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Platão
LISIS
INTRODUÇÃO
LISIS
SÓCRATES
-Que tipo de caçador você acha que seria aquele que assustou a
caça e a dificultou? presa?
- É claramente ruim.
b - E não é o cúmulo da falta de jeito usar a atração dos discursos e das
músicas para assustar?
- Parece-me.
- Olha então, Hipótales, não se culpe de tudo isso por causa da
sua poesia. Realmente me ocorre que um homem que se prejudica
não vai me dizer que, fazendo o que faz, é um bom poeta.
- Não, pelos deuses, ele me disse, porque seria uma grande loucura.
c Por isso, Sócrates, eu te consulto e, se tiver outros meios, me aconselha
sobre o que dizer ou fazer para que seja agradável aos olhos do amado.
- Não é fácil dizer, respondi, mas se você quisesse que ele viesse falar
comigo, talvez eu pudesse te mostrar aquelas coisas que deveriam ser
conversadas, em vez daquelas que, como eles próprios dizem, você
recita e canta .
d - Não é nada difícil, disse ele. Se você entrar com Ctesipo e sentar e
começar a conversar, tenho certeza que ele mesmo irá se aproximar de você,
porque, acima de tudo, ele adora ouvir. Além disso, como agora são as festas
de Hermes, adolescentes e crianças se misturam.8. Definitivamente está
chegando. Se não o fez, Ctesipo o trata muito por seu primo Menexeno, que
é o seu melhor companheiro de todos; Deixe-o ligar para ele, se ele não vier
sozinho.
8 Platão destaca, ainda mais claramente, o cenário do diálogo. Não nos indica
apenas o local, a arena, mas o horário específico, as festas de Hermes, patrono dos
ginásios. Nessas festas era permitida maior liberdade e certas separações podiam ser
quebradas.pedagógicoentre adolescentes e crianças. Hypotales era mais velho que
Lysis, que tinha entre 12 e 14 anos.
- Pelo céu, ele disse, oh Sócrates, você não apenas me impede, mas me bateria
se eu colocasse minhas mãos neles.
e - Por Hércules!, eu disse. Você talvez tenha incomodado seu pai ou sua mãe com
alguma coisa?
- Por Zeus, este não é o meu caso, disse ele.
- Mas por que então colocam obstáculos à sua felicidade e
para fazer o que você quer?13, e, o dia inteiro, sempre te mantêm
escravizado e, enfim, você não faz nada do que quer? De
Então, ao que parece, nem toda essa riqueza que você possui lhe serve de
209a alguma coisa, já que tudo isso comanda mais que você, nem esse corpo
esplêndido que, aliás, é atendido e cuidado por outra pessoa; porque você,
Lysis, não comanda nada, nem faz nada que queira.
13 Felicidade e liberdade. As pequenas liberdades a que Sócrates alude expressam
uma área em que a felicidade advém da realização de um desejo. Estes desejos, porém,
que moldam as possibilidades de um jovem da aristocracia ateniense não podem ser
satisfeitos logicamente. Nem o amor nem a felicidade podem ser reduzidos a este
âmbito estreito.
- Mas isto é porque ainda não sou velho, disse ele, Sócrates.
- Não, não é isso que te impede, filho de Democratas, pois, creio eu, há
algo, pelo menos, que tanto o pai como a mãe te abandonam e não esperam
que você atinja a maioridade; porque, quando quiserem que algo lhes seja
lido ou escrito, penso que é a ti, antes de qualquer outro membro da família,
que o confiarão. Não é assim?
- Claro que é, ele disse.
b - Então, neste caso, você pode escolher livremente qual letra deseja
escrever primeiro e qual segunda e também pode fazê-lo durante a leitura. E
quando, como suponho, você pega a lira, nem seu pai nem sua mãe o
impedem de afrouxar a corda que você deseja e fazê-la soar com os dedos
ou com a palheta, ou eles o impedem?
- Não, a propósito.
- Qual seria então, Lisis, o motivo pelo qual colocaram obstáculos no seu
caminho nas coisas que anteriormente dissemos que colocaram para você?
c - Porque acho, disse ele, que sei disso; mas não aqueles.
- Está tudo bem, amigo, eu disse. Não é, então, a sua idade que o pai
espera para confiar tudo em você, mas sim o dia em que ele achar que você
é mais inteligente. que o; então ele se confiará a você e, com ele, lhe confiará
todas as suas coisas.
- Acho que sim, ele disse.
- Bem, eu disse a ele, o que acontece com o vizinho então? Ele não terá
intenções semelhantes em relação a você como seu pai? Você não acha que
ele confiará em você as finanças da casa dele, quando entender que você se
d administrará melhor do que ele? Ou ele assumirá a liderança?
- Acho que ele vai confiar em mim.
- Bem, você não acha que os atenienses também confiarão em você suas coisas
quando perceberem que você é bastante sensato?14.
14. A educação como processo que conduz ao amadurecimento intelectual e
humano (phroneîn).Quando esta maturidade é atingida, já se está fora da esfera
familiar e com pleno controle da Polis. Como fazer oFiliacolaborar neste processo? As
semelhanças deLisee eleCharmidesEles vão além da simples forma.
- Por Zeus!, eu disse a ele. E o que acontecerá com o Grande Rei? Será que
ele confiará ao seu filho mais velho, que está encarregado da Ásia, ele
confiará a ele, eu digo, melhor do que nós, quando ele estava cozinhando a
e carne, para adicionar o que quisesse ao molho, supondo que chegássemos
ao lado dele e Mostrar a ele que somos melhores que seu filho em temperar
comida?
- É claro que para nós, disse ele.
- Então você não deixava ele colocar nem um pedacinho, e por outro lado,
você deixaria, mesmo que quiséssemos colocar sal aos montes?
- Como não!
210a - E que! Se os olhos do seu filho ficassem ruins, você deixaria
alguém tocá-los, sabendo que não era médico, ou os impediria?
- Previna-se.
- Mas para nós, se ele suspeitasse que éramos médicos e
quiséssemos, ao abrir os olhos, enchê-los de cinzas, creio que ele não
nos impediria, na convicção de que estávamos agindo corretamente.
- Você diz a verdade.
- Então, ele não nos confiaria todas as outras coisas melhor do que ele
mesmo ou seu filho, em tudo o que lhe parecíamos saber mais do que eles?
- Necessariamente, disse, oh Sócrates.
b É assim que as coisas são, querida Lisis, eu disse a ele. Naquilo que
nos entendemos, todos confiam em nós, gregos e bárbaros, homens e
mulheres. Faremos, portanto, nessas coisas o que quisermos, e
ninguém poderá nos impedir de fazê-lo, mas nelas seremos totalmente
livres e dominaremos os outros, e tudo isso será nosso porque
aproveitamos isso .quinze. Mas naquilo em que não alcançamos o
conhecimento, ninguém nos permitirá fazer o que queremos, antes nos
impedirão de fazer tudo o que puderem, e não apenas estranhos, mas
c também pai e mãe e até outra pessoa. caso existam. Nessas coisas,
então, seremos súditos dos outros e eles próprios nos serão estranhos,
porque deles não obtemos nenhum benefício.
15. O tema do amor já passou pelo contraste do conhecimento, do conhecimento. O
conceito de utilidade que adorna este conhecimento que Sócrates elenca, e que tem a ver com
uma noção característica da Atenas democrática, aponta, no entanto, para algo mais
profundo: para a ideia de competição que produz algum tipo de bem para a comunidade. .
Sócrates irá expressá-lo imediatamente com o termosofos(201d).
- Vou fazer isso agora. Responda-me, Menexeno, ao que lhe peço. Há algo
que desejo desde criança, como outros desejam outras coisas. Quem quer
ter cavalos, quem quer cachorro, quem quer ouro, quem quer honras. Para
e mim, porém, essas coisas me deixam com frio, mas sem ter amigos, pelos
quais sou apaixonado; e eu gostaria de ter um bom amigo mais do que a
melhor codorna do mundo ou o melhor galo, e até, por Zeus, mais do que o
melhor cavalo, do que o melhor cachorro. E acredito, pelo cachorro, que
preferiria ter uma companhia do que todo o ouro de Darius. Eu sou um
amigo de amigos! Ao ver você, você e Lisis, fico maravilhado e parabenizo
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vocês porque, tão jovens, vocês passaram a possuir tal dom, de uma forma
tão rápida e simples. Você rapidamente e facilmente fez dele seu amigo e
você dele. Mas estou tão longe disso que não sei como alguém se torna
amigo de outro. Portanto, dada a sua experiência, gostaria de perguntar
sobre tudo isso.
b - Diga-me então. Quando alguém ama alguém, quem é amigo de
quem, o amante do amado, ou o amado do amante? Ou eles não são
nada diferentes?
- Em nada, disse ele, parece-me que diferem. -Do que você
está falando?, eu disse. Então os dois ficam amigos, mesmo que
apenas um se ame?
- Para mim, pelo menos, é o que me parece, disse ele.
- Como? Não acontece às vezes que o amante não seja correspondido
por quem ama?
- Ocorre.
- E não acontece também que o amante seja odiado? Parece que os amantes
c têm que suportar coisas assim de seus entes queridos; Porque amando tudo que
podem, alguns, porém, acreditam que não são correspondidos, outros que são
odiados. Ou isso não parece verdade para você?
- Sim, parece-me verdade, disse ele.
- E também neste caso, eu disse, um ama e o outro é amado.
- Sim.
“Feliz aquele que tem seus filhos como amigos e tem cavalos de casco
e único e um hóspede estrangeiro”18.
-Pelo menos não me parece assim, eu disse. -Então, você acha que ele está falando a
verdade?
- Sim.
e faz com que eles se conheçam. Você nunca se deparou com esses versículos?
- Claro, ele disse.
- Não chegaste, de facto, às tuas mãos escritos de pessoas muito sábias
que dizem estas mesmas coisas, nomeadamente, que semelhantes devem
ser sempre amigos de semelhantes? Refiro-me àqueles que falaram e
escreveram sobre a natureza e sobre todo ovinte.
19.OdisseiaXVII 218.
20. Alusão aos primeiros filósofos, e mais especificamente a Empédocles e
Anaxágoras, que apresentam variações do verso de Homero, e para quem o tema da
semelhança, como motor da união, constitui uma ideia central. (Cf. ARISTÓTELES, Ética
a Nicômaco1157» 31 e segs.; 1156b 34 e seguintes; 1158» 11 ss.).
- Eu poderia também.
E em todos os outros casos ele disse que acontecia a mesma coisa, e que era necessário
que aqueles que são mais parecidos entre si estivessem cheios de inveja, rivalidade e
ódio, mas que aqueles que são menos parecidos estivessem cheios de amizade.23.
Porque o pobre tem a obrigação de ser amigo do rico e do fraco, do forte, da ajuda que
este lhe pode dar, e do doente, do médico, e todo aquele que não conhece tem que se
relacionar com aquele que o conhece e o ama.
e E ele continuou assim com seu discurso, de uma forma ainda mais
grandiloquente, falando sobre como não havia base para o semelhante
ser amigo do semelhante e que, antes, o que acontece é o contrário,
porque o oposto é o mais amigo do o oposto. Conseqüentemente, é
isso, mas não o mesmo, que cada um deseja: o seco para o úmido, o frio
para o quente, o amargo para o doce, o picante para o obtuso, o vazio
para o cheio e o cheio para o. vazio, e assim por diante, de acordo com o
mesmo sistema. Pois o oposto é o alimento do seu oposto; mas
semelhante não se beneficia de semelhante. E realmente, meu amigo,
essas coisas que ele disse pareciam muito inteligentes. Porque a
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verdade é que ele falou bem24.
- Para você, porém - eu disse - como você acha que ele falou?
- Muito bem, disse Menexeno, pelo menos no momento em que ouviu.
- Diremos então que o oposto é o que mais se aproxima daquilo que lhe se
opõe?
- Claro que sim.
- Bem, eu disse, e você não acha estranho, Menexeno? E não-Será que
aqueles homens que sabem tudo, quero dizer, aqueles que procuram
contradições, saltarão rapidamente sobre nós e nos perguntarão se a
amizade não é o oposto da inimizade?25. O que vamos responder a eles? Ou
não somos obrigados a confessar que falam a verdade?
22. Hasiod,Empregos e dias25.
23. O tema da auto-suficiência do bem conduziu a uma aporia e, com ela, a uma característica
essencial da relação amorosa. Porque, de fato, a semelhança pode, no homem, causar distanciamento
e diversidade. Aqueles que são menos parecidos são, portanto, aqueles que mais precisam uns dos
outros e que mais se sentem atraídos um pelo outro. O problema é, obviamente, simplificado.
Amizade e amor misturam semelhanças e diversidades, e dessa aparente desarmonia surge a atração
fundamental. O plano semântico em que se move a discussão permite referências contínuas.
referências à linguagem e à crítica conceitual.
24. A teoria da atração dos opostos faz-nos pensar em alguns fragmentos de
Heráclito e na sua intuição dos vários componentes da "harmonia invisível". A
passagem é colocada na boca de um possível discípulo de Heráclito. Talvez Crátilo,
professor de Platão?
25. A alusão aos procedimentos sofísticos dos “discursos duplos” e das oposições de
sentido parece clara.
b - Sim, nós somos.
- Então, dirão, o que o amigo mais ama é o inimigo, e vice-
versa.
- Nenhuma das duas coisas, ele disse.
- Mas sim, o justo para o injusto, ou o moderado para o destemperado, ou o
bom para o mau?
- Não creio que seja esse o caso. Mas, na verdade, eu disse, se, por ser
oposto, algo é amigo de algo, teria necessariamente que haver um
vínculo de amizade entre eles.
- Claro.
Assim, nem o semelhante é o amigo do semelhante, nem o oposto é o
oposto.
- Não parece.
c - Mas examinemos ainda o seguinte: se a amizade26Já não nos
está escondido e, na realidade, não é nada disso tudo, mas o
que se tornou amigo do bom não é bom nem mau.
- O que você quer dizer?, ele exclamou.
- Por Zeus, eu disse, não sei, mas antes fico como que atordoado pelo
equívoco do assunto, e temo que no final, segundo o velho provérbio, o
que é belo é o que é amado . Pelo menos parece algo macio, liso e
escorregadio. É por isso que, talvez, ele nos passe tão facilmente e nos
escape, porque é feito dessa forma. Insisto, portanto, que o bom é o
d
belo.
- Não acreditas?
- Sim, eu acredito.
- E digo, além disso, como se sentisse, que o amigo do belo e
do bom não é bom nem mau.27. Vou lhe dizer em que sentido
sinto isso. Parece-me que existiam algo como três géneros:
primeiro, o bom, depois o mau e, finalmente, o que não é bom
nem mau. Que tal?
26. Devido à dificuldade terminológica mencionada na nota 17, a maioria dos
tradutores coloca aqui um substantivo. Na realidade, o texto grego usa uma forma de
adjetivo precedida por um artigo neutropara Philon,Eu literalmente sou amigo dele. Na
verdade, o que está oculto pode ser algo como o que caracteriza a amizade, o que a
fundamenta, um passo em direção aopróton filon,que não aparece na linguagem.
27. Esta ideia de um terceiro gênero, intermediário e neutro entre o bem e o mal,
acentuará um tema característico da teoria platônica do amor. Desta indiferença surge
então a inclinação.
- Sim.
- Então, algo que não é bom nem ruim não é amigo de algo que
também é assim.
- Não parece.
- Portanto, só aquilo que não é bom nem mau pode ser amigo do
bom.
217a - Necessariamente, como você pode ver.
- Então, rapazes, eu disse, não vamos de vez?andar ou com o que
acabei de dizer? Se, segundo isto, quiséssemos olhar para o corpo
saudável, a gente veria que ele não precisa de remédio nem de ajuda alguma,
porque ele é autossuficiente, então nenhuma pessoa saudável vai ser amiga de
médico por causa da saúde, certo?
Assim é.
- Mas o doente, creio, vai ficar doente por causa da doença.
- Como não?
- A doença é, certamente, um mal; No entanto, a medicina é uma
b coisa útil e boa.
- Sim.
- Mas, neste caso e no que diz respeito à cor, o que está pintado é
igual ao que está por cima?
- Eu não entendo, ele disse.
d - Claro, eu disse. Se alguém pintasse o seu cabelo, que é loiro,
com tinta branca, ele ficaria branco ou só apareceria assim?30.
- Sim.
- Assim é.
- Saúde é algo amigo ou não?
- É algo amigo.
- E a doença é um mal?
- Certamente.
- O que não é mau nem bom é, portanto, amigo do bom por causa do
b mau e do odioso, e tendo em vista um bom amigo.3. 4.
- Evidentemente.
- Portanto, pelo que se ama e pelo que se odeia, amigo é
amigo de amigo.
- Assim parece.
- Bom, eu disse. Já que chegamos até aqui, pessoal, vamos manter os
olhos fixos para não nos perdermos. Deixaremos, portanto, de lado o facto
de o amigo se tornar amigo do amigo, bem como o facto de o semelhante se
tornar amigo do semelhante, embora disséssemos que era impossível. Mas,
ao mesmo tempo, e para não nos deixarmos enganar pelo que agora
aceitámos, examinemos o seguinte: a medicina, dissemos, é algo que se
c
quer por causa da saúde.
- Sim.
33. Sócrates questiona todo o seu discurso anterior para chegar à parte mais subtil
da sua reflexão sobre a amizade. A partir daqui poderíamos dizer que o diálogo atinge
o seu clímax.
34. Platão usa aqui a expressão causal-dia você- ea finalhéneka você.Tendo em vista,
então, o bem, o amor faz sentido. É, portanto, algo intencional. O texto grego segue
levantando a ambigüidade típica deFilão.Na mesma frase diz-se que o que não é bom
nem mau “é amigo(Filão)“do bem por causa do mal e tendo em vista o bom e o amigo”(
Filão).Talvez esta duplicidade se explique porque, dentroPhilonaquele “primeiro amado”
e fundador do amor já foi descoberto.
35. Com efeito, deve existir algo “primeiro” e original, um fim verdadeiramente final
e, portanto, original. Então não há razão para pesquisar mais. O desejo do bem atinge
aqui a sua plenitude e também a sua imortalidade. Neste “primeiro querido” não é
possível a presença do mal, nem, consequentemente, a instabilidade do desejo.
- Necessariamente.
- É isto, então, o que me faz afirmar que todas as coisas das quais dizemos
que somos amigos por causa dos outros, nos enganam, como se fossem
simulacros deles; mas onde está esse primeiro princípio, aí está o que é
verdadeiramente desejado. Vamos ver isso em um exemplo. Quando alguém
valoriza muito algo, como um pai que se preocupa mais com o filho do que
com todas as outras coisas, pelo próprio fato de amá-lo acima de tudo, não
poderia tal pai, porque coloca o filho acima de tudo, de tudo, valoriza muito
também, outras coisas? Suponha que você percebesse que seu filho havia
e bebido cicuta. Você valorizaria muito o vinho se acreditasse que isso o
salvaria?
- Certamente, ele disse.
- E também, então, a vasilha que contém o vinho?
- Definitivamente.
e - Então, aquilo que primeiro é amado por nós e no qual terminam todas as
outras coisas - aqueles que dissemos que foram amados por causa de outra
coisa amada - não são nada parecidos com estes. Porque, na verdade,
dissemos que todas essas coisas eram chamadas de “amadas” por causa de
algo mais que nelas era amado; mas aquilo que é realmente amado parece
ter uma natureza completamente diferente: de facto, revelou-se que o
amamos por causa de algo de que somos inimigos; Mas, se isto
desaparecesse, penso que não seríamos mais capazes de amar aquele outro.
- Não me parece assim, disse ele, pelo menos pelo que temos conversado.
- Mas será que, eu disse, por Zeus, se o mal for eliminado, não haverá
mais fome, nem sede, nem nada disso? Ou continuarão a existir
221a necessidades enquanto existirem homens e outros animais, mas pelo
menos deixarão de ser prejudiciais? E haverá também sede e todos os
outros apetites, só que não serão maus, já que o mal desapareceu? Ou a
questão é que às vezes é e outras vezes não é ridícula?36. Porque quem
pode saber? Mas há algo que sabemos: quem tem fome pode ser
prejudicado ou beneficiado por ela. Não é assim?
36. O tema da «natureza intermediária, do estado de neutralidade, tem diferentes
variações em Platão. Num contexto “político”, em relação ao problema da organização
da solidariedade, encontramos o mito cósmico da abundância e do pastoreio divino(
Político271 e segs.). Esta cidade "saudável"(República372e) não é bom nem mau, é
inocente. A cidade surgiu com a invasão de necessidades provocadas pela época
histórica. Da mesma forma, enquanto existirem homens, existirão deficiências que
organizam e orientam os desejos.-epithymíai-.Você não é bom, não é absolutamente
mau, porque a radicalização de ambos os extremos nos deixaria paralisados. A dialética
da vida histórica, como a dialética do amor, surgeindeterminaçãoe neutralidadeda
natureza humana.
- Definitivamente.
e - Então, quem está privado de alguma coisa, não é amigo daquilo de que
está privado?
- Penso que, se.
- E quem lhe tira algo é privado do que lhe é tirado.
- Como não?
- Então o amor, a amizade, o desejo apontam, aparentemente, para o que há
de mais pessoal e mais próximo.37. Isto é, pelo menos, o que se vê, ó Menexeno e
Lísis.
Eles concordaram.
Então, se vocês são amigos, significa que, em certo sentido,
vocês pertencem um ao outro por natureza.
- Certamente, eles disseram.
222a - E se, de fato, meninos, um deseja o outro, eu disse, ou o ama, ele não o
desejaria, nem o amaria, nem o quereria, se não houvesse uma certa
conaturalidade para com o ser amado, seja em relação à alma, com sua
maneira de ser, seus sentimentos ou sua aparência.
"É verdade", disse Menexenus, enquanto Lysis permaneceu em silêncio.
- Bom, eu disse. Assim, aqueles que pertencem uns aos outros por natureza têm,
como vemos, de amar uns aos outros.
- Assim parece, ele disse.
- De acordo.
- Estabelecemos então a tese de que o bem é conatural a tudo e o
mal é estranho? Poderemos afirmar também que o mau é conatural
ao mau e ao bom, ao bom, e ao que não é bom nem mau, ao que
não é bom nem mau?
Afirmaram que lhes parecia que cada uma dessas coisas era
conatural.
- Mas agora, rapazes, voltamos a cair, disse eu, no discurso que
d anteriormente havíamos rejeitado, a saber: que os injustos e os maus não
são menos amigos dos injustos e dos maus, do que os bons são dos bons.
- Esta parece ser a conclusão, disse ele.
- Mas como? Se disséssemos que o bom e o conatural são a
mesma coisa, então o bom não seria apenas amigo do bom?
- VERDADEIRO.