos por escolaridade:

Analfabetos – 20
1 a 4 anos de escolaridade – 25
5 a 8 anos de escolaridade – 26,5
9 a 11 anos de escolaridade – 28
Mais de 11 anos de escolaridade – 29

S.M.D.Brucki &Col. Sugestôes para o uso do mini-exame do estado


mental no Brasil. Arq. Neuropsiq. 2003
• O mini-exame é um teste representativo da
função cortical e tem por isso uma correlação com
a habilidade do indivíduo para tomar decisões

• Os escores do MEEM < 10 são diagnósticos de


comprometimento cognitivo tão severo que
impedem o indivíduo de tomar decisões

• O MEEM avalia presença de déficits cognitivos e


não de demência, cuja avaliação depende de
outros testes e exames
TESTE DO RELÓGIO (CLOCK TEST)

• É um instrumento de fácil e rápida aplicação, que


avalia as funções frontal e têmporo-parietal
• Ele pode ser utilizado para screening de quadros
demenciais e para avaliação da severidade do
quadro demencial
• A sua sensibilidade para detectar déficits
cognitivos leves é menor, em relação a detecção
de déficits cognitivos moderados e severos, por
isso deve ser usado juntamente com outros testes
(MMSE)
Y.Nishiwaki &Col. Validity Of the Clock-Drawing Test as a Screening Tool For
Cognitive Impairment in the Elderly. Am. Jour. Epidem., 2004
EXEMPLOS – TESTE DO RELÓGIO
EXAMES COMPLEMENTARES PARA
INVESTIGAÇÃO DE QUADRO DEMENCIAL:

• Hemograma
• Creatinina + eletrólitos
• Provas de função hepática
• Cálcio
• TSH
• Dosagem de vitamina B12
• VDRL
• Anti HIV
•Tomografia de crânio
AS 3 PRINCIPAIS CAUSAS DE DEMÊNCIA
TRATÁVEL EM PACIENTES IDOSOS SÃO:

• Toxicidade por medicações

• Depressão

• Doenças da tireóide
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA DEMÊNCIA:

• Definição do DSM-III para o diagnóstico de demência:


Um estado de comprometimento da memória associado a
perdas em outras habilidades cognitivas, ou mudanças na
personalidade que persistem (> 6 a 12 meses) e interferem
na vida social e ocupacional do indivíduo

• Cummings & Benson nos oferecem um esquema


diagnóstico alternativo:
Um comprometimento adquirido em pelo menos 3 dos
seguintes domínios: linguagem, memória, habilidade
visoespacial, personalidade e outras funções cognitivas
(abstração, cálculo, julgamento)

W.R.Hazzard & Col. Principles of Geriatric Medicine and Gerontology, 2003


EPIDEMIOLOGIA DOS QUADROS DEMENCIAIS

• Os quadros demenciais moderados a severos


afetam aproximadamente 8% das pessoas com
mais de 65 anos

• A maior parte dos quadros demencias ocorrem


em indivíduos “muito velhos”

• A prevalência é de 20% em pessoas com 80


anos ou mais e de 30% em pessoas com mais de
90 anos
CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS:

Podemos dividir as demências em subcorticais e corticais:

Demências subcorticais se caracterizam por:


• Perda de memória, apatia, lentidão, distúrbios do
movimento, linguagem e habilidade visoespacial
normais

Causas de demência subcortical:


• Hipotireoidismo, doença de Parkinson, esclerose
múltipla, hidrocefalia de pressão normal,
pseudodemência depressiva, demência vascular
CARACTERÍSTICAS DAS DEMÊNCIAS
CORTICAIS

• Perda de memória e múltiplos comprometimentos


nas funções corticais: AFASIA, APRAXIA,
AGNOSIA

• O exemplo mais comum de demência cortical é a


Doença de Alzheimer, também fazem parte as
Demências Frontais, a Demência por Corpos de
Lewy e demências raras como Creutzfeldt-Jakob
DÉFICIT COGNITIVO ASSOCIADO A UM QUADRO
DE DEPRESSÃO

• 20 a 50% dos pacientes que apresentam distúrbios


orgânicos no SNC como: AVC, D. de Parkinson, D.
de Alzheimer apresentam sintomas de depressão
maior

• Devemos sempre confirmar a alteração do humor


com o próprio paciente, pois muitas vezes a família
nos relata uma “depressão” quando na realidade o
paciente apresenta-se com apatia
• A depressão raramente causa déficits
cognitivos focais como: AFASIA, APRAXIA E
AGNOSIA

• O tratamento antidepressivo pode melhorar


tanto os distúrbios do humor como os distúrbios
da função cognitiva

L.R.Barker & Col. Principles of Ambulatory Medicine, 2003


QUANDO PENSAR QUE O DÉFICIT COGNITIVO É
CAUSADO POR UM QUADRO DE DEPRESSÃO?

• O início do declínio cognitivo é subagudo (< 6


meses e particularmente menor que 3 meses)
• O paciente apresenta uma história prévia de
depressão
• O quadro de demência é complicado por sintomas
hipocondríacos
• O paciente constantemente enfatiza o seu declínio
cognitivo
• O paciente refere sintomas como: acordar-se muito
cedo pela manhã, sentir-se sem energia, se auto
censurar
Mesmo que o paciente apresente uma melhora do
seu declínio cognitivo com o tratamento para
depressão, esse paciente possui um risco de 50%
para desenvolver um quadro de demência nos
próximos 5 a 10 anos

D.S.Geldmacher. Differ. Diag. Of Dementia Syndromes. Clin. Geriat. Med., 2004


“Não é pela força física, nem pela agilidade e rapidez
corporal, que as grandes coisas são realizadas, mas
sim, pela resolução, autoridade e juízo, qualidades que
existem na idade avançada, mas com a qual
geralmente, ela está até mesmo provinda mais
abundantemente” (Cícero)

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