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metodológicos para o
trabalho na EJA
Rocha, T. M.
SST Aspectos teórico-metodológicos para o trabalho na EJA /
Tainá Siqueira Theis;
Florianópolis, 2019; 24 páginas.
Apresentação
Neste momento de nossos estudos, teremos a oportunidade de analisar e refletir
sobre os conceitos fundamentais e as principais correntes teóricas e metodológicas
para o trabalho na EJA. Para isso, estudaremos sobre educação popular, o método
Paulo Freire e sua aplicação à sala de aula no EJA.
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Nas duas últimas décadas, o debate educacional tem se caracterizado
por uma quase total hegemonia das “pedagogias do aprender a aprender”
(DUARTE, 2001), com destaque para o construtivismo, a pedagogia
do professor reflexivo, a pedagogia das competências, a pedagogia
dos projetos e a pedagogia multiculturalista. (DUARTE, N. O debate
contemporâneo das teorias pedagógicas. In.: MARTINS, L. M.; DUARTE,
N. Formação de professores: limites contemporâneos e alternativas
necessárias, 2010, p. 33)
Dessa forma, no século XXI, o conceito de Heutagogia deve estar cada vez mais
presente nos estudos sobre aprendizagem, uma vez que a cada ano o número de
cursos a distância, em diferentes formatos, só aumenta.
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Com esses conceitos em mente, vamos adentrar cada vez mais nas teorias
para a Educação de Jovens e Adultos enquanto aprendizes que não iniciaram
ou concluíram os estudos na idade tida como adequada pelos pensadores da
educação.
Vimos, na primeira unidade, o que significa o termo EJA, mas às vezes nos
deparamos com outros termos utilizados para designar essa modalidade de ensino,
os quais nem sempre significam o mesmo que EJA. Vejamos alguns:
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Atenção
Protagonismo: processo de se tornar o protagonista, o personagem
central de sua vida e de seu aprendizado.
A Educação Popular merece atenção especial, uma vez que será necessário seu
amplo entendimento para estudarmos o modelo de ensino proposto por Paulo
Freire. Essa expressão aparece em diversos momentos históricos com sentidos
distintos, conforme Wanderley (apud GADOTTI, 2008, p. 36-37), que faz a distinção
entre três linhas da educação popular no país:
Atenção
Campesinato: conjunto de pessoas que trabalham no campo,
camponeses.
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E, por fim, a ideia de que a educação popular é um conjunto de práticas
emancipatórias para a transformação da realidade, em consonância com a
orientação de libertação (BRASIL, 2014, p. 17).
Atenção
Emancipação: libertar alguém, fornecer-lhe a independência e a
igualdade perante seus semelhantes.
Educação Popular
Paulo Freire é um nome muito conhecido em nosso país quando tratamos sobre
a alfabetização e formação de adultos. Porém, seu método foi desenvolvido ao
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longo dos anos, com inúmeras experiências, e em contraste com políticas públicas
massivas para a educação. Veja a seguir a linha do tempo de Paulo Freire.
Publicação no Brasil da
1974 Pedagogia do Oprimido.
Falecimento.
1997
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No âmbito da Educação Popular, Paulo Freire a entendia como um conceito
no qual a educação se torna abrangente e passa a "refletir, portanto, a sua
capacidade de mobilizar em direção a objetivos próprios. […] Lidando com o
processo de conhecer, a prática educativa é tão interessada em possibilitar o
ensino de conteúdos às pessoas quanto em sua conscientização.” (FREIRE apud
GADOTTI; ROMÃO, 2008, p. 16).
Nessa esteira, não podemos pensar a Educação Popular como prática restrita à sala
de aula, mas como um conjunto de práticas em constante movimento e presente
nos espaços frequentados pelo povo, espaços onde a cultura se constrói e espaços
democráticos de direito da população.
As bases da Educação Popular cunhadas por Paulo Freire podem ser descritas,
conforme o Marco de Referência da Educação Popular para as Políticas Públicas,
com as seguintes definições: dialogicidade, amorosidade, conscientização,
transformação da realidade do mundo, partir da realidade concreta, construção
do conhecimento e pesquisa participante, sistematização de experiências e do
conhecimento.
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Quadro – Conceitos norteadores da Educação Popular
Definição
Por meio do diálogo, constrói-se uma relação horizontal para as
práticas sociais e educativas, isto é, o governo necessita dialogar
com a população para a oferta educacional voltada a seus anseios,
além de estabelecer uma compreensão de que não existe, entre
os agentes do processo educativo, um saber maior do que o outro.
Freire diz sobre o dar voz ao povo, que estávamos fadados “a uma
estrutura economicamente feudal e a uma estrutura social em que
Dialogicidade
o homem vivia vencido, esmagado e ‘mudo’, uma forma política
e social cujos fundamentos exigiam, ao contrário do mutismo, a
dialogação, a participação, a responsabilidade, política e social”.
(FREIRE, 1967, p. 80)
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Definição
Sistematização de
Ordenação e reconstrução dos conhecimentos adquiridos, para
experiências e do
compartilhamento com os outros.
conhecimento
Como vimos na linha do tempo da vida e do trabalho de Paulo Freire, no ano de 1962
deu-se início ao experimento de alfabetização de 300 trabalhadores no município
de Angicos (RN), em apenas 45 dias, em parceria com uma equipe da Universidade
Federal de Pernambuco, experimento este chamado de "círculo de leitura”.
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Figura: Paulo Reglus Neves Freire
Fonte: Wikipedia/https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire
Essa experiência chamou a atenção do Governo Federal, que, até meados de 1964,
formou diversos alfabetizadores para que ensinassem as primeiras letras ao povo
nos futuros círculos de leitura a serem criados pelo governo. Esse plano não chegou
a ser concretizado em virtude do Golpe militar.
O método foi extinto na década de 1980, dando lugar ao EDUCAR, que também se
extinguiu, em 1990, época em que Paulo Freire assumiu a Secretaria de Educação
do Estado de São Paulo, dando início ao Movimento de Alfabetização de Jovens e
Adultos (MOVA) da cidade de São Paulo.
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O MOVA pretendia o pluralismo de metodologias, desde que não ferisse o princípio
básico de educação para a libertação. Nem mesmo o método Paulo Freire era
imposto aos educadores, que deveriam empreender um esforço coletivo na
construção do movimento. Foi extinto em 1993.
Para Paulo Freire e seus colegas do Movimento de Cultura Popular do Recife, para
ensinar de forma emancipatória e crítica os sujeitos adultos era necessário:
A fim de que esse diálogo seja efetivo, Paulo Freire aponta que é necessário ter
cuidado ao escolher o quadro de educadores, uma vez que a maioria das formações
em Licenciatura não desenvolveu nos professores a disposição para o diálogo e
para a escuta atenta. Veremos mais sobre esse assunto na Unidade 5.
Assim, veja a seguir as características do método criado por Paulo Freire e seus
colegas, descrito em seu livro Educação como prática de liberdade.
Fases
I. Levantamento do universo vocabular dos alunos
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Dessas entrevistas é que saem o que o Método chama de palavras geradoras,
que, nas palavras de Freire, “são aquelas que, decompostas em seus elementos
silábicos, propiciam, pela combinação desses elementos, a criação de novas
palavras” (FREIRE, 1967, p. 111).
São situações para o desafio dos alunos, em que devem ser discutidos problemas
regionais e nacionais a partir das palavras geradoras, seguindo-se a ordem
de dificuldade, para ampliação das perspectivas dos temas englobados nos
vocábulos. As discussões sobre as situações-problema levadas podem ser
trabalhadas em um contexto geral ou uma parte representativa dela.
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IV. Elaboração de fichas-roteiro
Para auxiliar os educadores nos debates em sala de aula, com os temas gerados
a partir dos vocábulos selecionados.
Compara-se cada família, isto é, que a família do ti começa com o mesmo som e
letra, mas termina diferente. Idem para as outras famílias.
ta te ti to tu
ja je ji jo ju
la le li lo lu
Em casa, formam todos os termos que puderem, mesmo que não tenham sentido.
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Figura– Construindo sentidos
ta
te ti
to tu
Fonte: Plataforma Deduca (2019).
Elaborado pela autora (2019).
Assim, o método Paulo Freire tem como mote central o desenvolvimento de uma
educação crítica e criticizadora, que parte da realidade do aluno para fazê-lo
compreender de forma macro o contexto social em que está inserido, não sendo
mero estudante das letras, mas também de toda a ideologia por trás dos termos
trazidos à sala de aula. Por fim:
Saiba mais
Você conhece o movimento do Governo Federal pela inovação
na EJA? Visite o link http://inovaeja.mec.gov.br/ para consultar
propostas e experiências inovadoras.
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Métodos tradicionais de alfabetização
aplicados na EJA
O mundo escrito nos circunda e está cada vez mais presente em todos os momentos
de nossa vida, especialmente na era tecnológica em que vivemos. São os símbolos
do celular, são as conversas escritas e faladas por aplicativos de mensagens, sãos
os e-mails no trabalho, as placas de trânsito, os letreiros luminosos, as propagandas,
os jornais nas bancas, os panfletos de informação, os manuais de instrução, entre
tantos outros meios.
Considerou-se por muito tempo que uma pessoa alfabetizada era aquela que podia
escrever seu nome e ler frases curtas. Assim, uma das linhas de pensamento sobre a
alfabetização era a de que instrumentalizar o adulto para ser capaz de decodificar as
letras e escrever de forma concisa era o suficiente.
A outra linha, ligada a Paulo Freire, prevê uma alfabetização que vai além dos signos
impressos, mas que subsidia o adulto a ler, compreender e ir além das palavras,
criando sentidos e recriando a realidade concreta, conforme vimos anteriormente.
Paulo Freire privilegia o termo “alfabetizando”, em vez de “analfabeto”.
Para Ribeiro, além do sujeito analfabeto (com nenhum conhecimento dos signos),
existem graus diferentes de alfabetização:
Grau médio-
Grau baixo Grau médio-alto Grau alto
-baixo
Hábitos de leitura
também relacionados
Indivíduos que têm
ao trabalho de forma
a leitura e a escrita Práticas de leitura e
restrita, porém com
restritas ao âmbito escrita voltadas ainda Pessoas que utilizam
maior grau de exigência
profissional, com para o trabalho, mas a leitura e a escrita em
por suas ocupações,
capacidade de registro que transcendem o diferentes âmbitos,
em especial na
muito simplificada. ambiente profissional e com acesso a jornais e
comunicação oral, que
Aprendizado e mobilizam os espaços revistas especializados,
necessita de maior
aquisição de familiares, com leituras livros técnicos e de
desenvoltura e trânsito
informações são de revistas e romances, diversos assuntos.
por diferentes variantes
orais, e as operações entre outros livros.
da língua. Maior
numéricas mentais.
familiaridade com a
escrita.
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Já para a UNESCO, os graus seriam os seguintes:
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Assim, a alfabetização como formadora de um adulto que lê e escreve deve ser
abandonada; a alfabetização, agora, deve ser ampliada e receber o reforço do
conceito de letramento.
Atenção
O conceito de letramento não substitui o de alfabetização, que é
considerada como "ferramenta importante para o uso efetivo e
competente da leitura e da escrita, envolvendo aprendizagens que
não se restringem à decodificação, mas dizem respeito, também,
à capacidade de usar a leitura e a escrita em diferentes situações”
(UNESCO, 2008, p. 74). Já o letramento é "compreendido como o
conjunto de práticas sociais relacionadas aos usos da escrita e
suas funções e possíveis efeitos na sociedade” (UNESCO, 2008,
p. 70).
Essa participação nas redes pede uma análise breve. As redes sociais são hoje um
meio de informação capaz de atingir um número gigantesco de pessoas das mais
variadas idades, em especial os jovens. Cada vez mais adultos e idosos participam
das redes sociais, ressignificando seu lugar no mundo.
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Como exemplo, podemos ver quantas informações equivocadas passam por dia
pelas redes sociais. As pessoas compartilham sem verificar a fonte e a veracidade
das informações, muitas vezes gerando comoções por correntes, prêmios e
notícias falsas.
Por isso, hoje é cada vez mais necessária uma educação que transcenda a
capacitação do indivíduo para ler e escrever, que dê bases para escolher entre o mar
de informações vigentes na internet.
Reflita
Você já pensou nos caminhos que trilha na internet e nas redes
sociais? Às vezes, ao colocarmos nossa vida de forma tão aberta
na internet, podemos estar dando abertura para que pessoas mal-
intencionadas utilizem nossos dados, como nome, documentos e
fotos. O cyberbullying é uma prática cada vez mais crescente em
nossa sociedade. Você já foi alvo de violência virtual? Quer saber
mais sobre o cyberbullying? Veja aqui: http://acervo.novaescola.
org.br/formacao/cyberbullying-violencia-virtual-bullying-agressao-
humilhacao-567858.shtml
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Até poucos anos atrás, os livros de linguagem eram produzidos com textos
fictícios, montados a partir de uma concepção de que a cada faixa etária deveria
corresponder um grau de dificuldade na leitura. Assim, um livro de redação trazia
inúmeros textos forjados e com dados fictícios visando ao ensino escolar.
Sabemos agora, e temos amplo acesso hoje, que os textos para trabalho de
alfabetização e letramento devem vir ao encontro da realidade do aluno e,
gradativamente, ir mostrando a ele diferentes realidades, e que os textos devem
ser de ampla circulação para que ampliem seu arcabouço literário e informacional.
Entende-se, então, que a prática de alfabetização deva ser concomitante à do
letramento.
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Normalmente, os adultos já vêm à sala de aula com os conhecimentos matemáticos
básicos, conseguindo reconhecer os principais símbolos e os números. Isso se dá
porque a maioria das ocupações dos alunos adultos pede que se utilizem conceitos
matemáticos mínimos.
Logo, o letramento matemático deve ser capaz de fazer com que o aluno adulto
compreenda o lugar da matemática em sua realidade, desenvolvendo a habilidade
de realizar operações de acordo com suas necessidades, compreendendo os termos
característicos dessa área de conhecimento.
Saiba mais
Você sabia que a Igreja Católica também vem empreendendo
esforços para a erradicação do analfabetismo no Brasil e no mundo?
Uma das atividades no país chama-se Movimento de Educação de
Base (MEB), ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB). Você pode conferir o trabalho deles aqui: http://www.meb.
org.br/home/.
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Fechamento
Ao longo de nossos estudos, analisamos conceitos pertinentes à Educação de
Jovens e Adultos; como a Andragogia e a Heutagogia, tão necessários no ensino
de adultos. Na sequência, estudamos a educação popular, passamos pela linha do
tempo dos fatos marcantes na trajetória de Paulo Freire, bem como refletimos sobre
o conceito de alfabetização do de letramento.
Referências
BRASIL. SECRETARIA GERAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. DEPARTAMENTO DE
EDUCAÇÃO POPULAR E MOBILIZAÇÃO CIDADÃ. Marco de referência da educação
popular para políticas públicas. Brasília, 2014. Disponível em: http://conae2014.
mec.gov.br/images/pdf/MarcodeReferencia.pdf. Acesso em: 20 out. 2019.
BARTON, D.; HAMILTON, M.; IVANIC, R. Situated literacies: reading and writing in
context. Londres: Routlege, 2000.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.
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RIBEIRO, V. M. Alfabetismo e atitudes: pesquisa com jovens e adultos. Campinas:
Papirus, 1999.
______. (org.) Educação de Jovens e Adultos: novos leitores, novas leituras. São
Paulo: Ação Educativa, 2001.
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