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A gênese do declínio

“Sócrates foi um equívoco: toda a moral do perfeccionismo, até mesmo a


cristã foi um equívoco”. Friedrich Nietzsche
Nas palavras de Giovanni Reale: “Nieztsche é um dessacralizador das
doutrinas tradicionais e profeta do novo homem”.
É impossível compreender a filosofia de Nietzsche, sem entender quem
foi Sócrates e o que ele fez. Pois toda a filosofia nietzscheana é uma
grande crítica à filosofia ocidental que é inteiramente baseada em Sócrates.
Por conseguinte, abaixo, vou descrever a versão bonitinha do Sócrates. As
críticas nietzscheanas ficarão para mais adiante. Sejamos dialéticos.
Primeiro apresentaremos o Sócrates da tradição, depois apresentaremos o
Sócrates de Nietzsche.
A partir do século V começa uma nova fase da filosofia na Grécia, esse
período caracteriza-se essencialmente pela volta do homem para si
mesmo.
A preocupação com o mundo segue-se a preocupação com o homem.
O predomínio de Atenas depois das guerras médicas, o triunfo da
democracia favorece o homem que fala bem, e o interesse do ateniense
volta-se para a realidade política, civil e, portanto, para o próprio
homem.
A palavra “Sofista” é um termo que significa “sábio”, “especialista do
saber”. A acepção do termo, que em si mesma é positiva, tornou-se
negativa sobretudo pela tomada de posição fortemente polêmica de Platão e
Aristóteles. A palavra sofista está relacionada com a palavra “sofisticado”
pois os sofistas eram pessoas com um discurso muito bem articulado,
sofisticado.
A palavra sofista não teve, originalmente, o sentido pejorativo que lhe
impôs Platão. Os sofistas foram, na verdade, reputados como grandes
mestres, e a eles acorriam quantidades de jovens bem-nascidos,
dispostos a pagar muito dinheiro para aprender o que eles apregoavam
ensinar. Os sofistas pretendiam saber e ensinar tudo.
Ao tempo em que florescia Demócrito, já tinham feito sua entrada no
cenário intelectual de Atenas alguns dos maiores sofistas: Górgias de
Leôncio (483-375 a.C), o primeiro dos grandes mestres de retórica;
Protágoras de Abdera (480- 410 a.C), conhecido por seu relativismo em
matéria de conhecimento.
Nascido em Abdera (490 — 420 a.C.), no nordeste da Grécia, Protágoras
foi possivelmente o primeiro de um crescente número desses intelectuais
sofistas que se manifestavam sobre uma variada gama de temas filosóficos
e práticos, sendo eles tão respeitados que seus alunos pagavam pelo
privilégio de ouvi-los. Ensinava retórica, requisito fundamental para
participar da vida pública na Grécia antiga, ensinava poesia,
gramática e sintaxe.
Dizia que “o homem é a medida de todas as coisas” uma frase que
demonstra bem o espírito sofista, que é relativista e subjetivista.
• Essa frase representa seu pensamento sobre a subjetividade e
particularidade de cada indivíduo. Ou seja, para ele, tudo é relativo e
não existe uma verdade absoluta.

• Se o homem é a medida de todas as coisas, então coisa alguma


pode ser medida para os homens, ou seja, as leis, as regras,
a cultura, tudo deve ser definido pelo conjunto de pessoas, e
aquilo que vale em determinado lugar não deve valer,
necessariamente, em outro. Esta máxima também significa que as
coisas são conhecidas de uma forma particular e muito pessoal
por cada indivíduo, o que vai contra, por exemplo, ao projeto
de Sócrates de chegar ao conceito absoluto de cada coisa.
Górgias (485 — 380 a.C.), era de Leontinos, na Sicília. Juntamente
com Protágoras de Abdera, formou a primeira geração
de sofistas. Escreveu um livro intitulado
Do não-ser e dizia que não existe nenhum ente, que se existisse não seria
cognoscível para o homem, e que se fosse cognoscível não seria
comunicável.
Górgias para fundamentar sua filosofia toma por base o niilismo, a
descrença por razão principal, onde nada existe de absoluto, onde não
existem verdades morais e nem hierarquia de valores. A verdade não
existe, qualquer saber é impossível e tudo é falso porque é ilusório.
O filósofo destrói — pelo menos tenta — a possibilidade de alcançarmos a
verdade absoluta. Nossa razão somente pode iluminar as situações em que
os homens vivem, mas não tem a capacidade de formular regras absolutas.
Podemos somente analisar a condição em que nos encontramos e expor
o que devemos ou não fazer e mesmo o que devemos ou não fazer muda
muito dependendo da situação em que nos encontramos. Uma mesma
atividade pode ser boa ou ruim dependendo de quem a prática e em que
situação se encontra.

No regime democrático que vigorava em Atenas, o exercício da função


política dependia do bom uso da palavra. E os sofistas foram mestres na
arte de bem falar, tanto em discursos longos quanto breves (perguntas
e respostas). Platão viu, nesse ensino sofístico, um perigo para a cidade. A
principal razão de sua má vontade em relação à retórica sofística parece ter
sido o fato de ser ela uma técnica puramente formal de persuasão. O bom
orador é aquele que sabe persuadir qualquer um de qualquer coisa;
• Aristóteles diz: “A sofística é uma sabedoria aparente, mas que não o
é, e o sofista, o que faz uso da sabedoria aparente, mas que não o é.
Ou seja, parece sabedoria, mas é só discurso bonito e enfeitado.
A retórica sofística — que se apresenta como uma técnica capaz de
persuadir qualquer um de qualquer coisa — pressupõe uma tese de
gravíssimas consequências para quem, como Platão, quer estabelecer a
política como ciência: o relativismo do conhecimento. De fato, a
existência de um conhecimento absoluto, verdadeiro, limita o jogo da
retórica: àquele que realmente sabe, não é possível persuadir do contrário.
O sofista vai, pois, negar que exista a verdade, ou pelo menos a
possibilidade de acesso a ela. Para o sofista, só existem opiniões: boas e
más, melhores e piores, úteis e prejudiciais, mas jamais falsas e
verdadeiras. Na formulação clássica de Protágoras, “o homem é a medida
de todas as coisas”.
• Com os sofistas a filosofia perde-se na retórica e na renúncia à
verdade. É o que Sócrates irá iniciar e exigir, e o que Platão e
Aristóteles irão realizar.
Sócrates nascido em Atenas (470 — 399 a.C.), Sócrates não deixou obras
escritas, não fundou nenhuma escola filosófica nem tinha um grupo
formalizado de discípulos, não aceitava dinheiro para ensinar, e é a
primeira grande figura da filosofia a antiga. Isto porque representa uma
clara mudança de direção em relação à anterior especulação filosófica
a respeito das origens e da natureza do universo, voltando-se para uma
análise da ética e dos conceitos morais que deveriam pautar a vida dos
seres humanos. Por isso que os filósofos anteriores foram chamados a
partir da modernidade de pré-socráticos. A partir de Sócrates a filosofia
ganha uma nova face, uma nova fase. Morreu aos 70 anos, julgado
injustamente.
Era filho de um escultor e de uma parteira, e dizia que sua arte era, como a
de sua mãe, uma maiêutica, a arte de fazer dar à luz na verdade. Alguns
pensavam que Sócrates era apenas mais um sofista, mas na verdade ele
estava se opondo aos sofistas, querendo restabelecer o sentido da verdade
no pensamento grego.
• As poucas informações que temos a seu respeito provêm de três
fontes muito diferentes: o comediógrafo Aristófanes, que era um
crítico de Sócrates e o via como mais um sofista (que eram os
inimigos do Sócrates) o comandante militar Xenofonte e o filósofo
Platão, que foi seu discípulo. Cada um deles, naturalmente, tinha
seu próprio ângulo de observação;

• Xenofonte escreveu as Memoráveis, dedicadas às lembranças de seu


mestre, Banquete e uma Apologia de Sócrates. Mas foi sobretudo
Platão que conservou o pensamento e a figura viva de um Sócrates
profundo e mais rico;

• Platão faz de Sócrates a personagem principal de seus diálogos, e põe


em sua boca sua própria filosofia, às vezes fica difícil determinar
onde termina o autêntico pensamento socrático, e onde começa a
filosofia original de Platão.
Aristófanes apresenta Sócrates como um grande sofista enganador em sua
peça As nuvens, — que inclusive temos aula aqui no Seminário de
Literatura — ao passo que, para Xenofonte, ele era um soldado e um
homem de ação. Graças, principalmente, a Platão é que nós conhecemos
as visões filosóficas de Sócrates. Platão as resume em forma de diálogos,
usando essa abordagem dramatúrgica para transmitir tanto o método
(raciocínio dialético) como as convicções (a busca do bem moral) do
mestre. Considera-se que a Apologia (discurso de defesa no julgamento de
Sócrates), Críton, Laques e Fédon refletem mais fielmente os
ensinamentos socráticos. Porque nos outros diálogos Platão começa a
falar através da boca de Sócrates.
Os diálogos se desenrolam como longas sessões de perguntas e respostas
com variados tipos de interlocutores — políticos, discípulos e amigos — e
exploram amplamente atitudes habituais em relação a conceitos
fundamentais, ou “virtudes”, como justiça, coragem, moderação, sabedoria
e devoção.
Segundo Platão, Sócrates sempre armava que nada sabia. Em vez de
impor seus pontos de vista, ele desafiava os interlocutores a defender a
fundamentação lógica das próprias ideias, no pressuposto teórico de
que isto os forçaria a se defrontar com eventuais contradições em seus
argumentos. Só então, quando a falsa lógica fosse eliminada, poderia
alguém aceitar a própria ignorância e sair em busca de definições de valor
universal das virtudes imprescindíveis à vida humana, revelando-se nesse
processo um mais profundo bem moral.
Para Sócrates, a chave de tudo era uma vida justa. O que significava resistir
à busca da fama e da fortuna, e nunca, em circunstância alguma, responder
ao mal com o mal. O mais importante era cuidar do bem-estar moral da
alma, pois seria este o caminho para a verdadeira felicidade. Era uma
filosofo a extremamente pessoal: uma vez esclarecido e entendido o
significado das virtudes, era possível tornar-se objetivamente uma pessoa
melhor, independentemente dos vínculos familiares e de amizade.
Infelizmente para Sócrates, a permanente contestação das crenças
arraigadas na sociedade o indispôs com as pessoas que passaram a odiá-lo;
ele foi julgado em, acusado de introduzir novos deuses e corromper a
juventude.
Durante o julgamento, Sócrates não cedeu em sua posição intelectual
objetiva. Ante a alternativa de pagar uma multa para não ser
condenado à morte, ele recusou; ofereceram-lhe, então, a oportunidade
de escapar da prisão mediante suborno, o que ele prontamente
rejeitou. E assim, tendo vivido intransigentemente pela filosofia, acabou
tomando cicuta e morreu por ela.
• Ofereceram também que parasse de filosofar, e ele não quis,
afirmava que “uma vida não examinada, não merece ser vivida!”

Sócrates afirmava que havia junto dele um gênio ou um demônio (daímon)


familiar, cuja voz o aconselhava nos momentos cruciais de sua vida. Era
uma espécie de inspiração intima que às vezes foi interpretada como algo
divino, como uma voz da Divindade.
O Oráculo de Delfos, disse ao amigo de Sócrates que não havia ninguém
mais sábio que o Sócrates, e este, modestamente, não acreditou e foi em
busca de mostrar que o oráculo estava enganado. Sócrates se propõe ir aos
homens conhecidos como muito sábios, na intenção de procurar
alguém que sabia mais do que ele, para demonstrar que o oráculo
estava errado.
• Vai até as praças perguntar aos sábios da cidade quais são as coisas
que ele ignora: “O que é a justiça? O que é a amizade? O que é a
ciência?” Acontece que eles não sabem, nem sequer sabem que não
sabem, e Sócrates conclui que ele era o mais sábio mesmo, porque
ele ao menos sabia tudo que sabia, e tudo o que não sabia.
Enquanto os outros não.
E isso gerou muito ódio pela figura do Sócrates, pois era incomodo para os
interrogados serem desmascarados, e os alunos de Sócrates começam a
imitá-lo, e por isso todos concluem que “Sócrates corrompe a juventude”.
Sócrates se torna o inimigo dos sofistas, porque demonstrava a inanidade
de seus pretensos saberes. A principal contribuição de Sócrates é delimitar
o princípio da ciência, quando Sócrates pergunta “o que é a justiça?” por
exemplo, pede uma definição. Definir é colocar limites numa coisa, e por
conseguinte, dizer o que algo é de fato, em essência. Sócrates volta-se
para a verdade enquanto os sofistas que faziam sucesso em Atenas, não
queriam saber disso. Para eles, tanto faz o que é a verdade. Sócrates quer
saber verdadeiramente o que as coisas são. E por esse caminho da essência
(o que define o que é), se chega à teoria platônica das ideias.
• A contribuição de Sócrates é modesta no sentido doutrinal, não foi
homem de ideias profundas de Metafísica como seriam em seguida
Platão e Aristóteles, seu papel foi prepará-las e torná-las possíveis.
Situando a filosofia na verdade, que é o lugar dela de fato.

Dito isto, agora entraremos no pensamento


nietzscheano.
1. Sempre há interesses pessoais em tudo que fazemos
Um dos grandes insights nietzscheanos, é a percepção de que, por detrás de
uma pessoa que defende algum valor, não existe um ser puro, imaculado,
perfeito e generoso.
Existe um ser humano concreto, que como bem sabemos, é egoísta e só
pensa nos seus próprios interesses o tempo todo. Quando defendemos
alguma visão, alguma crença, alguma ideia, pensamos que estamos agindo
de forma racional e desapegada. Mas basta observar o ser humano, e você
perceberá que não.
É um autoengano comum, pensarmos que, defendemos o que defendemos,
porque somos racionais. O homem que é egoísta e interesseiro, pensa que
na hora de raciocinar, sua natureza desaparece, e entra em cena uma
razão-pensante-fria-e-desapegada-disposta-a-abandonar-tudo-pela-
verdade. Pura ilusão.
Quando olhamos para as discussões políticas, vemos que Nietzsche tinha
mais razão do que ele imaginava. A política brasileira é bastante
pedagógica para demonstrar isto. As pessoas defendem um candidato não
porque ele é realmente bom, mas porque se identificam com ele de algum
modo, e somente depois, racionalizam o processo.

2. A Vontade de Poder
Se por detrás de tudo que fazemos há interesses pessoais, cabe-nos
responder a seguinte pergunta: por que somos assim? A resposta está no
conceito nietzscheano de Vontade de Poder.
A essência do mundo, e por conseguinte, a essência do homem é a Vontade
de poder. O homem faz parte do mundo, e não há nada no homem que
escape ao mundo. O mundo é vontade de poder, e o homem é parte deste
mundo, por conseguinte o homem é vontade de poder. Ninguém é capaz de
negar os próprios instintos, nem o homem.
• A vontade de poder é o desejo de dominar as partes do todo. Você
quer preservar a si mesmo e quer se expandir. Queremos
controlar e se apoderar do outro, do mundo, de todo o resto, de tudo
que não é eu. Todas as nossas atitudes giram em torno de ter o
controle do mundo. E tudo que está no mundo é assim;

• Por que estudamos e trabalhamos? Porque somos Vontade de Poder.


Queremos nos preservar e nos expandir, sobreviver e dominar as
outras partes do todo, tudo que você faz é para que o mundo seja
mais você e menos o outro. Quem pode mais? Um milionário ou um
mendigo? Quem tem mais poder sobre os outros? E qual dos dois
você gostaria de ser? Veja que você é vontade de poder. Esse é um
dos motivos pelos quais nunca estamos satisfeitos com o que temos,
sempre queremos mais da vida.

• Tudo que fazemos, é porque somos vontade de poder, pois isto,


ninguém defende nada por motivos lógicos-racionais, e sim para se
expandir. Sempre há interesses pessoais em tudo que fazemos. A
pergunta central, portanto, é: “quem defende e porquê defende?”

3. O Caso Sócrates, o defensor da verdade


Inimigo dos sofistas Sócrates foi um grande defensor da verdade, volta-se
para a verdade enquanto os sofistas – que faziam sucesso em Atenas –, não
queriam saber disso. Para eles, tanto faz o que é a verdade. Sócrates queria
saber verdadeiramente o que as coisas são. Mas, como acabamos de ver,
ninguém defende nada por motivos lógicos-racionais, então por que
Sócrates estava tão interessado na verdade?
Na pág. 15 e 17 do Crepúsculo dos Ídolos:
“Por sua origem, ele pertencia ao povo mais baixo: Sócrates era plebe.
Sabe-se, pode-se ainda ver, como ele era feio. [...] Mas Sócrates intuiu algo
mais. Ele enxergou por trás de seus nobres atenienses; entendeu que seu
próprio caso, sua idiossincrasia já não era exceção.
4. A Vontade de Poder II
A essência do mundo é vontade de poder, e nós somos parte do mundo, e
por conseguinte nós somos vontade de poder.

Agora vem o ponto chave: levando em conta que todos nós queremos
dominar as partes do todo, levando em conta que somos vontade de poder,
e que queremos nos preservar e nos expandir. Todos nós queremos nos
afirmar. Porém, alguns não conseguirão.

Qual a solução que eles encontram? Porque levando em conta que


somos vontade de poder, alguns perderão nessa guerra, qual solução
que eles encontram para exercerem a vontade de poder? A resposta é
simples: eles a exercerão passivamente.
Existem aqueles que exercem sua vontade de poder ativamente: os
fortes, os capazes, os poderosos, os belos, os aristocratas. E existem
aqueles exercem sua vontade de poder passivamente, porque não são
capazes de exercê-la ativamente, esses são os fracos, os débeis, os doentes,
os feios etc.
E o que o passivo faz então? Ele exerce sua vontade de poder
passivamente, ele cria um monte de regras e trapaças para tentar
dominar os fortes. Como não se afirma ativamente, ele se afirma
passivamente.
• Aqui no Rio de Janeiro temos um exemplo disso no futebol:
Vasco e Flamengo são rivais. Vasco era grande antigamente, hoje é
pequeno. O Flamengo continua grande. Os vascaínos sentem mais
alegria quando o Flamengo perde do que quando o Vasco ganha. O
vascaíno se alegra quando o seu rival não se afirma. Isto é a
definição da vontade de poder passiva.
A vontade de poder ativa se expressa indo atrás daquilo que quer, é
cheia de vida; a passiva se exerce de maneira reativa, dizendo o que os
outros não devem fazer é anti-vida.

5. Toda ideia tem uma origem


Se o ser humano é sempre egoísta e interesseiro, e se toda ideia tem uma
origem na história, a pergunta fundamental é: há quem as verdades
beneficiam? Porque se somos sempre egoístas, os homens que inventaram
as ideias também são. Que interesses eles tinham?
 Pensemos por exemplo, no conceito de Verdade: em todos os
livros de história da filosofia que você abrir, estará escrito que foi
Sócrates quem inventou a ideia de que temos que buscar a verdade.

Ou seja, a «verdade» é um conceito fabricado, foi criada num


determinado contexto histórico-social e. Porém, tem sua origem
ocultada, mas basta se lembrar que antes de Sócrates, não havia a
crença de que «devemos buscar a verdade»
“O dialético coloca seu antagonista na condição de provar que não é idiota;
enfurece e ao mesmo tempo impede todo socorro. O dialético degrada a
inteligência de seu adversário. A dialética de Sócrates era tão-somente
uma forma de vingança? [...] Nem Sócrates nem seus doentes gozavam da
liberdade de ser ou não racionais; isto lhes foi forçoso, era seu último
remédio.” Pág. 14. Crepúsculo dos Ídolos.
Retorno à realidade: o dionisíaco e o apolíneo
E em O nascimento da tragedia, que é de 1872, Nietzsche procura mostrar
como a civilização grega pré-socrática explodiu em vigoroso sentido
trágico, que é aceitação extasiada da vida, coragem diante do destino e
exaltação dos valores vitais. A arte trágica é um corajoso e sublime sim a
vida.
Com isso Nietzsche subverte a imagem romântica da civilização grega.
Entretanto, a Grécia de que fala Nietzsche não é a Grécia da escultura
clássica e da filosofia de Sócrates, Platão e Aristóteles, e sim a Grécia dos
pré-socráticos na qual o coro era a parte essencial, senão talvez tudo.
Ao lado do dionisíaco, diz Nietzsche, o desenvolvimento da arte grega
também está ligado ao apolíneo, que é a visão de sonho, e tentativa de
expressar o sentido das coisas na medida e na moderação. Existiam duas
divindades gregas chamadas de Apolo e Dionisio, que representavam
este contraste. Até que surge então Sócrates, com sua louca presunção de
compreender e dominar a vida com a razão e, com isso, temos a verdadeira
decadência.
Sócrates e Platão são “sintomas de decadência, os instrumentos da
dissolução grega, os pseudogregos, os antigregos. “Sócrates foi um
equívoco: toda a moral do perfeccionismo, até mesmo a cristã foi um
equívoco”. A mais crua luz diurna, a racionalidade a qualquer custo, a vida
clara, prudente, consciente e sem instintos. Disse não a vida; abriu uma
época de decadência que esmaga também a nós.
No mundo grego existiam dois espíritos que se contrabalanceavam, que
era o espírito dionisíaco e o apolíneo. Apolo é o deus da razão e o
racional, enquanto Dionísio é o deus da loucura e do caos. O Apolíneo é o
lado da razão e do raciocínio lógico; e o Dionisíaco é o lado do caos e
apela para as emoções e instintos.
Dionisio é o deus do vinho e das festas, é a imagem da força instintiva no
homem, é a embriaguez, a paixão sensual, é a humanidade em plena
harmonia com a sua própria natureza. Ao lado do dionisíaco, diz
Nietzsche, o desenvolvimento da arte grega também está ligada ao
apolíneo, que é a tentativa de expressar o sentido das coisas na medida e na
moderação.
Com isso, Nietzsche queria demonstrar, que uma sociedade saudável, é
uma sociedade que saiba conviver com estes dois espíritos, e que o começo
da decadência do homem, foi quando surge Sócrates com sua louca
presunção de compreender e dominar a vida com a razão, esquecendo
que a vida também é cega e caótica.
A racionalidade a qualquer custo, a vida clara, prudente, consciente e sem
instintos, é doente. E de modo algum, virtuosa, feliz e saudável. Sócrates
disse não à vida; abriu uma época de decadência que esmaga todos nós.
Ele combateu e destruiu o fascínio dionisíaco que liga o homem à sua
verdadeira natureza.
A vida é feita de razão e loucura; ordem e caos; dor e felicidade; alegria e
tragédia. Sócrates, Platão e depois o Cristianismo querem banir a vida
como ela é. Negando a vida. É a transvaloração dos valores. Eles baniram
o dionisíaco.

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