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1590/0103-166X2015000400019
Resumo
O estudo da excelência humana assume essencialmente dois enfoques, um deles acentuando as variáveis psicológicas
dos indivíduos e outro enfatizando as aquisições decorrentes da prática ou treino deliberado. Neste artigo procurou-
-se integrar tais estudos, propondo que o surgimento e a manutenção da excelência pressupõem uma constelação de
variáveis psicológicas que vão para além da alta capacidade intelectual. Mais concretamente, descreveu-se um conjunto
de variáveis cognitivas, motivacionais e de personalidade, assumidas como relevantes na excelência profissional em
diferentes áreas de desempenho e de conhecimento. No seio das variáveis cognitivas e, fazendo uma ponte com as
variáveis de personalidade, destaca-se o papel da criatividade para a excelência, reconhecendo a sua particular relevância
em algumas áreas de realização profissional.
Palavras-chave: Cognição; Criatividade; Excelência; Motivação; Personalidade.
Abstract
The study of human excellence can be described based on two main approaches focusing either on individuals’
psychological variables or on acquisitions by training or deliberate practice. The purpose of this study is to integrate
these models based on the assumption that the emergence and maintenance of excellence requires a constellation of
fundamental psychological variables that transcend intellectual capacity. More specifically, a set of cognitive, motivational,
and personality variables that are considered important for professional excellence in different levels of performance
and areas of knowledge were described. Among the cognitive variables and their association with personality variables,
it is worth mentioning the significant role of creativity in the pursuit of excellence, recognizing its relevance to specific
areas of professional performance.
Keywords: Cognition; Creativity; Excellence; Motivation; Personality.
EXCELÊNCIA PROFISSIONAL
As altas habilidades e talentos do ser huma- que nem sempre foram entendidas ou valorizadas
no sempre despertaram alguma curiosidade, mesmo como um aspecto positivo. Um livro muito bem
▼ ▼ ▼ ▼ ▼
1
Universidade do Minho, Instituto de Educação. Campus de Gualtar, 4715, Braga, Portugal. Correspondência para/Correspondence to:
L.S. ALMEIDA. E-mail: <leandro@ie.uminho.pt>.
2
Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Campinas, SP,
Brasil. 767
a felicidade e a qualidade de vida, o bem-estar se institui que o conceito se refere aos indivíduos
subjetivo e realização plena (Seligman, 2002). Trans- pertencentes aos 5% com desempenho mais ele-
pondo para a excelência, a investigação procura vado (critério estatístico). Se em várias modalidades
identificar os fatores e os processos que explicam a esportivas existem rankings internacionais que
emergência e a manutenção de um desempenho podem servir esse objetivo, também podendo-se
superior na área acadêmica e profissional (Ericsson, recorrer às medalhas conquistadas em campeonatos
2005; Monteiro, Castro, Almeida, & Cruz, 2009; do mundo ou nos Jogos Olímpicos, nas outras áreas
Renzulli, 2002; Zimmerman, 2002). a situação tende a não ser tão clara e os critérios
Tendo como foco deste artigo a excelência de definição da excelência assumem alguma ambi-
768 profissional, procurou-se sistematizar a investigação guidade. Por exemplo, se nas artes, música e litera-
necessárias, não são suficientes para explicar a exce- Variáveis cognitivas da excelência
lência, menos ainda quando esta está relacionada
Ainda que não sendo suficiente, a cognição
a algumas áreas da realização artística e esportiva,
é variável necessária da excelência. Mesmo quando
por exemplo.
se fala sobre talento motor ou excelência em áreas
Num dos modelos mais referenciados inter- do desporto e atividade física as habilidades cogni-
nacionalmente, Renzulli (1986; 2002) postula que tivas são requeridas. No entanto, importa entender
a sobredotação traduz a interseção de três variáveis essas variáveis cognitivas muito para além da capa-
(daí chamar-se a “teoria dos três anéis”): aptidão cidade intelectual (QI), incluindo então o conhe- 769
(2002) descreve um conjunto de processos autor- e executar bem (Araújo et al., 2011; Vallerand,
regulatórios, como planificação, monitorização e 2008). Esses níveis elevados de motivação intrínseca
avaliação, associados ao desempenho excelente. confundem-se a partir da adolescência com neces-
Vale acrescentar que esses processos estimulam sidades de autonomia, competência e afiliação
sentimentos ajustados de autoeficácia e de autoes- (Vallerand, 2008; 2010), emergindo então uma
tima, os quais reforçam a energia e paixão pela paixão ou dedicação extrema às aprendizagens e
aprendizagem e realização (Ericsson & Lehman, realização. Nestes casos, ao invés de uma paixão
1996). patológica decorrente de pressões externas introje-
No quadro das variáveis cognitivas as- tadas, fala-se de um sentimento harmônico inerente
770 sociadas à excelência, a criatividade assume lugar ao self (Deci & Ryan, 2000; Ryan & Deci, 2004).
mo trabalho muitas vezes, investindo uma grande problemas emocionais, ainda que estes ocorram em
quantidade de tempo e energia para alcançar o nível qualquer pessoa independentemente das suas altas
elevado de qualidade, o que, por vezes, os torna habilidades (Fleith, 2007). Na verdade, se existem
demasiado autocríticos e os leva a ter medo do relatos de pintores eminentes que tiveram proble-
fracasso (Alencar, 2007). Sendo uma característica mas mentais, tais como Van Gogh, existiram ainda
positiva e moderadora na excelência, importa tam- outros, como por exemplo Matisse e Picasso, ou
bém estarmos atentos a formas mais desestrutu- ainda eminentes cientistas, como Thomas Edison,
rantes da personalidade (perfeccionismo obsessivo- que não apresentavam distúrbios patológicos de 771
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EXCELÊNCIA PROFISSIONAL
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