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Atenção e Linguagem: Definições e Instrumentos de Avaliação
Patrícia Botelho da Silva

Em contato com o ambiente, estamos a todo momento recebendo


informações e estímulos de diferentes naturezas, tanto internos como nossos
pensamentos quanto externos advindos do ambiente. O papel do nosso
sistema nervoso é selecionar qual destas informações devem ser processadas
de maneira eficiente. Sendo assim, a atenção é conjunto de funções cognitivas
que possibilita selecionar estímulos do ambiente ou informações do mundo
interno para processá-los e lidar de maneira mais adaptativa. A partir disso, a
atenção permite a percepção de detalhes, processamento sensorial e motor
mais veloz e armazenamento de informações na memória de maneira mais
eficaz (Carreiro et al. 2015).
Diante disso, a atenção apresenta caráter seletivo e limitado, sendo
necessário mudar o foco atencional de um estímulo para outro para garantir
maior eficiência ao processo, sendo que outros estímulos não selecionados
são processados de maneira secundária. A partir disso, a atenção bem como
outras habilidades cognitivas realiza ajustes dinâmicos e flexíveis das
percepções de acordo com nossa experiencia, volição, expectativas e os
objetivos relacionados às tarefas. Pensando nisso, a atenção não pode ser
compreendida como um conceito único, e sim dependente de múltiplos fatores
que auxiliam na compreensão dos processos perceptivos e organiza a entrada
da informação em nossa consciência (Carreiro et al. 2015; Menezes et al.
2012; Miotto & Campanholo, 2019). Para a realização destes processos
complexos, a atenção está relacionada com outras habilidades cognitivas como
funções executivas e memória, sendo descrita como um pré-requisito para o
funcionamento intelectual (Miotto & Campanholo, 2019). A partir disso, torna-se
necessário diversos processos básicos, sendo eles: a seleção sensorial o que
permite focalizar e alterar a seleção automática; seleção de respostas
relacionadas a iniciação e inibição e controle; e capacidade atencional (alerta)
e desempenho sustentado (vigilância) (Menezes et al. 2012).
Quanto a sua classificação, podemos classificá-la de acordo com sua
origem em processos automáticos e voluntários. A orientação voluntária está

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relacionada com a capacidade de direcionar a atenção levando em
consideração se o indivíduo seleciona a fonte externa pela qual quer direcionar
seus recursos de processamento (também chamada de endógena ou top-
down). Já a orientação automática está relacionada com o direcionamento da
atenção após evento inesperado do ambiente que atrai sua atenção de
maneira não voluntária (chamada de exógena ou bottom-up) (Carreiro et al.
2015; Menezes et al. 2012).
Outra classificação está relacionada com o tipo de resposta ao estímulo,
sendo separada em atenção seletiva, alternada, dividida e sustentada. A
atenção sustentada é a capacidade em detectar, responder aos estímulos e
manter a resposta estável por um período determinado durante a realização da
tarefa. A atenção seletiva está relacionada com a capacidade de se manter
atento e direcionar a atenção a um estímulo, em detrimento a outros, ou seja,
focar sua atenção em um estímulo. Já a atenção dividida envolve a capacidade
de dividir o foco de atenção entre dois estímulos ou tarefas, sendo necessário
que um dos processos seja automático ou a natureza sensorial deve ser
distinta entre as duas atividades. Por fim, a atenção alternada é a capacidade
em modificar o foco da atenção de um componente para outro e atender a dois
ou mais estímulos ao mesmo tempo de maneira alternada sem interrupção
(Miotto & Campanholo, 2019). Também podemos destacar a atenção
concentrada que está relacionada com a capacidade de selecionar apenas
uma informação diante de estímulos distratores em um período pré-
determinado (Miotto & Campanholo, 2019).
Com isso, dificuldades no direcionamento ou manutenção da atenção
podem interferir na percepção de estímulos relevantes do ambiente e como
iremos responder adequadamente a eles. Sendo assim, prejuízos podem
interferir no aprendizado e com isso avaliações destes processos tornam-se
relevantes e importantes ao longo do desenvolvimento (Menezes et al. 2012). A
partir disso, a tabela a seguir apresenta os instrumentos disponíveis para
avaliação no contexto brasileiro e a respectiva idade para uso e
subcomponente para avaliação. Visto que a atenção envolve múltiplos
processos e mecanismos distintos, é importante selecionar adequadamente os
instrumentos a serem utilizados durante o processo avaliativo.

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Nome do instrumento Habilidade avaliada Idade para aplicação
Teste Stroop – Atenção seletiva e 12 a 14 anos
diferentes versões e inibição de respostas Versão Victoria original
cartões para amostra – 7 a 10 anos e 7 a 14
brasileira anos
Stroop Dia-Noite – 4 a 6
anos e 5 a 18 anos
Versão Victoria
modificada – 18 a mais
de 70 anos e 60 a 85
anos
Golden Stroop – 19 a 75
anos
Teste de atenção por Atenção seletiva e 3 a 14 anos de idade
cancelamento alternada Adultos: 20 a 32 anos
Teste de Trilhas Atenção sustentada e 18 a 86 anos
coloridas dividida.
Teste de atenção Atenção concentrada 18 a 64 anos
concentrada AC
Teste de atenção Atenção concentrada 16 a 60 anos
concentrada AC – 15 por período mais longo
de tempo
Teste de atenção Atenção concentrada 18 a 76 anos
concentrada TEACO-FF
Teste de Atenção Atenção dividida e TEADI – 18 a 73 anos
dividida (TEADI) e teste alternada TEALT – 18 a 76 anos
de atenção alternada
(TEALT)
Bateria Psicológica de Atenção concentrada, 6 a 82 anos
Avaliação da Atenção dividida e alternada
Teste de atenção visual Atenção visual seletiva, 6 a 17 anos
– 4 (TAVIS – 4) alternada e sustentada
Atenção On-line Concentrada, alternada 18 a 70 anos

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e dividida
Fonte: adaptada de Miotto, et al 2018; Miotto et al. 2019

E a Habilidade de Linguagem, como Defini-la?

Avaliar habilidades linguísticas torna-se relevante dentro da investigação


da cognição, pois se trata de uma habilidade essencial para o processamento
cognitivo geral. A linguagem é formada por um sistema que faz uso de
símbolos, sons e gestos com o objetivo de promover comunicação e interação
com o ambiente e construção de conceitos. Podemos classificá-la em suas
modalidades oral, escrita ou de sinais (Myers, 2015). A partir disso, vale
ressaltar que linguagem é diferente de fala. A linguagem é uma só
apresentando modalidades especificas (oral, escrita e de sinais) (Mousinho et
al., 2018).
A linguagem oral se desenvolve a partir da interação entre o aparato
biológico preservado e um ambiente estimulador e promotor de possibilidades
de desenvolvimento (Mousinho et al., 2018). Diante disso, para que ocorra o
domínio da linguagem devem ser desenvolvidos 6 seis componentes básicos: a
fonologia (conjunto de regras para o uso dos fonemas); a morfologia (regras de
combinação dos fonemas em unidades de significados, morfemas); a sintaxe
(regras para combinação dos morfemas); a semântica (significado da
linguagem); a pragmática (regras para uso da linguagem em contexto social); e
a prosódia (melodia da fala) (Miotto et al. 2018).
Mas para que a habilidade de combinar palavras possa se desenvolver,
primeiro é necessário armazenar as representações das palavras e seus
conceitos, sendo estas representações relacionadas a cada componente. Por
exemplo, para a palavra CACHORRO, preciso armazenar as características
fonológicas (os sons que formam a palavra), o significado dela (semântica),
como usá-la em uma frase (sintaxe), como a palavra é escrita (ortografia) entre
outras. Diante disso, todas as representações das palavras são armazenadas
no que é chamado de léxico mental. O léxico mental é, portanto, um repositório
mental de informações sobre palavras. Assim, o processamento lexical (acesso

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a todas as representações) permite a todos compreender e produzir palavras
(Gazzaniga et al., 2006).
Por outro lado, a linguagem escrita necessita de ensino formal e
sistemático das regras linguísticas e a percepção de que fala pode ser
representada por símbolos gráficos (Mousinho et al., 2018). Desta forma, a
linguagem escrita, diferente da linguagem oral, precisa ser ensinada para que
os circuitos neurais possam ser construídos e especializados para processar
seus estímulos, ou seja, é necessário que ocorra mudanças neurais (Scliar-
Cabral, 2010).
No entanto, a linguagem oral pode ser compreendida como a base para
o desenvolvimento da linguagem escrita (Mousinho et al., 2018). Diante disso,
habilidades preditoras relacionados a linguagem oral possibilitam a construção
e desenvolvimento de processos cognitivos e neurais que auxiliam no
desenvolvimento da linguagem escrita. Dentre as habilidades preditoras para o
desenvolvimento da alfabetização, destacam-se a nomeação automática
rápida, a consciência fonológica, a memória fonológica, vocabulário entre
outras (National Early Literacy Panel [Nelp], 2009).
A nomeação automática rápida é a habilidade em integrar estímulos
visuais com suas representações verbais de maneira rápida e acurada. Essa
habilidade envolve a integração de habilidades como percepção, movimentos
oculares, atenção, funções executivas, habilidades motoras, fonológicas e
verbais. É uma das principais preditoras para o desenvolvimento da linguagem
escrita em conjunto com a consciência fonológica que é a habilidade em
identificar, manipular e integrar sons para formar palavras (Silva et al. 2018).
Para avaliação da nomeação automática rápida, atualmente só existe o teste
TENA – teste de nomeação automática (Silva et al. 2018) que pode ser
utilizado com crianças de 3 a 9 anos de idade. Já para a avaliação da
habilidade de consciência fonológica, existem diversos testes normatizados
para a população brasileira, bem como para as outras habilidades de
linguagem. Assim, a seguir será apresentada uma lista com os principais testes
para avaliação da linguagem oral (Miotto et al. 2018):

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• Bateria Montreal de avaliação da comunicação (MAC) – Versão abreviada:
busca avaliar processos comunicativos (pragmático, prosódico, léxico-
semântico e discursivo); idade de aplicação 19 a 75 anos.
• Bateria Montreal-Toulousse de avaliação da linguagem: avalia as
habilidades de compreensão e emissão oral e escrita de palavras, frases,
sentenças e discurso principalmente em pacientes com lesões cerebrais; idade
de aplicação 19 a 75 anos.
• Token test reduzido: avalia a compreensão auditiva de ordens; idade de
aplicação: estudos com dados para crianças 7 a 10 anos e outro para maiores
de 60 anos.
• Teste de nomeação de Boston: avalia o resgate lexical e vocabulário; idade
de acordo com estudos brasileiros: 6 a 93 anos, 28 a 70 anos, 6 a 77 anos e 60
a 93 anos.
• Teste infantil de nomeação: avalia linguagem expressiva e acesso ao léxico;
idade: 3 a 14 anos.
• Teste de vocabulário por figuras USP: avalia o vocabulário auditivo-
receptivo; idade: 7 a 10 anos.
• Prova de Consciência fonológica por produção oral: avalia a habilidade de
consciência fonológica utilizando estímulos auditivos e respostas verbais;
idade: 6 a 14 anos.
• Prova de consciência fonológica por escolhas de figuras: avalia a habilidade
de consciência fonológica por respostas não verbais; idade: 6 a 10 anos.
• Teste de discriminação fonológica: avalia a discriminação de palavras
fonologicamente semelhantes; idade: 3 a 6 anos.
• Teste de Repetição de palavras e pseudopalavras: avaliar a memória
fonológica; idade: 3 a 14 anos.
• Prova de consciência sintática: avalia a habilidade de consciência sintática;
idade: 3 a 14 anos.
As habilidades de linguagem escrita podem ser avaliadas por meio dos
seguintes testes: Teste de competência de leitura de palavras e
pseudopalavras (6 a 15 anos de idade); Teste contrativo de compreensão
auditiva e de leitura (6 a 11 anos); Protocolo de avaliação da compreensão de
leitura (3º ao 5º ano do ensino fundamental); Prova de avaliação dos processos

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de leitura (PROLEC – 2º ao 5º ano do ensino fundamental; coleção ANELE
para leitura e escrita (6 a 12 anos e adultos para a prova de escrita); Prova de
escrita sob ditado (6 a 11 anos) (Miotto et al. 2018). Portanto, as habilidades de
linguagem oral devem ser avaliadas no processo de investigação
neuropsicológica como uma forma de investigar possíveis dificuldades que
podem interferir em habilidades de linguagem escrita e desempenho
acadêmico.

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Referências Bibliográficas

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avaliação neuropsicológica: a prática da testagem cognitiva. Vol. 2. São
Paulo: Memnon.

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(2019) Manual de avaliação neuropsicológica: a prática da testagem
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MIOTTO, E. C; CAMPANHOLO, K. R.; SERRAO, V. T.; TREVISAN, B. T.


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nomeação automática (1st ed.). Hogrefe CETEPP.

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