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TÉCNICA

DIETÉTICA II

Analú Barbosa da Silva


Bioquímica e tecnologia
de açúcares
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Identificar o processo de obtenção do açúcar a partir da cana-de-açúcar.


 Avaliar as propriedades dos açúcares e suas reações.
 Apontar as aplicações tecnológicas de açúcares.

Introdução
Desde a sua introdução, no século XVI, a cana-de-açúcar é um empreen-
dimento agroindustrial, que articula a agricultura com o processamento
fabril de um dos produtos mencionados neste capítulo — o açúcar. Na
sua trajetória, que foi dos engenhos às usinas, os processos de plantio
e transformação da cana-de-açúcar passaram por alterações até chegar
às configurações atuais, com tecnologia de produção, e à especialidade
das unidades produtoras. O processamento artesanal da cana-de-açúcar
— práticas similares às do período colonial, como a produção de rapa-
dura, melado e açúcar mascavo — coexiste em algumas regiões com
a agroindústria de ponta, com processos automatizados, como a mais
recente produção de açúcar e etanol (BRASIL, 2017). Para a obtenção de
diversos tipos de açúcar, de acordo com o grau de refinação (refinado,
primeira e segunda qualidade), dentre outros produtos, basicamente
estes passam pelos métodos de purificação, decantação, evaporação e
cristalização, concentração e cozimento, para finalizar com a centrifuga-
ção e a secagem. Quanto às propriedades físico-químicas e sensoriais
desses monossacarídeos, serão descritos a higroscopicidade (solubili-
dade, capacidade de retenção de umidade), mutarrotação, estado vítreo
(aumento da viscosidade), cristalização, inversão dos açúcares, poder
edulcorante (doçura relativa), aumento da velocidade de fermentação e
pressão osmótica e atividade de água (Aw). Já as aplicações tecnológicas
dos açúcares demonstram que servem não apenas para adoçar, mas
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cumprem importantes funções tecnológicas, contribuindo para a textura,


o volume, a cor e a preservação dos alimentos.
Neste capítulo, você vai identificar o processo de fabricação e as
aplicações tecnológicas do açúcar a partir da cana-de-açúcar, além de
suas propriedades e reações.

Processo de obtenção do açúcar a partir da


cana-de-açúcar
A cana-de-açúcar, planta sacarina da família das gramíneas, do gênero Sac-
charum, própria de climas tropicais e subtropicais, é explorada há séculos
como fonte industrial da sacarose, e, no Brasil, sua cultura foi introduzida
através de mudas provenientes da ilha da Madeira, cujo plantio em todo
território nacional, com exceção das regiões mais frias do Sul, colocou o país
como um dos maiores produtores mundiais. Quanto à sua produção, através
do Instituto do Açúcar e do Álcool e de órgãos competentes da indústria
açucareira, destaca-se a preocupação em ampliar e aprimorar esse importante
setor da economia nacional.
Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
a produção de açúcar no país, em 2015, foi de mais de 37 milhões de toneladas,
das quais mais de 53% eram do tipo VHP, sigla para a expressão em inglês
very high polarization (polarização muito alta), utilizado como matéria-prima
para a produção de açúcar refinado ou em outros processos industriais, vol-
tado principalmente ao comércio exterior (INSTITUTO BRASILEIRO DE
GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2017). O mapa na Figura 1 demonstra que
a Região Sudeste é a maior produtora de açúcar, evidenciando a alta produ-
tividade das usinas dessa região, que produzem, em média, duas vezes mais
que as da Região Nordeste, a segunda maior produtora de açúcar do Brasil.
O mapa também aponta a importância da produção de açúcar cristal e açúcar
VHP, os dois tipos que vêm crescendo nos últimos anos.
Na instalação de um canavial, diversos fatores são observados: escolha do
terreno, preparo do solo, adubação, plantio, tratos culturais, controle de pragas
e doenças, adubação de cobertura, colheita e cultivo de soqueiras, para que as
variedades a serem plantadas sejam distribuídas de acordo com sua maior ou
menor precocidade de maturação, obedecendo o ciclo de duração da cultura
e a fertilidade do solo escolhido.
Pela composição tecnológica da cana-de-açúcar, obtendo-se fibra (matéria
seca da cana, insolúvel em água, de 8 a 14 g/100g) e caldo (água e sólidos nela
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dissolvidos, de 86 a 92 g/100g), muitos fenônemos influenciam na extração do


açúcar e nas operações industriais, como a clarificação do caldo e cristalização
da sacarose. Contudo a qualidade da matéria-prima é medida pelo seu teor em
sacarose, que depende da maturação da cana, e pelo seu estado fitossanitário,
que influi na riqueza em açúcar (LIMA, 2010).
Segundo Salinas (2002), a cana é cortada e enviada aos engenhos em até
48h, para que haja um aproveitamento satisfatório antes que seja iniciado o
processo natural de inversão da sacarose e, consequentemente, a perda de
peso da matéria-prima. Nesse processo ocorre a conversão parcial do talo de
sacarose por ação enzimática, resultando no açúcar invertido (hidrólise da
sacarose e transformação em glicose e frutose). O caldo da cana extraído nas
moendas da indústria é bombeado para a fábrica de açúcar, passando pelas
seguintes etapas de produção:

1. Moagem: começa no trapiche, constituído por três grandes cilindros


superaquecidos que lhe subtraem 75% do peso, extraindo dele um líquido
escuro, denominado de garapa. Além do conteúdo de sacarose, tem
glicose e frutose (1%), ácidos orgânicos (2%), um pouco de proteínas,
minerais, grande quantidade de pigmentos e enzimas que, não obstante
a extração a quente, ainda mantêm certo grau de atividade. O restante
do resíduo chama-se de bagaço, que é a porção vegetal não extraível,
que serve atualmente para fabricação do papel, papelão ou fibra em
lâmina para paredes.
2. Tratamento do caldo (garapa): processo que promove a retirada de todas
as impurezas solúveis e insolúveis do caldo, como areia, bagacilho,
argila, e possibilita isolar a maior quantidade de sacarose purificada.
Ocorre por intermédio dos processos de aquecimento, tratamento
químico, decantação e peneiramento, com a adição das substâncias
descritas abaixo.
■ Sulforização — procede-se à adição de SO2 com o objetivo de produ-
zir inibição de enzimas hidrolíticas e certo grau de despigmentação.
■ Clarificação — adiciona-se hidróxido de cálcio (massa de cal aque-
cida), que neutraliza a acidez e precipita proteínas que se combinam
com o SO2, produzindo-se sal insolúvel (sulfito de cálcio), que é
subtraído do meio, e resulta desse filtro um líquido muito mais claro.
3. Evaporação — após o tratamento, obtém-se um caldo de cana transpa-
rente, de cor levemente amarelada, que contém basicamente água, sais
minerais e açúcares. A finalidade da evaporação é a retirada de pelo
menos 75% da água presente nesse caldo clarificado para transformá-
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-lo em um xarope concentrado, com aproximadamente 65° Brix (%


de sólidos solúveis). Paulatinamente o processo inicia-se por meio de
evaporadores colocados em série, onde cada um deles tem pressão ne-
gativa mais baixa que o anterior, de maneira que a passagem da solução
de açúcares, ao tornar-se muito densa, não eleve demasiadamente a
temperatura, para evitar a caramelização.
4. Cozimento — essa etapa visa a cristalização e recuperação de 80% a
85% da sacarose presente no xarope. O sistema utilizado transforma o
xarope em massa que, posteriormente, será centrifugada.
5. Centrifugação — após o cozimento, a massa passa por um processo de
separação física (centrifugação). A fase cristalizada para de evaporar
a pressão e temperaturas muito baixas, e obtém-se o açúcar branco. Já
na fase aquosa, submete-se novamente à refinação, prévia à diluição.
Descolore-se, o processo repete-se até obter o açúcar de primeira, e
outra fração, que se torna antieconômico, continua refinando. Resultam,
então, os açúcares de segunda e terceira qualidade (claro e escuro,
respectivamente), cujos melaços servem como matéria-prima para
obtenção de álcool etílico mediante a fermentação; porém, são vendidos
para consumo humano como melado de cana ou servem para confeitos
ou adição em forragens.
6. Secagem — após a centrifugação, o açúcar é encaminhado aos secadores
para a secagem e, posteriormente, peneirado. Na sequência, é envasado
em big-bags de 1.200 kg e armazenado para comercialização.

Conforme Prestes (2017) e Salinas (2002), a partir da cana-de-açúcar são


produzidos os seguintes tipos de açúcar:

Açúcar demerara: apresenta-se escuro, bruto ou mascavado; é parcialmente


solúvel em água, com não menos de 85% de sacarose e 4% de cinzas. Conhecido
por ser uma das formas mais caras dos açúcares extraídos da cana, o demerara
é um dos tipos de açúcar mais utilizados para fazer doces sofisticados. De sabor
mais ameno que o mascavo, o ingrediente passa pelo processo de purificação e
refinamento, porém, não leva aditivos químicos e, portanto, mantém os teores
minerais da cana-de-açúcar.

Açúcar mascavo: o açúcar mascavo é o açúcar bruto, escuro e úmido, extraído


depois do cozimento do caldo de cana. Como o açúcar mascavo não passa pela
etapa de refinamento, ele conserva o cálcio, o ferro e os sais minerais. Mas seu
gosto, semelhante ao do caldo de cana, desagrada alguns consumidores. Só o
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fato de ele não ter recebido o tratamento químico que os cristais brancos rece-
beram já é motivo suficiente para investir na substituição; 5 g tem 20 calorias.

Melado de cana: é a forma líquida extraída direto da cana-de açúcar, que


tem um poder de adoçar muito forte. Conserva todos nutrientes, como ferro,
cálcio, selênio, manganês e o cobre, e é indicado para quem tem imunidade
baixa ou anemia, para evitar o excesso de coagulação e para dar muita energia
para os músculos.

Açúcar cristal: tem como característica os cristais grandes, transparentes


ou levemente amarelados e possui praticamente as mesmas propriedades do
açúcar refinado. Existe também o açúcar cristal colorido, que contém corantes
alimentícios. É perfeito para preparar receitas e adoçar líquidos e para uso
decorativo em pães, docinhos e biscoitos.

Açúcar de confeiteiro: também conhecido como o glaçúcar, o açúcar de


confeiteiro é ideal para o preparo de chantilly, coberturas e glacês mais homo-
gêneos, pois possui grãos superfinos que permitem uma mistura mais eficaz,
mesmo a frio. No processo de fabricação, o refinamento é sofisticado e inclui
a adição de amido para evitar que os microcristais se juntem novamente.

Açúcar refinado: entre os tipos de açúcar, este é o mais utilizado no comér-


cio, denominado de açúcar branco refinado ou amorfo. É aquele com grau
de polarização de 99,9°S (mínimo); açúcar invertido 0,02%; cinzas 0,02%;
SO2 (dióxido de enxofre) a 2 mg/kg (máximo). Sua fórmula é composta por
grãos finos e irregulares que são fáceis de serem dissolvidos e misturados.
No processo de fabricação, são adicionados produtos químicos para que ele
fique branco e saboroso. Porém, ocorre a perda de vitaminas e sais minerais
através do refinamento. Diferenciam-se, segundo o alto grau de refinação,
mais dois tipos de açúcar: a) açúcar branco de primeira qualidade: conhecido
como açúcar impalpável, moído fino, que pode ter antiaglutinantes, até 3% de
amido ou 1,5% de aditivos como estereato de magnésio, carbonato de magnésio,
fosfato tricálcico, trissilicato de magnésio, silicato de cálcio, sódio e alumínio,
silicato de cálcio e gel de silício desidratado. Possuem polarização de 99,5°S
(mínimo); açúcar invertido 0,04%, cinzas 0,04%, SO2 20 mg/kg (máximo);
b) açúcar branco de segunda qualidade: polarização 99,5°S (mínimo), açúcar
invertido 0,10%, cinzas 0,10%, SO2 70 mg/kg (máximo). As formas de apre-
sentação podem ser em quadradinhos, pilão ou pilé, moído ou granulado. De
acordo com Instituto Nacional de Metrologia (INMETRO) (BRASIL, 2012),
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as análises de conformidade são realizadas no açúcar refinado, quanto à


seleção dos produtos, priorizando aqueles de consumo intensivo e extensivo
pela sociedade e que estejam relacionados a questões que envolvam a saúde
da população. O açúcar refinado é classificado em quatro diferentes tipos,
em função, principalmente, do teor de sacarose e da cor que o produto final
apresenta (amorfo de primeira; amorfo de segunda; granulado; extra e especial
ou superior). Dentre os critérios de análise, estão:

1. Teor de sacarose, que verifica se a classificação do açúcar indicada


pelo fabricante no rótulo principal da embalagem está de acordo com
a composição determinada pelo ensaio, ou seja, verifica a pureza do
produto, que está relacionada a sua capacidade de adoçar.
2. Resíduo mineral fixo ou teor de cinzas, verifica o teor de impurezas
(terra, areia, etc.) existentes na composição do produto, que, geralmente,
são provenientes da colheita da cana-de-açúcar.
3. Determinação do índice de cor CUMSA (Comissão Internacional para
Métodos Uniformes de Análise de Açúcar, do inglês International Com-
mission for Uniform Methods of Sugar Analysis). Esse ensaio descreve
os critérios para verificar se a coloração do produto está de acordo com
a classificação utilizada pelo fabricante no rótulo do produto. Portanto,
quanto mais baixo esse índice, mais claro, ou mais branco, é o açúcar. À
medida que esse índice aumenta, o açúcar vai adquirindo uma coloração
mais escura. A coloração do açúcar está diretamente relacionada: ao
número de partículas carbonizadas presentes, o que representa falha
na higienização do equipamento que entra em contato com o produto,
uma vez que tais partículas são arrastadas durante o processo de fa-
bricação; ao tamanho dessas partículas, ou seja, quanto menores as
partículas, mais branco é o açúcar e vice-versa. Uma coloração mais
escura representa ainda uma questão visual que pode influenciar na
decisão de compra do consumidor, ao optar por um açúcar mais branco.
4. Teor de dióxido de enxofre: verifica a existência de resíduos de dióxido
de enxofre (SO2) no açúcar refinado. O dióxido de enxofre é adicionado
durante a etapa de clarificação do açúcar. Esse método é utilizado para
o branqueamento do melado da cana, de coloração escura. Entretanto,
esse aditivo deve ser eliminado, dentro de limites toleráveis, até o final
do processo, pois traços residuais de enxofre podem ocasionar alterações
sensoriais do produto, principalmente de sabor e odor, além de reações
alérgicas e dores de cabeça, no caso de concentrações maiores.
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5. Teor de umidade: verifica a quantidade de água presente no produto.


A incidência elevada de água em alguns gêneros alimentícios significa
que eles podem trazer riscos para a saúde do consumidor, por criarem
ambientes propícios para a proliferação de microrganismos. Entretanto,
o açúcar, dada sua baixíssima atividade de água (Aw), é classificado
como produto estável microbiologicamente. O inconveniente decorrente
da presença de água nesse produto é o empedramento (formação de
pedras) que ele sofre, ocasionado pela aglomeração dos cristais, o que
dificulta o seu uso.
6. Teor de ferro: verifica a presença desse elemento na composição do
produto. O ferro é considerado como contaminante natural de produtos
de origem vegetal, dada a sua presença no solo onde a matéria-prima
é plantada. Entretanto, sua presença também pode estar relacionada à
má conservação dos equipamentos (ferrugem), podendo contaminar
o produto através do contato, seja durante a colheita, seja durante o
processamento da cana. A contaminação por ferro em grandes con-
centrações é facilmente perceptível, pois altera o sabor do produto.
Além disso, pode causar reações gástricas como, por exemplo, acidez
estomacal. Além dessas análises, são realizadas pelo INMETRO aná-
lises da conformidade relacionada às características microbiológicas,
microscópicas e sensoriais.

Açúcar orgânico: muito parecido com o mascavo, o açúcar orgânico não utiliza
produtos agrotóxicos em seu plantio e cultivo, nem componentes químicos
artificiais no processo de industrialização. Além disso, o açúcar orgânico não é
refinado, o que lhe confere grãos mais grossos e cor mais escura. Portanto, seus
benefícios estão relacionados à ausência de aditivos químicos e à preservação
dos sais minerais e não aos valores calórico e nutricional.

Açúcar invertido: a aparência do açúcar invertido é igual à de um xarope, que


é exatamente o que ele é. Em uma reação da sacarose, o açúcar tradicional,
com água e calor, a molécula se quebra e se divide em glicose e frutose. É
usado comumente para fazer balas e biscoitos, pois impede a cristalização e
funciona como um conservante.

Açúcar líquido: esse tipo de açúcar é bastante usado em indústrias alimentícias


para o preparo de bebidas gasosas, doces e balas.
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Açúcar light: é uma mistura de açúcar refinado com adoçantes artificiais, como
o aspartame, que adoça quatro vezes mais que as versões naturais. Portanto,
embora não seja isento de gorduras e calorias, o açúcar light adoça mais e é
utilizado em menor quantidade, ação que resulta em ingestão de menos calorias.

Açúcar-cande: tem sacarose em quase sua totalidade e se apresenta em cristais


volumosos com 99,9% de pureza.

Açúcar de fantasia: utilizado para decoração na confeitaria, podendo ser


acrescido de corantes permitidos.
Há outros tipos de açúcares oriundos de diferentes matérias-primas além
da cana-de-açúcar, importantes a saber:

Açúcar de coco: é um alimento de baixa caloria, e uma das suas principais ca-
racterísticas é a sua origem 100% natural, ou seja, ele não contém conservantes
nem qualquer desses componentes que prejudicam a saúde. É muito nutritivo,
sendo fonte de minerais como zinco, potássio, magnésio, ferro e vitaminas
do complexo B. Deve-se apenas observar que ele não deve ser consumido em
excesso; mesmo um produto natural, se consumido em excesso pode trazer
prejuízos ao organismo; contudo, em 5 g tem 20 calorias.

Frutose: a frutose também é um tipo de adoçante natural, extraído de frutas


ou do milho. De sabor muito mais doce, o ingrediente carrega menores valores
nutricionais e é utilizado na produção de doces industrializados.

Xarope de glicose: o principal uso da glicose na culinária é impedir que o


açúcar forme uma crosta cristalizada em volta do doce. Isso porque ela tem
um ponto de congelamento baixo, o que ajuda a não deixar brigadeiros duros,
por exemplo. Fácil de achar, também aparece como xarope de milho.

Maltodextrina: é o resultado da hidrólise do amido ou da fécula, normalmente


apresentando-se comercialmente na forma de pó branco, composto por uma
mistura de vários oligômeros da glicose, compostos por 5 a 10 unidades. Essas
moléculas são metabolizadas de forma rápida no organismo humano, contri-
buindo para um aumento exponencial da insulina na corrente sanguínea. Ela
é rapidamente absorvida e eleva a glicose no sangue de forma extremamente
rápida; é usada como suplemento por fisiculturistas que desejam um grande
pico de insulina para aumentar o anabolismo.
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Beterraba açucareira: sua safra é mais curta que a da cana-de-açúcar, a


purificação de seu caldo é mais difícil que o de cana, porém a extração de caldo
de beterrada é mais simplificado que a de tuberosas. A beterraba não oferece
resíduo celulósico combustível e a industrialização de seu açúcar depende do
uso de combustíveis diversos para energia motora e calorífica. Um hectare
de cana produz mais sacarose que um hectare de beterraba com menor custo,
pois a mão-de-obra é mais barata (LIMA, 2010).

De acordo com a Resolução 271/2005, da Agência Nacional de Vigilância


Sanitária (ANVISA), a rapadura constitui “o produto sólido obtido pela con-
centração do caldo de cana-de-açúcar (Saccharum off icinarum L.), podendo
ser adicionado de outro(s) ingrediente(s), desde que não descaracterize(m) o
produto” (BRASIL, 2005, documento on-line). A mesma resolução define
melado como o produto obtido da concentração do caldo de cana ou da rapadura
derretida, diferente do melaço, que é um subproduto da fabricação de açúcar.
A rapadura, o melado e o açúcar mascavo contêm alto valor energético, além
de minerais, e foram alimentos consumidos inicialmente pela população mais
carente, mas que depois se disseminaram pelos demais estratos da sociedade
brasileira. No entanto, o incremento tecnológico do processo produtivo do
açúcar cristal e refinado e os incentivos, como isenção de impostos para
fabricação desses açúcares, reduziram os custos da produção, ampliando o
acesso da população a esses produtos, em detrimento do consumo de açúcar
mascavo, produzido em menor escala. Nas últimas décadas, com a crescente
procura por produtos menos processados pela indústria, considerados mais
naturais, a rapadura, o açúcar mascavo e o melado encontraram um nicho no
mercado. O melado e a rapadura podem ser consumidos puros ou misturados
a outros alimentos, bem como no preparo de outras iguarias. Por seu conteúdo
energético e mineral, o melado e a rapadura foram incluídos nas cestas básicas
e na merenda escolar de alguns estados. A fabricação de rapadura, melado e
açúcares brutos ocorre, majoritariamente, nas pequenas propriedades rurais,
com o uso de equipamentos simples e mão-de-obra familiar. O processo de
fabricação dos três produtos é essencialmente o mesmo, baseado no cozimento
do caldo extraído a partir da moagem da cana; o que difere entre cada um é o
ponto do cozimento (Figura 1). Esses produtos são alternativas rentáveis para
os pequenos produtores rurais. Ao se adequar às normas oficiais de fabricação e
higiene, esses produtores podem entrar no mercado local e regional — incluindo
as empresas de transporte, sobretudo aéreo —, além de firmar parcerias com
governos para compor cestas básicas e merenda escolar (CHAVES et al., 2003
apud BRASIL, 2017).
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Cana-de-açúcar

Carregamento/transporte

Descarregamento

Moagem Bagaço

Filtração e decantação

Preparo e limpeza do caldo

Concentração e cozimento

Ponto para melado Ponto para açúcar mascavo Ponto para rapadura

Resfriamento Resfriamento e bateção Resfriamento, moldagem


e enformagem

Envase e embalagem Moagem e peneiragem Embalagem

Estocagem Embalagem Acondicionamento

Estocagem Estocagem

Figura 1. Fluxograma da elaboração de açúcar mascavo, melado e rapadura.


Fonte: Chaves et al. (2003 apud BRASIL, 2017).

No link a seguir, um site sobre as utilizações do açúcar invertido.

https://goo.gl/uDyHUF
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Propriedades dos açúcares e suas reações


Segundo Pereda (2005) e Oetterer (2002), as propriedades físico-químicas e
sensoriais dos açúcares têm relevante contribuição na tecnologia dos alimentos.
As propriedades relacionadas a seguir ocorrem com os monossacarídeos:

Higroscopicidade: é a capacidade de absorção de água, que depende de


outros fatores, como sua estrutura, a mistura de isômeros e sua pureza, pois
está relacionada com a presença de grupos hidroxila, que são capazes de ligar
a água às pontes de hidrogênio. Conforme a maior ou menor solubilidade do
açúcar em água, ele pode ser escolhido para um determinado tipo de alimento
industrializado. Todos açúcares são solúveis em água, há variação de 30 a
80% na solubilidade. Os açúcares impuros e os xaropes absorvem mais água
em velocidade maior do que os açúcares puros, já que as impuresas dificultam
o estabelecimento de reações entre os açúcares e deixam livres os grupos
hidroxila, que têm facilidade de unirem-se com as moléculas de água. Então,
essa propriedade é favorável quando contribui para a manutenção da umidade
de alguns alimentos, como produtos de padaria e confeitaria, visto que pode
formar-se uma camada superficial que limita a perda de água do alimento. E
essa propriedade é desfavorável no caso de produtos granulados ou em pó,
nos quais a entrada de água leva à formação de aglomerados que limitam a
posterior solubilidade dos açúcares. Essa capacidade do açúcar, na forma
cristalina, de absorver umidade da atmosfera forma torrões que às vezes são
tão duros que prejudicam a sua utilização. Propriedade não desejável, ocorre
com armazenamento mal feito, gerando o empedramento. Em atmosferas
saturadas de umidade, os açúcares tornam-se facilmente hidratados; convém
sempre secá-los em estufa antes de usá-los. Os açúcares são mais higroscópicos
quanto menor for o tamanho dos cristais, devido à maior superfície de contato.
O açúcar refinado é mais fácil de hidratar do que o açúcar cristal. Açúcar
exposto a uma determinada umidade relativa (UR) pode perder ou ganhar
umidade em função dessa UR. Os mecanismos que governam o fenômeno
são: a pressão parcial de vapor da água no açúcar e a pressão parcial de vapor
da água na atmosfera. Se a segunda for maior que a primeira, o açúcar ganha
umidade. Não exceder 60% de UR à temperatura de até 38°C em sacarose
armazenada. Embalagens de papel duplo foram substituídas pelas de polietileno
na indústria, para evitar a hidratação. A umidade permitida no açúcar é de
0,15, mas como ele é higroscópico, pode se alterar com aumento da Aw e com
o desenvolvimento microbiano.
12 Bioquímica e tecnologia de açúcares

Mutarrotação: na preparação de uma solução aquosa de açúcar, há a trans-


formação de isômeros em outros, mediante a mudança de rotação específica,
até atingir um valor final que corresponda ao momento em que as formas
isoméricas encontram-se em equilíbrio. Essa mudança das formas isoméricas
em outras transcorre com facilidade por polarimetria, e os valores atingidos
são característicos para cada açúcar em condições determinadas, pois os
ácidos e bases atuam como catalisadores, sendo as bases as mais eficazes, pois
aumentam a velocidade da reação. A temperatura também influi no processo,
ampliando a mutarrotação de 1,5 a 3 vezes para cada 10°C de aumento, que
dependendo do número de isômeros, podendo ser classificada como mutar-
rotação simples ou complexa.

Estado vítreo: é o estado amorfo no qual a viscosidade é tão elevada que


impede a cristalização do açúcar, num estado pouco estável que pode ser
alcançado por congelamento, concentração rápida ou desidratação de deter-
minada solução, ou ainda pela fusão térmica que certos açúcares cristalinos
têm, seguida de resfriamento brusco, o que impede que as moléculas se re-
organizem e formem cristais. Os açúcares nesse estado são higroscópicos, o
que contribui para sua instabilidade, já que, ao reter a água, há aumento de
sua mobilidade e da velocidade de cristalização. Os caramelos, por exemplo,
são soluções sobressaturadas de sacarose, cuja cristalização é impedida pela
elevada viscosidade e rigidez na massa e pela presença de outros açúcares,
como a glucose e xaropes de glicose.

Cristalização: é a capacidade de um açúcar formar cristais, resfriando solu-


ções saturadas e imobilizando e reorganizando as moléculas. Os fatores que
mais influenciam na cristalização são: grau de saturação da solução inicial,
temperatura, natureza da superfície do cristal e natureza e concentração das
impurezas presentes na solução, que podem ser absorvidas pela superfície do
cristal, reduzindo assim a velocidade de crescimento. O tempo de cristalização
influencia no tamanho dos cristais, pois, quanto mais lento é o resfriamento,
maior é o tamanho de tais cristais, o que, em certos alimentos, não é desejável
ao paladar.

Inversão dos açúcares: a inversão dos açúcares (sacarose) consiste na hidrólise


de sua molécula, tanto por via enzimática (invertase) quanto por procedimentos
físico-químicos (ácido clorídrico à temperature elevada) ou a utilização de
resinas sulfônicas. O produto obtido é denominado de açúcar invertido, que
encontra-se naturalmente no mel, referindo-se então à mudança que se observa
Bioquímica e tecnologia de açúcares 13

no poder rotatório da solução quando ocorre a hidrólise. A rotação específica de


uma solução de sacarose é de +66,5°, enquanto a do açúcar invertido é de 20°.
Esse fenômeno provoca o aumento do sabor doce e da solubilidade do açúcar.

Poder edulcorante: essa propriedade não se deve à concentração de açúcar


e, sim, mensura-se a intensidade do sabor doce através da determinação
do patamar de percepção do sabor ou por comparação com a substância de
referência, como a sacarose, que tem sabor agradável em altas concentrações.
A intensidade e qualidade do sabor dependem da temperatura, pH e da pre-
sença de outras substâncias que possam interferir nos receptores do sabor.
Segundo Pereda (2005), essa propriedade baseia-se na hipótese formulada por
Schallenberger e Acree, em 1967, que ocorre com a existência de um sistema
doador/receptor de prótons no alimento (sistema AHs/Bs), que pode entrar
em contato com algum sistema complementar do receptor, como as papilas
gustativas, mediante o estabelecimento de pontes de hidrogênio. Incluiu-se a
presença de grupos hidrófobos (X) nos açúcares (metileno, metila e fenila),
que são atraídos por grupos similares dispostos no receptor gustativo. A
ordenação das unidades ativas (AH, B e X) deve estar situada de tal maneira
que as três entrem em contato com o centro receptor, fazendo a base dessa
teoria. A doçura relativa é uma propriedade intrínseca e subjetiva. Em análise
sensorial, treina-se os degustadores segundo a capacidade de percepção e
elabora-se uma escala. Concentrações mínimas a serem detectadas: sacarose
0,01 M (0,3%), glicose 0,037 M (0,07%) e frutose 0,012 M (0,2%). A sacarose
usada para adoçar os alimentos recebe o grau 1 ou 100, nas escalas elaboradas
subjetivamente, por análise sensorial. O excesso de açúcar nos alimentos pode
ser nauseante. Os açúcares são aditivos alimentares (edulcorantes) usados
indiscriminadamente, na maioria das vezes sem necessidade, mascarando o
gosto natural dos alimentos, como ocorre com o leite e as frutas. A ingestão de
açúcar leva ao aumento do consumo de calorias e sacia a fome, porém, impede
o consumo de outros nutrientes. O excesso de ingestão de açúcar acelera o
metabolismo quanto à produção de insulina e provoca hipoglicemia aparente
(hiperglicemia verdadeira).

Aumento da velocidade de fermentação: na panificação, o açúcar pode ser


utilizado para aumentar a velocidade de fermentação, à base de 6 a 8% do
total dos demais componentes. Isso ocorre no preparo de pães de forma. No
pão comum, o fermento utiliza o açúcar proveniente da hidrólise do amido
da farinha por ação da amilase presente na farinha. No entanto, o excesso de
14 Bioquímica e tecnologia de açúcares

açúcar no pão (até 22%) pode retardar a fermentação por efeito de osmose.
Aí, é necessário adicionar mais fermento.

Pressão osmótica (PO) e Aw: essa propriedade está relacionada com o açúcar
em solução. Se adicionarmos açúcar em grande quantidade, podemos aumen-
tar o tempo de conservação de um alimento porque há aumento da pressão
osmótica (PO) e não sobrará água disponível para crescimento microbiano. O
açúcar tem ação desidratante, para que a pectina das geleias possa coalescer
(aglutinar) e geleificar. Neste exemplo, o açúcar em solução tem uma PO
intrínseca. PO é a pressão que pode ser aplicada a um sistema para prevenir a
difusão de água. Quanto maior a PO, menor a Aw e menor água disponível ao
microrganismo. Para uso como agente desidratante em frutas, pode-se verificar
qual tipo de açúcar deve ser utilizado. O açúcar, atuando como preservativo,
pode aumentar a PO a um nível de não reprodução microbiana por efeito de
plasmólise das células. Nas concentrações de 1 a 10% já influi no crescimento
de microrganismos. A 50%, inibe o crescimento da maioria das leveduras.
A 65 e 80%, inibe bactérias e fungos, respectivamente. O efeito bactericida
para Staphylococcus, por exemplo, ocorre ao se utilizar 35 a 45% de dextrose
ou 50 a 60% de sacarose. Essas concentrações levam a obtenção de diferentes
Aw. Os microrganismos crescem em Aw diferentes. Assim Clostridium e
Escherichia coli precisam alta Aw, 0,95. Staphylococcus, 0,86. Leveduras
osmofílicas ou açúcar tolerantes, 0,62 a 0,65, portanto podem crescer mesmo
em alta concentração de açúcar, como no mel, por exemplo. Microrganismos
do gênero Leuconostoc são tolerantes a açúcar. Na indústria de bebidas car-
bonatadas, refrescos e refrigerantes, o uso de solução de sacarose deve ser
feito após filtração, para diminuir o grau de contaminantes. Deve-se evitar
as leveduras e as bactérias (Bacillus) que poderão levar à formação do rope
(goma) dos refrigerantes. A armazenagem é feita a 66,5 — 68,00 Brix e com
ajuste de pH para acidez. Se mais concentrada, a armazenagem tem menos
perigo, mas pode supersaturar e cristalizar (limite). O açúcar mascavo deve
ser evitado, não só porque escurece, mas porque as películas de xarope não
filtradas aderidas aos cristais contém contaminantes.
Bioquímica e tecnologia de açúcares 15

Para saber mais, assista alguns vídeos sobre os processos de fabricação do açúcar de
coco, do açúcar mascavo e da rapadura. Leia também um artigo científico sobre a
colheita da cana-de-açúcar.
Vídeo sobre o processo artesanal do açúcar de coco:
https://goo.gl/7MibdY
Video sobre o processo do açúcar mascavo e da rapadura:
https://goo.gl/uMm1BJ
Artigo científico:
https://goo.gl/XqBUwY

Aplicações tecnológicas de açúcares


De acordo com Cooper (2012), Nursten (2005) e Patterson et al. (2012), sobre
a origem dos açúcares: estão naturalmente presentes nas frutas e hortícolas
(sacarose, glicose e frutose), no mel (frutose e glicose), no leite e nos produtos
derivados (lactose) e, em menor extensão,nos cereais (maltose). O principal
açúcar utilizado é o açúcar de mesa (sacarose), que é composto por duas uni-
dades — glicose e frutose. O açúcar branco, após o processamento, é isolado,
não sofrendo alterações químicas nem branqueamento.
As aplicações tecnológicas são descritas abaixo:
O açúcar cristalino branco e o castanho são utilizados como edulcorantes,
tanto em uso doméstico como pela indústria alimentar. Os açúcares em pó são
utilizados nos produtos de confeitaria. Os açúcares em xarope são usados na
produção de bebidas ou como base de molhos de fruta, toppings e xaropes
aromatizados. Os açúcares são igualmente usados para contrabalançar os
sabores ácidos e amargos, por exemplo, nos molhos de tomate, na maionese
ou em xaropes medicinais. Quanto à textura, ao volume e à umidade, os
açúcares desempenham um importante papel na definição do volume e da
textura dos alimentos, contribuindo, por exemplo, para dar volume aos bolos
e aos biscoitos. A combinação do açúcar com um agente gelificante (pectina)
é responsável pela textura gelatinosa das compotas. Nos produtos de padaria
16 Bioquímica e tecnologia de açúcares

e confeitaria, o açúcar aumenta a temperatura de gelatinização do amido,


aprisiona as bolhas de ar e confere uma textura leve aos bolos.
Também constitui a base para a fermentação das leveduras (fermentação das
leveduras do pão). O açúcar é humectante, ou seja, ligase à água, propriedade
que é importante para a textura e preservação dos alimentos. O açúcar reduz
igualmente a temperatura de congelação, importante para o fabrico de gelados
mais macios e aumenta a temperatura de ebulição, propriedade importante
na confecção de doces.
Segundo Pereda (2005), relativo a cor, os açúcares são responsáveis pelo
desenvolvimento da coloração acastanhada de muitos produtos alimentares,
através de dois processos que acarretam a transformação por ação do calor:
1. Reação de Maillard (escurecimento não enzimático); e 2. Caramelização.
A denominação de escurecimento não-enzimático ou reação de Maillard
engloba uma série de reações complexas e sob determinadas condições, como
pH, Aw, presença de íons metálicos, natureza do açúcar, tipo de aminoácido
e temperatura. Os açúcares redutores reagem com as proteínas e e produzem
pigmentos de cor pardo-escura e modificações no odor e sabor dos alimentos.
Essas reações estão presentes nas operações de cocção, pasteurização, esteri-
lização e desidratação, e podem ser desejáveis, como em assados, tostados ou
frituras, mas indesejáveis como cores escuras que se desenvolvem durante o
armazenamento. O desenvolvimento da reação ocorre a partir dos substratos,
que são de grupos carbonila (açúcares redutores, como a D-glicose) e outros
compostos, como ácido ascórbico, vitamin K e ortoferóis. A outra parte da
reação cabe a compostos como os aminoácidos básicos constituintes das
proteínas, cujo grupo amina reage com o grupo carbonila, e a velocidade da
reação, dependendo daquelas variáveis citadas, justifica que cada alimento
tenha características diferenciadas, implicando ainda nas seguintes sucessões:
condensação de Maillard, degradação das cetonas ou degradação de Streck.
No processo de caramelização, os açúcares quebram por ação do calor,
na ausência de compostos nitrogenados, favorecida pela presença de ácidos
e de certos sais, produzindo novas moléculas que fornecem cor e sabor. A
termólise provoca reações de desidratação dos açúcares com a introdução de
ligações duplas e a formação de anéis insaturados. Por conseguinte, essas
ligações duplas absorvem luz e provocam o aparecimento da cor, enquanto
os anéis se condensam uns com os outros para produzir polímeros com cor e
aroma. Esses polímeros contêm grupos hidroxila de acidez variável, carbonilas,
carboxilas, enólicos e fenólicos, e a velocidade com que se formam se inten-
sifica conforme aumenta o pH e a temperatura. Os pigmentos que aparecem
durante o processo são de três tipos: a) caramelo de cor parda: aquecimento
Bioquímica e tecnologia de açúcares 17

da solução de sacarose com bissulfito de amônio, utilizado em bebidas tipo


cola, em bebidas ácidas e em xaropes. Essas soluções são ácidas, com pH
de 2 a 4,5, e contêm partículas coloidais com cargas negativas; b) caramelo
avermelhado: aquecimento da glicose em presença de sais de amônio, quando
ocorre em soluções aquosas, essas apresentam pH entre 4,2 e 4,8 e contêm
partículas coloidais positivas. Essa coloração é aproveitada em produtos de
confeitaria e xaropes; c) caramelo de cor pardo-avermelhada: é obtido ao se
aquecer açúcar em sais de amônio, constituído por partículas coloidais com
cargas negativas, tem pH de 3 a 4 e pode dar cor ao malte na elaboração da
cerveja e de outras bebidas alcoólicas.
A caramelização da sacarose requer temperaturas em torno de 200°C,
distinguindo três fases — a primeira são 35 minutos de aquecimento, então
perde-se uma molécula de água por uma de sacarose; na segunda é o aque-
cimento adicional de 55 minutos, observando-se perda de 8% do peso e o
aparecimento do pigmento caramelano, que é solúvel em água e de sabor
amargo; o terceiro ocorre com aquecimento por mais 55 minutos, aparecendo
o pigmento solúvel em água (carameleno). Após essas fases, deve-se evitar o
sabor muito amargo da formação da humina, de peso molecular muito alto,
desagradável ao paladar.
Sobre a preservação dos alimentos, os açúcares são igualmente importantes
para conservar compotas, marmeladas, sobremesas doces, frutos cristalizados
e outras guloseimas. O elevado conteúdo em açúcar previne o crescimento
microbiano e estende o prazo de validade desses produtos alimentares. Para
aplicação em bebidas alcoólicas, as leveduras convertem o açúcar em álcool.
Os açúcares das uvas, cereais, mel e frutas são usados na produção de vinho,
cerveja e whisky, hidromel e cidra.
Na redução do teor de açúcar dos alimentos, atendendo à elevada prevalência
de excesso de peso e obesidade, estão a ser desenvolvidos esforços no sentido
da redução da quantidade de calorias consumidas pelos indivíduos, incluindo a
redução da densidade energética (calorias por grama) dos alimentos processa-
dos, diminuindo a adição de gordura e hidratos de carbono, incluindo açúcares.
As empresas de alimentos e bebidas respondem às políticas de saúde pública
através da redução do teor energético dos alimentos que produzem, sempre
que tecnologicamente possível. A reformulação dos produtos, no entanto, nem
sempre é simples. Os açúcares são responsáveis por muitas das propriedades
dos alimentos e, por isso, não podem ser substituídos por um único ingrediente.
A remoção ou substituição do açúcar vai alterar as características do alimento,
o sabor, a textura e a aparência. De forma a compensar, poderá ser necessário
alterar toda a formulação da receita, o que resultará num produto diferente. Ao
18 Bioquímica e tecnologia de açúcares

mesmo tempo, a reformulação tem que respeitar os gostos e as expectativas


do consumidor em face dos produtos. Por vezes, o ingrediente substituto do
açúcar pode fornecer as mesmas calorias. Contudo, açúcares desempenham
um importante papel na preservação dos alimentos e na extensão do tempo de
prateleira. Consequentemente, devem ser tomadas as devidas precauções quanto
à redução ou substituição do açúcar nos produtos alimentares, assegurandose
que se vai ao encontro das expectativas dos consumidores e que se mantém
a segurança alimentar.

Alimentos ricos em açúcar e seu impacto na saúde.

https://goo.gl/YmC26D

Índices de produção dos açúcares.

https://goo.gl/dPfAFg
Bioquímica e tecnologia de açúcares 19

ALCARDE, A. R. Extração. [2018?]. Disponível em: <http://www.agencia.cnptia.embrapa.


br/gestor/cana-de-acucar/arvore/CONTAG01_103_22122006154841.html>. Acesso em
27 out. 2018.
BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 271, de 22 de setem-
bro de 2005. Aprova o "REGULAMENTO TÉCNICO PARA AÇÚCARES E PRODUTOS PARA
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BRASIL. Instituto Nacional de Metrologia (INMETRO). Açúcar. 2012. Disponível em: <http://
www.inmetro.gov.br/consumidor/produtos/acucar.asp>. Acesso em 27 out. 2018.
COOPER, J. M. Product reformulation: can sugar be replaced in foods? International
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INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). A geografia da cana-de-
-açúcar: dinâmica territorial da produção agropecuária. Brasília, DF: IBGE, 2017. Disponível
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SALINAS, R. D. Alimentos e nutrição: introdução à bromatologia. 3. ed. Porto Alegre:
Editora Metha, 2002.

Leitura recomendada
ZACURA FILHO, G. Z.; PICCIRILLI, J. P. O processo de fabricação do açúcar e álcool: desde
a lavoura da cana até o produto acabado. São Paulo: Viena, 2012.
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