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SEÇÃO•ORTODONTIA•CLÍNICA

[ 58 ] © Dental Press Publishing | Clin Orthod. 2021 Dec-2022 Jan;20(6):58-70


Tratamento da má oclusão de Classe II com
retrognatismo mandibular utilizando propulsor
mandibular associado a aparelhos autoligáveis
passivos com prescrições individualizadas

H E N R I Q U E
MASCARENHAS
VILLELA
1 caso clínico, com um protocolo de
tratamento para corrigir esse tipo de
deformidade dentofacial, associando
propulsores mandibulares aos braquetes
autoligáveis passivos com prescrições indivi-
Resumo
dualizadas. O tratamento ortodôntico visou preparar as
INTRODUÇÃO: A correção da má oclusão de Classe II com arcadas para efetuar o avanço ortopédico, bem como inibir
deficiência mandibular em pacientes em fase de cresci- os efeitos colaterais indesejados decorrentes das forças
mento necessita de uma abordagem ortopédica associada geradas pelo propulsor mandibular. Essa abordagem
ao tratamento ortodôntico para, além de corrigir as rela- promoveu uma rotação horária de 2,5° do plano oclusal
ções dentárias, estimular o crescimento da mandíbula e (PHF.POcl de 2,5° para 5,0°); porém, manteve o plano
reduzir a convexidade facial. Os propulsores mandibulares mandibular (FMA=17°). A relação sagital entre maxila e
podem ser utilizados acoplados aos aparelhos ortodônticos mandíbula melhorou, com uma redução de 4° no ANB (de 6°
fixos, com o objetivo de efetuar a correção ortopédica jun- para 2°). A inclinação dos incisivos superiores aumentou,
tamente com as movimentações ortodônticas necessárias. promovendo um trespasse horizontal, permitindo a cor-
OBJETIVO: O presente artigo apresenta um relato de reção ortopédica com o avanço mandibular. A inclinação
dos incisivos superiores aumentou 19° (1.PP de 100° para
1. Mestre em Ortodontia, UNIARARAS (Araras/SP, Brasil). Especialista em 119°), e a dos inferiores aumentou 7° (IMPA de 93° para 100°).
Ortodontia e Ortopedia Facial, Associação Brasileira de Odontologia-BA
A convexidade facial melhorou 4° (Â Conv.Face de 163° para
(Salvador/BA, Brasil).
167°). CONCLUSÃO: A associação do propulsor mandibular

https://orcid.org/0000-0002-4473-583X com os aparelhos autoligáveis passivos com prescrições


individualizadas se mostrou eficiente na correção da má
oclusão de Classe II, promovendo um bom efeito ortopédico
Como citar: Villela HM. Treatment of Class II malocclusion with mandibular
retrognathism using mandibular propulsion associated to passive self-ligating e inibindo os efeitos ortodônticos indesejáveis.
appliances with individualized prescriptions. Clin Orthod. 2021 Dec-2022
Palavras-chave
Jan;20(6):58-70.
DOI: https://doi.org/10.14436/2675-486X.20.6.058-070.ort
Má oclusão de Classe II. Aparelho funcional fixo. Aparelhos

Enviado em: 29/10/2021 - Revisado e aceito: 10/11/2021


autoligáveis passivos. Prescrições individualizadas.
Endereço para correspondência: Henrique Mascarenhas Villela
E-mail: hvillela@terra.com.br

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Villela HM Tratamento da má oclusão de Classe II com retrognatismo mandibular utilizando propulsor mandibular associado a aparelhos autoligáveis passivos com prescrições individualizadas

INTRODUÇÃO tinuamente e não depender da colaboração do


paciente6,7. Pacientes com um ângulo goníaco
A má oclusão de Classe II está presente em um em torno de 122°, com características de cresci-
grande segmento da população que necessita mento mais horizontal, apresentam as melhores
de tratamento ortodôntico por razões estéticas respostas de estímulo de crescimento mandibu-
e funcionais. Para efetuar um planejamento lar nesse tipo de má oclusão8.
mais adequado das correções desse tipo de má
oclusão, as relações dentárias não podem ser Os propulsores mandibulares promovem um
avaliadas isoladamente. Outros fatores, como giro no sentido horário do plano oclusal. Esse
o padrão facial e a época de tratamento, devem efeito é decorrente dos componentes de forças
ser levados em conta para se obter metas te- verticais, que acarretam a intrusão dos molares
rapêuticas individualizadas e mais eficientes. superiores e dos incisivos inferiores. Esse efeito
Para isso, é necessário avaliar as estruturas dentário promove, também, a extrusão dos mo-
esqueléticas, as relações dentárias e o poten- lares inferiores e dos incisivos superiores. Sendo
cial de crescimento . 1,2
assim, essa abordagem pode estar contraindica-
da em pacientes com ângulo do plano oclusal
As metas terapêuticas no tratamento da má oclu- alto, principalmente os que têm mordida aberta
são de Classe II em um paciente em crescimento anterior e sorriso gengival acentuado9.
devem, além de corrigir as relações dentárias,
corrigir problemas esqueléticos e melhorar o Além disso, o propulsor mandibular, ao deslocar
perfil facial. Quando a má oclusão de Classe II a mandíbula para anterior, promove componen-
é associada ao retrognatismo mandibular, há tes de forças de distalização na arcada superior
uma tendência de se ter um perfil mais convexo, e de mesialização na arcada inferior. Essas for-
que é menos favorecido quando comparado com ças promovem uma tendência de aumento da
os perfis mais retos, com queixos mais proemi- inclinação dos incisivos inferiores e da retroin-
nentes3. A redução da convexidade de um perfil clinação dos incisivos superiores. Dessa forma,
com retrognatismo mandibular, decorrente da quando se deseja efetuar a correção ortopédica,
projeção do mento, aumenta significativamen- esses efeitos ortodônticos devem ser inibidos ou
te a atratividade . Como a maioria dos casos de
4
minimizados, pois essa movimentação dentária
Classe II envolve algum tipo de deficiência man- reduz a quantidade de avanço da mandíbula,
dibular, os aparelhos ortopédicos funcionais fi- diminuindo a eficiência do estímulo de cresci-
xos são amplamente utilizados na correção des- mento mandibular. Portanto, antes de instalar o
sa má oclusão, pois são capazes de estimular o propulsor no aparelho fixo, os incisivos devem
crescimento mandibular . 5
se encontrar bem posicionados em suas respec-
tivas bases ósseas, com um trespasse horizon-
O propulsor mandibular gera um maior cresci- tal compatível com a discrepância esquelética.
mento da mandíbula, em comparação aos pa- Da mesma forma, durante o período de utiliza-
cientes que não utilizam esse tipo de aparelho. ção do propulsor nos pacientes em crescimen-
Além disso, apresenta uma grande eficiência no to, a compensação dentária deve ser inibida,
tratamento da Classe II, por ser fixo, usado con- por meio da ancoragem esquelética ou com a

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utilização de prescrições individualizadas com Classe II de pré-molares; linha média dentária


braquetes de alto torque na arcada superior e superior desviada para a direita, em relação à
baixo torque na arcada inferior . 10
linha média dentária inferior; e relação entre os
incisivos superiores e inferiores com trespasse
Dessa forma, o presente artigo apresenta um vertical aumentado. A arcada superior apresen-
caso clínico com uma sugestão de protocolo de tou o canino direito retido, com bom alinhamen-
tratamento ortodôntico e ortopédico das más to dos demais dentes e presença de diastema
oclusões de Classe II com deficiência mandibu- na região do canino direito. Já a arcada inferior
lar em fase de crescimento. São abordados as- revelou um suave apinhamento dos incisivos
pectos do diagnóstico, como características fa- inferiores. Tanto na arcada superior quanto na
ciais, dentárias e esqueléticas do paciente, além inferior, os segundos molares estavam iniciando
da mecânica empregada, os resultados obtidos, a erupção na cavidade bucal (Fig. 2).
as avaliações e as discussões pertinentes.
A análise da radiografia panorâmica inicial,
DIAGNÓSTICO DO CASO CLÍNICO em topo, mostrou a presença de todos os den-
tes, com o canino superior direito retido, os
Paciente do sexo feminino, 11 anos e 2 meses de segundos molares em fase de erupção e os
idade, na análise facial frontal apresentou sime- terceiros molares com 1/3 da coroa formada.
tria facial, selamento labial passivo e terço infe- Os demais dentes e estruturas periodontais,
rior da face suavemente reduzido, em relação bem como a ATM, apresentavam condições de
ao terço médio. A análise facial lateral revelou normalidade (Fig. 3).
um perfil com convexidade levemente aumen-
tada, linha queixo-pescoço um pouco diminuí- A análise cefalométrica inicial revelou ângulos
da, com pouca projeção do mento e ângulo do do plano oclusal e plano mandibular reduzidos
mento suavemente aberto. Esses aspectos refle- (ângulo PHF.POcl = 2,5o e ângulo FMA = 17o). Além
tem uma suave deficiência mandibular; porém, disso, apresentou uma discrepância sagital
apresentou um bom ângulo nasolabial, o que re- aumentada entre maxila e mandíbula (ângulo
flete um bom posicionamento sagital da maxila. ANB = 6°). Porém, a maxila se encontrava bem
Todas essas características são típicas da face posicionada (SNA = 81°) e a mandíbula suave-
Padrão II, deficiente mandibular. Na avaliação mente retraída (SNB = 75°). Essas são caracterís-
do sorriso, apresentou suave assimetria da ar- ticas de pacientes Padrão II, deficiente mandibu-
cada superior, com a linha média dentária supe- lar e braquifacial. Além disso, mostrou incisivos
rior desviada para a direita em relação à linha superiores com retroinclinação (1.PP = 100°); já
média facial (Fig. 1). os inferiores apresentavam uma boa inclina-
ção (IMPA = 93o). Esses aspectos mostraram uma
A análise das arcadas dentárias revelou: má oclu- compensação dentária superior da discrepância
são de Classe II, divisão 2 de Angle, com 3/4 de sagital esquelética (Fig. 4).

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Figura 1: Vistas extrabucais iniciais.

Figura 2: Vistas intrabucais iniciais da


paciente com má oclusão de Classe II,
divisão 2, de Angle.

Figura 3: Radiografia panorâmica inicial. Figura 4: Telerradiografia em norma lateral


inicial, com as medidas cefalométricas.

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DESCRIÇÃO DO CASO CLÍNICO rior, deve-se utilizar um braquete com torque


mais elevado (HT), de no mínimo 12° a mais da
A primeira fase consistiu em preparar as arca- inclinação final desejada da coroa. O torque alto
das para receber os propulsores mandibula- é utilizado para impedir a retroinclinação dos
res, alinhando e nivelando até o fio retangular incisivos superiores durante o uso do propulsor,
0,019”x0,025” de aço. Na segunda fase, foi efetuado permitindo a correção ortopédica. Da mesma
o tratamento ortopédico com aparelho propulsor forma, o propulsor imprime na arcada inferior
mandibular fixado aos arcos ortodônticos. Na ter- uma força recíproca de mesialização, que pre-
ceira fase, foi efetuada a estabilização dos resulta- cisa ser inibida. Para tal, deve ser utilizado um
dos obtidos, com uso de elásticos intermaxilares. braquete com torque mais reduzido (LT), de no
mínimo 12° a menos da inclinação final desejada
Nesse caso, foram utilizados os braquetes Tellus da coroa, inibindo a tendência de aumento da
EX (Eurodonto, Curitiba/PR), metálicos, autoligá- inclinação nos incisivos13.
veis passivos, com slot 0,022” e com prescrições
individualizadas. Na arcada superior, foi utiliza- A abertura do espaço para o canino superior di-
do o torque alto (High Torque, HT) nos incisivos reito foi iniciada com mola de NiTi em um arco
centrais (+23°), nos incisivos laterais (+14°) e nos 0,014” de NiTi termoativado (Fig. 5).
caninos (+12°). Na arcada inferior, foi utilizado
torque baixo (Low torque, LT) nos incisivos (-10°); Após a erupção do canino superior, foi cola-
porém, torque padrão (Standard, S) foi utilizado do um braquete nesse dente e instalado o arco
nos caninos (+7°). 0,018” de NiTi termoativado. Já na arcada in-
ferior, foi iniciada a mecânica de alinhamento
A posição final do dente nem sempre correspon- com o arco 0,014” de NiTi termoativado. Para
de à prescrição do braquete escolhido. Para isso, que fosse possível colar os braquetes na arca-
são utilizados torques individualizados, com a da inferior, foi necessário efetuar um levante
intenção de compensar a folga entre o slot do de mordida, com cimento de ionômero de vi-
braquete e o arco ortodôntico. O valor da pres- dro azul, na face oclusal dos primeiros mo-
crição do torque do braquete não é expresso na lares superiores. Os segundos molares não
sua totalidade, pois uma porcentagem do tor- foram incluídos na mecânica, pois ainda não
que é perdida, devido à folga existente entre o tinham concluído sua erupção (Fig. 6).
slot e o fio. O arco de maior calibre utilizado com
os braquetes autoligáveis é o 0,019” x 0,025” de Posteriormente, os arcos foram trocados pelos
aço, em um slot 0,022” x 0,028”. Essa combinação 0,014” x 0,025” e, em seguida, 0,019” x 0,025” de
apresenta uma folga de 12° em uma direção e, NiTi termoativados, iniciando o nivelamento das
se contabilizarmos as duas direções, perfaz um arcadas. Nessa fase, os segundos molares devem
total de 24° de folga .
11,12
ser incorporados. Entretanto, os segundos mola-
res inferiores ainda não tinham irrompido, cau-
Diante das forças de retração impostas pelo pro- sando um aumento no tempo de preparo para
pulsor mandibular nos dentes na arcada supe- instalação do propulsor mandibular (Fig. 6).

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Com a erupção dos segundos molares, foi inicia- necer por, no mínimo, quatro semanas, para que
da a inclusão desses dentes na mecânica orto- as prescrições dos torques dos braquetes possam
dôntica. Na arcada superior, os tubos foram cola- efetuar um melhor posicionamento dos incisivos
dos e foi inserido o arco 0,014” x 0,025” de NiTi ter- antes da instalação do propulsor (Fig. 9).
moativado. Como o segundo molar inferior não
apresentava a coroa clínica totalmente irrompi- Os propulsores mandibulares rígidos, tipo Herbst,
da, foi colado um minitubo (Morelli, São Paulo). foram fixados aos arcos ortodônticos, efetuando
Outro aspecto importante é efetuar o aumento o avanço mandibular até a relação de topo dos
do levante de mordida, para remover qualquer incisivos superiores com os inferiores, coin-
tipo de interferência oclusal e permitir a colagem cidindo a linha média superior com a inferior.
desses tubos. Foi instalado o arco 0,018” de NiTi Na arcada superior, os propulsores foram posi-
termoativado na arcada inferior, devido ao desni- cionados entre os primeiros e segundos mola-
velamento existente entre os molares (Fig. 8). res e, na arcada inferior, entre os primeiros e
segundos pré-molares. Para ajudar a consolidar
Após a inclusão dos segundos molares, o nive- a ancoragem dentária, cadeias elastoméricas fo-
lamento das arcadas foi concluído até os arcos ram instaladas em ambas as arcadas, incluindo
0,019” x 0,025” de aço. Pode-se observar que as todos os dentes (Fig. 10).
linhas médias dentárias superior e inferior se
encontravam coincidentes, em decorrência da O propulsor foi removido após dez meses de uso,
abertura de espaço para a inclusão do canino su- e iniciou-se a fase de contenção dos resultados
perior. Nessa fase, os arcos são preparados para obtidos, por meio do uso de elásticos intermaxila-
receber os propulsores mandibulares. Para tal, res de Classe II. Essa fase não pode ser negligen-
são feitas dobras justas na extremidade do arco, ciada e deve durar no mínimo seis meses (Fig. 11).
na distal dos tubos dos segundos molares supe-
riores e inferiores. Essas dobras são efetuadas O aparelho fixo não deve ser removido até que
para impedir a abertura de diastemas nas arca- se obtenha um bom encaixe dos dentes e uma
das, diante das forças impostas pelo propulsor boa chave de oclusão, pois a boa relação dentá-
mandibular, e aumentar a ancoragem dentária. ria ajuda a manter os resultados obtidos. Para
Além disso, os levantes de mordida devem ser re- isso, foram efetuadas dobras de finalização, jun-
movidos, pois, nessa fase, as arcadas devem estar tamente com a utilização de elásticos de inter-
totalmente niveladas. Esses arcos devem perma- cuspidação (Fig. 12).

Figura 5: Arco inicial 0,014” de NiTi termoativado.

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Figura 6: Arco superior 0,018” de NiTi termoativado e arco inferior 0,014” de NiTi termoativado.

Figura 7: Arcos retangulares 0,019” x 0,025” de NiTi termoativados.

Figura 8: Arco 0,014” X 0,025” NiTi termoa-


tivado na arcada superior e arco 0,018” NiTi
termoativado na arcada inferior.

Figura 9: Arcos 0,019" x 0,025” de aço.

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Figura 10: Propulsores mandibulares fixados aos arcos 0,019" x 0,025” de aço.

Figura 11: Início da fase de estabilização, com uso de elásticos intermaxilares de Classe II nos arcos 0,019" x 0,025” de aço.

Figura 12: Dobras de finalização nos arcos 0,019" x 0,025” de aço.

RESULTADOS

Ao fim do tratamento, os incisivos mantiveram No aspecto facial, houve modificações positivas,


uma boa relação de trespasses vertical e horizon- com o avanço do mento, a redução da convexi-
tal. Além disso, a relação sagital das arcadas foi dade facial e a correção da linha média dentária
corrigida, com a obtenção da relação Classe I superior. A relação vertical dos incisivos supe-
dos caninos, pré-molares e molares. Também riores com o lábio ficou adequada, tanto com os
pode-se observar uma boa forma final das arca- lábios entreabertos, mostrando o terço incisal,
das. Foi instalada uma barra fixa 3 x 3 na arcada quanto no sorriso, expondo toda a coroa clínica
inferior, como contenção (Fig. 13). e uma pequena faixa de gengiva (Fig. 14 e 15).

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Figura 13: Vistas intrabucais finais da


paciente, com trespasses horizontal e
vertical dos incisivos normalizados, rela-
ção dos molares, pré-molares e caninos
em Classe I, e boa forma das arcadas.

Figura 14: Vistas extrabucais finais.

Figura 15: Vistas aproximadas da relação


dos incisivos superiores com os lábios
entreabertos e sorrindo.

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A análise da radiografia panorâmica final, em rações revelaram um bom efeito ortopédico desse
relação de topo, mostrou a presença de todos os protocolo, mostrando um bom avanço da mandí-
dentes, com os terceiros molares apresentando bula no sentido horizontal, inibindo a compensa-
coroas formadas. Os dentes, as demais estrutu- ção dentária (Fig. 17).
ras periodontais e ATM mostraram condições de
normalidade (Fig. 16). A sobreposição total em SN, com registro em S,
revelou um crescimento mandibular favorável,
As medidas cefalométricas finais melhoraram, com o deslocamento mais horizontal do men-
em comparação com as iniciais: o ângulo do pla- to em relação à maxila. A sobreposição parcial
no oclusal aumentou 2,5° (ângulo PHF.POcl de 2,5° da maxila, sobre o plano palatino, com registro
para 5,0°); o ângulo do plano mandibular não se em ENA, mostrou aumento da inclinação dos
alterou (ângulo FMA=17°); a discrepância sagital incisivos e uma discreta extrusão dos molares.
entre maxila e mandíbula diminuiu 4° (ângulo ANB A sobreposição parcial da mandíbula sobre sua
de 6° para 2o); a inclinação dos incisivos superiores base, com registro na sínfise, exibiu uma con-
aumentou 19° (1.PP de 100° para 119°) e dos inferio- tenção da extrusão dos incisivos inferiores com
res aumentou 7° (IMPA de 93° para 100°). Essas alte- a extrusão dos molares inferiores (Fig. 18).

Figura 16: Radiografia panorâmica final. Figura 17: Telerradiografia em norma late-
ral final, com as medidas cefalométricas.

Figura 18: Sobreposição dos traçados


iniciais e finais.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS desses dentes. O objetivo dessa prescrição foi


promover o aumento da inclinação inicial, bem
No caso clínico abordado, o aparelho propulsor como inibir o efeito retrusivo do propulsor man-
mandibular escolhido foi o rígido, tipo Herbst, dibular. Já na arcada inferior, o baixo torque (LT)
uma vez que produz maior efeito ortopédico, em se mostrou eficiente em amenizar a tendência
relação aos híbridos ou flexíveis, que promovem de vestibularização dos incisivos inferiores de-
mais efeito ortodôntico14,15. Contudo, o aparelho corrente da correção da curva de Spee aumen-
utilizado é conectado aos arcos do aparelho orto- tada, juntamente com o componente protrusivo
dôntico fixo, o que traz uma desvantagem em re- gerado pelo propulsor mandibular. O aumento
lação ao aparelho Herbst convencional, que é a de- da inclinação dos incisivos superiores foi de 19°,
mora em iniciar sua instalação, pois essa depende enquanto na arcada inferior, foi de apenas 7°.
da erupção completa dos segundos molares e da
incorporação desses dentes no aparelho fixo. Os melhores resultados são encontrados em pa-
cientes que apresentam um ângulo goníaco em
O propulsor mandibular, ao deslocar a mandí- torno de 122°. Dessa forma, os pacientes Clas-
bula para anterior, promove componentes de se II que apresentam um padrão de crescimento
forças de distalização na arcada superior e de mais horizontal, tipo braquifacial, teriam uma
mesialização na arcada inferior. Essas forças resposta mais favorável a esse tipo de terapia16.
promovem uma tendência de aumento da in-
clinação dos incisivos inferiores e a retroincli- Após oito meses de uso do propulsor, os côndilos
nação dos incisivos superiores. Quando dese- apresentam um crescimento, sendo levados à
jamos efetuar uma correção ortopédica, esses sua posição inicial na cavidade articular17. Ape-
efeitos colaterais são indesejados, pois reduzem sar disso, o avanço mandibular deve ser manti-
a eficiência da correção ortopédica. Para inibir o do durante dez a doze meses com o propulsor
efeito dentário indesejado promovido pelo pro- e, depois, contido com uso de elásticos por mais
pulsor mandibular, torques individualizados seis meses. O tempo é um fator crítico na matu-
devem ser selecionados, como alto torque (HT) ração do osso recém-formado e na estabilidade
nos incisivos superiores e baixo torque (LT) nos dos resultados alcançados.
incisivos inferiores.
CONCLUSÃO
No caso clínico mostrado, os incisivos superio-
res tiveram um aumento significativo da incli- O propulsor mandibular fixo se mostrou eficien-
nação, em relação à posição inicial, devido a te na correção ortopédica da Classe II, quando
dois fatores: primeiro, a abertura de espaço para associado aos braquetes autoligáveis passivos
o canino superior direito; e segundo, a prescri- com prescrições individualizadas, reduzindo os
ção de alto torque (HT) utilizada nos braquetes efeitos colaterais ortodônticos indesejados.

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Treatment of Class II malocclusion from the forces generated by the mandibular


with mandibular retrognathism using propulsion. This approach promoted a clockwise
mandibular propulsion associated to rotation of 2.5° in the occlusal plane (FHP.Ocl Pl
passive self-ligating appliances with from 2.5° to 5.0°); however, the mandibular plane
individualized prescriptions was maintained (FMA = 17°). The sagittal relationship
between maxilla and mandible improved, with a 4°
Abstract ANB reduction (ANB from 6° to 2°). Maxillary inci-
Introduction: : Correction of Class II malocclusion sors increased inclination, promoting a horizontal
with mandibular deficiency in growing patients trespass (overjet), allowing orthopedic correction
requires an orthopedic approach associated with with mandibular advancement. The inclination
orthodontic treatment to, in addition to correcting of the maxillary incisors increased by 19° (1.PP
tooth relationships, stimulate mandibular growth from 100° to 119°), and the lower incisors had an
and reduce facial convexity. Mandibular propulsion increase of 7° (IMPA from 93° to 100°). Facial con-
can be used coupled to fixed orthodontic appliances, vexity improved by 4° (FCA 163° to 167°). Conclusion:
to carry out the orthopedic correction, together with The association of the mandibular propulsion to
the necessary orthodontic movements. Objective: passive self-ligating appliances with individualized
This article presents a clinical case report, with a prescriptions proved to be effective in correcting
treatment protocol to correct this type of dentofacial Class II malocclusion, promoting a good orthopedic
deformity, associating mandibular propulsion to effect and inhibiting unwanted orthodontic effects.
passive self-ligating brackets with individualized
prescriptions. The aim of orthodontic treatment was Keywords
to prepare the arches for orthopedic advancement, Malocclusion, Angle Class II. Fixed functional appliance.
as well as to inhibit unwanted effects resulting Self-ligating appliances. Individualized prescriptions.

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