Você está na página 1de 6

1

TEMA III: A INVASÃO COLONIALISTA DA ÁFRICA,


A SUA PARTILHA E OCUPAÇÃO

3.1. AS RIVALIDADES COLONIAIS E AS OCUPAÇÕES

3.1.1. Causas económicas, motivações políticas e ideológicas da expansão europeia


em África, a partir do último terço do século XIX

Desde o século XVI os negreiros europeus frequentavam as costas do continente africano


em busca de escravos destinados, essencialmente, às plantações e minas da América. Para
este tráfico bastavam as feitorias estabelecidas pelos europeus ao longo da costa africana.

«Os estrangeiros efectuavam as suas transacções à pressa e fugiam logo que possível ao
calor seco ou húmido e às febres de regiões consideradas como o túmulo dos homens
brancos» (Brunschwig, 1972:17)

Mas a atitude europeia em relação à África irá mudando paulatinamente e, no último


quartel do século XIX, a “questão africana” será a grande preocupação dos governos
europeus. Na base da viragem estiveram além de causas económicas, as determinantes,
motivações políticas e ideológicas que, no seu conjunto, levaram à rápida conquista da
África.

Causas económicas

A enorme acumulação de capitais (provenientes, essencialmente, do comércio triangular,


da colonização da América e do comércio de produtos orientais) favoreceu a rápida
industrialização da Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, tendo provocado
alterações nos modos de uso dos recursos naturais e, por conseguinte, na economia e na
sociedade.

A Inglaterra aboliu a escravatura em 1772 (a Revolução Industrial tornou desnecessário


o trabalho escravo) e aboliu o tráfico de escravos em 1807 (a perda das Treze Colónias
na América e o rápido desenvolvimento da indústria inglesa tornava necessário que os
Africanos passassem a desempenhar o papel de consumidores dos produtos
industrializados e fornecedores de matérias-primas baratas). A partir de 1830 as fragatas
britânicas passaram a percorrer as velhas rotas dos negreiros, montando guarda nos mares
em volta de África, não por razões humanitárias, mas porque a sua mecanizada indústria
já não se coadunava com o trabalho escravo.

Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012


2

Entretanto, nas primeiras décadas do século XIX, a América tinha deixado de ser, quase
inteiramente, um continente colonizado pela Europa e, nesta última, a generalização do
uso das máquinas (a vapor, de fiar, de tecer, etc.) provocou o desenvolvimento industrial
de vários países.

Na segunda metade do século XIX, a grande indústria europeia, desenvolvida em


proporções imprevistas, carecia de mercados cada vez mais vastos para o consumo dos
produtos industrializados e de fontes de matérias-primas baratas. É, então, que a África
começa a atrair a atenção dos governos europeus. «A idade mecânica impunha à África
um novo papel a desempenhar no desenvolvimento europeu» (Ki-Zerbo, 1972: 68).

Em 1873, na Europa, ocorre uma grave crise económica que será determinante para a
expansão europeia em África. Pela primeira vez o equipamento industrial coloca no
mercado mais produtos do que ele pode absorver. Até essa altura os países de além-mar
eram considerados essencialmente como fornecedores de matérias-primas para ajudar a
produção europeia. Neste ano de 1873 põe-se, pela primeira vez, em termos dramáticos,
o problema do escoamento dos produtos e a concepção da expansão torna-se decisiva
(Cornevin, 1966).

Com a depressão internacional da indústria na década de 70, começa o grande período de


desenvolvimento dos monopólios e, em breve, o Capitalismo transforma-se em
Imperialismo. Como sublinhou Lénine (1975) na obra “O Imperialismo Fase Superior do
Capitalismo”, é indubitável que a passagem do Capitalismo à fase de capitalismo
monopolista, ao capital financeiro, se encontra relacionada com a exacerbação da luta
pela partilha do Mundo. Em fins do século XIX, sobretudo na década de 80, todos os
Estados capitalistas se esforçaram por adquirir colónias. A posse de colónias é a única
coisa que garante de maneira completa o êxito do monopólio contra todas as
contingências da luta com o adversário. Quanto mais desenvolvido está o Capitalismo,
quanto mais sensível se torna a insuficiência de matérias-primas, quanto mais dura é a
concorrência, tanto mais encarniçada é a luta pela aquisição de colónias.

Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012


3

CAUSAS ECONÓMICAS DA EXPANSÃO COLONIAL EUROPEIA EM ÁFRICA, NO FIM DO SÉCULO XIX

PERDA DAS COLÓNIAS EUROPEIAS NA AMÉRICA


(AS QUAIS PROCLAMARAM A SUA INDEPENDÊNCIA)

ACELERADO DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DE EXPANSÃO


ALGUNS PAÍSES EUROEPUS, NO SÉC. XIX COLONIAL
EUROPEIA
EM ÁFRICA
CRISE ECONÓMICA DE 1873 NO FIM DO
(CRISE DE SUPER PRODUÇÃO) SÉC. XIX

SURGIMENTO DO CAPITALISMO MONOPOLISTA

POSSE DE COLÓNIAS

MERCADOS DE
FONTES DE
CONSUMO DOS
MATÉRIAS -
PRODUTOS DA
- PRIMAS
INDÚSTRIA

Motivações políticas

Entre as motivações políticas que impulsionaram a expansão europeia em África, nos


finais do século XIX «as mais importantes foram a estratégia e o objectivo de defender,
para lá dos mares, o princípio do equilíbrio europeu» (Monnier, 1968: 63), quer dizer, a
rivalidade entre as grandes potências europeias impulsionou-as para as conquistas em
África como tentativa, por um lado, de manterem o seu lugar no concerto político europeu
e, por outro lado, de criar obstáculos ao engrandecimento das potências rivais.

Em França, até 1870, apenas os marinheiros preconizavam a expansão baseada na


rivalidade secular existente entre a França e a Inglaterra, pois, tinham a convicção de que
esta se estabeleceria em todo o lado onde a França não se encontrasse. É esta velha
rivalidade que leva as duas potências a ocupar regiões da costa ocidental africana

Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012


4

movidas, de início, mais por motivos políticos do que por interesses económicos
imediatos, uma vez que ainda não sabiam ao certo o que tirar dessas regiões, logo após a
abolição do tráfico. Mas depois da derrota de Sedan (1871) diante dos alemães, o
patriotismo francês tornou-se amargo e exaltado Os franceses desejavam compensar a
derrota sofrida, provando ao Mundo que a França ainda tinha possibilidades de retomar
o seu lugar de grande potência e já que não podia reconquistá-lo na Europa, vai tentar
reparar em África a perda das províncias orientais de Alsácia e Lorena. Então, o
nacionalismo da marinha apoderou-se da Nação inteira e as Câmaras começaram a votar
os créditos para a expansão colonial.

O chanceler alemão Bismarck, dedicando todo o seu esforço à consolidação do Império,


cuja unidade conseguira vai, no âmbito da sua política externa, apoiar as reivindicações
francesas em diferentes regiões africanas, pretendendo, com isso, afastar a nação rival das
terras perdidas a leste.

É de salientar que Bismarck antes de 1884 não estava interessado na aquisição de colónias
cuja manutenção era bastante dispendiosa. Mas a problemática da posse da bacia do
Congo acabou por influenciar Bismarck fazendo-o recear que no futuro o pudessem
acusar de ter deixado passar a ocasião de adquirir uma parte do “bolo africano” para a
Alemanha. A Sociedade Colonial Alemã, recentemente fundada, focando a necessidade
de novos mercados devido ao desenvolvimento do comércio e da indústria na Alemanha,
bem como a conveniência em dirigir a emigração alemã para territórios sob domínio
alemão, também jogou um certo papel na conversão do “Chanceler de ferro” à política de
expansão colonial. Contudo, para a nova atitude de Bismarck parece ter sido decisivo o
memorando do conselheiro da legação para os assuntos estrangeiros Henri Kusserov,
fazendo notar que se poderia adquirir colónias sem sobrecarregar o orçamento do Estado,
o qual encarregaria companhias privadas da ocupação administrativa e da valorização dos
novos territórios, limitando-se a afirmar a sua soberania para impedir a intervenção de
outras potências. E «a revelação de que, por intermédio de companhias munidas de
diploma, se podia instalar a Alemanha sem a comprometer financeiramente,
convenceu-o» (Brunschwig, 1972:120).

Por outro lado, a viragem de Bismarck também visava contrabalançar o poderio das suas
rivais, a Inglaterra e a França.

Em 24 de Abril de 1884, o Chanceler alemão inaugurou a política colonial da Alemanha,


colocando os territórios adquiridos por Luderitz na baía de Angra Pequena (no Sudoeste
Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012
5

Africano) sob a protecção do Reich. E entre Julho e Outubro desse ano a bandeira alemã
foi içada nas colónias alemãs da África Ocidental (Togo e Camarões).

E foi a rápida actuação da Alemanha fazendo, em poucos meses, anexações em quatro


partes bastante separadas do continente africano (Togo, Camarões, Sudoeste Africano,
em 1884, e África Oriental Alemã – Tanganhica, em Fevereiro de 1885) que desencadeou
a “corrida “ europeia até à completa conquista do continente.

Segundo os historiadores Oliver e Fage (1972), a investigação histórica recente tem


tendência para mostrar que a Alemanha se embrenhou pela África, não em primeiro lugar
para aí satisfazer uma sede de Império, mas antes como parte de um desígnio muito mais
vasto, de desviar a hostilidade francesa contra ela na Europa, fomentando rivalidades em
África e criando uma situação em que a Alemanha seria o “árbitro” entre as ambições
francesas e inglesas.

Mas, muito antes das atenções da governo alemão se terem virado para a expansão
colonial, tinha entrado na cena africana o rei Leopoldo II da Bélgica, homem de negócios,
apaixonado pela Geografia e hábil na gerência de uma fortuna pessoal que sonhava
utilizar na valorização de países novos. E a partir de 1876 aquele soberano dirigiu toda a
sua atenção para a África Central. Sob um pretexto filantrópico, irá preparando o caminho
para o reconhecimento internacional da sua soberania na região do Congo. A habilidade
diplomática de Leopoldo II aguçou as mútuas desconfianças das potências europeias
acerca das suas actividades em África e, por isso, ele é considerado o precursor da
“corrida para a África”

Motivações ideológicas

A Europa, fortemente interessada na posse de África por razões económicas e políticas,


vai procurar uma justificação moral para as suas acções, apoiando-se nas descrições de
missionários que fizeram crer que o homem branco deveria jogar em África um grande
papel civilizador, ajudando as populações “primitivas” a elevarem-se, instruindo-as e
evangelizando-as.

Livingstone, médico, missionário e explorador, que passou grande parte da sua vida em
África, desejava a colonização como um remédio contra o tráfico de escravos e dizia:
«Que Deus abençoe amplamente todo o homem, seja ele americano, inglês ou turco, que
possa ajudar a sarar esta chaga» (Livingstone, apud Ki-Zerbo, 1972:74).

Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012


6

Assim, a colonização aparecia como um dever humanitário para a civilização e


evangelização dos africanos.

Conclusão

A perda das colónias europeias na América e o rápido desenvolvimento industrial das


potências europeias tornou absolutamente necessária a aquisição de colónias em África
que jogassem o papel de consumidoras dos produtos das indústrias europeias e
fornecedoras de matérias-primas baratas para essas mesmas indústrias.

A rivalidade política entre a França, a Inglaterra e a Alemanha, agudizada pela


intervenção do rei Leopoldo II da Bélgica, impulsionou a ocupação de vastas regiões do
continente africano, nas duas últimas décadas do século XIX.

A difusão das ideias da necessidade de civilizar e evangelizar “os povos primitivos” da


África Negra legitimou a sua colonização.

Bibliografia

BRUNSCHWIG, Henri (1972). A Partilha da África. Lisboa: Publicações Dom


Quixote.
CORDEIRO, Luciano (1934). Questões Coloniais I. Coimbra: Imprensa da
Universidade.
CORNEVIN, Robert (1966). Histoire de l’Áfrique. Vol.2. Paris: Payot.
COSTA, Mariete da C. P. (1989). A Conferência de Berlim de 1884 /1885.
Realidades e Consequências Históricas Verdadeiras. Lubango:
ISCED (Tese de Licenciatura).
HERNANDEZ, Leila Leite (2005). A África na Sala de Aula: Visita à História
Contemporânea. São Paulo: Selo Negro.
KAKÉ, I. M’BOKOLO, E. (1977). Des Missionnaires aux Explorateurs.
Histoire Général de l’Afrique. Vol. 7. Paris: ABC.
KI-ZERBO, Joseph (1972). História da África Negra. Vol. 2, Tradução
de Américo de Carvalho. Editor Francisco Lyon de Castro, Viseu:
Publicações Europa – América.
LÉNINE, V,I. (1975). O Imperialismo Fase Superior do Capitalismo.
Lisboa: Edições Avante
M’BOKOLO, Elikia (2007). África Negra. História e Civilizações – do século
XIX aos nossos dias. Vol.2, 2.ª Edição. Tradução de Manuel
Resende. Lisboa: Edições Colibri.
MONNIER, J. (1968). História Universal – Idade Contemporânea (1870 –
1914). Lisboa: Verbo Juvenil.
OLIVER, Roland e FAGE, J. D. (1972). Breve História de África. Lisboa: Sá da
Costa Editora.
SANTA-RITA, J. G. (1959). África nas Relações Internacionais depois de 1870.
Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar

História Geral de África, VII: África sob dominação colonial, 1880 – 1935.
Editado por Albert Adu Boahen, 2.ª ed. rev. , Brasília: UNESCO, 2010.

Texto de Apoio compilado por Mariete Costa, Lubango: ISCED, 2012

Você também pode gostar