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O Espírito de Deus
Devemos admitir que a evidência escriturística direta sobre a
divindade do Espírito é limitada. Isso, sem dúvida, é a razão-chave de
tantos crentes sinceros ao longo da história da igreja cristã não terem
se convencido dessa divindade. Deus, porém, deixou evidências
suficientes para que entendamos as verdades básicas.
A mais clara delas pode ser a declaração de Pedro em Atos 5, em
que ele pergunta ao enganador Ananias por que ele mentiu "ao
Espírito Santo" a respeito da venda de sua propriedade, e depois
declara: "Não mentiste aos homens, mas a Deus" (At 5:3, 4). Para
Pedro, "mentir ao Espírito Santo" e "mentir a Deus" são expressões
intercambiáveis. Ele afirma que Ananias não estava mentindo
meramente aos apóstolos da nascente igreja do Novo Testamento,
mas ao próprio Deus.
Outro exemplo de expressões intercambiáveis é a frase de Paulo;
usada em 1 Coríntios 3 e 6. No capítulo 3:16, ele escreve: "Não sabeis
que sois santuário de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?"
Três capítulos adiante, ele usa uma linguagem quase idêntica: "Acaso
não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que está
em vós, o qual tendes da parte de Deus [...]?" (1Co 6:19). Paulo usa o
santuário de Deus e o santuário do Espírito Santo com o mesmo
sentido.
"O Espírito Santo não é mero espírito", disse Martinho Lutero,
"uma criatura, por exemplo, ou algo à parte de Deus e ainda assim
dado aos homens por Ele, ou meramente a obra que Deus executa em
nosso coração. De fato, Ele é um Espírito que, em si mesmo, é Deus
em essência."3
Jesus também usou as palavras Deus e Espírito Santo de modo
intercambiável. Durante o encontro noturno com Nicodemos, Cristo
fez referência à possibilidade de um novo nascimento pelo Espírito,
uma referência comum à salvação, embora o discípulo secreto o
considerasse impossível. Ele disse: “Como pode suceder isso?” (Jo 3:5-
9). Mais tarde, em seu ministério, quando outro grupo de discípulos se
reuniu para inquirir como pessoas que não se esperava que fossem
salvas poderiam ser salvas, Jesus respondeu: "Isto é impossível aos
homens, mas para Deus tudo é possível" (Mt 19:23-26). Claramente,
para Jesus, era Deus quem tornava possível a salvação, assim como era
o Espírito quem levava as pessoas a nascer de novo. Isso porque é o
Espírito Santo que tem a capacidade de produzir a convicção do
pecado, da justiça e do juízo (Jo 16:8-11).
No livro de Hebreus encontramos a única referência bíblica ao
"Espírito eterno" (Hb 9:14), enquanto no livro de Deuteronômio
encontramos a única referência bíblica ao "Deus eterno" (Dt 33:27).
Sabemos que somente Deus é eterno. Também sabemos que somente
Deus pode trazer os mortos à vida. "Em verdade, em verdade vos digo
que vem a hora e já chegou, em que os mortos ouvirão a voz do Filho
de Deus; e os que a ouvirem viverão. [...] Todos os que se acham nos
túmulos ouvirão a sua voz e sairão" (Jo 5:25, 28).
Sobre qual base pode Cristo chamar os mortos à vida? Ele explica
no versículo seguinte: "Assim como o Pai tem vida em si mesmo,
também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo" (v. 26). Poucos anos
mais tarde, Paulo ecoou as palavras de Jesus, quando escreveu em
Romanos 8:11:
A pessoa do Espírito
A personalidade do Espírito era um conceito sobre o qual os
pioneiros adventistas debatiam, Junto com pontos de vista
antitrinitarianos, alguns achavam que o Espírito Santo era menos do
que uma pessoa. Uriah Smith, por exemplo, por longo tempo editor e
secretário da Associação Geral, descreveu o Espírito Santo, em 1891,
como "aquela divina e misteriosa emanação pela qual eles [o Pai e o
Filho] levam avante sua grande e infinita obra."4 Um ano antes, ele
havia descrito o Espírito como uma "divina influência" e não uma
"pessoa como o Pai e o Filho".5 Tudo isso, porém, mudou pela década
de 1890, quando Ellen White insistiu na definição do Espírito Santo
como "a terceira pessoa da Trindade".6
Por vezes, as pessoas consideram o Espírito Santo como uma
energia, em parte, porque o gênero neutro para "espírito", no original
grego pneuma, contribui para esse conceito. Contudo, quando João, o
discípulo amado, registrou as palavras de Jesus, ele usou o pronome
masculino ekeinos ("ele") para se referir ao Espírito Santo. "Quando
vier, porém, o Espírito da verdade, Ele vos guiará a toda a verdade; [...]
Ele me glorificará" (Jo 16:13, 14). "O Espírito da verdade, que o mundo
não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; vós o conheceis,
porque Ele habita convosco e estará em vós" (Jo 14:17). Os críticos da
Bíblia podem alegar que o grego não era a língua materna de João e,
por isso, ele teria cometido um erro. No entanto, ou João cometeu um
erro gramatical coerente, ou chamou o Espírito Santo de "ele"
propositalmente. E, como nenhum erro semelhante foi cometido no
restante do evangelho de João, ele deve ter feito isso a propósito, para
deixar claro que Jesus se referia a uma Pessoa, e não a uma coisa.
A Bíblia também identifica, no Espírito Santo, diversos atributos
característicos apenas de pessoas. Por exemplo, o Espírito Santo
exerce sua vontade. Paulo e seus companheiros, depois de serem
"impedidos pelo Espírito Santo de pregar a palavra na Asia,
defrontando Mísia, tentavam ir para Bitínia, mas o Espírito de Jesus
não o permitiu" (At 16:6-8). Em 1 Coríntios 12, após a menção a vários
dons do Espírito, lemos que um só e o mesmo Espírito realiza todas
estas coisas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um,
individualmente" (v. 11).
Também se diz que o Espírito Santo tem uma mente. Paulo nos
lembra que "aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do
Espírito" (Rm 8:27). O Espírito usa essa mente para interceder em
nosso favor: "o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com
gemidos inexprimíveis" (v. 26).
Como só pessoas podem fazer, o Espírito também dá instruções.
Paulo escreve a Timóteo: "Ora, o Espírito afirma expressamente que,
nos últimos tempos, alguns apostatarão da fé, por obedecerem a
espíritos enganadores e a ensinos de demónios" (1Tm 4:1). Neemias
relembrou o modo como Deus havia concedido a Israel seu "bom
Espírito, para os ensinar" (Ne 9:20). Jesus prometeu aos discípulos que,
ao enfrentarem perigo ou apreensão por sua causa, "o Espírito [os
ensinaria], naquela mesma hora, as coisas que [deveriam] dizer" (Lc
12:12). Além disso, nenhuma força pode se comunicar verbalmente,
como o Espírito Santo o faz. Somente pessoas conseguem isso. Por
exemplo, o Espírito "diz" às igrejas o que lemos em Apocalipse 2: 7, 11,
17 e 29 e 3:6, 13 e 22. E ele responde à voz do Céu em Apocalipse
14:13. Finalmente, lemos que "o Espírito e a noiva dizem: Vem!" (Ap
22:17), sugerindo, novamente, qualidades de uma pessoa.
Uma característica adicional é o fato de o Espírito Santo ter
sentimentos. Paulo aconselha os efésios a não entristecer o Espírito de
Deus (Ef4:30); e Isaías recorda como os filhos de Israel, de modo tão
obstinado, "foram rebeldes e contristaram o seu Espírito Santo" (Is
63:10).
O Espírito também exerce influência. Paulo garante que "ninguém
pode dizer: Senhor Jesus!, senão pelo Espírito Santo" (1Co 12:3).Jesus
prometeu que, "quando Ele [o Espírito Santo] vier, convencerá o
mundo do pecado, da justiça e do juízo" (Jo 16:8).
Finalmente, só pessoas amam, e os três membros da Trindade
amam (ver Jo 3:16; 13:1). Paulo apela em Romanos: "Rogo-vos, pois,
irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e também pelo amor do Espírito
[que orem por mim]" (Rm 15:30). Ele já havia dito, em Romanos 5, que
"o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo"
(v. 5, itálico acrescentado).
1
Este capítulo tem como base meu artigo publicado: "The Personhood of the Holy Spirit and Why
It Matters", no Journal of the Adventist Theological Society, v. 17, n. 1 (primavera 2006), p. 11-
32.
2
"Não é essencial que sejamos capazes de definir exatamente o que seja o Espírito Santo. [...] A
natureza do Espírito Santo é um mistério. Os homens não a podem explicar, porque o Senhor
não lhos revelou. [...] Com relação a tais mistérios — demasiado profundos para o entendimento
humano — o silêncio é ouro" (Atos dos Apóstolos, p. 51, 52).
3
Martinho Lutero, "Sermon on John 15:26, 27", em Luther's Works, 24:297, citado em Arnold
Valentin Wallenkampf, New by the Spirit (Mountain View, CA: Pacific Press, 1978), p. 14.
4
General Conference Bulletin, 1891, p. 146; Review and Herald, 24 de outubro de 1890, p. 664,
citado em George R. Knight, Em Busca de Identidade: O Desenvolvimento das Doutrinas
Adventistas do Sétimo Dia (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2005), p. 17.
5
Looking Unto Jesus (Battle Creek, MI: Review and Herald, 1897), p. 10.
6
O Desejado de Todas as Nações, p. 671.
7
Otto H. Christensen, Getting Acquainted With God (Washington, DC: Review and Herald, 1970),
p. 69.
8
Donald T. Williams, The and Work of the Holy spirit (Eugene, OR:Wift & stock, 1994), p. 10.
9
O número varia de acordo com a versão bíblica utilizada e os estudiosos consultados.