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1º MÓDULO - DESENVOLVIMENTO COGNITIVO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

O termo “cognição” se refere ao conjunto de habilidades mentais que são


básicas para a construção de conhecimento sobre o mundo. Como processos
cognitivos, podemos citar todos aqueles relacionados ao desenvolvimento do
raciocínio, pensamento, memória, abstração, imaginação, linguagem, entre outras
características importantes.

Tais processos permitem ao homem reconhecer o mundo à sua volta e


compreender determinado assunto para, então, fazer julgamentos ou solucionar
problemas por meio do raciocínio. De forma resumida, a cognição é a maneira como o
cérebro percebe, aprende, pensa e recorda determinada informação que foi captada
pelos cinco sentidos.

A cognição é, ainda, um mecanismo que converte aprendizados para o modo


de ser interno de cada ser humano. Portanto, o conceito também pode representar o
processo pelo qual uma pessoa interage com seus semelhantes e com o ambiente em
que vive — incluindo a escola infantil —, sem que perca sua identidade ao longo do
tempo.

Para haver construção de conhecimento, as funções de várias regiões cerebrais


devem estar íntegras e, principalmente, maduras e de acordo com a idade do
indivíduo. Nesse sentido, é fundamental que professores da educação infantil estudem
e trabalhem com práticas que sejam benéficas para o adequado desenvolvimento
cognitivo de seus alunos.

Desenvolvimento infantil x desenvolvimento cognitivo

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Toda pessoa nasce inserida em uma sociedade, na qual passa a ser criadora de
cultura e produtora da história. Quando crianças, construímos nosso conhecimento a
partir da nossa própria realidade, com base nas condições em que vivemos e, também,
a partir do relacionamento com os outros. É nesse sentido que faz toda a diferença ter
o apoio e a orientação de bons profissionais desde a fase escolar.

O processo de aprendizagem não acontece de forma rápida e completa, todo


de uma vez. Ele se inicia no ventre da mãe e segue todo um caminho ao longo da vida.
Dada essa característica, é essencial desenvolver atividades que permitam às crianças
evoluir suas potencialidades ao máximo, evitando a temida inibição cognitiva —
diminuição da atuação de algum aspecto da cognição.

A importância do desenvolvimento cognitivo na educação infantil

O desenvolvimento das crianças deve ser medido e acompanhado como uma


estratégia de prevenção de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta
sobre a importância de vigiar possíveis atrasos ou distúrbios nos diversos eixos do
desenvolvimento infantil: motor, social, afetivo, adaptativo e cognitivo.

A identificação precoce de qualquer anormalidade pode ser debatida no


planejamento escolar, a fim de diminuir problemas na aprendizagem infantil. Além de
acompanhar o desempenho de seus alunos, a escola deve propiciar um ambiente
adequado e executar práticas que estimulem as habilidades cognitivas. Assim, é
possível prevenir fatores médicos e ambientais que possam alterar a estrutura e o
funcionamento do cérebro.

Devemos partir do princípio que, de certa forma, educadores têm, algumas


vezes, mais referências para avaliação do que os pais. Isso porque esses profissionais
convivem diariamente com um grande número de pessoas da mesma faixa etária,
sendo mais fácil acostumar-se a observar padrões e realizar comparativos. Embora
cada indivíduo tenha suas características singulares, existem alguns aspectos de
desenvolvimento que, quando fora da curva, merecem atenção.

A importância do desenvolvimento cognitivo no futuro da educação

Hoje em dia, além das ferramentas comuns do dia a dia, escolas contam com
diversos canais tecnológicos, que permitem auxiliar ainda mais no desenvolvimento
cognitivo dos seus alunos. Devemos levar em conta também o quanto as mudanças no

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meio impactam nessa capacidade de desenvolvimento. As novas gerações já nascem
em contato com a tecnologia.

Ao que tudo indica, o futuro da educação infantil será marcado a cada vez mais
pela presença tecnológica. É por isso que, desde os primeiros anos escolares, as
crianças precisam ser preparadas para esse contexto. Um bom desenvolvimento
cognitivo desde os primeiros anos de vida permite melhor integração com novos
processos nos anos seguintes.

A visão de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo

Jean William Fritz Piaget (1896–1980) desenvolveu a teoria do desenvolvimento


cognitivo da criança observando seus próprios filhos interagindo com o meio. Segundo
ele, o público infantil tem uma maneira particular de pensar e aprender, e demonstra
esses processos em quatro estágios sucessivos. Confira quais são:

Estágio sensório-motor

Ocorre do nascimento aos 2 anos de idade. Aqui, a inteligência da criança é


essencialmente prática e, portanto, as ações de reflexo predominam. A relação com o
meio ambiente começa após o primeiro mês de vida, mas não se dá pelo raciocínio
lógico ou representação simbólica. Em vez disso, a interação acontece pela
experimentação direta.

O período em que as ações são executadas por alguém que ainda não se
reconhece como sujeito é denominado “egocentrismo radical”. Afinal, mesmo não
fazendo inferências a si mesma, a criança pratica atos primitivos que evidenciam um
reconhecimento nas ações. É nessa fase que são iniciadas atividades motoras, como
tocar, agarrar, sugar, chorar, entre outras.

Estágio pré-operatório

Ocorre dos 2 aos 6 anos. Nesse período, o egocentrismo predomina, ou seja, a


criança ainda não consegue se colocar no lugar do outro e pratica o monólogo. Como a
prioridade está nos aspectos que são relevantes aos olhos do próprio indivíduo, a
leitura da realidade se torna parcial e incompleta.

Ao longo do tempo, a percepção abstrata vai ficando mais aguçada, à medida


que aumenta a capacidade de simular e imaginar figuras, situações ou pessoas. No

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chamado pré-operatório ou pré-operacional, a criança passa a conhecer e assimilar o
meio, utilizando a linguagem e os jogos simbólicos como meio de comunicação.

Estágio operatório concreto

Ocorre dos sete aos 12 anos. É quando a lógica começa a se desenvolver e a


criança passa a organizar e sistematizar diferentes situações. Nesse período, a
compreensão do mundo não é mais tão prática, embora ainda dependa do mundo
concreto para realizar abstrações.

É aqui que o egocentrismo intelectual e social vai dar lugar à necessidade de


estabelecer relações e considerar pontos de vista diferentes. Além disso, a criança
também começa a executar operações mentalmente (definir distâncias, medidas,
alturas), e não se limita mais às ações físicas da inteligência sensório-motora.

Estágio das operações formais

Ocorre dos 12 anos em diante e destaca o amadurecimento dos conceitos


infantis. Aqui, predomina a lógica formal, pois a criança/adolescente já consegue
realizar abstrações sem o auxílio de representações concretas e imaginar situações
nunca antes vistas ou vivenciadas.

Ao chegar a essa fase, o indivíduo atinge sua forma final de equilíbrio, ou seja,
consegue alcançar um padrão intelectual que vai perdurar durante toda a idade
adulta. Isso não significa que haverá estagnação das funções cognitivas. Afinal, o
desenvolvimento posterior consistirá na ampliação de conhecimentos, seja em
extensão, seja em profundidade.

É importante que os professores da educação infantil compreendam os


diferentes estágios que englobam a aquisição de conhecimento. Dessa forma, poderão
contribuir ainda mais com ações que favoreçam o processo de ensino e aprendizagem.

Fatores que influenciam o desenvolvimento cognitivo

O estudo de Piaget considera que o desenvolvimento humano envolve


mecanismos bastante complexos e fatores que se complementam, como o processo de
maturação do organismo, a vivência social do indivíduo, a experiência com objetos e,
ainda, o equilíbrio com o meio.

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Para o autor, são dois fatores básicos que influenciam o desenvolvimento
cognitivo:

Fatores invariantes

Para Piaget, ao nascer, uma pessoa recebe como herança uma série de
estruturas biológicas — sensoriais e neurológicas —, as quais permanecem constantes
ao longo de toda a vida. Logo, são essas estruturas biológicas que vão predispor o
surgimento de determinadas estruturas mentais. Trata-se de uma questão
estritamente genética, transmitida de pais para filhos.

Com base nisso, considera-se que cada pessoa carrega duas marcas inatas: a
tendência natural à organização e à adaptação. Isso significa que, em última instância,
o principal motor do comportamento do homem é inerente ao ser, algo que já nasce
com ele e, portanto, não é passível de modificação.

Fatores variantes

Os fatores variantes constituem a unidade básica do pensamento piagetiano


como um elemento que se transforma durante o processo de interação com o meio
(incluindo a sala de aula), buscando a adaptação do indivíduo ao ambiente que o
circunda. De acordo com esse princípio, algumas características são desenvolvidas de
acordo com o meio em que o indivíduo está inserido em seus primeiros anos de vida.

Aqui, a teoria deixa claro que a inteligência não é herdada, mas construída no
processo interativo entre o homem e o espaço (físico e social) em que está inserido.
Isso daria margem a interpretações de que, o desenvolvimento cognitivo pode ser
moldado inteiramente por pais e educadores.

Equilíbrio entre essas duas vertentes

Para Piaget, o equilíbrio é o que o organismo almeja e, mesmo assim, nunca


alcança. Afinal, no processo de interação podem surgir desajustes que rompem com o
estado de equilíbrio do organismo, exigindo esforços para o restabelecimento da
adaptação. Isso colocaria em xeque as características até então consideradas
invariantes.

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Entretanto, sempre é possível adequar-se ao meio, cuidando sempre para que
a singularidade não seja perdida. A busca de novas formas de adaptação engloba dois
mecanismos que, embora diferentes, são indissociáveis:

Assimilação

É a tentativa do indivíduo de solucionar um problema específico a partir da


estrutura cognitiva que tem naquele momento de sua existência. Trata-se de algo que
vai mudando com o passar dos anos e a evolução no desenvolvimento.

Acomodação

É a capacidade de modificar a estrutura mental antiga para dominar outro


objeto do conhecimento. Trata-se de um processo que acontece ao longo dos
primeiros anos de vida e necessita de estímulos e acompanhamento de pais e
professores.

Os mecanismos de assimilação e acomodação são complementares e se fazem


presentes ao longo da vida de cada indivíduo, o que permite um estado de adaptação
intelectual, que nunca estará concluído.

Como fortalecer o desenvolvimento cognitivo com novas ideias

O vocabulário de uma criança pode começar a ser ampliado, desde que ela
ainda é um bebê. Conversar, ainda que a criança pareça não entender bem o que você
diz, fará com que ela amplie a sua percepção do mundo. Também os brinquedos
educativos permitem que os pequenos exercitem a sua curiosidade, explorando tais
ferramentas.

Mais tarde, oferecer jogos sensoriais e de raciocínio, contar histórias e


demonstrar curiosidade pelos assuntos de interesse da criança são uma forma de
estimular o desenvolvimento cognitivo e construir vínculos. Com o tempo, eles
também podem ganhar certa autonomia na escolha entre algumas opções de
brincadeiras e atividades.

9 Práticas benéficas para o desenvolvimento cognitivo

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Para que tenha valor cognitivo, uma atividade didática precisa ser lúdica. Nesse
sentido, as escolas necessitam adotar ações que divirtam os alunos sem a atribuição
formal de um processo educativo. Com esse cuidado, é possível tornar a experiência
mais atrativa e proveitosa para as crianças. Elas aprendem enquanto se divertem, sem
se dar conta, ao certo, de que estão, na verdade, estudando.

Neste tópico, vamos listar nove práticas benéficas para o desenvolvimento


cognitivo e que podem ser aplicadas em sala de aula. Confira as opções:

1. Adivinhação

Brincadeiras que propõem adivinhações são ótimas para desenvolver a


capacidade de abstração, concatenação e formação de ideias. Elas estimulam a
criatividade e a composição do imaginário infantil.

2. Brincadeira com água

Brincar na água é algo de que o público infantil gosta, além de ser uma
atividade benéfica para crianças com perfil mais agitado. Experimentos com pincéis e
baldes com água limpa podem ser feitos para propor a limpeza de uma parede ou
outra superfície.

3. Jogos de silêncio e imobilidade

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Atividades que desafiam as crianças a ficar em silêncio e/ou imóveis por
determinado período são excelentes para exercitar o controle motor e o autodomínio
das emoções. Um bom exemplo nesse caso é a antiga brincadeira de “estátua”.

4. Cantos e danças

Brincadeiras cantadas e que envolvem alguma dança ou outro tipo de


movimento (por exemplo, dança das cadeiras) são atividades de grande valor nas
escolas infantis. Canções suaves, com ritmos equilibrados e harmônicos, atuam na
formação das sinapses auditivas e estimulam o surgimento de emoções positivas.

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5. Atividades ao ar livre

Mudar de ambiente no horário de aula pode ser muito interessante para as


crianças. Os professores podem planejar atividades ao ar livre, que permitam o
contato com plantas e animais.

É importante aproveitar o momento para explicar a importância da fauna e da


flora, a fim de despertar na turma o amor à natureza e o senso de cooperação, de que
dividimos o nosso planeta com outros seres vivos, que também merecem atenção e
respeito.

6. Plantio e jardinagem

Ensinar o cuidado com as plantas, desde o plantio até a rega das mudinhas, é
uma prática importante para despertar a sensibilidade ecológica em crianças de todas
as idades. Se a escola tiver espaço suficiente, vale até montar uma horta ou jardim.

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7. Olhos vendados

Pedir que algumas crianças guiem os colegas que estão com os olhos vendados
é uma maneira de ensinar sobre amizade e ajuda voluntária. A atividade cria na turma
o senso de cooperação e ética solidária. Além disso, ajuda a estimular a construção de
vínculos de confiança, tão importantes na infância, devido ao seu impacto na idade
adulta.

Ao condutor, a mensagem transmitida é de responsabilidade e respeito pelo


outro. Já o conduzido obtém confiança no amigo e se sensibiliza com as limitações
alheias, sentindo, na prática, a dificuldade de pessoas com deficiência visual. Para
garantir ambas as experiências, é importante intercalar os papéis executados pelas
crianças.

8. Pintura e desenho

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A criatividade representada em rabiscos e espaços preenchidos com cores é
excelente para expressar sentimentos e dar asas à imaginação dos pequenos. A
vantagem é que eles podem ser feitos com qualquer tipo de material escolar, como
papel sulfite, cartolina, giz de cera, lápis de cor, tinta e pincel.

O professor pode propor desenhos livres ou a reprodução de linhas retas


(horizontais, verticais e diagonais), de figuras geométricas e de símbolos gráficos, a
partir de modelos. Também pode fazer pinturas dirigidas/guiadas, estimulando o
preenchimento completo do papel.

9. Jogos coletivos

Os tradicionais jogos coletivos sempre terão papel importante no


desenvolvimento das habilidades cognitivas. Na educação infantil, o ideal é priorizar
modalidades em que cada criança desempenhe papel importante para a execução da
atividade. Assim, será possível despertar o senso de responsabilidade social e a
autoconfiança.

Perceba que muitas dessas atividades permitem ao aluno praticar, sentir e


assimilar sensorialmente os aprendizados. A experiência sensorial, por sua vez, é
necessária para que o cérebro crie sinapses que associem os relatos teóricos aos fatos
apresentados. É dessa forma que se constrói o verdadeiro desenvolvimento cognitivo.

Fonte: https://educacaoinfantil.aix.com.br/desenvolvimento-cognitivo-sala-de-aula/

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DESENVOLVIMENTO COGNITIVO NA APRENDIZAGEM POR MEIO DE
JOGOS E BRINCADEIRAS

O papel importante da aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras na


promoção do desenvolvimento cognitivo de crianças pequenas tem sido discutido por
antigos teóricos, educadores e pesquisadores como Platão (p. 24),1 Froebel2 e Gesell;3
teóricos e pesquisadores posteriores, como Bruner,4 Erikson,5 Piaget6 e Vygotsky,7 e
teóricos e pesquisadores mais recentes, como Bodrova e Leong,8 DeVries,9 Fein10 e
Singer & Singer.11

Entretanto, nos últimos anos, o tempo destinado à aprendizagem por meio de


jogos e brincadeiras para crianças ativas tem sido reduzido em muitas salas de aula da
pré-escola, com crescente ênfase na prontidão das habilidades acadêmicas. Para
completar, alguns educadores, responsáveis pela determinação de currículos escolares
e de políticas, além do público em geral, têm diminuído a importância dos jogos e
brincadeiras na aprendizagem.

A tese desta discussão é que a aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras


proporciona um excelente ambiente para a promoção do desenvolvimento cognitivo
das crianças pequenas, especialmente para as habilidades de raciocínio essenciais para
a profundidade cognitiva. Como as evidências da pesquisa estão misturadas com o
papel dos jogos e brincadeiras na promoção desse desenvolvimento, são necessários
mais estudos longitudinais sólidos para investigar a extensão e os efeitos cognitivos de
longo prazo da aprendizagem precoce por meio de jogos e brincadeiras.

O papel dos jogos e brincadeiras como meio de aprendizagem12 tem sido


defendido por diversos profissionais da primeira infância desde que os programas pré-
escolares surgiram, no início do século 20. Entretanto, sempre foi discutido o papel
desempenhado pela aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras na promoção do
desenvolvimento cognitivo de crianças pequenas, especialmente em áreas específicas
como o aprendizado da leitura ou da matemática.

Embora seja louvável a atual ênfase na importância da educação na primeira


infância e seja positivo o crescente investimento na área, que tem permitido aumentar
a frequência das crianças nos programas da pré-escola, os recentes defensores da pré-
escola nem sempre se baseiam na teoria e prática da educação da primeira infância e,
portanto, têm visto a “aprendizagem” como uma atividade dirigida pelos professores,
altamente estruturada e difícil, que precisa ser imposta às crianças pequenas.

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Essa visão é especialmente problemática nas discussões sobre como os jogos e
brincadeiras podem promover o desenvolvimento cognitivo, porque brincar,
usualmente, envolve tipos de aprendizagem iniciados por crianças que não são
facilmente quantificáveis e, portanto, frequentemente, os adultos não têm certeza
sobre como proporcionar tais oportunidades e avaliar a aprendizagem ocorrida
durante experiências ricas e prolongadas dos jogos e brincadeiras.

As formas de estudar o relacionamento entre os jogos e brincadeiras e o


desenvolvimento cognitivo têm variado, incluindo estudos observacionais, estudos
experimentais e tipos autorrelatados de coleta de dados. Entretanto, a maioria dos
estudos sobre brincadeiras e jogos, incluindo aqueles relacionados com experiências
de brincadeiras/cognição, tem recebido pouquíssimo investimento e, portanto, a
maior parte é composta por estudos de pequena escala, de curto prazo e, usualmente,
não replicados. Logo, as pesquisas sobre a aprendizagem por meio de jogos e
brincadeiras não têm sido especialmente sólidas, sendo que muitas apresentaram
resultados mistos, dependendo de diversas variáveis nos estudos e nos problemas
encontrados pelos pesquisadores.13

Devido à necessidade de justificar o tempo das brincadeiras das crianças nos


programas da pré-escola, os pesquisadores têm tentado estudar os efeitos potenciais
das brincadeiras de faz-de-conta, dos jogos e das brincadeiras construtivas em tipos
específicos de aprendizagem, como o desenvolvimento da linguagem, da leitura e da
matemática, assim como de outras habilidades cognitivas, como o funcionamento
executivo, a criatividade, o desenvolvimento social/moral e a teoria da mente (isso é,
a capacidade de entender nossos próprios estados mentais e perceber que as outras
pessoas também têm tais estados mentais, que podem ser semelhantes ou diferentes
do nosso).

Diversos pesquisadores têm investigado os aspectos dessas questões e relatado


vários tipos de crescimento cognitivo relacionados com as formas lúdicas de
aprendizagem.14

Resultados de pesquisas recentes

Em relação às habilidades do tipo acadêmico, têm sido descritos bons exemplos


do papel dos jogos e brincadeiras na aprendizagem da alfabetização.15 Esses estudos
encontraram muitos resultados positivos do envolvimento lúdico das crianças com
materiais de alfabetização. Kami16 demonstrou que diversos tipos de conhecimentos
matemáticos, como aritmética, classificação e compreensão da relação
espacial/temporal podem ser promovidos por meio da interação lúdica da criança com

13
materiais e jogos que promovam tais conhecimentos. Também Griffin, Case e Siegler17
vincularam a atividade matemática lúdica ao aumento do desenvolvimento das
“estruturas conceituais centrais” do raciocínio.

Outros pesquisadores relataram o aprimoramento da teoria da mente por meio


de jogos e brincadeiras18,19 e descobriram uma relação entre as habilidades de
representar o faz-de-conta e as habilidades da teoria da mente, embora não esteja
claro se as crianças pequenas veem o faz-de-conta como ação mental envolvente.20
Wyver e Spence,21 que estudaram a resolução de problemas por meio de
brincadeiras, observaram que havia uma relação recíproca, em vez de unidirecional,
entre a brincadeira cooperativa e a resolução de problemas.

Em uma análise recente de estudos sobre o faz-de-conta, Lillard e colegas22


relataram que as evidências indicaram alguns efeitos dos jogos e brincadeiras nas
habilidades da linguagem, mas resultados inconsistentes em relação às habilidades de
raciocínio, criatividade e diversas habilidades acadêmicas. Embora esses estudos
tenham todos sido classificados como “jogos e brincadeiras", muito do que foi feito
eram atividades controladas por adultos, e não brincadeiras e jogos controlados por
crianças.

Além disso, a maioria dos estudos sobre jogos e brincadeiras é de curto prazo e,
portanto, os resultados relacionados com os ganhos cognitivos de longo prazo,
frequentemente, são indistintos ou ausentes.

Pesquisas longitudinais indicaram algumas relações. Por exemplo, Wolfgang e


colegas23 relataram que pré-escolares envolvidos em jogos de blocos complexos
demonstraram ganhos de longo prazo em cognição matemática, e Bergen e Mauer24
relataram que pré-escolares com altos níveis de brincadeiras com materiais de
alfabetização eram mais propensos a ser leitores espontâneos dos sinais e a ter uma
linguagem simulada maior em uma “atividade de construção de cidades” aos 5 anos.

Em um estudo de autorrelato de lembranças de brincadeiras de infância de


indivíduos em idade universitária, Davis e Bergen25 descobriram que altos níveis de
brincadeiras de faz-de-conta e de jogos na primeira infância estavam
significativamente relacionados com maiores níveis de raciocínio moral adulto.
Curiosamente, Root-Bernstein e Root-Bernstein26 observaram que os beneficiários
das “bolsas para gênios” McArthur, frequentemente, relataram um alto nível de
brincadeiras de faz-de-conta de “minimundos” durante a infância.

Lacunas da pesquisa

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Existem muitas lacunas nas pesquisas da aprendizagem por meio de jogos e
brincadeiras, devido a, no mínimo, quatro razões. Primeiro, tanto os educadores como
os pesquisadores variam em suas definições de aprendizagem por meio de jogos e
brincadeiras, de modo que as experiências de brincadeiras podem diferir em matéria
de duração, quantidade de direção/interferência adulta, materiais disponíveis e
métodos de coleta de dados.

Logo, o que um educador/pesquisador chama de aprendizagem por meio de


jogos e brincadeiras pode ser extremamente diferente da definição de outro
educador/pesquisador. Muitas vezes, o que o programa curricular chama de atividade
por meio de jogos e brincadeiras tem uma forte direção do professor e o tempo
disponível para brincadeiras autodirigidas pela criança não é muito extenso.

Em segundo lugar, muitos estudos de aprendizagem por meio de jogos e


brincadeiras concentram-se somente na aprendizagem de habilidades acadêmicas, em
vez de no papel da brincadeira na promoção de outros tipos de crescimento cognitivo.

Em terceiro lugar, a maioria dos estudos é de curto prazo e deveria ser de


natureza longitudinal (no mínimo durante um ano escolar) para medir a mudança
cognitiva. Entretanto, nos estudos longitudinais há também fatores de crescimento
geral que podem afetar o crescimento cognitivo.

Em quarto lugar, como os programas pré-escolares atendem crianças com


diversas experiências de brincadeiras e jogos em casa, diferentes temas de
brincadeiras, habilidades variadas e uma diversidade de contextos econômicos, essas
diferenças também podem afetar os resultados dos estudos do crescimento cognitivo
por meio de jogos e brincadeiras. Todavia, como as bases teóricas e experienciais que
sugerem a importância da aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras são muito
sólidas, deveria ser prioridade ter uma disponibilidade maior de investimentos e
atenção para a pesquisa dessa questão.

O interesse e o suporte à aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras na


pré-escola têm variado nos últimos 75-100 anos, e é promissor haver atualmente
suporte e interesse em encorajar as brincadeiras e jogos das crianças. As brincadeiras e
jogos das crianças pequenas são valiosos para reforçar diversas áreas evolutivas, não
somente aquelas relacionadas com habilidades acadêmicas específicas e, portanto, o
estudo da aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras deveria incluir um foco
amplo baseado em teorias e cientificamente rigoroso. Deveria incluir também o estudo
de brincadeiras e jogos autodirigidos por crianças, assim como experiências de
brincadeiras e jogos dirigidos por adultos, com a necessidade de estudos longitudinais.

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Implicações para os pais, serviços e políticas

As decisões de todos os grupos relevantes relacionados com os serviços e


políticas deveriam ser tomadas baseando-se em uma profunda compreensão dos jogos
e brincadeiras e seu papel crucial nas vidas das crianças pequenas.

Os pais deveriam ser especialmente vigilantes com o monitoramento da


quantidade de tempo que seus filhos pequenos passam brincando com dispositivos
tecnológicos e garantir que as brincadeiras de seus filhos incluam não apenas materiais
de jogos e brincadeiras tradicionais, mas também tempo ao ar livre. Já que a
aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras é um aspecto importante das salas de
aula da pré-escola, ela deveria ser valorizada não somente considerando a
aprendizagem de habilidades acadêmicas, mas também para dar suporte à
aprendizagem da autorregulação, do controle emocional, do funcionamento executivo,
da compreensão social, da criatividade e de outras habilidades cognitivas das crianças,
assim como ser valorizada simplesmente pela alegria que as brincadeiras
proporcionam às crianças.

Referências

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Doris Bergen, PhD, Distinguished Professor of Educational Psychology, Emerita - Miami University, EUA

Para citar este artigo:

Bergen D. Desenvolvimento cognitivo na aprendizagem por meio de jogos e brincadeiras. Em: Tremblay
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