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Direito dos Seguros

Não se pode iniciar o estudo de uma disciplina, sobretudo no campo do direito sem que
se apresente o respectivo conceito. O direito dos seguros, sendo uma disciplina de
índole jurídica não pode fugir à regra.

1. Conceito

Assim, o direito dos seguros pode ser definido como o conjunto de normas jurídicas
que regulam o seguro enquanto fenómeno social e económico.

Para necessária compreensão, propomo-nos abordar a disciplina do direito dos seguros


em duas partes, correspondendo à contraposição entre direito institucional e direito
material dos seguros.

2. Objecto

O direito dos seguros tem por base o contrato de seguro, negócio jurídico obrigacional,
produto da autonomia privada. O referido contrato de seguro, atendendo à sua natureza
mercantil, encontra-se regulado no Regime Jurídico dos Seguros, aprovado pelo
Decreto-lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro e encontra nos códigos comercial, civil e
demais legislação extravagante uma base supletiva, por isso, qualificar-se como um
contrato de direito privado.

3. Características

Pelo facto de o direito dos seguros não estar codificado, encontrando-se a sua legislação
dispersa por vários diplomas, não se pode concluir que esteja insuficientemente
sedimentado. O direito dos seguros, a nível do Ordenamento Jurídico Moçambicano
encontra-se baseado no Regime Jurídico dos Seguros, aprovado pelo Decreto-lei nº
1/2010, de 31 de Dezembro, sendo este um possível prenúncio para o agrupamento de
múltiplos aspectos que tratam dos seguros, pese embora, pelo seu carácter dinâmico,
mutável, acompanhando todos os aspectos de evolução da economia e do mercado
segurador, permitir a produção de leis avulsas.

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Neste plano é importante salientar que o actual código comercial aprovado pelo
Decreto-lei nº 2/2009, de 24 de Abril, não trata de forma específica a matéria dos
seguros, mas o direito comercial, tal como do direito civil, são direitos acessórios do
direito dos seguros.

4. Enquadramento

Atendendo às várias características apontadas pelas teorias com base nas quais,
frequentemente, se distingue o direito privado e o direito público, conclui-se que o
direito dos seguros – excluindo alguns aspectos do direito institucional dos seguros – se
integra entre os ramos do direito privado.

Com base na teoria do interesse, verifica-se que no direito dos seguros não estão em
causa interesses públicos. É evidente que se podem indicar alguns interesses públicos,
em especial relacionados com a tutela dos segurados, mas tais interesses públicos não
são exclusivos do âmbito dos seguros, pois decorrem de regras comuns de tutela dos
cidadãos.

Assim, certos deveres que resultam de regimes relacionados com a protecção da saúde
ou, especificamente, de tutela do consumidor não transformam a situação em concreto
em direito público; tal como o contrato de compra e venda de produtos não passará a ser
de direito público por se imporem regras de protecção do consumidor ou do utilizador
desses produtos, também o contrato de seguro permanece no âmbito privado, não
obstante a preocupação de tutela dos segurados.

A intervenção do Estado nas situações contratuais, que se generalizou no último quartel


do século XX, assentava na ideia de que o dogma liberal da não-ingerência estadual nos
diferentes sectores da economia deveria ser limitado, mas a intromissão dos poderes
públicos numa relação jurídica de direito privado não a transforma, na parte que respeita
a essa intervenção, em direito público.

Quanto à natureza dos sujeitos, é sabido que os intervenientes nas relações jurídicas de
seguro – à excepção dos órgãos de tutela e de supervisão, nomeadamente, o Ministro

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que superintende a Área das Finanças e o Instituto de Supervisão de Seguros de
Moçambique (ISSM) – são sujeitos de direito privado; tanto as seguradoras (sociedades
anónimas ou mútuas de seguros) como os tomadores do seguro e os beneficiários são
privados. Ainda que o tomador ou o beneficiário do seguro seja uma entidade pública
(por exemplo, uma autarquia local ou um instituto público), integram-se na relação
jurídica em moldes idênticos ao de sujeitos privados; assim, se um instituto público, na
qualidade de tomador, celebrar um contrato de seguro, não estará munido de ius imperii.

Concluindo, no âmbito dos seguros as relações jurídicas estabelecem-se entre privados.


E as entidades públicas, quando são parte em contratos de seguro ou beneficiam de
compensações neles previstas, não se encontram numa situação de publica potestas.

5. Autonomia do direito dos seguros

O Direito dos Seguros insere-se no grupo das disciplinas de especialização de ciências


jurídicas e no contexto do ordenamento jurídico moçambicano, importa distinguir dois
níveis: o institucional e o material, sendo este último de maior relevo por respeitar ao
regime do contrato de seguro, justificando que o seu tratamento seja substancialmente
mais desenvolvidos.

A autonomia da disciplina direito dos seguros é incontestável, atendendo, por um lado,


à evolução histórica, mas principalmente em virtude de se estabelecerem princípios
próprios. Isto não põe em causa a necessidade de integrar o direito dos seguros no
direito civil e, em particular, no direito comercial.

Aos seguros aplicam-se tanto as regras gerais de direito civil – por exemplo., no que
respeita à formação do contrato, ao regime das cláusulas contratuais gerais ou regras de
interpretação – como igualmente as de direito comercial. Dessa conjugação de regras de
direito civil e de direito comercial resultará, por exemplo, que, na particular relação
entre o seguro e o instituto da responsabilidade civil, esta tem de ser enquadrada numa
perspectiva mercantilista.

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A natureza comercial dos seguros decorre do Regime Jurídico dos Seguros.
Exceptuando os seguros mútuos, todo o contrato de seguro tem natureza comercial para
a seguradora.

Tal como noutras áreas – por exemplo, sociedades – também se justificaria a autonomia
legislativa do direito dos seguros, a elaboração de um diploma único integrador da
matéria, que poderia ser um Código dos Seguros. Mas apesar de faltar esta
«independência» legislativa, a autonomia dos seguros no âmbito comercial parece
incontestável.

6. Razão de estudo do direito dos seguros

O estudo desta disciplina também se justifica atendendo a certas particularidades no que


respeita à terminologia. No léxico dos seguros usam-se expressões próprias, como
«tomador do seguro», «segurado», «beneficiário do seguro», «seguradora», «risco»,
«sinistro», «avaria» (simples e grossa), «fortuna de mar», «barataria», «liquidação do
sinistro», «salvado», «franquia» e «prémio», com sentidos muito precisos, nem sempre
consentâneos com a linguagem comum.

7. Fontes

Enunciação:

De forma mais ampla, é possível afirmar que as fontes materiais do direito são todos os
factores que condicionam a formação das normas jurídicas, ou seja, que implicam o
conteúdo das fontes formais, sendo todas as razões humanas que estabeleceram a feitura
de uma lei específica, de um determinado costume ou de um princípio geral de direito,
como razões económicas, sociológicas, políticas etc. que influenciaram a criação de
uma fonte formal. Este argumento demonstra que os factores sociais influenciam a
ordem jurídica, aspectos importantes, mas menos fundamentais para a ciência do direito
do que aqueles que digam respeito ao processo de produção de normas jurídicas, ou
seja, são regras não escritas que se formam por um comportamento e pela convicção de
que este é obrigatório e necessário. Regras não escritas que tornaram-se normas de
conduta.

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Portanto, entre as fontes específicas de direito dos seguros, importa destacar a Lei no
seu sentido mais amplo e com primazia o Decreto-lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro,
que aprova o Regime Jurídico dos Seguros, para além dos códigos civil e comercial e,
ainda, numerosa legislação extravagante.

O Regime Jurídico dos Seguros divide-se em dois livros, nomeadamente, o LIVRO I


(artigos 1 a 78), que comporta o direito institucional dos seguros, regulando as
Condições de Acesso e de Exercício da Actividade Seguradora, Resseguradora e da
respectiva Mediação; e o LIVRO II (artigos 79 a 260), que trata do direito material dos
seguros, regulando o contrato de seguro e outras relações jurídicas que as seguradoras
estabelecem com os particulares e entidades públicas, sempre que estas não estejam
cobertas do seu poder de supremacia.

 Órgãos Competentes
a. Estatuto Orgânico do Ministério das Finanças
b. Estatuto ISSM – Instituto de Supervisão de Seguros de
Moçambique
c. Lei nº 5/2010, 07 de Julho – autoriza o Governo a aprovar
o Regime Jurídico dos Seguros

 Acesso, Regulamentação e Prática da Actividade Seguradora e


Resseguradora
a. Decreto-Lei nº 3/77, de 13 de Janeiro- a actividade e
resseguradora passa a ser de exclusiva competência do
Estado;
b. Lei nº 24/91, de 31 de Dezembro – Liberaliza a actividade
seguradora e resseguradora;
c. Lei nº 3/2003, de 21 de Janeiro - Estabelece as condições de
acesso e exercício da actividade seguradora, mediação e
resseguro
d. Decreto nº 41/2003, de 10 de Dezembro – aprova o
Regulamento da Lei nº 3/2003, de 21 de Janeiro

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e. Decreto – Lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro – Regime
Jurídico dos Seguros.
f. Decreto nº 25/2009, de 17 de Agosto – Aprova o
Regulamento de Fundos de Pensões no Âmbito de Segurança
Social Complementar
g. Decreto nº 62/2013, de 4 de Dezembro - Regime Jurídico de
Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais.

 Usos
Como última fonte específica do direito dos seguros cumpre atender às
remissões para usos do sector.

Apesar de os usos não serem fonte de direito, sendo juridicamente atendíveis


quando a lei o determine, desde que não contrariem os princípios da boa-fé,
conforme atesta o nº 1 do artigo 3º CC.

Tudo para justificar que, por vezes é dada a relevância aos usos em
determinados sectores de seguros por via de remissões, mas perdendo relevo
dada a frequência de intervenção legislativa, vão cada vez mais dando lugar
às normas jurídicas.

8. Actividade Seguradora

a. Origem dos Seguros

Poderá, em várias obras atinentes à matéria de seguros, se contar a mesma história, de


diferentes formas, no entanto, o conteúdo é e será sempre o mesmo, pese embora o facto
de cada autor ter a sua linha de escrita e interpretação de todas as passagens ao longo do
tempo. A história dos Seguros apresenta um longo caminho de muitos séculos.

O conhecimento dessa história é mais do que conhecer uma parte significativa da


actividade humana. Por um lado, permite-nos compreender melhor algumas regras
práticas e algumas técnicas da actividade seguradora que, hoje em dia, são comummente
usadas; por outro, permitirá pôr em evidência algo de muito elementar mas muitas vezes

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esquecido, na medida em que, o seguro existe apenas para satisfazer necessidades das
pessoas e das organizações, enquanto essas necessidades forem sentidas.

Em tempos muito recuados, encontramos como que um pré-seguro, onde, no entanto, já


estavam presentes formas de solidariedade e de compensação, base do seguro moderno,
por exemplo na civilização egípcia, cerca de 4700 anos a.C.

De facto, já na Antiguidade as pessoas se agrupavam e punham em comum os meios de


que dispunham para ajudar quem fosse afectado por um golpe de má sorte: o Código de
Hammurabi (século XVIII a.C.), da antiga civilização da Mesopotâmia, contém
disposições relativas a um sistema de assistência mútua, para o caso de as mercadorias
transportadas em caravanas não chegassem ao destino.

Na Grécia antiga, existia um sistema de pagamento de um subsídio aos descendentes de


quem falecesse e, em Roma, existiam algumas espécies de associações de socorros
mútuos. São exemplo disso as “mútuas” dos soldados, para proverem às necessidades
dos familiares, quando eram mobilizados para zonas mais afastadas.

Note-se que nenhum destes sistemas era, propriamente, aquilo a que hoje se chamaria
“seguro”: eram meros esquemas de assistência mútua. Só mais tarde, quando, na Idade
Média, se transfere o risco para um terceiro, totalmente estranho à actividade arriscada,
é que se abrem as portas do seguro moderno. Esta transferência ocorre com o contrato
de empréstimo, verdadeiro antecedente do seguro marítimo, também conhecido por
empréstimo para a grande aventura.

Para armarem os barcos em que transportavam as suas mercadorias, os comerciantes


precisavam de fundos, recorrendo a empréstimos que, em caso de sucesso da viagem,
seriam pagos com um juro que chegava a atingir os 50%. Em caso de naufrágio, o
empréstimo não seria reembolsado. O credor fazia, de facto, uma aposta, algo
especulativo, o que justificava o elevado juro e o nome dado a este tipo de contrato. Era
uma prática geradora de abusos e considerada pura agiotagem, que, em 1234, por
decisão do Papa Gregório IX, foi proibida.

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A proibição levou a que se procurassem outras soluções para o problema e, desse modo,
chegou-se a um esquema em que a operação de garantia era separada da de empréstimo:
os comerciantes associavam-se e aceitavam garantir, mediante o pagamento de uma
quantia previamente fixada, que aquele que, por naufrágio, perdesse o seu barco e
respectiva carga seria reembolsado do prejuízo. Este contrato era reduzido a escrito e
chamava-se apólice, nome que foi adoptado para o contrato de seguro. Quando a
viagem chegava ao fim, o contrato era rasgado, talvez por isso, poucos exemplares
subsistiram até aos nossos dias, não se sabe, ao certo, quando teria começado este
sistema, contudo, conhecem-se alguns exemplares e o mais antigo data de 1347, tendo
sido celebrado em Génova.

A institucionalização das obras de caridade, na Idade Média, foi uma outra forma de
responder ao desafio de minorar o risco, estamos a falar de riscos de pessoas e não de
patrimónios, podendo-se, desse modo, afirmar que a prática seguradora, em especial no
que se refere ao seguro de pessoas, tem origem no mutualismo cristão, sobretudo
monástico. Tratava-se, porém, de uma actividade filantrópica, não económica, não
visando obter um lucro, isso terá travado o desenvolvimento dos seguros de pessoas,
que só muito mais tarde se verificou o seu surgimento.

É na alta Idade Média, e em estreita ligação com o comércio marítimo, que o seguro,
propriamente dito, se começa a configurar no “empréstimo para a grande aventura”
separa-se a garantia do empréstimo propriamente dito, e é então que se assiste à
transferência do risco para uma entidade terceira, totalmente estranha à “grande
aventura” propriamente dita. Esse terceiro vai assumir o risco mediante uma
remuneração, cedo designada como prémio, e assim nasce o Seguro.

Surgiu todo um conjunto de regras sobre o funcionamento desta nova actividade,


verdadeiros códigos do contrato de seguro, tais como o Consulado do Mar, de
Barcelona, do século XII, o Regulamento de Oléron, de 1200, e as “Ordenações de
Wisbury”, de 1288.

A importância económica de alguns Estados italianos – Génova e Veneza, graças ao


comércio marítimo, e Florença, graças ao sistema bancário, tornando aquelas cidades-
estado, nos séculos XIV a XVII, os principais centros de actividade seguradora no

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continente Europeu. A figura do intermediário de seguros surge, pela primeira vez, em
Florença, em pleno século XIV, e a primeira empresa de seguro marítimo foi criada em
Génova, em 1424.

É também em Itália, em 1552, na cidade de Veneza, que será publicado o primeiro texto
sistemático sobre teoria e prática de seguros: o Tractatus de Assecurationibus et
Sponsionibus Mercatorum, da autoria do jurisconsulto e corretor de seguro Pedro de
Santarém, judeu português que exercia a actividade seguradora.

Esta obra, ímpar na literatura de seguros, tem a particularidade de não ser apenas um
trabalho meramente teórico, mas também um verdadeiro manual prático para o
exercício quotidiano da profissão de segurador.

Curiosamente, a Inglaterra, tida como a pátria dos seguros, só começa a desenvolver


essa actividade no reinado de Isabel I (1558-1603).

A decadência económica das repúblicas italianas e, depois, de Portugal (e de Espanha)


levou a que, a partir do século XVII, os principais centros do comércio internacional se
deslocassem para Londres e para Amesterdão, arrastando para aí os centros seguradores
da Europa.

Em Londres, em 1686, surge uma instituição única e muito sui generis. Vejamos do que
se tratou. Muitos armadores, comerciantes e seguradores londrinos reuniam-se, num
misto de convívio e de encontro de negócios, no café do Senhor Eduardo Lloyd. Para
fidelizar essa clientela o Senhor Lloyd teve a iniciativa de criar um registo de
naufrágios, ou seja, sempre que chegava a notícia de um naufrágio, não só o anunciava,
fazendo soar uma sineta, mas também registava num livro, colocado num ponto central
do seu estabelecimento, junto à sineta, o nome do navio sinistrado, a data e local do
acidente, o nome do armador, a carga, enfim toda a informação disponível e relevante.
Por outro lado, cedia o espaço do seu café para a realização de negócios. Foi assim que
nasceu a actual corporação Lloyds – ou mercado de Londres – onde se continua a
celebrar grande parte dos contratos de seguro, onde se mantém o registo de naufrágios,
sempre actualizado e usando o ritual do século XVII e onde se edita a gazeta do Lloyds,

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relevante informação sobre armadores, naufrágios, frotas mercantes e, de uma forma
geral, sobre comércio marítimo internacional.

O seguro de cascos e de mercadorias cedo foi acompanhado pelo de pessoas,


inicialmente para fazer face a eventuais resgates que fosse necessário pagar por
tripulações aprisionadas e também para fazer face à morte, em trânsito, de escravos,
muito embora estes fossem considerados mera mercadoria.

O seguro de vida, tal como o conhecemos hoje, só apareceu mais tarde – final do século
XVII, primórdios do século XVIII – depois de estudos levados a cabo por Pascal e por
Halley.

Em 1666, em Londres, ocorreu um gigantesco e catastrófico incêndio, vitimando


centenas, senão milhares, de edifícios e de pessoas. Esse desastre, que ficou conhecido,
na História, como o “Grande Incêndio”, levou a que fosse criado o primeiro corpo de
bombeiros da Europa e, em 1684, ao aparecimento do seguro contra o risco de incêndio
e com ele a primeira seguradora cobrindo esse risco.

Outros ramos e modalidades de seguros irão surgindo, progressivamente, ao longo do


tempo, sempre em íntima associação aos progressos científicos e ao desenvolvimento
das economias.

Em suma, nascido na Antiguidade Oriental para protecção das mercadorias


transportadas em caravanas, em Roma e na Grécia, evoluindo ao longo dos séculos, com
o mutualismo baseado em acções de caridade da Idade Média e o associativismo dos
mercadores, no Renascimento, a partir dos séculos XV/XVI, surge a actividade
seguradora propriamente dita.

Há que destacar aqui que, por razões de ordem religiosa, o Islão não acompanhou a
evolução do seguro, pois, segundo os seus princípios, fazer um seguro era tido como
uma heresia, pois era desafiar Deus e a Sua omnipotência. Contudo, nos países
islâmicos a pressão dos negócios e da vida moderna se fez sentir, levando os teólogos

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muçulmanos a reverem a proibição, existindo hoje um seguro com características muito
específicas, designado takaful1, que é o chamado “seguro islâmico”.

Histórica e logicamente, poderemos dizer que o seguro surge da sobreposição de três


elementos: i) a existência de uma série de riscos comparáveis e susceptíveis de se
compensarem entre si (a mutualização do risco); ii) uma componente jurídica, que se
materializa no contrato de seguro (a apólice); e iii) uma componente de
conhecimento científico, a previsão do risco, feita por alguém (o segurador) com base
na informação estatística relativa à ocorrência, no passado, de riscos similares e
comparáveis.

A partir de uma dada situação de risco, a combinação daqueles três elementos veio
possibilitar garantir que, se o risco ocorrer de facto, é possível proceder à reparação
financeira dos danos verificados, ao ressarcimento dos danos, como se diz em
linguagem técnica-jurídica.

Com a Revolução Industrial, o seguro acabou se tornando um elemento praticamente


obrigatório em todas as áreas da actividade humana, afinal, os avanços tecnológicos, as
actividades de alto risco e os novos meios de transportes podem causar prejuízos de
proporções incalculáveis.

Todo esse crescimento da indústria, do comércio e dos meios de transporte, fez com que
as empresas seguradoras também evoluíssem para acompanhar a demanda do mercado.
E, existem hoje seguradoras que controlam elevadíssimos valores, contribuindo com a
sociedade, na geração de empregos e com projectos de responsabilidade social.

Antes de concluirmos esta breve passagem pela história dos Seguros, é interessante falar
um pouco de Moçambique, mas por força de razões também históricas que nos ligam a
Portugal, torna-se imperioso que olhemos com muita brevidade como foi a génese dos
seguros naquela antiga potência colonial.

1
Espécie de um sistema de cooperativa em que são activados os mecanismos de interajuda em caso de
verificação de uma perda por ocasião de um evento danoso.

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Foi entre 1293 e 1297, no reinado de D. Dinis, que foram criadas várias instituições,
ligadas à Igreja, que praticavam o mutualismo alicerçado na caridade. E, com o
desenvolvimento do comércio marítimo, se começou a afirmar a actividade seguradora,
culminando com a criação de uma espécie de mercado segurador, a Bolsa de Seguros,
no reinado de D. Fernando.

O período das “Descobertas” e, sobretudo, o reinado de D. Manuel I constituíram como


que o substracto para a primitiva actividade seguradora portuguesa, exercida quer em
Lisboa quer na Feitoria da Flandres. Não havia empresas de seguros, mas apenas
indivíduos que exerciam intermediação entre outros indivíduos, os que queriam
precaver-se contra os riscos e aqueles que, a troco de remuneração, aceitavam assumir
esses riscos.

Ainda naquela época, em Portugal, como de resto noutros países europeus, a


generalidade dos contratos não era reduzida a escrito, a maior parte dos contratos era
verbal. Daí, também, o facto de haver poucas apólices antigas, assim como a
necessidade de controlar, quanto mais não fosse por razões fiscais, o exercício destes
negócios. Nasceu, desta forma, em 15 de Outubro de 1529, o cargo de Escrivão de
Seguros, de nomeação régia e que se pode considerar como o antepassado da autoridade
portuguesa de regulação e de supervisão de seguros.

Foi, portanto, nesta base que, ainda, durante o século XVI foi criada a Casa dos
Seguros, uma espécie de central de registo e de negociação de contratos de seguros.

Mesmo assim, não foi de imediato que Portugal viu criada a primeira companhia
privada de seguros, na medida em que, teve que inicialmente fazer face aos problemas
de decadência económica, a perda da independência, em 1580, as lutas para a
reconquista dessa mesma independência, a reconstrução económica e demais obstáculos
de índole económico e social. Só assim surgiu, em 1791, a primeira companhia de
seguros de gestão privada.

Por outro lado, por razões que se prendem com as constantes invasões napoleónicas
fizeram com que a actividade seguradora passasse a ser exercida por seguradoras
estrangeiras, geralmente britânicas, situação que arrastou até 1848, ano em que nasceu a

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Companhia de Seguros Fidelidade, que, nos últimos tempos, no século XXI, viria
fundir-se com a seguradora Mundial Confiança, dando origem à Companhia de Seguros
Fidelidade-Mundial.

b. Evolução dos seguros em Moçambique

Embora o seguro, na sua forma moderna, tenha iniciado a praticar-se na Europa, desde o
século XIV, e registado um grande desenvolvimento a partir do século XVIII, em
Moçambique só começou a ser transaccionado no início do século XX.

No nosso país, a origem e evolução do seguro, nas suas variadas vertentes está
fortemente ligada ao nascimento da indústria seguradora no solo pátrio que, durante
muitos anos vai conhecendo algumas inovações, em termos práticos, à medida que o
país vai dando sinais cada vez mais evidentes de desenvolvimento económico e social,
designadamente, mercê de um parque automóvel em constante crescimento e
surgimento de um parque industrial e empresas de prestação de serviços, assim como,
graças, também, da existência de instrumentos legais que dão corpo à figura jurídica às
várias classes de seguro.

Por outro lado, tal como foi nos países europeus, em relação a Moçambique também
pode dizer-se que a indústria de seguro evolui à medida do desenvolvimento económico
e da própria consciência que se vai tendo em relação ao “risco”, assim como a
preocupação cada vez mais crescente de proteger vidas e os bens patrimoniais, para
além decrescimento contínuo da responsabilidade de reparação de danos, em relação
que os causa para com o lesado.

Aliás, é sabido que modalidades de interajuda no seio de comunidades e famílias


moçambicanas, perante infortúnios de alguns, que não são mais do que a ideia básica do
seguro e do célebre princípio “um por todos e todos por um”, constituem práticas
seculares.

Nos primeiros anos, as transacções de seguro estavam entregues a firmas comerciais


que, para além do comércio interno, importação e exportação, se dedicavam, entre
outras actividades subsidiárias, a actividade de seguro, sendo maior parte dessas

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instituições constituídas por agências estabelecidas em Moçambique, de capitais
Britânicos e Sul-africanos, numa reflexão clara do fraco poderio económico de Portugal,
então potência colonizadora, sendo maior expressão económica destas agências
observada no período compreendido entre 1933 a 1942.

Em 1943, foi criada a primeira sociedade de seguros colonial, a “NAUTICUS” e nos


tempos que se seguiram até 1948, com a também criação da segunda companhia
colonial, a “LUSITANA”, em 1945, a situação conheceu uma inversão positiva nas
transacções de seguro a favor das companhias de seguro com sede em Moçambique.

Em 1949, foram criados em Moçambique os serviços de Fiscalização Técnica da


Indústria Seguradora, que mais tarde passou a ostentar o nome de Inspecção de Seguros.
Em 1957, nasceram mais duas novas sociedades de seguro com sede local,
nomeadamente, a “MUNDIAL E CONFIANÇA DE MOÇAMBIQUE” e a
“TRANQUILIDADE DE MOÇAMBIQUE”, elevando para quatro o número de
companhias seguradoras com sede em Moçambique.

Após a Independência Nacional, a 25 de Junho de 1975, a importância económica deste


sector mereceu, desde logo, a atenção do Estado e Governo de Moçambique, tendo sido
um dos primeiros sectores de actividade económica a ser nacionalizado, acto que se
verificou em Janeiro de 1977, à luz dos seguintes objectivos:

 Por tratar-se dum sector consumidor de divisas que, como tal, importava controlar;

 Por ser um sector que gere, também, seguros sociais, no caso, por exemplo, de
Acidentes de Trabalho e, como tal, de reflexos sociais importantes;

 Por ser um sector de serviços complexos e onde não havia quadros nacionais
preparados. Havia, assim, que garantir a sua formação técnica e profissional de
forma acelerada;

 Em suma, por servir melhor as necessidades da economia, assegurando o


desenvolvimento dos seguros que sirvam os máximos interesses nacionais.

É, assim, criada em 1 de Janeiro de 1977, a EMOSE – EMPRESA MOÇAMBICANA


DE SEGUROS, E.E., pelo Decreto-Lei nº 3/77, de 13-01-1977, instituição que foi
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confiada a exclusividade do exercício da actividade seguradora e resseguradora e que
resultou da fusão das quatro companhias seguradoras com sede em Moçambique,
nomeadamente, as companhias de Seguros NAUTICUS, LUSITANA,
TRAQUILIDADE DE MOÇAMBIQUE e a MUNDIAL E CONFIANÇA DE
MOÇAMBIQUE, esta última com a sede na cidade da Beira e que foi liquidada, dada à
sua situação prática de falência.

Por outro lado, cessaram as suas actividades na República de Moçambique as agências


gerais e delegações das cerca de trinta companhias de seguros estrangeiras, entre as
quais, portuguesas, inglesas, sul-africanas e italianas.

Esta exclusividade do exercício da actividade seguradora do Estado Moçambicano, por


intermédio da EMOSE, E.E., teve sempre em vista a prossecução dos objectivos do
Governo, considerando que:

 O sector segurador apoiava-se “em esquemas e estruturas capitalistas que não


beneficiavam a Nação”;

 Os prémios, as poupanças, o investimento e a mutualidade não eram processados em


benefício do Povo, mas sim com vista a multiplicação da riqueza dos detentores do
capital;

 Das cerca de três dezenas de seguradoras e agências existentes em Moçambique,


apenas quatro delas possuíam sede no solo pátrio;

 “A legislação, as modalidades de seguro, suas bases e reservas técnicas, e seu


caucionamento fora do País”, visavam obter vantagens para a “potência colonial”;

 “Os dinheiros das seguradoras eram, fundamentalmente, aplicados nos sectores


especulativos, em especial para a área imobiliária”;

 As resseguradoras nem sempre tinham em conta o necessário equilíbrio de cobertura


de risco a nível nacional, “favorecendo as suas companhias-mãe”.

Com a liberalização do mercado, em Dezembro de 1991, a Assembleia da República de


Moçambique, considerando que, o processo de reestruturação económica em curso
exigia a correcta adaptação e dinamização do sector financeiro do país, dado que, a
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actividade seguradora assumia importância vital na economia, sendo para a segurança
individual e colectiva, o sistema de seguros e as formas do seu desenvolvimento deviam
ser adaptadas às tendências da estruturação económica e social, o que iria permitir uma
maior competitividade económica e melhoria da qualidade dos serviços prestados, foi a
actividade seguradora e resseguradora autorizada o seu exercício por entidades publicas,
privadas ou outras, desde que, para tal, se mostrassem devidamente licenciadas à luz da
Lei nº 24/91, de 31 de Dezembro.

Desde então, já foram autorizadas a operar em Moçambique seguradoras de gestão


privada, de entre as quais:

 Global Aliance (ex- Companhia Geral de Seguros de Moçambique, SARL), com


registo a 29 de Julho 1992, nas modalidades “vida” e “não vida”;

 Seguradora Internacional de Moçambique, SA (ex - IMPAR – Companhia de


seguros de Moçambique, SARL), registada em 23 de Setembro de 1992, operando
nas modalidades “vida” e “não vida”;

 Hollard, desde 29 Setembro 2001, na modalidade “não vida” e mais tarde, em 22


Outubro 2008, passou a acumular as duas modalidades, passando a operar também
na modalidade “vida”;

 Moçambique Companhia de Seguros, operando na modalidade “não vida”, com


registo datado a 20 de Outubro de 2001;

 Austral Seguros, registada em 19 de Agosto 2008, exercendo apenas na modalidade


“não vida”;

 Real Seguros, com registo a 9 de Junho de 2010, na modalidade “não vida”.

 A Tranquilidade - A Tranquilidade Moçambique Companhia de Seguros, SA, e a


Tranquilidade Moçambique Companhia de Seguros Vida, SA. são seguradoras de
direito Moçambicano que iniciaram a sua actividade em Moçambique em 2012.

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c. Interligação entre as actividades seguradora e bancária

Tendo em conta que há uma frequente interligação entre as actividades seguradora e


bancária, importa atender a essa interferência para concretizar o âmbito específico dos
seguros; de facto, tanto se verifica a expansão da banca para actividade seguradora,
passando os bancos a comercializar contratos de seguro, como a hipótese inversa de as
seguradoras se expandirem para actividade bancária, comercializando operações de
crédito.

Em suma, sabendo-se que os bancos e as seguradoras podem ter um objectivo comum


de captação de poupança, não se pode descurar a análise da interligação entre as
actividades bancária e seguradora.

A referida interligação entre as actividades bancária e seguradora vale no que respeita


aos designados “conglomerados financeiros”, em que há uma conexão entre o crédito e
o seguro – por exemplo, Seguro de Vida ou Plano Poupança Reforma.

Nestes casos, pode questionar-se a summa divisio (a principal divisão) entre o crédito e
o seguro. Por via de regra, nos últimos tempos, a seguradora não é simplesmente uma
empresa que presta um serviço de assunção de risco como contrapartida da percepção
de um prémio, pois os seguros financeiros têm um papel relevante na dinâmica destas
sociedades.

d. Importância económica e social do seguro

Mesmo que não se recorra a uma explicação assente na evidência, a relevância do


seguro relaciona-se com a sua complexidade teórica e generalização da vida corrente. O
seguro tem uma importância significativa tanto na economia nacional e individual,
como até, na vida das pessoas.

Por via do seguro, pretende-se transferir o risco que seria suportado numa esfera jurídica
para outra entidade, mediante o pagamento de uma contrapartida. E o seguro tem que
ver com quase todos os aspectos da vida das pessoas – seja qual for a modalidade ou
ramo dos seguros.

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Por outro lado, toda a actividade económica, directa ou indirectamente, relaciona-se
com os seguros, pois é desenvolvida com o recurso a variados contratos de seguro.

Em suma, nos seguros além da importância económica e social, ter-se-á de atender à


gestão do risco. Conjugam-se, assim, os aspectos de grande relevo: a dinâmica
económica de uma indústria baseada na gestão do risco com a utilidade social dos
seguros.

e. Mercado Segurador Moçambicano

Acesso e exercício da actividade seguradora e respectiva mediação

O acesso e exercício da actividade seguradora e respectiva mediação encontra-se devida


e legalmente tratado no ordenamento jurídico moçambicano, a avaliar pela entrada em
vigor do Decreto-Lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro, que aprova o Regime Jurídico dos
Seguros, cujo regulamento é aprovado pelo Decreto nº 30/2011, de 11 de Agosto.

O Decreto-Lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro surge em revogação da Lei nº 3/2003, de


21 de Janeiro, que se mostrou como a primeira tentativa de resolução do problema de
dispersão de diplomas atinentes à actividade seguradora, partes dos quais se mostravam,
há muito, desactualizados, não propiciando, por isso, um ambiente adequado para a
dinâmica do desenvolvimento e modernização da industria seguradora, com a necessária
confiança que deve caracterizar as relações entre os diferentes intervenientes, no
contexto da economia de mercado.

Portanto, a Lei nº 3/2003 constitui o primeiro diploma legal a definir as condições de


acesso e exercício da actividade seguradora e respectiva mediação, na era pós
liberalização do mercado de seguro.

O regime jurídico ora aprovado estabelece as condições de acesso e exercício, na


República de Moçambique, da actividade seguradora, resseguradora, micro-seguro e
mediação de seguros, definido ainda, as condições de estabelecimento no estrangeiro de

Mucusse – USTM - 2017 Página 18


quaisquer formas de representação de seguradoras, micro-seguradoras e resseguradoras
com sede social no solo pátrio.

E, com a publicação e entrada em vigor do Regulamento das Condições de Acesso e


Exercício da Actividade Seguradora e Respectiva Mediação, aprovado pelo Decreto nº
30/2011, consolida-se, desta forma o Direito dos Seguros moçambicano, que
compreende agora uma componente institucional e uma componente material.

Naturalmente, a primeira componente referir-se-á às condições de acesso e exercício da


actividade seguradora, incluindo a das micro-seguradoras, e sua mediação, nas
categorias de corretor, agente e promotor. E, a segunda componente, aquela que deveria
versar-se à volta das normas que devem obedecer o contrato de seguro, o legislador
deixou em aberto, valendo-se as partes na faculdade do uso da liberdade contratual,
dentro da autonomia privada.

Por isso, o Regulamento centra-se na componente institucional e define com detalhe,


tanto as condições de acesso como as de exercício da actividade seguradora em
Moçambique e refere claramente, no seu artigo 2, que se aplica às entidades
devidamente autorizadas, nos termos do Regime Jurídico dos Seguros.

O Regime Jurídico dos Seguros (RJS), refere que a actividade seguradora, incluindo o
segmento do micro-seguro, só pode ser exercida por sociedades anónimas e sociedades
mútuas, com sede social baseada em Moçambique, para o caso de exercício da
actividade do seguro directo, de resseguro ou de micro-seguro, respectivamente, e
sucursais de seguradoras, resseguradoras e micro-seguradoras estrangeiras, constituídas
nos países de origem, sob forma de sociedade comercial - art. 2.

Conforme o art. 4, nº 1, do mesmo RJS em conjugação com o artigo 7 do Regulamento,


o acesso e exercício da actividade seguradora, resseguradora e do micro-seguro e, ainda,
o estabelecimento em país estrangeiro, de sucursais ou quaisquer outras formas de
representação de seguradoras, resseguradoras e micro-seguradoras, carecem de
autorização prévia a conceder, pelo Ministro que superintende a área das Finanças,
mediante parecer do ISSM – Instituto de Supervisão de Seguros de Moçambique.

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Nos termos do artigo 4 do Regulamento, ao ISSM cabe, por um lado, proceder à
verificação da constituição formal e do início actividade seguradora, resseguradora e
micro-seguradora, dentro dos prazos legalmente estabelecidos, após o respectivo registo
especial previsto no artigo 9 do RJS e, por outro, proceder à verificação da adequação
das instalações e dos meios materiais, técnicos e humanos para o normal
funcionamento, em conformidade com os elementos constantes do correspondente
processo de autorização.

Na verdade, em matéria de acesso à actividade seguradora, para além da instrução do


requerimento previsto no artigo 7 do Regulamento das Condições de Acesso e de
Exercício da Actividade Seguradora e da Respectiva Mediação, aprovado pelo Decreto
nº 30/2011, de 11 de Agosto, a decisão sobre o pedido de autorização é notificada, por
escrito, aos interessados no prazo máximo de 45 dias, a contar da data da recepção do
pedido, ou se for o caso, da data em que foi recebida no ISSM a informação
complementar, conforme se refere o nº 1 do artigo 8, em conjugação com os artigos 6 e
7, todos do dispositivo legal acima mencionado.

Mas, por outro lado, o pedido poderá conhecer algum indeferimento, sempre que não
estiver instruído com todas as informações e documentos exigidos, ou se a sua instrução
apresentar inexactidões e falsidades, ou ainda, se se verificar a falta de garantias e
gestão sã e prudente. Para todos efeitos, a falta de notificação da decisão no prazo
legalmente previsto, equivale a indeferimento tácito do pedido.

Regulação e supervisão
Com entrada em vigor do novo Regime Jurídico dos Seguros é, simultaneamente e pelo
mesmo Decreto – Lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro, criado o ISSM – Instituto de
Supervisão de Seguros de Moçambique.

Conforme refere ao artigo 5 do dispositivo legal (Decreto – Lei nº 1/2010, de 31 de


Dezembro) que aprova o Regime Jurídico dos Seguros (RJS), o ISSM funciona sob
tutela do Ministro que superintende a área das Finanças. É uma pessoa colectiva de
direito público, dotada de personalidade jurídica, com autonomia administrativa e
financeira e tem por objecto:

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 O exercício da supervisão e fiscalização das entidades habilitadas ao exercício da
actividade seguradora, de mediação de seguros e resseguro e de gestão de fundos de
pensões complementares; e

 A supervisão e fiscalização subsidiária da execução da política de investimento da


segurança social obrigatória gerida pelo Instituto de Segurança Social (INSS) e do
Fundo de Pensões dos Trabalhadores do Banco de Moçambique.

O ISSM, no âmbito das suas atribuições e competências, emite, por Aviso publicado no
Boletim da República, normas técnicas, de cumprimento obrigatório, necessárias à
correcta implementação das disposições legais aplicáveis à actividade seguradora e sua
mediação.

Portanto, no processo de actualização legislativa, a criação do ISSM vem extinguir a


Inspecção Geral de Seguros (IGS) criada pelo Decreto nº 42/99, de 20 de Julho,
sucedendo-a em tudo quanto respeita à fiscalização e supervisão e conserva a
universalidade dos direitos e obrigações anteriormente titulados pela IGS.

Fica, efectivamente, clara esta transferência para o organismo recentemente criado com
extinção do outro, quando o nº 3 do artigo 6 do decreto-lei que aprova o RJS salienta
que os recursos humanos, financeiros e patrimoniais afectos à IGS transitaram para o
ISSM, salvaguardando-se os direitos adquiridos em carreiras profissionais ou categorias
ocupacionais anteriores dos funcionários e agentes do Estado que sejam integrados no
quadro de pessoal do ISSM, sendo estes regidos pelo Estatuto Geral dos Funcionários e
Agentes do Estado.

O Conselho de Ministros, no uso das suas competências e atribuições, e tendo por


escopo melhor esclarecimento sobre os mecanismos a partir dos quais o ISSM possa
levar a cabos as suas acções de supervisão, aprovou o Regulamento das Condições de
Acesso e de Exercício da Actividade Seguradora e da Respectiva Mediação, por via do
Decreto nº 30/2011, de 11 de Agosto. Trata-se de um instrumento com características
adjectivas ao serviço do Decreto – Lei nº 1/2010, de 31 de Dezembro.

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Este Regulamento define os procedimentos relativos ao acesso e de exercício da
actividade seguradora e da respectiva mediação e aplica-se às entidades que,
devidamente autorizadas nos termos do RJS exerçam suas actividades legalmente.

As entidades habilitadas ao exercício da actividade, incluindo as operadoras do micro-


seguro, estão sujeitas ao pagamento de uma taxa, conforme previsto no artigo 7 RJS e
são susceptíveis de serem sancionadas sempre que se verifique atraso e falta de
pagamento dos valores da taxa de supervisão, ficando para o efeitos devidos os juros de
mora e multa.

Subsidiariamente são aplicáveis à actividade seguradora às disposições constantes dos


Códigos Comercial, Civil e Penal, assim como dos Códigos de Processo Civil e Penal e
respectiva legislação complementar.

Ainda em matéria de acesso à actividade seguradora é condição fundamental que as


sociedades sejam do tipo anónimas de seguros e, sem prejuízo do legalmente previsto
em matéria do micro-seguro e da mediação de seguros, a autorização para o início da
actividade é concedida separadamente para os ramos “Vida” e “Não Vida”, abrangendo,
abrangendo a totalidade do respectivo ramo, tanto para o seguro directo como para o
resseguro, salvo se, no que respeita aos ramos “Não Vida”, a entidade requerente apenas
pretender cobrir alguns riscos ou modalidades de um determinado ramo.

O artigo 3 do regulamento das condições de acesso e exercício da actividade seguradora


e da respectiva mediação preconiza que a exploração de novos ramos ou modalidades
de seguros não incluídos na autorização inicial depende da autorização prévia,
observando-se os mesmos procedimentos legais.

Por outro lado, deverá merecer a autorização prévia do Ministro que superintende a área
das Finanças, mediante parecer do Instituto de Supervisão de Seguros de Moçambique
(ISSM) aspectos relacionados com:

a) Alterações aos estatutos, decorrentes da alienação ou da transformação,


nomeadamente, cisão ou fusão de seguradora, micro-seguradora ou resseguradora

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com sede na República de Moçambique, bem como dos mediadores, na categoria de
corretor ou de agente de seguros sob forma de sociedade comercial;

b) Alienação isolada de sucursal de seguradora estrangeira a operar na República de


Moçambique.

Devem ainda ser comunicadas ao ISSM as alterações estatutárias de todas entidades que
operem na actividade de seguros e que se apresentem sob forma de sociedade comercial,
consistindo exclusivamente na mudança do local da respectiva sede, no prazo de 10
dias, após a sua verificação. Outrossim, quando ocorram modificações que se
verifiquem nos estatutos ou na composição do órgão da administração de seguradora
com sede no estrangeiro, autorizada a instalar a respectiva sucursal em Moçambique, no
prazo de 30 dias a contar da data em que tiverem ocorrido.

Nos termos do artigo 13 do Regime Jurídico dos Seguros, obriga que as seguradoras
devem constituir-se em Moçambique sob forma de sociedade anónima, nos termos
previstos no Código Comercial e demais legislação aplicável ou sob forma de sociedade
mútua de seguros, com natureza de sociedade cooperativa. Sendo que, as
resseguradoras, revestem, igualmente, a forma de sociedade anónima.

Em termos de objecto social, as seguradoras sedeadas em Moçambique são instituições


financeiras que perseguem de forma exclusiva o exercício da actividade seguradora, não
obstante do facto de, respeitando o âmbito da autorização que lhes tenha sido concedida,
nomeadamente, quanto aos ramos e modalidades de seguros a explorar, podem aceitar
contratos de resseguro, bem como efectuar o resseguro da sua própria actividade em
seguradoras ou resseguradoras devidamente autorizadas, ainda que as cessionárias não
se encontrem estabelecidas ou representadas em território nacional.

Para todos efeitos, há uma obrigatoriedade de registo especial das entidades como uma
das condições para o acesso e exercício da actividade seguradora. Estão, sem prejuízo
de quaisquer outras obrigações legais de registo exigidas, igualmente sujeitos ao registo
especial na entidade de supervisão.

São, igualmente, factos sujeitos a registo, bem como o prazo da sua efectivação, aqueles
estabelecidos nas respectivas disposições regulamentares e do registo e das suas

Mucusse – USTM - 2017 Página 23


alterações são passadas as respectivas certidões sumárias a quem demonstre interesse
legítimo para requerê-las.

No entanto, poderão ocorrer casos de recusa do registo especial, quando as entidades


habilitadas ao exercício da actividade seguradora no âmbito do seguro directo, resseguro
e do micro-seguro, bem como os mediadores de seguros, (i) manifestem factos não
titulados nos documentos apresentados; (ii) se verifique que o facto constante do
documento já esteja registado ou não sujeito a registo; (iii) for manifesta a nulidade; e
(iv) se verifique que não está preenchida alguma das condições de que depende a
autorização necessária para constituição da sociedade ou para o exercício da respectiva
actividade.

Mais ainda, poderá ser recusado o registo especial, quando o requerimento ou os


documentos apresentados manifestem insuficiências ou irregularidades que possam ser
supridas pelos interessados e estes são notificados pela entidade de supervisão para
procederem ao necessário suprimento, no prazo que lhes for fixado, sob pena de não o
fazendo ser recusado o registo ou o averbamento.

Para o início da actividade, preconiza o artigo 4 do Regulamento que cabe ao ISSM


proceder à necessária verificação formal e do início da actividade seguradora, micro-
seguradora ou resseguradora, dentro dos prazos legalmente estabelecidos, após o
respectivo registo especial previsto nos termos do artigo 9 do Regime Jurídico dos
Seguros.

O acesso à actividade seguradora e o estabelecimento de seguradoras obriga, em


primeiro lugar, que deve ser no âmbito de sociedades anónimas de seguros e, nos
termos do artigo 7 do Decreto nº 30/2011, de 11 de Agosto, que aprova o Regulamento
das Condições de Acesso e de Exercício da Actividade Seguradora, será mediante um
requerimento solicitando a autorização para a constituição de uma seguradora dirigido
ao Ministro que superintende a área das Finanças, acompanhado de seguintes
elementos:

a) Acta da reunião em que foi deliberada a constituição da sociedade;

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b) Projecto dos estatutos da sociedade a constituir;

c) Identificação dos accionistas fundadores, sejam pessoas singulares, colectivas ou


sociedades comerciais, titulares de participação directa ou indirecta, com
especificação do capital subscrito por cada um e a origem dos respectivos fundos;

d) Indicação, por cada accionista fundador, de outras sociedades em cujo capital


detenha participações qualificadas e a estrutura do respectivo grupo;

e) Informação detalhada relativa à estrutura do grupo em que, previsivelmente, a


sociedade a constituir é integrada;

f) Acta do órgão social competente dos accionistas que revistam a natureza de pessoa
colectiva ou sociedade comercial, deliberando a participação na sociedade;

g) Certificado do registo criminal dos accionistas fundadores, quando pessoas


singulares, e dos respectivos directores, administradores ou gerentes, quando
pessoas colectivas ou sociedades comerciais, emitidos no prazo não superior a 90
dias.

h) Declaração dos accionistas fundadores de que nem eles nem as sociedades cuja
gestão tenham assegurado ou de que tenham sido administradores, directores ou
gerentes foram declarados em estado de insolvência ou falência que lhes seja
imputável, tendo nas mesmas sociedades exercido sempre uma gestão sã e prudente.

Tratando-se de cidadãos de nacionalidade estrangeira, o certificado do registo criminal


poder substituído por documento equivalente, emitido no país de origem, no prazo não
superior a 90 dias. E havendo, na sociedade a constituir, accionistas fundadores com
participação qualificada que sejam pessoas colectivas ou sociedades comerciais, é
obrigatória a apresentação, juntamente com o requerimento solicitando a autorização
para a constituição da seguradora, os seguintes elementos relativos a cada um:
1. Estatutos;

2. Relatórios de contas dos últimos três exercícios sociais;

3. Identificação dos membros do órgão de administração, com informação de


dados biográficos;

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4. Distribuição do capital social, indicando os detentores de participações sociais
iguais ou superiores a 10%.

Mais ainda, o requerimento é instruído com um programa de actividades que inclui, de


entre outros, condições gerais das apólices correspondentes aos ramos e operações de
seguros que se pretende explorar e respectivas bases técnicas, princípios orientadores do
resseguro que se propõe seguir, estrutura orgânica, e demais elementos legalmente
previstos, nos termos dos artigos 7 e seguintes do Regulamento das Condições de
Acesso e de Exercício da Actividade Seguradora, destacando-se acima de tudo a
idoneidade e experiência profissional da nova seguradora em constituição.

Já para a constituição das mútuas de seguros, o mesmo Regulamento recomenda que


deve ser feita por via de sociedades de mútuas de seguros constituídas por pessoas
singulares e/ou colectivas e/ou sociedades comerciais.

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